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Monitoramento de contatos de pacientes com tuberculose por agentes comunitários de saúde

Monitoreo de contactos de pacientes con tuberculosis por agentes comunitarios de salud

Resumo

Objetivo

Analisar o monitoramento de contatos de pacientes com tuberculose (TB) na perspectiva de Agentes Comunitários de Saúde (ACS).

Métodos

Estudo descritivo, transversal e qualitativo, com ACS de oito Unidades Básicas de Saúde da Supervisão Técnica de Saúde Casa Verde/Cachoerinha/Limão do Município de São Paulo, SP. Foram realizadas entrevistas semiestruturadas de junho a julho de 2021. A Vigilância à Saúde constituiu o referencial conceitual e os depoimentos foram submetidos a análise de conteúdo.

Resultados

Os ACS (51) tinham um tempo médio de atuação de 7,4 anos e 169 famílias sob sua responsabilidade; referiram já ter tido casos de TB na microárea de atuação (68,7%) e algum treinamento em relação à doença (70,6%). Em geral, o monitoramento de contatos não era conhecido pelos participantes, que também não reconheciam essa atividade como uma tarefa de sua responsabilidade. Várias dificuldades foram identificadas na rotina de trabalho, incluindo: resistência dos contatos em ser avaliados em consulta e realizar os exames solicitados, aceitar a possibilidade de ter TB, não conseguir acessar os contatos, dentre outras.

Conclusão

O desconhecimento da necessidade de monitorar os contatos pode fragilizar a detecção precoce de casos novos de Tuberculose e a Infecção Latente por Tuberculose, e contribuir para a manutenção da transmissão da doença. Dada a importância dos ACS para essa prática, e considerando que são um importante elo entre a comunidade e a equipe de saúde, recomenda-se sua devida instrumentalização para a identificação precoce de novos casos de TB e para o monitoramento adequado dos contatos.

Tuberculose; Busca de comunicante; Agentes comunitários de saúde; Vigilância em saúde pública; Monitoramento epidemiológico

Resumen

Objetivo

Analizar el monitoreo de contactos de pacientes con tuberculosis (TB) bajo la perspectiva de agentes comunitarios de salud (ACS).

Métodos

Estudio descriptivo, transversal y cualitativo, con ACS de ocho Unidades Básicas de Salud de la Supervisión Técnica de Salud Casa Verde/Cachoerinha/Limão del municipio de São Paulo, estado de São Paulo. Se realizaron entrevistas semiestructuradas de junio a julio de 2021. La Vigilancia de la Salud constituyó el marco conceptual y los testimonios fueron sometidos al análisis de contenido.

Resultados

Los ACS (51) contaban con un tiempo promedio de actuación de 7,4 años y 169 familias bajo su responsabilidad. Declararon haber tenido casos de TB en su microárea de actuación (68,7 %) y alguna capacitación relacionada con la enfermedad (70,6 %). En general, los participantes no conocían el monitoreo de contactos y tampoco reconocían esa actividad como una tarea bajo su responsabilidad. Se identificaron varias dificultades en la rutina de trabajo: resistencia de los contactos a ser evaluados en consulta y realizar los exámenes solicitados, aceptar la posibilidad de tener TB, no poder acceder a los contactos, entre otras.

Conclusión

La falta de conocimiento de la necesidad de monitorear los contactos puede debilitar la detección temprana de nuevos casos de tuberculosis y de infección por tuberculosis latente, lo que contribuye a mantener la transmisión de la enfermedad. Dada la importancia de los ACS para esta práctica y considerando que son un importante eslabón entre la comunidad y el equipo de salud, se recomienda que sean debidamente preparados para la identificación temprana de nuevos casos de TB y para el monitoreo adecuado de los contactos.

Tuberculosis; Razado de contacto; Agentes comunitarios de salud; Vigilancia en salud pública; Monitoreo epidemiológico

Abstract

Objective

To analyze the monitoring of contacts of tuberculosis (TB) patients from the perspective of Community Health Workers (CHWs).

Methods

This was a descriptive, cross-sectional, qualitative study with CHWs from eight Primary Care Center in the Casa Verde/Cachoerinha/Limão Technical Health Supervision in the city of São Paulo, SP. Semi-structured interviews were conducted from June to July 2021. Health Surveillance was the conceptual framework and the statements were subjected to content analysis.

Results

The CHWs (51) had an average working time of 7.4 years and 169 families under their responsibility; they reported having already had cases of TB in the micro-area they worked in (68.7%) and had some training in the disease (70.6%). In general, the monitoring of contacts was not known by the participants, who also did not recognize this activity as a task for which they were responsible. Several difficulties were identified in the work routine, including: contacts’ resistance to being assessed at appointments and carrying out the tests requested, accepting the possibility of having TB, not being able to access contacts, among others.

Conclusion

Ignorance of the need to monitor contacts can weaken the early detection of new cases of tuberculosis and latent tuberculosis infection, and contribute to maintaining the transmission of the disease. Given the importance of CHWs for this practice, and considering that they are an important link between the community and the health team, it is recommended that they be properly trained for the early identification of new TB cases and for the proper monitoring of contacts.

Tuberculosis; Contact tracing; Community health workers; Public health surveillance; Epidemiological monitoring

Introdução

A Tuberculose (TB) pode ser prevenida e curada, mas sua prevalência ainda é relevante, constituindo um importante problema de saúde pública. Em 2021, 10,6 milhões de pessoas no mundo foram acometidas pela doença. A pandemia de COVID-19 reverteu anos de progresso em seu controle e o número de mortes aumentou pela primeira vez em mais de uma década: foram 1,5 milhões em 2020 e 1,6 milhões em 2021.11. World Health Organization (WHO). Global Tuberculosis Report 2022. Geneva: WHO; 2022 [cited 2023 Feb 21]. Available from: https://www.who.int/teams/global-tuberculosis-programme/tb-reports/global-tuberculosis-report-2022
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O Brasil está entre os 30 países com alta carga de TB, incluindo a TB associada ao Vírus da Imunodeficiência Humana (TB-HIV), ambas de controle prioritário, segundo a OMS.22. Brasil. Ministério da Saúde. Brasil livre da tuberculose - Plano nacional pelo fim da tuberculose como problema de saúde pública: estratégias para 2021-2025. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2021 [citado 2023 Fev 21]. Disponível em: https://www.gov.br/saude/pt-br/centrais-de-conteudo/publicacoes/svsa/tuberculose/plano-nacional-pelo-fim-da-tuberculose-como-problema-de-saude-publica_-estrategias-para-2021-2925.pdf/view
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Em 2021, a incidência da TB foi de 48,0/100 mil hab. (104.000 casos novos); em 2020, foram 6.000 mortes (coeficiente de mortalidade por TB em HIV negativos: 2,8 casos/100 mil hab.).33. World Health Organization (WHO). Tuberculosis profile: Brazil. Estimates of TB burden, 2021. Geneva: WHO; 2021 [cited 2023 Aug 25]. Available from: https://worldhealthorg.shinyapps.io/tb_profiles/?_inputs_&entity_type=%22country%22&lan=%22EN%22&iso2=%22BR%22
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Tais dados evidenciam a importância das medidas de controle, visando reduzir o número de casos, detectá-los e tratá-los precocemente, além de monitorar seus contatos. O Ministério da Saúde (MS) recomenda que todos os contatos sejam avaliados sistematicamente, definindo-os como todas as pessoas expostas àquelas diagnosticadas com TB, seja em domicílio, trabalho, instituições de longa permanência, escola, etc.44. Brasil. Ministério da Saúde. Manual de recomendações para o controle da tuberculose no Brasil. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2019 [citado 2023 Fev 21]. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/manual_recomendacoes_controle_tuberculose_brasil_2_ed.pdf
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A investigação de contatos é estratégia efetiva na detecção de casos de TB e contribui para controlar a doença e prevenir o adoecimento.55. Feng JY, Chen SC, Lee MC, Fan WC, Su WJ, Hu YW, et al. Is 1-year follow-up adequate for adult tuberculosis contacts? Eur Respir J. 2015;45(5):1501-4.Embora a avaliação seja extensivamente recomendada, ela não tem sido valorizada na prática como fonte de identificação de novos casos. Mais ainda, há evidências de que a vigilância no domicílio ganha amplitude, ao se estender para os espaços sociais e, buscando construir as redes sociais do indivíduo que apresenta a TB.66. Maciel EL, Sales CM. Epidemiological surveillance of tuberculosis in Brazil: how can more progress be made? Epidemiol Serv Saude. 2016;25(1):175-8. Em 2021, o percentual de exames de contatos de casos novos de TB pulmonar, com confirmação laboratorial, no Brasil, foi de 69,1%; no Estado de São Paulo, de 80,7%; e no Município de São Paulo, de 56,1%.77. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Boletim Epidemiológico de Tuberculose. Brasília (DF): Ministério da Sáude; 2022 [citado 2023 Fev 21]. Disponível em: https://www.gov.br/saude/pt-br/centrais-de-conteudo/publicacoes/boletins/epidemiologicos/especiais/2022/boletim-epidemiologico-de-tuberculose-numero-especial-marco-2022.pdf
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A Estratégia Global para o Enfrentamento da TB orienta a intensificação da avaliação de contatos e a incorporação de novas tecnologias para o diagnóstico da Infecção Latente de Tuberculose (ILTB).88. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde: Plano Nacional pelo Fim da Tuberculose como Problema de Saúde Pública. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2017 [citado 2023 Fev 21]. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/brasil_livre_tuberculose_plano_nacional.pdf
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A ILTB é identificada principalmente a partir do monitoramento de contatos, e se refere aos indivíduos infectados pelo Mycobacterium tuberculosis que não apresentam a doença ativa. Embora nem todos estes adoecerão com a forma ativa da TB, eles permanecem como um reservatório que pode ser reativado em caso de resposta imunológica comprometida.99. Brasil. Ministério da Saúde. Protocolo de vigilância da infecção latente pelo Mycobacterim tuberculosis no Brasil. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2022 [citado 2023 Fev 21]. Disponível em: https://www.gov.br/aids/pt-br/central-de-conteudo/publicacoes/2022/af_protocolo_vigilancia_iltb_2ed_9jun22_ok_web.pdf/view
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Para cumprir as metas desta estratégia, o Plano Nacional pelo Fim da Tuberculose adotou, como indicador, a proporção de contatos examinados (dos casos novos de tuberculose pulmonar com confirmação laboratorial), estabelecendo como meta avaliar 90% deles.22. Brasil. Ministério da Saúde. Brasil livre da tuberculose - Plano nacional pelo fim da tuberculose como problema de saúde pública: estratégias para 2021-2025. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2021 [citado 2023 Fev 21]. Disponível em: https://www.gov.br/saude/pt-br/centrais-de-conteudo/publicacoes/svsa/tuberculose/plano-nacional-pelo-fim-da-tuberculose-como-problema-de-saude-publica_-estrategias-para-2021-2925.pdf/view
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Neste contexto, destaca-se a importância de estudos que possibilitem compreender eventuais dificuldades encontradas pelos profissionais de saúde, com destaque para o Agente Comunitário de Saúde (ACS), que realiza o acompanhamento contínuo de usuários junto ao território da unidade de saúde em que atua.1010. Maciel EL, Vieira RC, Milani EC, Brasil M, Fregona G, Dietze R. O agente comunitário de saúde no controle da tuberculose: conhecimentos e percepções. Cad Saude Publica. 2008;24(6):1377-86.,1111. Rocha GS, Lima MG, Moreira JL, Ribeiro KC, Ceccato M, Carvalho WS, et al. Conhecimento dos agentes comunitários de saúde sobre a tuberculose, suas medidas de controle e tratamento diretamente observado. Cad Saude Publica. 2015;31(7):1483-96.Portanto, o objetivo deste estudo foi analisar o monitoramento de contatos em Unidades Básicas de Saúde (UBS) na perspectiva de agentes comunitários de saúde.

Métodos

Estudo transversal, descritivo, de abordagem qualitativa, em oito UBS com Estratégia Saúde da Família da Supervisão Técnica de Saúde (STS) Casa Verde/Cachoerinha/Limão da Coordenadoria Regional de Saúde Norte de São Paulo, SP.

A amostra foi intencional, tendo sido entrevistados, por sorteio, um ACS em cada equipe das UBS, totalizando 51 participantes. Quando o estudo foi realizado, havia 51 equipes da ESF na região, e cada UBS tinha 4-9 equipes. Atuar como ACS, por pelo menos um ano, foi critério de inclusão; e ACS afastados do trabalho por licença médica ou férias foi critério de exclusão.

A coleta de dados ocorreu no período de junho-julho de 2021, por meio de entrevista semiestruturada individual (gravada em áudio portátil, em ambiente privado no local de trabalho do ACS), que foi agendada previamente com o gerente da unidade de saúde. Foi aplicado um instrumento elaborado para este estudo, contendo questões sobre o perfil sociodemográfico do ACS e sua experiência com TB; além disso, foram feitas oito perguntas norteadoras que buscavam capturar sua forma de atuação em relação ao monitoramento de contatos, além de outros aspectos sobre sua experiência com pacientes com TB. Os depoimentos foram submetidos a análise de conteúdo1212. Minayo MC. O desafio do conhecimento: Pesquisa Qualitativa em Saúde. São Paulo: Hucitec; 2014. seguindo-se as etapas de pré-análise, codificação, categorização e inferências.1313. Bardin L. Análise de conteúdo. São Paulo: Edições 70; 2011.Excertos de frases dos depoimentos são identificados por E (ACS entrevistado) e número sequencial (conforme a ordem de realização da entrevista).

O conceito de Vigilância da Saúde foi o referencial do estudo, considerando que se refere a prática que organiza os processos de trabalho para enfrentar os problemas de saúde em um determinado território.1414. Mendes EV. Planejamento e programação local da Vigilância da Saúde no Distrito Sanitário. Brasília (DF): Organizaçäo Pan-Americana da Saúde; 1994. 109 p. (Série Desenvolvimento de Serviços de Saúde, 13).

O projeto foi aprovado pelos Comitê de Ética em Pesquisa de Instituição Pública do Ensino Superior (# 4.601.966) (Certificado de Apresentação de Apreciação Ética: 41891621.6.0000.5392) e Comitê de Ética da Secretaria de Saúde do Município de São Paulo (# 4.697.559) (Certificado de Apresentação de Apreciação Ética: 41891621.6.3001.0086).

Resultados

Com o intuito de facilitar a compreensão e apenas didaticamente, uma vez que perfazem o conjunto das entrevistas e por guardar dependência em sua interpretação, os resultados são apresentados por categorias de conteúdo.

O perfil dos ACS entrevistados

Um total de 49 (96,4%) entrevistados eram mulheres (média de idade: 40,6 anos); a maior parte se autodeclarou como brancas (19; 37,2%), seguida de pardas (17; 33,3%). A maioria (35: 68,6%) completou o ensino médio. O tempo médio de atuação como ACS foi de 7,4 anos, e a média de famílias sob sua responsabilidade era 169. Quanto à experiência com tuberculose, a maior parte delas (36; 70,6%) relatou ter participado de capacitação e/ou orientações no cotidiano, especialmente por parte da enfermeira da equipe e 68,7% (35) afirmaram ter tido casos de tuberculose em sua microárea de atuação (Tabela 1).

Tabela 1
Experiência dos participantes do estudo com Tuberculose (Bairros de Casa Verde, Limão e Cachoeirinha; São Paulo, SP)

Percepção dos ACS sobre ações junto a contatos de pacientes com TB

Os participantes descreveram como percebiam o fluxo de atendimento na unidade de saúde e apontaram ações sobre o monitoramento dos contatos de pacientes com TB, tais como, orientações para evitar a transmissão, manter a vigilância e convocá-los para atendimento e realização de exames na UBS. Eles apontaram que os contatos eram acolhidos na UBS em um primeiro momento, sendo orientados sobre a doença, sua sintomatologia e os exames necessários para a sua detecção (E14, E40, E41, E45).

Acolher e tirar dúvidas, porque muitas pessoas ainda têm dúvidas sobre a doença no geral; estar esclarecendo, fazer o acolhimento, esclarecer todas as dúvidas, as informações; reforçar os cuidados e suprir as necessidades em questão, mesmo da orientação para o paciente e para família (E40).

Algumas orientações, especialmente sobre a necessidade de isolar a pessoa doente e seus objetos particulares, são equivocadas e evidenciam a compreensão precária sobre a enfermidade quando a terapêutica correta é instaurada:

Acho que deveria ter um isolamento da família, todo mundo usar máscara, como é parecido com o COVID, porque é uma doença... tuberculose é uma doença grave... mas eu acho que o isolamento social deveria incluir para toda a família (E6).

Em uma outra perspectiva, alguns ACS relataram que os contatos não são necessariamente avaliados na UBS após realizarem exames e terem resultado negativo (E17, E20, E23, E26, E32, E35, E38, E39, E47), ainda que o agendamento era priorizado pela equipe, sendo então atendidos no mesmo dia em que procuravam o serviço (E44, E50).

Os ACS orientam os contatos para que compareçam à UBS, afirmando não ter dificuldades nessa atividade (E1, E4, E5, E6, E8, E9, E11, E12, E13, E15, E16, E19, E20, E22, E24, E25, E27, E29, E30, E33, E38, E39, E40, E41, E43, E45, E46, E47, E50, E51). Entretanto, afirmaram que a concretização dessa orientação independe de sua vontade (E13, E30, E40, E45, E51).

Eu acredito que não teria dificuldade não; eu vou lá e agora a gente tem um tablet que a gente trabalha com ele; também temos contatos via WhatsApp com os pacientes... a gente não tem dificuldade para falar com eles, tanto pessoalmente, tanto pelo tablet (E6).

Não, dificuldade nenhuma, até porque é o nosso papel estar fazendo a orientação e a visitação mensal dessas famílias... e sempre persistir na orientação; uma hora a pessoa vai acabar vindo na unidade (E46).

Eu acho que dar a orientação não (dificuldade), mas vir até o posto, aí depende de cada família (E30).

... de ela entender e, às vezes, a pessoa também não vê o risco, tem medo... (E51).

Segundo os ACS, a vigilância dos contatos ocorre nas visitas domiciliares, e eles entendem ser a ponte entre a UBS e as famílias, levando informações sobre eventuais alterações à equipe de saúde (E4, E5, E6, E8, E16, E32, E39), além de compreender a necessidade de rastreamento e avaliação dos contatos na UBS (E10, E11, E24, E31, E46, E48).

...é uma doença que pega no ar... Então, quanto mais cuidado o ACS puder ter com essa família e um olhar mais de perto, eu acho que é muito importante (E6).

Eu acredito que tenha que fazer no rastreamento também das pessoas que convivem e; provavelmente, tem um contato próximo, até porque na mesma casa às vezes você acaba compartilhando talheres, mesmo copo... (E24).

A vigilância se concretiza na identificação da sintomatologia, mesmo em pacientes já avaliados clinicamente e com exames inalterados (E13, E24, E35).

...a gente vem acompanhando, a médica também, a enfermeira também, ... se a gente percebe que a pessoa não está muito bem, a gente já chama a enfermeira: “olha XXX, é assim: esse paciente ele não está muito bem, ele está ruim, ele está com uma tosse; chegou com a mãe dele; não é melhor a gente refazer de novo os exames?” (E13)

A necessidade de submeter os contatos a exames laboratoriais não foi mencionada em apenas 6 depoimentos (E2, E5, E8, E24, E30, E42). A maioria dos ACS apontou que os contatos realizaram o “teste de TB”, o BK (referindo-se ao Teste Molecular Rápido para TB ou ao exame baciloscópico de escarro), ou raios X (E12, E13, E15, E18, E20, E21, E36, E37, E44, E48, E50).

Entretanto, só 15 ACS mencionaram que um dos testes que os contatos devem realizar é o Protein Purified Derived (PPD), a Prova Tuberculínica (E3, E8, E12, E13, E18, E21, E22, E26, E36, E37, E40, E41, E42, E43, E48). Mesmo ao citar o PPD, a maior parte desconhecia sua finalidade; alguns não lembraram sua denominação, dizendo apenas que era realizado em outro local (UBS de referência) (E3, E8, E41, E42, E43).

Ainda em relação aos exames, alguns ACS disseram que os exames realizados pelos contatos adultos são diferentes daqueles realizados pelas crianças (E5, E8, E12, E13, E16, E18, E20, E24, E26, E33, E37, E40, E42, E47, E49).

...nas crianças, é feito o PPD; e nos adultos, geralmente é feito o raio X para aqueles que não têm sintomas; quando têm sintomas ainda, pede o BK para ver se tem a doença, mas nas crianças é só o PPD (E26).

Segundo os ACS, os exames para contatos são solicitados previamente por médico ou enfermeiro da equipe; e depois, o ACS entrega os pedidos e um frasco para a coleta do escarro (E13, E18, E20, E29, E21, E27, E33, E40, E48). Embora a maior parte dos ACS tenha mencionado com exatidão a sistemática operacional para a realização de exames pelos contatos, alguns mostraram incerteza em relação ao seu fluxo (E6, E9, E28, E51).

Apesar da variedade e complexidade das ações realizadas pelos ACS no território, e de apreciarem o seu trabalho, alguns deles consideraram não ser parte de sua função, a exemplo de agendamento de consultas a pedidos de pacientes (E33, E34, E46):

...eu gosto porque... apesar de que sempre tem alguns que... já aconteceu várias vezes comigo, não foi uma nem duas vezes; eles cobram um papel da gente que não é nosso; cobram às vezes um papel de cuidador; eles não entendem a nossa função, qual é a nossa função?, que nós somos limitados, que nós não estamos aqui para isso; muitas vezes, a gente até faz coisas que não deveria para ajudar a família, mas mesmo assim tem a ingratidão; isso acontece muito; tem pessoas que demandam demais da gente; desgasta muito, bastante, e eu procuro lidar com paciência e sabedoria, porque é difícil... (E33).

Percepção dos ACS sobre o tratamento da ILTB

Os ACS mostraram compreensão limitada sobre o tratamento da ILTB, que é fundamentalmente relevante no monitoramento dos contatos, mas sem apresentar diferenças de conduta em relação ao tratamento no caso da TB (E7, E21, E29, E30, E38, E43, E47, E48, E49), com exceção de apenas três menções (E43, E47, E48).

...no meu caso, eu sei que o meu médico ele tratou o paciente, mas também deu medicação para a própria família também (E7).

Eu acho que é passar no médico, fazer exames; eu não sei; teve uma vez que teve um paciente da nossa equipe que a família tomou um remédio também (E30).

...a mãe e a sobrinha tomou o remédio por três meses, no caso do assintomático a medicação é diferente do que estava com o contato, é bem menos tempo e é uma outra medicação, o que está com a tuberculose já detectada, ele tem que tomar quatro comprimidos, a outra não, já é uma dose bem menos e é bem menos tempo... (E43).

É o PPD e faz o exame e ele, dando uma pequena reação, às vezes, começa o tratamento de profilaxia também (E47).

Percepção dos ACS sobre dificuldades no cuidado aos contatos

A este respeito, os ACS apontaram: resistência dos contatos em realizar exames (E4, E7, E9, E12, E17, E21, E22, E26, E32, E35, E38, E44, E46, E48, E49) e em aceitar a possibilidade de ter TB (E18); oferecimento do PPD só na unidade de referência (E12, E26); não conseguir acessar os contatos (ausentes na moradia, não residiam na área de abrangência da UBS ou não compreendiam o idioma português, no caso de imigrantes) (E14, E16, E18, E28, E31, E38); e necessidade de trabalhar, que limita as chances de comparecimento à UBS (E6, E8, E14, E28).

Sim, ... de trazer, vai ter um pouquinho de rejeição deles... porque até então, eles não aceitam; é muito difícil; eles não têm essa; eles não aceitam mesmo que estão com tuberculose, entendeu? para trazer, é bem difícil; tem alguns pacientes que são bem difíceis trazer para fazer um exame comum (E22).

Mesmo a gente perguntando, falando, “está tudo bem? tem alguém com tosse?” “ah tô tossindo um pouquinho só”, um pouquinho só, mas vai ver quantos dias já está, principalmente quem é boliviano, eles não querem parar de trabalhar, ... eles não querem perder tempo, de vir ao posto para fazer o exame; enquanto isso, vai contaminando os outros, demais que estão ali trabalhando ao seu redor (E18).

... a única dificuldade que eu acho é do PPD, porque às vezes, eu tenho uma família que é bem carente e, quando eles tiveram a tuberculose, tinha que fazer o teste em outra unidade (E26).

... a dificuldade seria se eles tivessem que trabalhar; que muitos falam assim: que eu não posso ir à unidade, porque eu tenho que ir para o trabalho (E6).

Sempre tem aquela família, que tem aquela pessoa, que mora ali, que trabalha... que tem medo de, sei lá, pegar uma declaração ou não quer deixar de trabalhar para vir, sempre vai ter um que vai dar mais trabalho... (E8).

Ausência de sintomas, TB extrapulmonar (E26, E38), contatos do meio extrafamiliar, p.ex., no caso de amigos, também dificultam o monitoramento dos contatos (E2, E10, E23, E26, E38).

...tem algumas pessoas que não se preocupam... não tem esse cuidado... por não ter tido sintoma, acho que não viriam, acho que familiar é importante vir, mas acho que amigo... não sei se viriam (E2).

Discussão

O monitoramento de contatos, foco deste estudo, não é realizado de forma sistemática. Há incertezas, entre os ACS, quanto ao fluxo e acesso ao serviço, inclusive em relação a suas atribuições. A maioria dos ACS não reconhece o monitoramento como trabalho de sua responsabilidade, o que compromete a proposta da Vigilância à Saúde.

O ACS têm diversas atribuições no controle da tuberculose; entre elas, destacam-se as seguintes: estar atento aos principais sinais e sintomas de TB em todos os encontros com a comunidade; encaminhar os casos suspeitos; realizar prioritariamente a busca ativa de sintomáticos respiratórios (SR); orientar a população sobre a transmissão e medidas de prevenção da doença; acompanhar a situação vacinal das crianças e encaminhar à UBS os menores de 5 anos sem registro da vacina BCG, além de orientar e encaminhar os contatos de pacientes com TB para avaliação clínica e possível tratamento na UBS.15 Embora algumas dessas atribuições tenham sido citadas no presente estudo, os participantes não orientavam a população em geral sobre a doença, restringindo-se às famílias afetadas pela TB, mesmo assim com restrições. Tampouco foi constatado que a busca ativa de SR é uma estratégia prioritária dos ACS; e a identificação da situação vacinal dos menores de 5 anos não foi mencionada.

Foi possível identificar um certo equívoco em relação ao fluxo de atendimento aos pacientes sintomáticos respiratórios e aos contatos de pacientes com TB. Se os contatos apresentam sintomas, recomenda-se descartar a tuberculose ativa através de exames diagnósticos, tais como Teste Rápido Molecular de TB (TRM-TB) ou Baciloscopia; após a certeza de que o contato não tem a doença, deve-se investigar a ILTB.44. Brasil. Ministério da Saúde. Manual de recomendações para o controle da tuberculose no Brasil. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2019 [citado 2023 Fev 21]. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/manual_recomendacoes_controle_tuberculose_brasil_2_ed.pdf
https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicaco...

Quanto à realização de exames pelos contatos, quase todos os sujeitos do estudo citaram que o TRM-TB ou o exame baciloscópico de escarro devem ser realizados; alguns deles mencionaram a necessidade de os contatos realizarem o raio X de tórax e cerca de um terço relataram que o PPD também deveria ser realizado, o que evidencia conhecimento deficitário.44. Brasil. Ministério da Saúde. Manual de recomendações para o controle da tuberculose no Brasil. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2019 [citado 2023 Fev 21]. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/manual_recomendacoes_controle_tuberculose_brasil_2_ed.pdf
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Apesar da prática corrente do uso do PPD, a maioria dos participantes desconhecia sua finalidade. O teste PPD é usado rotineiramente e constitui-se em reação de hipersensibilidade do tipo tardia ao antígeno micobacteriano.44. Brasil. Ministério da Saúde. Manual de recomendações para o controle da tuberculose no Brasil. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2019 [citado 2023 Fev 21]. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/manual_recomendacoes_controle_tuberculose_brasil_2_ed.pdf
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Outro ponto preocupante, apontado em algumas falas dos ACS, é que os contatos não deveriam necessariamente retornar para avaliação na UBS se eles realizaram exames (baciloscópico e/ou raio X de tórax e/ou PPD) cujos resultados foram negativos. Como a maioria dos ACS não relatou PPD como o principal exame a ser realizado nos contatos, isso pode significar que tal grupo venha a ter a TB supostamente descartada, e não será cogitado o tratamento de ILTB, com repercussões negativas no controle da enfermidade. Entretanto, uma das dificuldades mencionadas é a de que há um escasso número de UBS que realizam o PPD. De fato, quando o estudo ocorreu, a STS era composta por 13 UBS e só uma delas realizava este exame.

O tratamento para a ILTB consiste na terapêutica para indivíduos infectados pelo Mycobacterium tuberculosis que não manifestaram a doença ativa, sendo uma das principais estratégias para interromper a cadeia de transmissão.99. Brasil. Ministério da Saúde. Protocolo de vigilância da infecção latente pelo Mycobacterim tuberculosis no Brasil. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2022 [citado 2023 Fev 21]. Disponível em: https://www.gov.br/aids/pt-br/central-de-conteudo/publicacoes/2022/af_protocolo_vigilancia_iltb_2ed_9jun22_ok_web.pdf/view
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Alguns ACS apontaram que os contatos realizaram tratamento para a ILTB, mas mostraram conhecimento insuficiente e equívocos em relação à diferença entre a TB e a ILTB. Para o diagnóstico de ILTB, é necessário descartar a doença ativa e realizar o PPD ou o Interferon-Gama Release Assay (IGRA).99. Brasil. Ministério da Saúde. Protocolo de vigilância da infecção latente pelo Mycobacterim tuberculosis no Brasil. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2022 [citado 2023 Fev 21]. Disponível em: https://www.gov.br/aids/pt-br/central-de-conteudo/publicacoes/2022/af_protocolo_vigilancia_iltb_2ed_9jun22_ok_web.pdf/view
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Este, como o PPD, permite avaliar a resposta imune mediada por células, e o primeiro avalia essa resposta in vitro. O PPD era o único método disponibilizado pelo SUS para o manejo da ILTB nas unidades públicas de saúde, mas em 2023 o IGRA foi disponibilizado para algumas situações, à exemplo de seu uso em crianças que são contatos de pacientes com TB.1616. Silva DR, Rabahi MF, Sant'Anna CC, Rodrigues da Silva-Junior JL, Capone D, Bombarda S, et al. Consenso sobre o diagnóstico da tuberculose da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia. J Bras Pneumol. 2021;47(2):e20210054.,1717. São Paulo. Divisão de Vigilância Epidemiológica. Coordenadoria de Vigilância em Saúde. Secretaria Municipal da Saúde. Prefeitura do Município. Realização do Teste IGRA para diagnóstico da Infecção Latente por Mycobacterium tuberculosis (ILTB) na rede municipal de saúde. Nota Operacional PMCT 01/23. São Paulo: Divisão de Vigilância Epidemiológica; 2023 [citado 2023 Fev 21]. Disponível em: https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/upload/saude/nota_operacional_PMCT_0123_IGRA.pdf
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As dificuldades para o manejo dos contatos são corroboradas por estudo realizado em Vitória (ES)1010. Maciel EL, Vieira RC, Milani EC, Brasil M, Fregona G, Dietze R. O agente comunitário de saúde no controle da tuberculose: conhecimentos e percepções. Cad Saude Publica. 2008;24(6):1377-86. e em Ribeirão Preto (SP). Este último concluiu que a mudança da condição do ACS de transmissor de informações à equipe de saúde para participante no controle da TB, é um processo complexo, uma vez que a prática de trabalho deve estar associada ao conhecimento técnico e à competência política, que vão além das vivências pessoais.1818. Crispim JA, Scatolin BE, Silva LM, Pinto IC, Palha PF, Arcêncio RA. Agente Comunitário de Saúde no controle da tuberculose na Atenção Primária à Saúde. Acta Paul Enferm. 2012;25(5):721-7.Isso também foi reportado em um estudo realizado na África do Sul, destacando-se, ainda, a falta de recursos e treinamento, baixa aceitação pela comunidade, equívocos entre as atividades de rastreamento de contatos e outros cuidados de TB, bem como falta de priorização do monitoramento de contatos em relação a outras atividades.1919. Chetty-Makkan CM, deSanto D, Lessells R, Charalambous S, Velen K, Makgopa S, et al. Exploring the promise and reality of ward-based primary healthcare outreach teams conducting TB household contact tracing in three districts of South Africa. PLoS One. 2021;16(8):e0256033.

Os ACS reconhecem que devem realizar a vigilância dos contatos nas visitas domiciliares, buscando identificar sinais e sintomas, e agir como ponte entre a família e a UBS. A Estratégia Saúde da Família permitiu descentralizar as ações do PNCT e as visitas domiciliares devem incluir a busca ativa e a identificação dos sintomáticos respiratórios e a não realização de tais ações compromete a vigilância à saúde.2020. Santos TM, Nogueira LT, Arcêncio RA. Atuação de profissionais da Estratégia Saúde da Família no Controle da Tuberculose. Acta Paul Enferm. 2012;25(6):954-61.,2121. Gaspar LM, Braga C, Albuquerque GD, Silva MP, Maruza M, Montarroyos UR, et al. Conhecimento, atitudes e práticas de agentes comunitários de saúde sobre tuberculose pulmonar em uma capital do Nordeste do Brasil. Cien Saude Colet. 2019;24(10):3815-24.

É relevante destacar que os ACS se reconhecem como uma ponte entre a UBS e a comunidade. Sua função é integrar a comunidade aos serviços de saúde buscando facilitar a comunicação, atuando como interlocutores, pois eles conhecem o território de atuação, vivenciam o cotidiano das famílias moradoras na região, o que pode facilitar o trabalho de vigilância e promoção da saúde realizado por toda a equipe e, com isso, admite-se que há potencial para reorientar o modelo assistencial.2222. Alonso CM, Béguin PD, Pueyo V, Duarte FJ, Alonso CM, Béguin PD, et al. Community Health Agent: a professional world in search of consolidation. Physis. 2021;31(1):e310129.

De fato, o trabalho dos ACS envolve uma abordagem ampliada da família, estabelecendo e mantendo o vínculo, em articulação com o serviço de saúde. Seu trabalho é essencial para identificar os Sintomáticos Respiratórios (SR) e diagnosticar a TB, ainda que esse trabalho não se mostre isento de dificuldades.2323. Gonzales RI, Harter J, Costa LM, Pinho LB, Lima LM, Reis SP. A descoberta da tuberculose no território: análise qualitativa do trabalho do agente comunitário de saúde. Cien Enferm. 2015;21(2):87-97.

Além das mencionadas anteriormente, foram apontadas como dificuldades no monitoramento de contatos, a não aceitação destes da possibilidade de contrair a doença, recusa em realizar exames, devido à ausência de sinais e sintomas e a restrição de alguns contatos se ausentarem do cotidiano de trabalho. Tais dificuldades são semelhantes às encontradas em um estudo em Campina Grande (PB).2424. Pinto ML. Contatos de indivíduos com tuberculose: análise na perspectiva da vulnerabilidade [tese]. São Paulo: Escola de Enfermagem, Universidade de São Paulo; 2020 [citado 2022 Jun 22]. Disponível em: https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/7/7141/tde-22022021-133502/pt-br.php
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Outra questão apontada foi o atendimento a contatos imigrantes, principalmente quanto a sua limitação na compreensão do idioma. É relevante lembrar que a imigração internacional vem se tornando um dos maiores desafios à saúde pública; os migrantes têm enfrentado outras dificuldades além da barreira linguística no acesso aos serviços de saúde, tais como falta de informação, baixa percepção de saúde e autocuidado, falta de profissionais qualificados para demandas específicas dessa população, etc.2525. Ventura DF, Yujra VQ. Saúde de migrantes e refugiados. Rio de Janeiro: Editora Fio Cruz; 2019.,2626. Eberhardt LD, Miranda AC. Health, work and immigration: Latin American scientific literature review. Saúde Debate. 2017; 41(Spec):299-312. Review.Em estudo realizado em Barcelona (Espanha), em áreas de alta concentração de imigrantes, a presença dos agentes comunitários foi importante, pois contribuíram para o aumento significativo do rastreamento de contatos de pacientes com TB pulmonar, com baciloscopia positiva e em todas as formas clínicas de TB.2727. Ospina JE, Orcau A, Millet JP, Sánchez F, Casals M, Caylà JA. Community health workers improve contact tracing among immigrants with tuberculosis in Barcelona. BMC Public Health. 2012;12:158.

Embora a maioria dos ACS tenham manifestado não sentir dificuldade em orientar os contatos sobre a importância da procura do serviço de saúde para serem avaliados, eles mencionaram que nem todos comparecem à UBS. Em consonância aos baixos índices de avaliação de contatos, um estudo realizado na Etiópia também identificou que a proporção de contatos rastreados era baixa (20%), apontando ainda a necessidade de qualificar as visitas domiciliares.2828. Gebretnsae H, Ayele BG, Hadgu T, Haregot E, Gebremedhin A, Michael E, et al. Implementation status of household contact tuberculosis screening by health extension workers: assessment findings from programme implementation in Tigray region, northern Ethiopia. BMC Health Serv Res. 2020;20(1):72.Diferentemente, um estudo realizado em Recife (PE) observou que a maior parte dos ACS realizava busca ativa de contatos, orientava sobre a prevenção da tuberculose, além de encaminhá-los para avaliação na UBS.2121. Gaspar LM, Braga C, Albuquerque GD, Silva MP, Maruza M, Montarroyos UR, et al. Conhecimento, atitudes e práticas de agentes comunitários de saúde sobre tuberculose pulmonar em uma capital do Nordeste do Brasil. Cien Saude Colet. 2019;24(10):3815-24.

O diagnóstico de TB extrapulmonar foi também mencionado pelos ACS como dificuldade, uma vez que é uma forma não transmissível desta doença. Mesmo assim, é necessário investigar os contatos para descobrir o caso fonte e interromper a cadeia de transmissão.44. Brasil. Ministério da Saúde. Manual de recomendações para o controle da tuberculose no Brasil. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2019 [citado 2023 Fev 21]. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/manual_recomendacoes_controle_tuberculose_brasil_2_ed.pdf
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Os resultados deste estudo permitiram conhecer uma face do monitoramento de contatos realizado pelos ACS, revelando limitações para a sua efetivação e lacunas no conhecimento desses profissionais, tais como a necessidade de isolar os doentes, mesmo desconhecendo a situação do seguimento terapêutico. Além disso, este estudo aponta para outras fragilidades, tais como a baixa oferta de PPD no território e avaliação incompleta dos contatos pela UBS, destacando-se que o conhecimento de tais brechas pode ajudar a aprimorar o trabalho da equipe de saúde, e orientar estratégias de superação, além de contribuir para que os enfermeiros compreendam as potencialidades e fragilidades do trabalho dos ACS na atenção primária em saúde.

Uma vez que os resultados deste estudo estão restritos a uma região de saúde no Município de São Paulo, reconhece-se que esta é uma limitação e que, portanto, não podem ser generalizados.

Conclusão

Os ACS são imprescindíveis na ESF e no monitoramento de contatos. Entretanto, as falhas observadas em seus conhecimentos podem corroborar os baixos índices de avaliação, trazer prejuízos no diagnóstico precoce da TB e ILTB, e a permanência da cadeia de transmissão da doença. Eles devem ser instrumentalizados sobre o tema, destacando-se que devem ser utilizados recursos metodológicos que alcancem essa categoria de trabalhadores.

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Editado por

Editora Associada

Rafaela Gessner Lourenço (https://orcid.org/0000-0002-3855-0003) Universidade Federal do Paraná, Curitiba, PR, Brasil

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    23 Set 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    25 Out 2022
  • Aceito
    29 Abr 2024
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