Resumos
OBJETIVO: Analisar a temperatura corporal do paciente submetido a cirurgia eletiva no período intra-operatório. MÉTODOS: Para a coleta de dados elaborou-se um instrumento que foi submetido à validação aparente e de conteúdo e a amostra foi constituída de 70 pacientes. As variáveis mensuradas foram: temperatura e umidade da sala de cirurgia e temperatura corporal do paciente em diferentes momentos do período intra-operatório. RESULTADOS: Em relação à temperatura corporal dos pacientes observou-se que no final do procedimento anestésico-cirúrgico a média foi de 33,6º C. A temperatura média da sala na chegada dos pacientes foi de 24,6º C e na quarta hora de procedimento anestésico-cirúrgico foi de 22,4ºC. Houve correlação estatisticamente significante e positiva entre as variáveis mensuradas. CONCLUSÃO: Os resultados apontaram a necessidade de implementação de intervenções efetivas para a prevenção da hipotermia e, neste cenário, a atuação do enfermeiro é crucial para a melhoria da assistência prestada ao paciente cirúrgico.
Hipotermia; Enfermagem perioperatória; Período intra-operatório
OBJETIVO: Analizar la temperatura corporal del paciente sometido a cirugía electiva en el período intra-operatorio. MÉTODOS: Para la recolección de datos se elaboró un instrumento que fue sometido a la validación aparente y de contenido. La muestra estuvo constituida por 70 pacientes. Las variables mensuradas fueron: temperatura y humedad de la sala de cirugía y temperatura corporal del paciente en diferentes momentos del período intra-operatorio. RESULTADOS: En relación a la temperatura corporal de los pacientes se observó que al final del procedimiento anestésico-quirúrgico el promedio fue de 33,6º C. La temperatura promedio de la sala a la llegada de los pacientes fue de 24,6º C y en la cuarta hora de procedimiento anestésico-quirúrgico fue de 22,4ºC. Hubo correlación estadísticamente significativa positiva entre las variables mensuradas. CONCLUSIÓN: Los resultados apuntaron la necesidad de implementación de intervenciones efectivas para la prevención de la hipotermia y, en este escenario, la actuación del enfermero es crucial para la mejora de la asistencia prestada al paciente quirúrgico.
Hipotermia; Enfermería perioperatoria; Periodo intraoperatorio
OBJECTIVE: To evaluate the body temperature of patients during the intraoperative period. METHODS: The sample consisted of 70 patients undergoing elective surgery. An instrument with established face and content validity was used to collect the data. The variables consisted of operation room temperature and humidity and patient's body temperature at different time points during the intraoperative period. RESULTS: The mean temperature of the operation room when the patients were transferred to the surgical table and at the fourth hour of the surgical procedure were 24.6º C and 22.4ºC, respectively. At the end of the surgery the patients' mean body temperature was 33.6º C. There were statistically significant positive correlations among the variables measured. CONCLUSION: The results indicated the need for implementation of effective interventions to prevent hypothermia during the intraoperative period. Nursing interventions are crucial to improve the delivery of quality care to surgical patients.
Hypothermia; Perioperative nursing; Intraoperative period
ARTIGO ORIGINAL
Hipotermia no período intra-operatório em pacientes submetidos a cirurgias eletivas* * Artigo extraído da Tese de Doutorado intitulada "Hipotermia no período intra-operatório" apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Enfermagem Fundamental da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (USP), São Paulo (SP), Brasil.
La hipotermia en el período intraoperatorio en pacientes sometidos a cirugías electivas
Vanessa de Brito PovedaI; Cristina Maria GalvãoII; Rosana Aparecida Spadoti DantasII
IDoutora em Enfermagem, Professora das Faculdades Integradas Teresa D'Ávila-Lorena (SP), Brasil
IIEnfermeira. Professor Associado da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (USP), São Paulo (SP), Brasil
Autor Correspondente Autor Correspondente: Cristina Maria Galvão Av. Bandeirantes, 3900 - Monte Alegre Ribeirão Preto (SP), Brasil - CEP. 14040-902 E-mail: crisgalv@eerp.usp.br
RESUMO
OBJETIVO: Analisar a temperatura corporal do paciente submetido a cirurgia eletiva no período intra-operatório.
MÉTODOS: Para a coleta de dados elaborou-se um instrumento que foi submetido à validação aparente e de conteúdo e a amostra foi constituída de 70 pacientes. As variáveis mensuradas foram: temperatura e umidade da sala de cirurgia e temperatura corporal do paciente em diferentes momentos do período intra-operatório.
RESULTADOS: Em relação à temperatura corporal dos pacientes observou-se que no final do procedimento anestésico-cirúrgico a média foi de 33,6º C. A temperatura média da sala na chegada dos pacientes foi de 24,6º C e na quarta hora de procedimento anestésico-cirúrgico foi de 22,4ºC. Houve correlação estatisticamente significante e positiva entre as variáveis mensuradas.
CONCLUSÃO: Os resultados apontaram a necessidade de implementação de intervenções efetivas para a prevenção da hipotermia e, neste cenário, a atuação do enfermeiro é crucial para a melhoria da assistência prestada ao paciente cirúrgico.
Descritores: Hipotermia/prevenção & controle; Enfermagem perioperatória; Período intra-operatório
RESUMEN
OBJETIVO: Analizar la temperatura corporal del paciente sometido a cirugía electiva en el período intra-operatorio.
MÉTODOS: Para la recolección de datos se elaboró un instrumento que fue sometido a la validación aparente y de contenido. La muestra estuvo constituida por 70 pacientes. Las variables mensuradas fueron: temperatura y humedad de la sala de cirugía y temperatura corporal del paciente en diferentes momentos del período intra-operatorio.
RESULTADOS: En relación a la temperatura corporal de los pacientes se observó que al final del procedimiento anestésico-quirúrgico el promedio fue de 33,6º C. La temperatura promedio de la sala a la llegada de los pacientes fue de 24,6º C y en la cuarta hora de procedimiento anestésico-quirúrgico fue de 22,4ºC. Hubo correlación estadísticamente significativa positiva entre las variables mensuradas.
CONCLUSIÓN: Los resultados apuntaron la necesidad de implementación de intervenciones efectivas para la prevención de la hipotermia y, en este escenario, la actuación del enfermero es crucial para la mejora de la asistencia prestada al paciente quirúrgico.
Descriptores: Hipotermia/prevención & control; Enfermería perioperatoria; Periodo intraoperatorio
INTRODUÇÃO
A temperatura corporal é regulada pelo equilíbrio entre a produção e a perda de calor. A maior parte do calor do corpo humano é produzida em órgãos profundos, depois o calor é transferido para a pele e, posteriormente, perdido no meio ambiente. Assim, a produção de calor do organismo dependerá do metabolismo corporal e a perda dependerá principalmente da rapidez com que o calor pode ser transferido de seu local de produção até a pele e a rapidez com que este calor é perdido da pele para o meio ambiente(1).
Quando o corpo humano sofre um aumento da temperatura corporal, há mecanismos que atuam na sua redução, como a vasodilatação, a sudorese e a diminuição da produção de calor. Em contrapartida, na exposição ao frio extremo, o organismo reage com vasoconstrição da pele em todo o corpo, piloereção e aumento da produção de calor, por meio dos calafrios, excitação simpática da produção de calor e aumento da produção de tiroxina (produzida pela glândula tireóide), substância que determina o aumento do metabolismo celular(1).
A hipotermia ocorre em mais de 70% dos pacientes no período perioperatório, tornando-se um evento adverso freqüente(2). As principais complicações descritas na literatura são: aumento da taxa de morbidade, aumento da incidência de infecção do sítio cirúrgico, aumento na demanda cardíaca e de oxigenação na presença de tremores e prejuízos da função plaquetária(3).
A implementação de medidas para a prevenção e o tratamento da hipotermia, no período perioperatório, não apenas reduz a experiência sensorial desagradável do paciente, como consiste em conduta eficaz no controle das complicações associadas a esse evento(3).
O presente estudo pretende contribuir para a melhoria da assistência da enfermagem perioperatória, na busca de dados da realidade nacional sobre como a hipotermia desenvolve-se no intra-operatório. Os resultados evidenciados fornecerão subsídios para a compreensão deste evento com vistas à implementação de intervenções eficazes no cotidiano da prática clínica. Assim, o objetivo da pesquisa foi analisar a temperatura corporal do paciente submetido a cirurgia eletiva no período intra-operatório.
MÉTODOS
O estudo foi desenvolvido na abordagem metodológica quantitativa, com delineamento de pesquisa não experimental, tipo descritivo-exploratório, correlacional, prospectivo.
O local selecionado para o desenvolvimento do estudo foi um hospital filantrópico com 109 leitos situado no interior do Estado de São Paulo.
O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade São Paulo, após autorização do hospital selecionado para este estudo, de acordo com a Resolução n.º 196/96 do Conselho Nacional de Saúde, que regulamenta a pesquisa em seres humanos(4). Todos os participantes do estudo assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
Os critérios de inclusão dos sujeitos foram: ter idade igual ou superior a 18 anos; ser submetido à cirurgia eletiva, com duração da anestesia de, no mínimo, uma hora. Os critérios de exclusão foram: não concordar em participar da pesquisa; apresentar temperatura corporal igual ou superior a 38ºC ou abaixo de 36ºC na chegada na sala de cirurgia.
Para o alcance do objetivo proposto neste estudo elaboramos um instrumento, no qual realizamos a validação aparente e de conteúdo por três juízes. O instrumento contém dados relacionados ao paciente, ao procedimento anestésico-cirúrgico, a temperatura ambiental e corporal do paciente.
Um dos pesquisadores do estudo realizou a mensuração da temperatura corporal do paciente na recepção do centro cirúrgico, na chegada na sala, no início do procedimento anestésico e a partir daí a cada 20 minutos, até o final do procedimento anestésico-cirúrgico.
A temperatura corporal do paciente foi verificada com o termômetro timpânico por infravermelho, canadense, marca ProCheck®, com precisão de leitura em laboratório de ± 0,2ºC. A aferição da temperatura timpânica é o método não invasivo de escolha, segundo as diretrizes para a prevenção da hipotermia da American Society of PeriAnesthesia Nurses (ASPAN)(5).
A temperatura e a umidade da sala de cirurgia foram mensuradas na entrada do paciente na sala, no início do procedimento anestésico e a cada 20 minutos até o final do procedimento anestésico-cirúrgico. Para tal utilizamos o termohigrômetro nacional, marca Minipa®, com precisão para temperatura interna de ± 1ºC e para umidade ambiente ± 8% RH (relative humidity - umidade relativa), o qual foi posicionado a um metro aproximadamente da cabeça do paciente e do mesmo lado onde foi aferida a temperatura timpânica.
Todas as mensurações foram realizadas por um dos pesquisadores do estudo e com os mesmos instrumentos, no período de agosto de 2006 a junho de 2007. Os resultados foram apresentados segundo medidas estatísticas descritivas, tais como média aritmética, mediana, desvio-padrão, valores mínimo e máximo. Por meio do coeficiente de correlação de Pearson verificamos a correlação entre as medidas da temperatura corporal média dos pacientes e da temperatura média da sala de cirurgia.
A técnica de dupla digitação foi utilizada e os dados coletados foram analisados por meio do software Statistical Package Social Science (SPSS 10.0). O nível de significância utilizado foi á= 0,05.
RESULTADOS
Dos 70 pacientes investigados, a média da idade foi 53,6 anos, com desvio padrão de 15,4 anos. Quanto ao sexo, 46 (65,8%) pacientes eram do sexo feminino e 24 (34,2%) do sexo masculino. Em relação à cor 61(87%) dos sujeitos eram brancos, seguidos por oito (11,5%) pardos e um (1,5%) negro.
O Índice de Massa Corporal (IMC) dos sujeitos apresentou média de 25,3 kg/m2 e mediana de 24,9 kg/m2. A hipertensão arterial foi a doença crônica que mais se destacou na amostra do estudo com 18 casos (25,7%). Em relação ao índice da American Society of Anesthesiologists (ASA), dos pacientes investigados, 49 (70%) foram classificados como ASA 2, 13 (18,5%) ASA 1 e 7 (10%) ASA 3, um indivíduo não foi classificado. Ressaltamos que esse dado foi coletado no prontuário médico do paciente e registrado pelo anestesista.
Os procedimentos anestésicos tiveram duração média de 158,2 minutos, com mediana de 150 e desvio padrão de 53,7 minutos. O procedimento anestésico de menor duração foi de 75 minutos e o de maior 280 minutos. A maioria dos pacientes foi submetida à anestesia geral (54 pacientes, 77,1%), sendo a anestesia combinada administrada em nove pacientes (12,9%) e a regional em sete (10%).
A duração média dos procedimentos cirúrgicos foi de 111 minutos, com mediana de 100 e desvio padrão de 48,1 minutos, com duração mínima de 40 minutos e máxima de 230 minutos.
A maioria dos pacientes investigados (72,8%) foi submetida a procedimentos cirúrgicos de médio porte, dentre esses, houve predominância de cirurgias minimamente invasivas, sendo que a colecistectomia e a correção de hérnia de hiato por videolaparoscopia corresponderam a 35,7% dos procedimentos, seguidas pelas cirurgias prostatectomia radical, mastectomia radical e amputação abdomino-perineal.
Na Tabela 1, apresentamos os dados sobre a temperatura corporal média dos pacientes, temperatura e umidade da sala de cirurgia no período intra-operatório. No geral, os pacientes chegaram à sala de cirurgia normotérmicos, ou seja, com temperatura corporal média e mediana igual a 36,4º C. No início do procedimento anestésico houve redução da temperatura média e da mediana para 36,2º C e no início do procedimento cirúrgico, ou seja, no momento da incisão cirúrgica, a temperatura média dos pacientes foi igual a 35,6º C, com mediana de 35,6º C, sendo, portanto possível constatarmos a presença de hipotermia. No final do procedimento anestésico cirúrgico (quarta-hora) a média da temperatura corporal dos pacientes foi igual a 33,6º C, com mediana de 33,7º C e desvio padrão de 0,2ºC.
A temperatura média da sala de cirurgia na chegada dos pacientes foi de 24,6º C, diminuindo para 22,4º C após quatro horas de procedimento anestésico-cirúrgico. A umidade média do ar na chegada dos pacientes era de 48,6%, caindo durante o procedimento anestésico-cirúrgico e aumentando na quarta hora para 49,3%.
De forma positiva a temperatura média da sala de cirurgia apresentou correlação estatisticamente significante com a temperatura corporal média dos pacientes (r = 0,43; p @ 0), isto é, quanto maior a temperatura da sala maior a temperatura corporal do paciente.
DISCUSSÃO
A maioria da amostra do presente estudo era da cor branca e feminina. A média da idade dos pacientes foi de 53,6 anos.
A prevalência de hipotermia perioperatória em pacientes idosos é freqüentemente maior e mais prolongada do que em pacientes jovens, sendo que idosos e neonatos estão em risco para desenvolver hipotermia por, respectivamente, terem seu sistema termorregulador comprometido ou não desenvolvido(6-7). Em estudo recente, a idade foi apontada como fator de risco para o desenvolvimento de hipotermia, sendo a idade superior a 70 anos fator preditivo para hipotermia durante a cirurgia(8).
Além dos extremos de idade, o sexo pode ser fator de risco para a hipotermia, ressaltando o sexo feminino(9). Geralmente, a mulher experimenta menor perda de calor, no período perioperatório, do que o homem, pois seu corpo possui maior percentual de tecido adiposo que age como uma camada protetora; por outro lado, a mulher tem menor quantidade de massa muscular e maior índice de superfície corporal, tornando-a mais susceptível a perdas de calor para o ambiente(10).
De acordo com os estudos encontrados na revisão da literatura, detectamos que há evidências da associação entre hipotermia e a idade; entretanto, quanto ao sexo, apesar da aparente maior susceptibilidade do sexo feminino, observamos escassez de publicações e há necessidade de novos estudos para o fortalecimento desta associação. Ressaltamos, ainda, que não constatamos na literatura estudos que investigaram a cor como fator preditor de hipotermia.
Conforme já mencionado, no presente estudo houve predominância de cirurgias minimamente invasivas, as quais corresponderam a 35,7% dos procedimentos.
A hipotermia é freqüente nas cirurgias abdominais, pela exposição de órgãos ao ambiente, e também freqüente nas cirurgias laparoscópicas pela exposição da cavidade a insuflação de grande quantidade de gás carbônico frio. Assim, um estudo procurou comprovar essa afirmação comparando as mudanças de temperatura corporal nos pacientes submetidos a cirurgias laparoscópicas e abertas de bypass gástrico, nas quais lençóis de algodão aquecidos e umidificação de vias aéreas foram utilizados como medidas para a prevenção de perda de calor durante o período intra-operatório. Participaram 101 pacientes com obesidade mórbida que apresentavam IMC entre 40-60 kg/m2, selecionados aleatoriamente para o grupo submetido à cirurgia aberta (n=50) ou laparoscópica (n=51)(11).
Após a indução anestésica, as temperaturas mensuradas foram similares nos grupos investigados, os dados evidenciados não apresentaram diferença estatisticamente significante, desde a indução anestésica até a recuperação dos pacientes após a cirurgia. Os autores concluíram que não há diferença significativa na temperatura corporal do paciente no intra-operatório, entre os tipos de cirurgia, e que a prolongada insuflação de gás carbônico na cirurgia laparoscópica, não aumenta os índices de hipotermia, quando adotadas medidas que minimizem a perda de calor(11).
Em outro estudo, também com o objetivo de comparar a incidência de hipotermia durante a cirurgia laparoscópica colorretal e a cirurgia aberta, os autores analisaram 60 pacientes, 33 submetidos à cirurgia laparoscópica e 27 submetidos à cirurgia aberta. Os resultados corroboraram os dados do estudo mencionado anteriormente, ou seja, não houve diferença estatisticamente significante entre os grupos investigados. Apesar destes resultados, os autores apontaram a necessidade de outros estudos para esclarecer se há diferença ou não na incidência de hipotermia entre cirurgia aberta e cirurgia laparoscópica(12).
A literatura indica que é mais freqüente o paciente desenvolver hipotermia em cirurgias de duração mais prolongada, pois a queda mais acentuada na temperatura corporal ocorre de fato dentro dos primeiros 40 a 60 minutos após o início da anestesia(3).
A maioria dos sujeitos neste estudo (77,1%) recebeu anestesia geral. O desenvolvimento da hipotermia durante a anestesia geral pode ser explicado resumidamente em três fases, a saber: após a indução anestésica acontece uma rápida queda da temperatura central devido ao fenômeno da redistribuição interna de calor, a partir daí percebe-se uma redução linear na temperatura que varia entre 0,5ºC a 1ºC, justificada, ainda, pela manutenção das diferenças entre a produção e a perda de calor para o ambiente; finalmente, quando o organismo atinge uma determinada temperatura, acontece restrição no fluxo de calor, desencadeado pela vasoconstrição, levando a uma redistribuição interna reduzida de calor, com perdas menores desse calor para o ambiente, atingir-se-ia, então, um novo equilíbrio térmico, agora com valores reduzidos(13).
A anestesia regional pode afetar de forma extensa a termorregulação durante a cirurgia, tanto pelo efeito da redistribuição interna de calor quando pelo rebaixamento do limiar da temperatura necessária para ativar as respostas termorreguladoras(14).
Afinal, as respostas termorregulatórias são neuralmente mediadas, conseqüentemente, o bloqueio de nervos impede a ativação normal de defesas termorregulatórias regionais como a sudorese, vasoconstrição e calafrios. As anestesias raqui e peridural interrompem a condução em mais da metade do corpo, assim, esta inibição periférica das respostas termorregulatórias é a maior causa de hipotermia durante a anestesia regional(15).
Na presente pesquisa, as médias da temperatura corporal dos pacientes, a partir do início do procedimento anestésico (36,2ºC) apresentaram queda constante chegando a 33,4ºC na quarta hora de procedimento anestésico-cirúrgico.
Quando a temperatura central cai abaixo de 36ºC chegando até 34ºC, considerada hipotermia suave, esta pode se manifestar por meio de confusão, calafrios, amnésia, pulso e pressão arterial normais e vasoconstrição periférica, muitas vezes esses sinais são de difícil reconhecimento, o que ressalta a importância da monitorização constante da temperatura corporal no período perioperatório(16).
Com a progressão da queda da temperatura, ou seja, temperatura central entre 30ºC e 33ºC, a hipotermia recebe a denominação de moderada, com sintomas que incluem dilatação de pupilas, fibrilação atrial, contrações pós-ventriculares, presença de ondas J no eletrocardiograma. Caso a queda da temperatura persistir, tornando-se severa, abaixo de 30ºC, as manifestações incluem fibrilação ventricular, hipotensão, assistolia, podendo chegar a morte(16).
De acordo com a recomendação da ASPAN, a temperatura da sala de cirurgia deve permanecer entre 20ºC e 24ºC(5). No presente estudo, a média da temperatura da sala de cirurgia apresentou variações discretas mantendo-se entre 22,4 a 24,1ºC, sendo que essa variável apresentou correlação estatisticamente significante e positiva com a temperatura corporal média dos pacientes.
O organismo humano exposto ao meio ambiente perde calor por mecanismos físicos, conhecidos como: radiação, o organismo perde calor para o ambiente mais frio do que seu corpo, por meio de ondas eletromagnéticas, corresponde a 60% de sua eliminação térmica total; condução corresponde à perda calórica mínima (3%), resultante da transferência da energia térmica pelo contato direto com as superfícies; convecção ocorre remoção do calor do corpo por correntes de ar, correspondendo a aproximadamente 12% da perda total e por evaporação, quando se perde água por evaporação da superfície corporal(1).
O paciente, quando exposto ao ambiente cirúrgico, perde calor pela pele para o ambiente por meio de radiação, convecção e evaporação. Esses mecanismos acarretam 90% da perda metabólica de calor pela superfície cutânea(17).
A Association of periOperative Registered Nurses(18) indica que a temperatura da sala de cirurgia determina quanto será a perda de calor do paciente pela pele por radiação e convecção e por evaporação, devido ao uso de soluções anti-sépticas no preparo da pele.
Pesquisadores analisaram 40 pacientes submetidos a cirurgia ortopédica de extremidades, com o objetivo de determinar a incidência e a magnitude da hipotermia. Os autores testaram a hipótese que a hipotermia ocorreria com menor freqüência, independente da idade, quando a temperatura da sala de cirurgia fosse mantida em torno de 26ºC; os resultados indicaram que a manutenção da temperatura da sala no parâmetro investigado é efetiva na prevenção de hipotermia, sendo bem tolerada pela equipe cirúrgica, tornando-se, dessa forma, uma ferramenta de custo-efetivo, especialmente nos locais que não dispõem de métodos de aquecimento(19).
Em uma pesquisa, as variáveis técnica anestésica, temperatura da sala de cirurgia e idade foram investigadas sobre a etiologia multifatorial da hipotermia perioperatória; os autores investigaram 97 pacientes submetidos a cirurgia vascular periférica, sob anestesia geral (GA) e epidural (EA), alterando-se a temperatura da sala. Em dois grupos, os pacientes permaneceram na sala com temperatura de aproximadamente 24,5ºC (GA=30; EA= 33) e em dois grupos (GA=21; EA= 13) os pacientes ficaram na sala com temperatura de aproximadamente 21,3ºC(20).
Os resultados indicaram associação estatisticamente significante entre a temperatura da sala e o tipo de anestesia, sendo maior o decréscimo da temperatura corporal dos pacientes na anestesia geral, quando comparada à anestesia epidural, sendo similar o decréscimo de temperatura na anestesia geral, independente da temperatura da sala. Os dados também sugerem associação entre o tipo de anestesia e a idade do paciente, sendo maior a queda em pacientes jovens submetidos à anestesia geral e similar a hipotermia em idosos, independente do tipo de anestesia(20).
A manutenção da normotermia do paciente durante o período perioperatório pode resultar na redução dos custos hospitalares; diminuição do sangramento intra-operatório, da infecção do sítio cirúrgico e da permanência na sala de recuperação pós-anestésica; melhor conforto térmico e, conseqüentemente, maior satisfação do paciente; entretanto, consiste em um desafio que o enfermeiro deve enfrentar(10).
O enfermeiro no perioperatório tem papel importante na prevenção e tratamento da hipotermia, sendo a implementação de intervenções eficazes um aspecto crucial para tornar essa complicação um problema do passado. Para tal, a busca de conhecimento científico para fundamentar a prática clínica consiste em condição sine qua non se restringe a melhoria do cuidado na enfermagem perioperatória.
CONCLUSÃO
Ao analisarmos os dados dos 70 pacientes investigados, os principais resultados evidenciados foram:
- houve queda constante da temperatura corporal média dos pacientes variando de 36,4ºC (chegada na sala de operação) a 33,6ºC (final do procedimento anestésico-cirúrgico);
- a temperatura média da sala de operação apresentou variações discretas, sendo de 24,6ºC na chegada dos pacientes e de 22,4ºC no final do procedimento anestésico-cirúrgico;
- houve correlação estatisticamente significante e positiva entre as medidas da temperatura corporal média dos pacientes e a temperatura média da sala de cirurgia.
Artigo recebido em 05/05/2008 e aprovado em 11/08/2008
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
06 Out 2009 -
Data do Fascículo
2009
Histórico
-
Aceito
11 Ago 2008 -
Recebido
05 Maio 2008