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Qualidade de vida e sobrecarga de cuidados em cuidadores de dependentes químicos

Resumos

OBJETIVOS: Avaliar a qualidade de vida e a presença de sobrecarga de cuidados em cuidadores de dependentes químicos. MÉTODOS: Estudo de corte transversal, realizado em quatro Centros de Atenção Psicossocial de Mato Grosso, com 109 cuidadores. Foram coletados dados sociodemográficos, de qualidade de vida por meio do Medical Outcomes Studies 36 - Item Short-Form, sintomas de depressão (Inventário de Depressão de Beck) e sobrecarga do cuidador (Caregiver Burden Scale). RESULTADOS: Dentre os 109 cuidadores, 55,9% eram mães, idade média 47,66 anos e 23,8% apresentaram sintomas depressivos. Os escores do SF36 mais comprometidos foram: aspectos emocionais, vitalidade, dor e saúde mental. A média geral da sobrecarga entre os cuidadores foi de 2,24. Houve correlação significativa nas dimensões da qualidade de vida, presença de depressão e sobrecarga de cuidado. CONCLUSÃO: Os achados confirmaram o comprometimento da qualidade de vida e alta sobrecarga de cuidado que evidenciam a necessidade de apoio emocional a esses cuidadores.

Cuidadores; Qualidade de vida; Relações familiares; Depressão; Transtornos relacionados ao uso de substâncias


OBJECTIVE: To evaluate quality of life and presence of stress in caregivers of drug-addicted people. METHODS: This cross-sectional study was carried out at four Psychosocial Care Centers in Mato Grosso. Demographic and quality of life data were collected for 109 caregivers using the Medical Outcomes Study 36 - Item Short-form, depression symptoms (Beck Depression Inventory) and stress of caregivers (Caregiver Burden Scale). RESULTS: Of 109 caregivers, 55.9% were mothers with a mean age of 47.66 years; 23.8% had depressive symptoms. The SF36 scores most compromised were emotional aspects, vitality, pain and mental health. Mean stress among caregivers was 2.24. A significant correlation in quality of life, depression and stress of caregivers was seen. CONCLUSION: Findings confirmed that quality of life is compromised and stress is high among caregivers, highlighting the need for providing emotional support.

Caregivers; Quality of life; Family relations; Depression; Substance-related disorders


OBJETIVOS: Evaluar la calidad de vida y la presencia de sobrecarga de cuidados en cuidadores de dependientes químicos. MÉTODOS: Se trata de un estudio de corte transversal, realizado en cuatro Centros de Atención Psicosocial de Mato Grosso, con 109 cuidadores. Fueron recolectados datos sociodemográficos, de calidad de vida por medio del Medical Outcomes Studies 36 - Item Short-Form, síntomas de depresión (Inventario de Depresión de Beck) y sobrecarga del cuidador (Caregiver Burden Scale). RESULTADOS: De los 109 cuidadores, 55,9% eran madres, con edad promedio de 47,66 años y 23,8% presentaron síntomas depresivos. Los scores del SF36 más comprometidos fueron: aspectos emocionales, vitalidad, dolor y salud mental. El promedio general de la sobrecarga entre los cuidadores fue de 2,24. Hubo correlación significativa en las dimensiones de la calidad de vida, presencia de depresión y sobrecarga de cuidado. CONCLUSIÓN: Los hallazgos confirmaron el compromiso de la calidad de vida y alta sobrecarga de cuidado que evidencian la necesidad de apoyo emocional a esos cuidadores.

Cuidadores; Calidad de vida; Relaciones familiares; Depresión; Trastornos relacionados consustancias


ARTIGOS ORIGINAIS


Qualidade de vida e sobrecarga de cuidados em cuidadores de dependentes químicos

IEnfermeira, Doutora em Ciências da saúde. Professora Adjunta do Curso de Enfermagem do Departamento de Enfermagem, Universidade Federal de Mato Grosso – UFMT – Cuiabá – (MT)

IIEnfermeira, Doutora em Ciências da saúde. Professora Adjunta do Curso de Enfermagem do Departamento de Enfermagem, Universidade Federal de Mato Grosso – UFMT – Cuiabá – (MT)

IIIEstatístico, Pós-doutor em confiabilidade pela Universidade de São Paulo – USP SP. Professor Adjunto do Departamento de Estatística, Universidade Federal Mato Grosso – UFMT- Cuiabá – (MT)

IVEnfermeira, Pós-doutora em Nefrologia. Professora Adjunta da Escola Paulista de Enfermagem, Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP – São Paulo – (SP), Brasil

VEnfermeira, Pós-doutora em Nefrologia. Professora Adjunta da Escola Paulista de Enfermagem, Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP – São Paulo – (SP), Brasil

Endereço para correspondência

RESUMO

OBJETIVOS: Avaliar a qualidade de vida e a presença de sobrecarga de cuidados em cuidadores de dependentes químicos.

MÉTODOS: Estudo de corte transversal, realizado em quatro Centros de Atenção Psicossocial de Mato Grosso, com 109 cuidadores. Foram coletados dados sociodemográficos, de qualidade de vida por meio do Medical Outcomes Studies 36 – Item Short-Form, sintomas de depressão (Inventário de Depressão de Beck) e sobrecarga do cuidador (Caregiver Burden Scale).

RESULTADOS: Dentre os 109 cuidadores, 55,9% eram mães, idade média 47,66 anos e 23,8% apresentaram sintomas depressivos. Os escores do SF36 mais comprometidos foram: aspectos emocionais, vitalidade, dor e saúde mental. A média geral da sobrecarga entre os cuidadores foi de 2,24. Houve correlação significativa nas dimensões da qualidade de vida, presença de depressão e sobrecarga de cuidado.

CONCLUSÃO: Os achados confirmaram o comprometimento da qualidade de vida e alta sobrecarga de cuidado que evidenciam a necessidade de apoio emocional a esses cuidadores.

Descritores: Cuidadores; Qualidade de vida; Relações familiares; Depressão; Transtornos relacionados ao uso de substâncias

INTRODUÇÃO

O contexto histórico sociopolítico, econômico e cultural que envolve a problemática das drogas é complexo, e configura-se como uma ameaça à qualidade de vida (QV) das populações, constituindo-se em um grave problema de saúde pública(1). Estudos evidenciam a ampla repercussão da dependência química não só no usuário de substâncias psicoativas, mas também nos familiares que convivem com ele(2,3).

A convivência dos familiares com o usuário, como uma via de mão dupla, é afetada à medida em que a dependência química evolui e desenvolve-se(2), acarretando prejuízos incalculáveis como instabilidade financeira, violência física, verbal, psicológica, com redução das condições de QV, constituindo-se em um ônus direto para ambos(4).

Em estudo realizado com familiares de dependentes químicos, foi identificado um risco aumentado para o surgimento de distúrbios mentais em 58% dos cônjuges, além da frequência aumentada de agressões físicas, morte de familiares e envolvimentos com problemas policiais nesses lares(5). Outro estudo com esposas cuidadoras de dependentes de álcool, demonstrou a tendência que as suas companheiras têm de adoecer em razão de frequentes pressões e angústias diante da expectativa constante de constrangimentos, agressões, medos, frustrações em virtude das recaídas, entre outras consequências (3).

Especialmente, nas situações de uso e abuso de drogas, embora toda a estrutura familiar esteja abalada, os diferentes membros sofrem em graus variados de aproximação e distanciamento quanto aos impactos negativos desse comportamento e, frequentemente, a família faz-se representar por um membro familiar que assume a condição de cuidador, ou seja, os cuidados recaem quase sempre sobre um membro da família, fazendo com que este vivencie a sobrecarga advinda do processo de cuidar (4,6).

Considerando que, atualmente, as políticas direcionadas ao dependente químico preconizam a participação efetiva da família no processo de recuperação, é fundamental avaliar de modo adequado o sofrimento do cuidador, bem como os danos à sua qualidade de vida, e acrescenta-se ainda a escassez de estudos publicados com cuidadores de usuários de drogas ilícitas. Diante do exposto, este estudo objetivou avaliar a qualidade de vida e a presença de sobrecarga de cuidado em cuidadores de dependentes químicos.

MÉTODOS

O delineamento do estudo foi de corte transversal, desenvolvido em quatro Centros de Atenção Psicossocial para Álcool e Outras Drogas (CAPS AD) de quatro municípios do Estado de Mato Grosso: Cuiabá, Várzea Grande, Rondonópolis e Barra do Garças, no período de agosto de 2008 a setembro de 2009.

A população do estudo foi composta por cuidadores dos usuários de drogas ilícitas que estavam em tratamento no CAPS AD. O cuidador era definido após a entrevista com o usuário, como sendo a pessoa que este tinha como referência ou que se responsabilizava pelo acompanhamento do tratamento.

Com base cálculo da amostra dos usuários cadastrados nos serviços, foi definida a amostra de cuidadores (n=109). Considerando que os CAPS AD possuíam tamanho de populações diferentes, utilizou-se o método de amostragem aleatória estratificada proporcional ao número médio de usuários cadastrados no ano de 2007. Um erro de estimação de 0,05, confiança de 95% e uma proporção de 0,5,foram empregados e os critérios de inclusão foram: indivíduos maiores de 18 anos que não faziam uso de substâncias lícitas e/ou ilícitas. O período de coleta de dados correspondeu aos meses de agosto de 2008 a setembro de 2009.

O contato com o cuidador ocorreu posteriormente à obtenção da autorização do usuário. Após o aceite, os cuidadores foram informados quanto ao objetivo do estudo e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. A entrevista foi realizada nos CAPS AD, pela pesquisadora e um bolsista previamente treinado, em ambiente reservado, com tempo médio de duração de 50 minutos.

No estudo, foram coletados dados sociodemográficos de QV por meio do Medical Outcomes Study 36 – Item Short-Form Health Survey(7), instrumento multidimensional, traduzido e validado no Brasil em 1997, composto por 36 itens, divididos em oito escalas ou domínios: capacidade funcional; aspectos físicos; dor; estado geral de saúde; vitalidade; aspectos sociais; aspectos emocionais e saúde mental. Os escores variam de zero (pior estado) a 100 (melhor estado).

Foi aplicado ainda o Inventário de Depressão de Beck(8) (BDI) para a investigação da presença de sintomas depressivos, escala composta por 21 itens que incluem sintomas e atitudes. As resposta variam entre 0 (ausência de sintomas) a 3 (sintomas depressivos mais acentuados) e dependendo da natureza da amostra existem diferentes pontos de corte. O ponto de corte utilizado foi de <15= normal ou depressão leve 16-20= disforia e >20= depressão.

Para a avaliação da sobrecarga do cuidado, foi aplicada a Cargiver Burden Scale(9) (CBS), escala composta por 22 questões e subdividida em cinco dimensões: tensão geral, isolamento, desapontamento, envolvimento emocional e ambiente, com escores parciais e totais que variam entre 1 (ausência de sobrecarga) e 4 (maior sobrecarga).

Para a caracterização dos dados amostrais, foram realizadas análises descritivas e inferenciais. Na parte descritiva, foram consideradas porcentagens, medidas de posição e variação. Na parte inferencial, foram utilizadas as técnicas de correlação de Sperman e regressão linear múltipla, em todos os casos considerando um nível de significância de p<0,05. As análises estatísticas foram realizadas com o auxílio dos programas SPSS, versão 14, e MINITAB, versão 14.

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Universidade Federal de São Paulo sob o registro 0556/07 e obteve assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido dos participantes.

RESULTADOS

Os dados da Tabela 1 evidenciam maior proporção dos cuidadores do gênero feminino (90,8%), casados (68,8%), possuindo algum tipo de inserção no mercado de trabalho (77,0%) e com média de idade de 47,6 anos. Entre os cuidadores, 23,8% apresentaram sintomas depressivos e 12,8% disforia.

Na Tabela 2, os dados mostram os escores dos domínios do SF36 mais afetados: aspectos emocionais (44,6 ± 4,0), vitalidade (52,8 ± 2,3), dor (54,1 ± 2,4) e saúde mental (55,3 ± 2,3). Os escores médios dos domínios da escala de sobrecarga dos cuidadores evidenciam o envolvimento emocional (2,5) e a tensão geral (2,4) como os mais comprometidos. A média geral da sobrecarga entre os cuidadores foi de 2,2.

Nos dados da Tabela 3, evidencia-se a correlação entre os escores dos domínios do SF36 com o Inventário de Depressão de Beck e com a sobrecarga geral do cuidador, utilizando-se o coeficiente de correlação de Spearman (ρ), observou-se forte correlação (p<0,01) em todos os domínios do SF36, sendo saúde mental, aspectos emocionais e a vitalidade, os que se correlacionaram mais fortemente com a presença de sintomas depressivos e os domínios saúde mental, aspecto social e estado geral de saúde tiveram correlações mais fortes para a sobrecarga do cuidado.

A análise de regressão linear múltipla mostra que as variáveis que mais afetaram os escores dos domínios do SF36 foram: sobrecarga do cuidado (36,5%), problemas de saúde (6,3%) e o sexo do cuidador (2,0%), conforme apresentado nos dados da Tabela 4.

DISCUSSÃO

Este estudo foi desenvolvido em quatro CAPS AD do Estado de Mato Grosso, com cuidadores de dependentes químicos e utilizou diferentes escalas de avaliação, não sendo encontrados no Brasil, estudos realizados utilizando essa metodologia. Portanto, algumas limitações metodológicas devem ser consideradas. O levantamento bibliográfico mostrou um número reduzido de trabalhos realizados sobre este tema e, dentre os poucos, os resultados são de difícil comparação em decorrência dos diferentes desenhos, métodos e instrumentos utilizados. Desta forma, buscamos outros estudos com cuidadores de doentes crônicos, a fim de obter um parâmetro para análise dos dados.

Nesta pesquisa, houve o predomínio de mulheres casadas que reafirma o fato amplamente demonstrado na literatura da presença maciça da mulher no cuidado familiar(4,10). A inserção no mercado de trabalho dos cuidadores deste estudo, e a renda média de R$ 780,00, diferem de outros cuidadores de pacientes com doenças crônicas que, em sua maioria, têm como ocupação os serviços domésticos(11,12).

É válido ressaltar a característica diferenciada desse tipo de cuidador, pois na dependência de substâncias psicoativas, o usuário não possui um grau de dependência similar a outras doenças, tais como demência, Aids, doenças renais, e muitos nem chegam a ser considerados por si mesmos e nem pelos familiares como doentes, embora causem muitos problemas durante a vida(10). Portanto, o cuidado não interfere diretamente nas atividades de vida diária do cuidador (trabalho, organização da casa, dentre outras) como nas demais doenças crônicas, por demandar menos cuidados físicos.

A idade média dos cuidadores de 47,6 anos foi maior quando comparada com outro estudo de familiares de dependentes químicos (2) (26 a 35 anos). O fato da maioria das cuidadoras deste estudo ser mãe pode ter contribuído para este achado, considerando que, no estudo citado, as cuidadoras eram esposas/companheiras, no entanto, os estudos com cuidadores de doentes de Alzheimer demonstram em média idades maiores para o cuidador (57,4 e 51,3 anos, respectivamente)(11,13).

A presença de sintomas depressivos foi evidenciada em 23,8% dos cuidadores, e estes podem comprometer a relação de cuidado com o dependente químico, além da percepção que o cuidador tem de sua QV. Pesquisa sobre QV realizada com familiares de dependentes químicos, utilizando os critérios diagnósticos do CID-10(2), encontrou a presença de depressão em 23% da amostra, resultado muito semelhante ao verificado no presente estudo. Estes dados quando comparados com os resultados evidenciados entre cuidadores de pacientes com demência(11,14), são discretamente inferiores, e a literatura demonstra que a depressão atinge 30% a 55% dos cuidadores(13).

Na investigação da QV, os aspectos emocionais, vitalidade, dor e saúde mental apresentaram-se mais comprometidos. Enquanto a QV tem sido avaliada em diferentes populações de cuidadores de doenças crônicas (9,11); na dependência química, são escassos os estudos e, dentre eles, quase sua totalidade, direciona-se ao cuidador de dependente de álcool(1,3-4,10), além de utilizar abordagens qualitativas dificultando a comparação entre as populações.

Um estudo sobre a avaliação de QV entre cuidadores de dependentes químicos usando o WHOQOL-Bref(2) evidenciou melhores escores para o domínio físico (14,4), decrescendo para o social (13,2), psicológico (12,5) e do meio ambiente (10,6). Outro estudo com cuidadores de pacientes hemiplégicos(15) obteve menores escores no SF-36 para vitalidade (51,7), capacidade funcional (53,8), saúde mental (56,8) e aspectos emocionais (55,8). O que os estudos de avaliação da QV desenvolvidos entre cuidadores trazem em comum, é que ser o responsável pelo paciente compromete significativamente a QV, sendo o maior prejuízo relacionado aos aspectos emocionais e de saúde mental(9). Entre os cuidadores deste estudo, o aspecto emocional demonstrou-se mais comprometido quando realizada a comparação com outros cuidadores de doenças crônicas(11,15).

Na investigação da sobrecarga de cuidado, a média geral obtida foi de 2,2, e o envolvimento emocional (sentimentos relacionados à vergonha e raiva) e tensão geral (sentimentos de responsabilidade, esgotamento, enfrentamento de problemas de difícil resolução, prejuízos à saúde, falta de tempo, dentre outros) foram os maiores preditores da presença de sobrecarga. Neste estudo, a média observadafoi maior em relação aos estudos com cuidadores de pacientes em hemodiálise (2,07)(16) e com cuidadores de pacientes com amputação de membros inferiores(1,96)(17), que utilizaram o mesmo instrumento.

As correlações entre as dimensões do SF36 com o BDI apresentaram-se negativas e significantes em todas as dimensões, estando a saúde mental, a vitalidade e os aspectos emocionais mais fortemente correlacionados. Um estudo com cuidadores de pacientes com doença de Alzheimer(11) também obteve correlação em todas as dimensões do SF36, sendo a saúde mental (p=0,000), vitalidade (p=0,000) e dor (p=0,000) as mais comprometidas, resultados semelhantes aos encontrados neste estudo. Outros estudos confirmam a correlação entre a QV e a presença de sintomas depressivos(14).

A forte correlação também foi obtida entre o SF36 e a CBS em todos os domínios, sendo a saúde mental, aspectos sociais e estado geral de saúde os que mais se correlacionaram com a sobrecarga do cuidado. O estudo que comparou a QV e a sobrecarga de cuidadores de pacientes com Epilepsia por Esclerose Mesial Temporal e Epilepsia Mioclônica Juvenil, com o SF36 e Zarit Burden Interview (instrumento que avalia a relação cuidador/paciente, a condição de saúde, o bem-estar psicológico, finanças e vida social), obteve correlação significante apenas para os domínios estado geral de saúde (p=0,011), aspectos emocionais (p=0,037) e saúde mental (p=0,002)(18). Esses resultados permitem inferir que indivíduos mais sobrecarregados pela tarefa de cuidar, bem como com a presença de sintomas depressivos, apresentam diminuição na percepção subjetiva de sua QV, sobretudo relacionada aos aspectos da saúde mental e emocional.

A saúde mental e os aspectos emocionais interferem de forma significativa no cuidado, bem como na QV por implicar diretamente em um processo de adoecimento dos cuidadores e esmorecimento de suas estratégias de enfrentamento, frente à convivência em um ambiente permeado de conflitos, ameaças, desqualificação, ciúmes e recaídas, acarretando distanciamento e desesperança(10), sentimentos que precisam ser trabalhados para fortalecer os vínculos e a capacidade de prover o cuidado do familiar(19).

Na análise linear multivariada dos escores dos domínios do SF36, em função da sobrecarga do cuidado, das variáveis sociodemográficas e das variáveis relativas à saúde do cuidador, os achados mostram que os domínios da escala de sobrecarga (36,5%), problemas de saúde (6,3%) e o gênero do cuidador (2,0%) foram as variáveis que mais afetaram a QV, respondendo a 44,9% de seu comprometimento. Um estudo com cuidadores de pacientes dependentes no Programa de Saúde da Família (12) demonstrou que as variáveis estatisticamente relacionadas com o Índice Geral de Qualidade de Vida foram a escala de sobrecarga Zarit Burden Interview, a presença de doença no cuidador e ter um companheiro, e esta última contribuiu favoravelmente à QV do cuidador.

Na presença de problema físico, a possibilidade da relação deste com o aspecto emocional devem ser considerados, visto que o ser humano é um ser biológico, emocional e social, e o comprometimento em qualquer dessas esferas reflete-se no todo(19). Estudo com cuidadores de pessoas com transtorno mental(19) identificou doenças relacionadas ao sistema nervoso como gastrite, problemas gastrointestinais e outros entre os cuidadores, demonstrando que os aspectos emocionais repercutiram sobre a saúde física. Assim, a atenção ao cuidador deve ser construída com propostas direcionadas para à saúde, com constante avaliação da equipe multiprofissional quanto às enfermidades existentes, avaliando como essas podem interferir na tarefa de cuidar, bem como na QV(12).

Quanto ao gênero do cuidador, o estudo com cuidadores de pacientes com doença de Alzheimer confirma o achado de que ser do gênero feminino influencia negativamente a QV do cuidador(11). Estudos demonstram que cuidadores do gênero feminino estão sujeitos a maior sobrecarga quando comparados com cuidadores do gênero masculino(13).

CONCLUSÃO

Os achados com cuidadores de dependentes químicos apresentou escores abaixo dos encontrados em outros cuidadores de doentes crônicos, alta sobrecarga do cuidado e forte correlação entre a QV, sobrecarga de cuidados e sintomas depressivos. A escala de sobrecarga de cuidados, problemas de saúde, e o sexo do cuidador responderam a 44.9% do comprometimento da QV entre estes cuidadores. Estes dados reforçam a importância de ações direcionadas a esta clientela que cuida e precisa ser cuidada.

Desta forma, considerando a escassez de informações entre os cuidadores de dependentes químicos, e os achados deste estudo que confirmam o comprometimento da QV e a alta sobrecarga de cuidado, novos estudos precisam ser realizados, visando conhecer melhor esta população, bem como subsidiar intervenções direcionadas a esta clientela.

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  • *
    Samira Reschetti MarconI; Elizete Aparecida RubiraII; Mariano Martinez EspinosaIII; Angélica BelascoIV; Dulce Aparecida BarbosaV
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      04 Mar 2013
    • Data do Fascículo
      2012

    Histórico

    • Recebido
      22 Maio 2011
    • Aceito
      06 Maio 2012
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