Resumos
Objetivo:
Descrever a prevalência de tabagismo e consumo de álcool; identificar o nível de atividade física; os graus de dependência de nicotina e álcool e verificar a associação entre esses fatores de risco em indivíduos com síndrome coronariana aguda.
Métodos:
Estudo transversal com 150 pacientes com síndrome coronariana aguda. Para coleta de dados, foram utilizadas entrevistas, análise de prontuários e questionários validados sobre tabagismo, consumo de álcool e atividade física.
Resultados:
58.7% eram fumantes (35,2% alta dependência), 42% consumiam álcool (65,1% baixo risco), 36,7% eram ativos. O tabagismo correlacionou-se significativamente ao consumo de álcool e a alta dependência de nicotina associou-se ao sedentarismo.
Conclusão:
Houve alta prevalência de tabagismo e consumo de álcool. Observou-se elevada dependência de nicotina e consumo de álcool de baixo risco. A maioria dos entrevistados era ativa. Houve correlação entre consumo de álcool e tabagismo, assim como associação da alta dependência de nicotina com sedentarismo.
Hábito de fumar/efeitos adversos; Consumo de bebidas alcoólicas/ efeitos adversos; Exercício; Síndrome coronariana aguda; Fatores de risco; Avaliação em enfermagem
Objective:
To describe the prevalence of smoking and alcohol consumption; to identify the level of physical activity; the degree of nicotine and alcohol dependence and the association between these risk factors in subjects with acute coronary syndrome.
Methods:
Cross-sectional study with 150 patients with acute coronary syndrome. For data collection, interviews, analysis of patients' charts and validated questionnaires on smoking, alcohol consumption and physical activity were used.
Results:
58.7% were smokers (35.2% high dependence), 42% consumed alcohol (65.1% low risk), 36.7% were active. Smoking was significantly correlated to alcohol consumption and high nicotine dependence was associated with sedentary lifestyles.
Conclusion:
There was high prevalence of smoking and alcohol consumption. There was a high nicotine dependence and low risk alcohol consumption. Most participants were active. There was a correlation between alcohol consumption and smoking, as well as association of high nicotine dependence with sedentary lifestyles.
Smoking/adverse effects; Alcohol drinking/adverse effects; Exercise; Acute coronary syndrome; Risk factors; Nursing assessment
Introdução
A crescente prevalência da taxa de doenças crônicas não-transmissíveis no Brasil e no mundo é alarmante, uma vez que acarretam incapacidades e diminuição da qualidade de vida por debilitarem o indivíduo, mantendo-o, em muitos casos, acamado e sob longas hospitalizações. A cada três mortes, duas têm como causa as doenças crônicas não-transmissíveis.(11. Beaglehole R, Bonita R, Horton R, Adams C, Alleyne G, Asaria P, et al. Priority actions for the non-communicable disease crisis. Lancet. 2011;377:1438-47.)
Dentre essas doenças, as cardiovasculares são a principal causa de mortalidade no Brasil e no mundo. Estima-se que, até 2020, as doenças cardiovasculares causarão cerca de 25 milhões de óbitos, 19 milhões deles em países de baixa e média renda.(22. Servinc S, Akyol AD. Cardiac risk factors and quality of life in patients with coronary artery disease. J Clin Nurs. 2010;19(9-10):1315-25.)
O aumento da mortalidade estará diretamente associado à presença ou não de fatores de
risco e de outras patologias concomitantemente, as quais influenciarão na predisposição
do indivíduo a desenvolver complicações e gerarão agravos crônicos, mais comprometedores
à saúde.(33. Chan CW, Perry L. Lifestyle health promotion interventions for the
nursing workforce: a systematic review. J Clin Nurs.
2012;21(15-16):2247-61.) A modificação
de um ou mais fatores de risco beneficia a saúde, reduzindo significativamente a
morbimortalidade da doença cardíaca e de eventos coronarianos. Além disso, contribui
para a melhora dos sintomas, bem -estar geral e para a qualidade de
vida.(22. Servinc S, Akyol AD. Cardiac risk factors and quality of life in
patients with coronary artery disease. J Clin Nurs.
2010;19(9-10):1315-25.
3. Chan CW, Perry L. Lifestyle health promotion interventions for the
nursing workforce: a systematic review. J Clin Nurs.
2012;21(15-16):2247-61.-44. Marrero SL, Bloom DE, Adashi EY. Noncommunicable diseases. A global
health crisis in a new world order. J Am Med Assoc.
2012;307(19):2037-8.)
Informações sobre certos agrupamentos de fatores de risco podem direcionar o desenvolvimento de programas de intervenção. Dentre indivíduos hipertensos, por exemplo, a prevalência de outros fatores de risco cardiovasculares é alta. O agrupamento de alguns desses fatores associa-se à necessidade de maior número de anti-hipertensivos.(55. Ohta Y, Tsuchihashi T, Onaka U, Hasegawa E. Clustering of cardiovascular risk factors and blood pressure control status in hypertensive patients. Intern Med. 2010;49(15):1483-7.)
Os fatores de risco para doenças cardiovasculares têm recebido particular atenção das
organizações governamentais, bem como dos sistemas de saúde, constituindo prioridade de
atenção para a redução das doenças crônicas.(66. World Health Organization. Reducing risks and preventing disease:
population-wide interventions. [Internet]. 2011[cited 2013 Jun 17]. Available from:
http://www.who.int/nmh/publications/ncd_report_chapter4.pdf.
http://www.who.int/nmh/publications/ncd_...
) Os fatores de risco modificáveis, como o tabagismo, a
inatividade física, a alimentação não saudável e o uso prejudicial do álcool -
destacam-se pela possibilidade de serem minimizados a partir da busca de comportamentos
saudáveis adquiridos pelo indivíduo. Alguns desses fatores são compartilhados entre
indivíduos com diferentes doenças crônicas não-transmissíveis, e podem condicionar o
surgimento da síndrome coronariana aguda.(4)
Apesar de modificáveis, a alteração de tais fatores de risco é desafiadora. Um ano após cirurgia de revascularização do miocárdio de 320 indivíduos, verificou-se que apenas 9% dos fumantes haviam cessado o hábito, a obesidade abdominal havia aumentado 8% e não ocorrera mudança dos hábitos alimentares e padrão de exercício físico.(77. Pomeshkina S, Borovik IV, Barbarash OL. Adherence to non-medication treatment in patients undergoing coronary artery bypass surgery. Eur Heart J. 2013;34 (Suppl 1):1213-8. )
Preocupada com o aumento das doenças crônicas não-transmissíveis, com as repercussões
geradas no sistema de saúde do país e com o desenvolvimento saudável da sociedade, a
Organização Mundial da Saúde elaborou um conjunto de metas e indicadores que buscam,
sobretudo, a prevenção e o controle dessas doenças e de seus fatores de
risco.(66. World Health Organization. Reducing risks and preventing disease:
population-wide interventions. [Internet]. 2011[cited 2013 Jun 17]. Available from:
http://www.who.int/nmh/publications/ncd_report_chapter4.pdf.
http://www.who.int/nmh/publications/ncd_...
) Tal
preocupação também é compartilhada pelos profissionais da saúde, que se encontram
instigados a buscar fatores de risco em populações variadas, com o intuito de propor
educação em saúde e reduzir a incidência destas doenças.
Considerando-se a alta prevalência e mortalidade associada às doenças crônicas não-transmissíveis mundialmente, particularmente das doenças cardiovasculares, bem como os objetivos estabelecidos pela Organização Mundial da Saúde para a prevenção e controle dessas doenças e de seus fatores de risco, o conhecimento da presença concomitante das características que aumentam o risco de desenvolvimento da síndrome coronariana aguda é essencial em todos os níveis de atenção.
Frente ao exposto, os objetivos deste estudo foram descrever a prevalência de tabagismo e consumo de álcool; identificar o nível de atividade física; os graus de dependência de nicotina e álcool e verificar a associação entre esses fatores de risco em indivíduos com síndrome coronariana aguda.
Métodos
Estudo transversal realizado na Unidade de Terapia Intensiva Cardiológica e Unidade de Internação de Cardiologia de um hospital-escola terciário de grande porte localizado na capital do Estado de São Paulo, sudeste do Brasil.
O tamanho amostral foi obtido por meio do teste estatístico Z, de distribuição normal, estimando-se uma proporção referente à população de interesse para um nível de significância de 5% e poder amostral de 90%. O tamanho amostral mínimo foi de 138 pacientes.
Foram incluídos pacientes com idade igual ou maior que 18 anos e hospitalizados pela primeira vez devido à síndrome coronariana aguda. Foram excluídos pacientes com dor aguda, dispnéia ou hipotensão sintomática no momento da coleta de dados, devido ao desconforto que poderiam apresentar durante a entrevista.
Os dados foram coletados entre setembro de 2011 a maio de 2012, por meio de entrevista, análise de prontuários e utilizando um instrumento elaborado pelas autoras e composto por três partes: informações sociodemográficas (gênero, idade), variáveis clínicas (diagnóstico médico) e fatores de risco relacionados ao estilo de vida (tabagismo, etilismo e atividade física).
Os fatores de risco foram avaliados utilizando-se questionários internacionalmente validados. A dependência de nicotina foi avaliada por meio do Teste de Dependência de Nicotina de Fagerström. Este teste é o mais reconhecido e utilizado na detecção da dependência de nicotina entre fumantes, composto por seis perguntas. O grau de dependência de nicotina é determinado pela soma das respostas, com escores que variam de 0 a 10 pontos. Para avaliar os pacientes, foi utilizada a seguinte categorização: 0-2 pontos: dependência muito baixa; 3-4 pontos: baixa dependência; 5 pontos: média dependência; 6-7 pontos: alta dependência; 8-10 pontos: muito alta dependência.(88. Pérez-Ríos M, Santiago-Pérez MI, Alonso B, Malvar A, Hervada X, Leon J. Fagerstrom test for nicotine dependence vs heavy smoking index in a general population survey. BMC Public Health. 2009;9:493-7.)
Para avaliação do consumo de álcool foi utilizado o Teste de Identificação de Desordens pelo Uso de Álcool, desenvolvido pela Organização Mundial da Saúde para identificação da dependência do consumo e sua gravidade no último ano. O questionário contém dez questões, cada uma com quatro alternativas, com um escore para cada item que varia de zero a quatro pontos, totalizando zero a 40 pontos. Os paciente são classificados em: baixo risco (<7 pontos), risco (8-15 pontos); risco elevado (1619 pontos); possível dependência (>20 pontos).(99. Jomar RT, Paixão LA, Abreu AM. Alcohol Use Disorders Identification Test (AUDIT) e sua aplicabilidade na atenção primária à saúde. Rev APS. 2012;15(1):113-7.)
A atividade física foi avaliada pelo instrumento International Physical Activity Questionnaire, versão longa - desenvolvido pela Organização Mundial da Saúde e pelo Center for Disease Control and Prevention. Este instrumento avalia a atividade física desenvolvida pelo indivíduo em cinco diferentes domínios relacionados ao trabalho, transporte, atividades domiciliares, recreação, esporte e lazer. A intensidade absoluta da atividade física reflete a taxa de gasto energético durante o exercício e é expressa em equivalentes metabólicos (METs), em que 1 MET é igual à taxa metabólica em repouso de, aproximadamente, 3,5 mL O2/kg/min.(1010. Lee PH, Macfarlane DJ, Lam TH, Stewart SM. Validity of the international physical activity questionnaire short form (IPAQ-SF): A systematic review. Int J Behav Nutrit Physical Activity. 2011;8:115-26.)
Foi considerado o gasto energético em METs de cada atividade que compunha os cinco domínios. Após o cálculo do gasto energético de cada domínio, os valores de cada indivíduo foram somados e
o resultado possibilitou estratificar o paciente como muito ativo, ativo, irregularmente ativo e sedentário.
Os indivíduos considerados muito ativos foram aqueles que cumpriram as recomendações de atingir um total mínimo de 1500 MET-min/ semana com atividade vigorosa ≥5 dias/semana durante ≥30 minutos por sessão ou atividade vigorosa ≥3 dias/semana durante ≥20 minutos associada a atividade moderada ou caminhada ≥5 dias/semana durante ≥30minutos por sessão. Também foram considerados muito ativos aqueles que realizavam qualquer atividade somada ≥7 dias/semana, atingindo um total mínimo de 3000 MET-min/semana.
Os indivíduos considerados ativos foram aqueles que cumpriram as recomendações de realizar atividade vigorosa ≥3 dias/semana durante ≥20 minutos por sessão; atividade moderada ou caminhada ≥5 dias/semana durante ≥30minutos por sessão; ou qualquer atividade somada ≥5dias/sem, ≥150 minutos /semana (caminhada mais atividade moderada mais atividade vigorosa), atingindo um total mínimo de 600 MET-min/semana.
Os indivíduos considerados irregularmente ativos foram aqueles que realizavam atividade física, porém, de forma insuficiente para serem classificados como ativos, pois não cumpriam as recomendações quanto à frequência ou duração. Para realizar essa classificação, somaram-se a frequência e a duração dos diferentes tipos de atividades (caminhada somada às atividades moderada e vigorosa).
Os indivíduos considerados sedentários foram aqueles que não realizaram nenhuma atividade físi-ca por pelo menos, 10 minutos contínuos durante a semana.
Os dados foram analisados utilizando os softwares SPSS (Statistical Package for the Social Sciences) versão 19. Estatísticas descritivas de frequências (absolutas e relativas) foram utilizadas para medidas qualitativas. Estatísticas sumárias de média, mediana, desvio padrão e percentis foram utilizadas para medidas quantitativas. A relação entre medidas ordinais e quantitativas (escores) de tabagismo, atividade física e consumo de álcool foi avaliada por meio do coeficiente de correlação de Spearman. A associação entre medidas qualitativas foi avaliada utilizando-se o teste de qui quadrado de Pearson ou Fisher. Os resultados foram avaliados com intervalo de confiança de 95%, e a significância estatística estabelecida em p<0,05.
O desenvolvimento do estudo atendeu as normas nacionais e internacionais de ética em pesquisa envolvendo seres humanos.
Resultados
Foram incluídos 150 pacientes no estudo, hospitalizados devido a infarto agudo do miocárdio com supradesnivelamento de ST (n=109; 72,7%), angina instável (n=19; 14,7%) e infarto agudo do miocárdio sem supradesnivelamento de ST (n=19; 12,7%). A maioria era do sexo masculino (72,7%), com idade média de 57,51±11,23 anos.
Sessenta e três pacientes (42%) relataram consumo de álcool. Na maioria, o consumo foi considerado de baixo risco (65,1%) (Tabela 1). O escore de consumo médio foi de 7,67±7,07 (baixo risco), com mínimo de um e máximo de 31.
Classificação do consumo de álcool, dependência de nicotina e atividade física de indivíduos hospitalizados por síndrome coronariana aguda
Oitenta e oito pacientes (58,7%) fumavam, dentre o quais 35,2% tinham elevado grau de dependência de nicotina, e 33% tinham dependência muito elevada (Tabela 1). O escore médio de dependência foi de 6,29 ± 2,08 (alta dependência), com mínimo de um e máximo de dez.
Com relação à atividade física, a maioria dos participantes foi considerada ativa (36,7%) e somente 15,3% foram classificados como sedentários (Tabela 1).
Dentre os pacientes que consumiam álcool, houve uma fraca (r<0,3), porém significativa (p<0,05) correlação com o tabagismo. Não houve correlação significativa entre os outros FR (Tabela 2).
Correlação entre tabagismo, consumo de álcool e frequência de atividade física em indivíduos hospitalizados por síndrome coronariana aguda
Encontrou-se fraca evidência de associação entre os escores de dependência de nicotina e níveis de atividade física (p<0,10). Houve maior proporção de dependência média de nicotina no grupo muito ativo (18,8%), e alta dependência de nicotina no grupo sedentário (Tabela 3).
Associação entre o nível de dependência de nicotina e freqüência de atividade física em hospitalizados por síndrome coronariana aguda
Não houve associação significativa entre os escores de dependência de nicotina e consumo de álcool (p=0,620). Os níveis de atividade física e consumo de álcool também não tiveram associação significativa (p=0,726).
Discussão
Os resultados deste estudo são limitados pelo seu desenho transversal, uma vez que não podem ser estabelecidas relações causais entre os fatores de risco. No entanto, informações importantes que diferenciam os indivíduos estudados da população em geral foram reveladas.
As características e associações investigadas neste estudo contribuem para a expansão do conhecimento sobre o agrupamento diferencial de fatores de risco para doenças cardiovasculares. Uma vez que os enfermeiros estão inseridos no contexto da educação em saúde, essas informações embasam o planejamento de intervenções direcionadas ao principal fator de risco, o tabagismo. Quando implementadas tais intervenções, espera-se que haja impacto positivo também no consumo de álcool prejudicial e nível de atividade física.
A dependência do álcool na população brasileira vem aumentando. Pesquisas conduzidas com mais de 200000 habitantes de 107 cidades brasileiras em 2001 e 2005 mostram que o consumo de álcool na população em geral aumentou de 11,2% para 12,3%.(1111. Fonseca AM, Galduroz JC, Noto AR, Carlini EL. Comparison between two household surveys on psychotropic drug use in Brazil: 2001 and 2004. Ciênc Saúde Coletiva. 2010;15(3):663-70.) No presente estudo, a prevalência de consumo de álcool foi 3,4 vezes mais alta do que aquela da população em geral. No entanto, a maioria dos pacientes tinha baixo risco de dependência, sugerindo que esse fator de risco possa não ter contribuído significativamente para a síndrome coronariana aguda.
De fato, quando consumido diariamente em baixas a moderadas doses (15g de etanol para mulheres e 15 a 30g de etanol para homens), associa-se cardioproteção.(1212. Ronksley PE, Brien SE, Turner BJ, Mukamal KJ, Ghali WA. Association of alcohol consumption with selected cardiovascular disease outcomes: a systematic review and meta-analysis. BMJ. 2011;342:d671-83.) No entanto, um dos fatores associado à chance reduzida de cessação do tabagismo é o consumo atual de álcool. Em um coorte prospectivo com 4832 indivíduos, aqueles que bebiam quatro ou mais drinques mais uma vez por semana (consumo considerado pesado) apresentaram menores taxas de cessação de tabagismo comparados aos outros participantes.(1313. Kahler CW, Borland R, Hyland A, McKee SA, Thompson ME, Cummings KM. Alcohol consumption and quitting smoking in the International Tobacco Control (ITC) Four Country Survey. Drug Alcohol Depend. 2009;100(3):214-20.)
Os resultados da atual investigação evidenciam correlação positiva entre o tabagismo e consumo de álcool, especialmente em indivíduos com alta dependência de nicotina e consumo moderado de álcool. Esses resultados corroboram com achados anteriores de que, mesmo na ausência de dependência de álcool, existe forte relação linear positiva entre maior envolvimento com álcool e chance aumentada de progressão do tabagismo de uma prática esporádica para um hábito diário e para a dependência de nicotina.(1414. Kahler CW, Strong DR, Papandonatos GD, Colby SM, Clark MA, Boergers J, et al. Cigarette smoking and the lifetime alcohol involvement continuum. Drug Alcohol Depend. 2008;93(1-2):111-20.)
Grande parte dos pacientes com doença cardiovascular continua a fumar após o infarto
agudo do miocárdio, expondo-se a um risco 50,0% maior de recorrência de eventos
coronarianos comparados aos não fumantes.(1515. Kim HE, Song YM, Kim BK, Park YS, Kim MH. Factors associated with
persistent smoking after the diagnosis of cardiovascular disease. Korean J Fam Med.
2013;34(3):160-8. ) No Brasil, a população de fumantes é de 14,8%, sendo maior a
prevalência entre homens.(1616. Brasil. Ministério da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde,
Secretaria de Gestão Estratégia e Participativa. [Vigitel Brazil 2010: Monitoring
System of Risk and Protective Factors for Non Communicable Chronic Diseases by
Telephone Survey]. Ministério da Saúde, Brasília [Internet]. 2011. [cited 2013 Dec
12] Available from: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/vigitel_2010.pdf.
Portuguese
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoe...
) Dentre os indivíduos avaliados neste estudo, a prevalência de
tabagismo foi quase quatro vezes mais alta do que aquela da população em geral, com
predomínio de dependência elevada e muito elevada, sugerindo que esse FR pode ter
desempenhado um papel crucial no desenvolvimento da síndrome coronariana aguda.
O sedentarismo foi o fator de risco mais prevalente (86,8%) entre 152 pacientes com síndrome coronariana aguda atendidos em um serviço de emergência.(1717. Lemos KF, Davis R, Moraes MA, Azzolin K. [Prevalence of risk factors for acute coronary syndrome in patients treated in an emergency] Rev Gaúcha Enferm. 2010;31(1):129-35. Portuguese.) A atividade física regular é recomendada tanto na prevenção primária quanto na prevenção secundária das doenças arteriais coronarianas. Um programa de exercícios físicos aeróbios três vezes por semana envolvendo esteira, bicicleta ergométrica ou caminhada com duração de 45 minutos por seis semanas reduziu significativamente o estado inflamatório de 52 indivíduos com doença coronariana e associou-se a melhora do índice de massa corpórea.(1818. Ranković G, Miličić B, Savić T, Đinđić B, Mančev Z, Pešić G Effects of physical exercise on inflammatory parameters and risk for repeated acute coronary syndrome in patients with ischemic heart disease. Vojnosanit Pregl. 2009;66(1):44-8.)
Entretanto, dentre os pacientes da amostra deste estudo, mais de 50,0% foram considerados ativos. Esse resultado aproxima-se àquele da população em geral das capitais dos estados do Brasil, em que 76% da população adulta é ativa em pelo menos um dos domínios da atividade física (lazer, trabalho, atividade doméstica ou deslocamento).(1919. Florindo AA, Hallal PC, Moura EC, Malta DC. Practice of physical activities and associated factors in adults, Brazil, 2006. Rev Saúde Pública. 2009;43(Supl 2):65-73.)
Apesar de a maioria ter sido considerada ativa, pode-se sugerir, com base na avaliação da existência de relações entre os fatores de risco, que o maior consumo de nicotina leva ao sedentarismo, ou o estilo de vida sedentário leva a dependência de nicotina aumentada. Cerca de 60,0% dos pacientes que tiveram um infarto agudo do miocárdio ou outro evento coronariano têm alto risco para desenvolver um novo evento. A presença de fatores de risco aumenta essa suscetibilidade. Assim, foi demonstrado que a cessação do tabagismo, o consumo de frutas e verduras e a prática de exercícios podem juntos diminuir o risco relativo de infarto agudo do miocárdio em até 80,0%.(2020. Kãner A, Nilsson S, Jaarsma T, Andersson A, Wiréhn A-B, Wodlin P, et al. The effect of problem-based learning in patient education after an event of CORONARY heart disease- a randomized study in PRIMARY health care: design and methodology of the COR-PRIM study. BMC Fam Pract. 2012;13:110-8.)
A mudança nos fatores de risco para doença cardiovascular pode ter impacto mundial. De 1991 a 2005, ocorreu importante diminuição do número de mortes por doença arterial coronariana no mundo. Destaca-se que 54,0% da diminuição da mortalidade são atribuídas à mudança nos fatores de risco, principalmente à redução da concentração do colesterol total e aumento na atividade física. A pressão arterial no sexo feminino diminuiu, o que explicou a queda da mortalidade em 29,0%, e cerca de 15,0% da diminuição da mortalidade observada foi atribuída à redução do tabagismo no sexo masculino.(2121. Muñiz J, Doblas GJJ, Pérez SMI, Goya LI, Eizagaetxebarría MN, Galván TE, et al. The effect of post-discharge educational intervention on patients in achieving objectives in modifiable risk factors six months after discharge following an episode of acute coronary syndrome (CAM-2 Project): a randomized controlled trial. Health Qual Life Outcom. 2010;8:137-45.)
Apesar de o risco elevado para doença cardiovascular estar presente em apenas 10,0% da população, há um grupo de pessoas de intermediário e baixo risco que têm maior tendência a apresentar eventos cardiovasculares. Como resultado, 90,0% ou mais dos eventos cardiovasculares ocorrerão em indivíduos com um ou mais fatores de risco. Essa população não qualificaria procedimentos intensivos e invasivos, mas se beneficiaria com a redução dos fatores de risco, por meio de mudanças no estilo de vida e consequente redução do risco de evento cardiovascular. Portanto, compreendem-se como pilares fundamentais para a diminuição das taxas de morbidade, para a manutenção da vida e para a diminuição de comorbidades, a implementação urgente de medidas educativas.(2222. Kones R. Primary prevention of coronary heart disease integration of new data, evolving views, revised goal, and role of rosuvastatin in management. A comprehensive survey. Drug Des Devel Ther. 2011;5:325-80.)
A prevenção primária e secundária deve ser prioridade na assistência a indivíduos que
apresentem fatores de risco para o desenvolvimento de síndrome coronariana aguda, bem
como outras doenças crônicas não-transmissíveis.(2222. Kones R. Primary prevention of coronary heart disease integration of
new data, evolving views, revised goal, and role of rosuvastatin in management. A
comprehensive survey. Drug Des Devel Ther. 2011;5:325-80.) Um dos principais desafios que os profissionais da
saúde pública enfrentam é a dificuldade em desenvolver programas de intervenção que
abordem múltiplos fatores de risco, uma vez que há infinitas combinações de FR que cada
paciente pode ter.(2323. Leventhal AM, Huh J, Dunton GF. Clustering of modifiable
biobehavioral risk factors for chronic disease in US adults: a latent class analysis.
Perspect Public Health. [Internet]. 2013[cited 2013 Dec 02]. Available from:
http://rsh.sagepub.com/content/early/2013/08/02/1757913913495780.long.
http://rsh.sagepub.com/content/early/201...
)
Três estudos (EUROpean Action on Secondary Prevention through Intervention to Reduce Events -EUROASPIRE I, II, III) investigaram a tendência temporal dos fatores de risco cardiovasculares em pacientes hospitalizados previamente por doença arterial coronariana, demonstraram que as recomendações para o controle dos fatores de risco cardiovasculares não têm sido implementadas na prática clínica e mostram urgente necessidade de fortalecimento de estratégias de prevenção em pacientes com doença arterial coronariana.(2424. Prugger C, Heidrich J, Wellmann J, Dittrich R, Brand SM, Telgmann R, et al. Trends in cardiovascular risk factors among patients with coronary heart disease. Dtsch Arztebl Int. 2012;109(17):303-10.)
A modificação comportamental deve ter prioridade similar à terapêutica medicamentosa imediatamente após a síndrome coronariana aguda. Um estudo populacional acompanhou 18809 pacientes de 41 países até 6 meses após a hospitalização por síndrome coronariana aguda. Os pacientes que relataram continuar fumando e ausência de adesão à dieta e exercícios apresentaram chance 3,8 vezes maior de infarto agudo do miocárdio, acidente vascular encefálico ou morte comparados aos não fumantes que modificaram a dieta e padrão de exercícios em até seis meses.(2525. Chow CK, Jolly S, Rao-Melacini P, Fox KA, Anand AA, Yusuf S. Association of diet, exercise, and smoking modification with risk of early cardiovascular events after acute coronary syndromes. Circulation. 2010;121(6):750-8.)
Muitos estudos apresentam resultados importantes para pacientes em prevenção secundária que recebem intervenções educativas. Dentre 1510 pacientes hospitalizados por síndrome coronariana aguda acompanhados durante seis meses, houve redução média do índice de massa corpórea, da circunferência da cintura e aumento da atividade física regular no grupo que recebeu uma intervenção educativa.(2121. Muñiz J, Doblas GJJ, Pérez SMI, Goya LI, Eizagaetxebarría MN, Galván TE, et al. The effect of post-discharge educational intervention on patients in achieving objectives in modifiable risk factors six months after discharge following an episode of acute coronary syndrome (CAM-2 Project): a randomized controlled trial. Health Qual Life Outcom. 2010;8:137-45.) Na Itália, um programa educacional implementado por enfermeiras para pacientes hipertensos melhorou significativamente a obesidade, baixo consumo de frutas, hipertensão não-controlada, LDL e colesterol total.(2626. Cicolini G, Simonetti V, Comparcini D, Celiberti I, Di Nicola M, Capasso LM, et al. Efficacy of a nurse-led email reminder program for cardiovascular prevention risk reduction in hypertensive patients: A randomized controlled trial. Int J Nurs Stud. 2013 Oct 25. pii: S0020-7489(13)00302-7.)
Conclusão
Houve alta prevalência de tabagismo e consumo de álcool, a dependência de nicotina foi alta, o consumo de álcool foi de baixo risco. A maioria dos indivíduos era ativa. Houve correlação significativa entre dependência de álcool e tabagismo. A alta dependência de nicotina associou-se significativamente ao sedentarismo.
Pesquisa realizada com o apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), processo 301688/2009-5.
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Colaborações Brunori EHFR contribuiu com a concepção do projeto, análise e interpretação dos dados e redação do artigo. Cavalcante AMRZ e Lopes CT colaboraram com a análise e interpretação dos dados e redação do artigo. Lopes JL e Barros ALBL participaram da concepção do projeto, análise e interpretação dos dados, revisão crítica relevante do conteúdo intelectual e aprovação final da versão a ser publicada.
Referências
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1Beaglehole R, Bonita R, Horton R, Adams C, Alleyne G, Asaria P, et al. Priority actions for the non-communicable disease crisis. Lancet. 2011;377:1438-47.
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2Servinc S, Akyol AD. Cardiac risk factors and quality of life in patients with coronary artery disease. J Clin Nurs. 2010;19(9-10):1315-25.
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3Chan CW, Perry L. Lifestyle health promotion interventions for the nursing workforce: a systematic review. J Clin Nurs. 2012;21(15-16):2247-61.
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4Marrero SL, Bloom DE, Adashi EY. Noncommunicable diseases. A global health crisis in a new world order. J Am Med Assoc. 2012;307(19):2037-8.
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5Ohta Y, Tsuchihashi T, Onaka U, Hasegawa E. Clustering of cardiovascular risk factors and blood pressure control status in hypertensive patients. Intern Med. 2010;49(15):1483-7.
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6World Health Organization. Reducing risks and preventing disease: population-wide interventions. [Internet]. 2011[cited 2013 Jun 17]. Available from: http://www.who.int/nmh/publications/ncd_report_chapter4.pdf.
» http://www.who.int/nmh/publications/ncd_report_chapter4.pdf -
7Pomeshkina S, Borovik IV, Barbarash OL. Adherence to non-medication treatment in patients undergoing coronary artery bypass surgery. Eur Heart J. 2013;34 (Suppl 1):1213-8.
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8Pérez-Ríos M, Santiago-Pérez MI, Alonso B, Malvar A, Hervada X, Leon J. Fagerstrom test for nicotine dependence vs heavy smoking index in a general population survey. BMC Public Health. 2009;9:493-7.
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9Jomar RT, Paixão LA, Abreu AM. Alcohol Use Disorders Identification Test (AUDIT) e sua aplicabilidade na atenção primária à saúde. Rev APS. 2012;15(1):113-7.
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Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
Mar-Apr 2014
Histórico
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Recebido
16 Fev 2014 -
Aceito
31 Mar 2014