Resumos
OBJETIVO: Identificar o conhecimento e comportamento de pessoas diabéticas em relação aos cuidados com os pés. MÉTODOS: Estudo descritivo e transversal realizado em um centro de pesquisa e extensão universitária do interior paulista, em 2005. Foram entrevistados 55 pacientes diabéticos. Para a obtenção dos dados utilizamos um formulário, dois questionários e exame físico dos pés. RESULTADOS: As pessoas diabéticas não reconhecem a dimensão do risco real com relação aos pés. O conhecimento referido nem sempre se traduz na adoção de ações de autocuidado para a prevenção de problemas relacionados aos pés. Esta realidade aponta para a necessidade de considerarmos as particularidades de cada sujeito e sua interação com o ambiente, para delineamento das intervenções educativas. CONCLUSÕES: É preciso que os profissionais de saúde compreendam que o descompasso entre conhecimento e comportamento dos diabéticos não deve ser interpretado como um obstáculo intransponível, mas como um dos desafios fundamentais que precisam ser enfrentados.
Diabetes mellitus; Prevenção primária; Pé diabético; Conduta de saúde; Conhecimentos, atitudes e prática em saúde
OBJETIVO: Identificar el conocimiento y comportamiento de personas diabéticas en relación a los cuidados de los piés. MÉTODOS: Estudio descriptivo y transversal realizado en un centro de investigación y extensión universitaria del interior paulista, en el 2005. Fueron entrevistados 55 pacientes diabéticos. Para la obtención de los datos utilizamos un formulario, dos cuestionarios y examen físico de los piés. RESULTADOS: Las personas diabéticas no reconocen la dimensión del riesgo real en relación a los piés. El conocimiento referido no siempre se traduce en la adopción de acciones de autocuidado para la prevención de problemas relacionados a los piés. Esta realidad apunta hacia la necesidad de considerar las particularidades de cada sujeto y su interacción con el ambiente, para el delineamento de las intervenciones educativas. CONCLUSIONES: Es preciso que los profesionales de salud comprendan que el descompás entre conocimiento y comportamiento de los diabéticos no debe ser interpretado como un obstáculo intransferible, sino como uno de los desafíos fundamentales que precisan ser enfrentados.
Diabetes mellitus; Prevención primaria; Pie diabético; Conducta de salud; Conocimientos, actitudes y práctica en salud
OBJECTIVE: To describe the knowledge and behaviors of patients with diabetes towards foot care. METHODS: A cross-sectional descriptive study was conducted at a university research and intervention center in the interior of the state of São Paulo. Data were collected through interviews, two specific questionnaires, and physical examination of the foot in 55 patients in 2005. RESULTS: The participants did not recognize the dimension of the true risks regarding lack of foot care. The participant knowledge of diabetes did not translate into actions to prevent foot problems. These results suggest the need to take into consideration specific individual characteristics and the individual's interactions with the environment in designing educational interventions. CONCLUSIONS: Health care professionals need to understand that discrepancy between knowledge and behaviors of patients with diabetes is not an obstacle impossible to cross, but a challenging issue that needs to be addressed.
Diabetes mellitus; Primary prevention; Diabetic foot; Health behavior; Health knowledge, attitudes, practice
ARTIGO ORIGINAL
Comportamento e conhecimento: fundamentos para prevenção do pé diabético*
Comportamiento y conocimiento: fundamentos para la prevención del pié diabético
Roseanne Montargil RochaI; Maria Lúcia ZanettiII; Manoel Antônio dos SantosIII
IDoutora em Enfermagem Fundamental pela Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo - USP Ribeirão Preto (SP), Brasil
IIProfessor Associado da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo - USP Ribeirão Preto (SP), Brasil
IIIDoutor, Professor da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo - USP Ribeirão Preto (SP), Brasil
Autor Correspondente Autor Correspondente: Maria Lúcia Zanetti Av. Bandeirantes, 3900 - Monte Alegre Ribeirão Preto - SP - CEP. 14040-902 E-mail: zanetti@eerp.usp.br
RESUMO
OBJETIVO: Identificar o conhecimento e comportamento de pessoas diabéticas em relação aos cuidados com os pés.
MÉTODOS: Estudo descritivo e transversal realizado em um centro de pesquisa e extensão universitária do interior paulista, em 2005. Foram entrevistados 55 pacientes diabéticos. Para a obtenção dos dados utilizamos um formulário, dois questionários e exame físico dos pés.
RESULTADOS: As pessoas diabéticas não reconhecem a dimensão do risco real com relação aos pés. O conhecimento referido nem sempre se traduz na adoção de ações de autocuidado para a prevenção de problemas relacionados aos pés. Esta realidade aponta para a necessidade de considerarmos as particularidades de cada sujeito e sua interação com o ambiente, para delineamento das intervenções educativas.
CONCLUSÕES: É preciso que os profissionais de saúde compreendam que o descompasso entre conhecimento e comportamento dos diabéticos não deve ser interpretado como um obstáculo intransponível, mas como um dos desafios fundamentais que precisam ser enfrentados.
Descritores: Diabetes mellitus; Prevenção primária; Pé diabético/prevenção & controle; Conduta de saúde; Conhecimentos, atitudes e prática em saúde
RESUMEN
OBJETIVO: Identificar el conocimiento y comportamiento de personas diabéticas en relación a los cuidados de los piés.
MÉTODOS: Estudio descriptivo y transversal realizado en un centro de investigación y extensión universitaria del interior paulista, en el 2005. Fueron entrevistados 55 pacientes diabéticos. Para la obtención de los datos utilizamos un formulario, dos cuestionarios y examen físico de los piés.
RESULTADOS: Las personas diabéticas no reconocen la dimensión del riesgo real en relación a los piés. El conocimiento referido no siempre se traduce en la adopción de acciones de autocuidado para la prevención de problemas relacionados a los piés. Esta realidad apunta hacia la necesidad de considerar las particularidades de cada sujeto y su interacción con el ambiente, para el delineamento de las intervenciones educativas.
CONCLUSIONES: Es preciso que los profesionales de salud comprendan que el descompás entre conocimiento y comportamiento de los diabéticos no debe ser interpretado como un obstáculo intransferible, sino como uno de los desafíos fundamentales que precisan ser enfrentados.
Descriptores: Diabetes mellitus; Prevención primaria; Pie diabético/prevención & control; Conducta de salud; Conocimientos, actitudes y práctica en salud
INTRODUÇÃO
O pé diabético representa uma das mais incapacitantes complicações crônicas advindas do mau controle da doença, com impacto social e econômico para as famílias, o sistema de saúde e a sociedade, tanto em países desenvolvidos como emergentes(1).
O pé diabético é a principal causa de internação de diabéticos e corresponde a 6% das hospitalizações nos Estados Unidos. No Brasil, a prevalência desse tipo de ulceração em diabéticos do tipo 2 é de 5% a 10%(2).
Os agravos nos membros inferiores neuropatia diabética, doença arterial periférica, ulceração ou amputação, afetam a população diabética duas vezes mais do que a não-diabética, atingindo 30% em indivíduos com 40 anos ou mais de idade(3).
Estima-se que, pelo menos 15% dos diabéticos desenvolverão uma lesão no pé ao longo da vida(4). Um estudo mostrou que 28% dos pacientes em seguimento em um serviço de saúde desenvolveram lesões nos pés em um período de 30 meses(5).
O fator mais importante para o desencadeamento de úlceras nos membros inferiores é a neuropatia diabética, que afeta 50% dos diabéticos com mais de 60 anos. Esse agravo à saúde pode estar presente antes da detecção da perda da sensibilidade protetora, resultando em maior vulnerabilidade a traumas, além de acarretar um risco de ulceração aumentado em sete vezes(6-8).
Um dos maiores desafios para o estabelecimento do diagnóstico precoce em pessoas diabéticas em risco de ulceração nos membros inferiores é a inadequação do cuidado para com os pés ou a falta de um simples exame dos mesmos. Estudos mostram que, dos pacientes admitidos em hospitais com diagnóstico de diabetes, 10% a 19% tiveram seus pés examinados após a remoção de meias e sapatos(9-10).
Por outro lado, está bem estabelecido que 85% dos problemas decorrentes do pé diabético são passíveis de prevenção, a partir dos cuidados especializados(1).
Há recomendações para prevenção e intervenção adequadas, que incluem o reconhecimento dos fatores de risco, como neuropatia diabética, doença arterial periférica e deformidades estruturais, mediante tecnologia leve e média leve(1).
Faz parte desse esforço preventivo conhecer as experiências prévias quanto ao conhecimento e comportamento que os diabéticos apresentam em relação aos cuidados com os pés. Para alcançar as metas da educação em diabetes, o paciente deve ser estimulado a desenvolver uma postura pró-ativa em relação ao seu autocuidado. Assumir essa postura envolve mudanças de hábitos de vida, que exigem habilidade de traduzir informação em ação(11).
Os profissionais de saúde devem envolver a pessoa diabética em todas as fases do processo educacional pois, para assumir a responsabilidade do papel terapêutico, o paciente precisa dominar conhecimentos e desenvolver habilidades que o instrumentalizem para o autocuidado. Para tanto, precisa ter clareza acerca daquilo que necessita, valoriza e deseja obter em sua vida.
O propósito da educação em saúde é propiciar combinações de experiências bem-sucedidas de aprendizagem, destinadas a facilitar adaptações voluntárias de comportamentos em busca de saúde e melhor qualidade de vida. Assim, o processo de educação em saúde para a prevenção do pé diabético deve visar o desenvolvimento pessoal que propicie as mudanças de comportamento em relação aos cuidados com os membros inferiores. Para tanto, é necessário promover condições favoráveis para a manutenção e valorização do comportamento esperado. O comportamento esperado é aquele em que a pessoa diabética se envolve de modo comprometido, tornando-se co-partícipe e parceiro engajado em seu processo educacional.
Nessa vertente, ao cuidar de pessoas com condições crônicas, os profissionais de saúde devem determinar a prontidão para a aprendizagem, utilizando abordagens educacionais efetivas. A avaliação do conhecimento e das habilidades, especialmente a capacidade de solucionar problemas do dia-a-dia, é um componente relevante do autocuidado com os pés.
Mesmo não havendo ainda um consenso quanto ao modelo educativo recomendado, reconhece-se que, quando há aumento do conhecimento, em curto prazo constata-se redução, embora modesta, do risco de ulceração e amputação. A ênfase deve ser dada aos pacientes com alto risco para o desenvolvimento de úlceras, que devem ser agendados a cada três meses para retorno clínico. O processo de conscientização mostra-se especialmente importante nesses casos, uma vez que está comprovado que remover as calosidades reduz a pressão plantar em cerca de 26%(12).
Reconhecendo que tanto o conhecimento, quanto o comportamento para o cuidado com os pés são fundamentos para prevenção de complicações nos membros inferiores, e que há poucos estudos na literatura nacional acerca dessa temática, este estudo teve como objetivo identificar o conhecimento e o comportamento de pessoas diabéticas em relação aos cuidados com os pés.
MÉTODOS
Estudo descritivo e transversal, realizado em um centro de pesquisa e extensão universitária do interior paulista em 2005. A amostra, por conveniência, foi constituída por 55 pacientes diabéticos cadastrados no referido centro que preencheram os seguintes critérios de inclusão: ter diabetes do tipo 1 oudo tipo 2, estar cadastrado no programa educativo oferecido, não ser portador de deficiência cognitiva, sensorial ou transtorno mental que prejudicasse a compreensão das questões formuladas e concordar em participar da pesquisa, mediante assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
Para obtenção das variáveis sócio-demográficas (sexo, idade, nível de escolaridade, renda familiar) e clínicas (tipo de diabetes, tempo de diagnóstico, tipo de tratamento, comorbidades, índice de massa corporal) utilizou-se um formulário. Para obtenção das variáveis relacionadas às alterações dermatológicas, circulatórias, neuropáticas autonômicas, neuropáticas motoras e neuropáticas sensitivas foi realizado o exame físico dos pés, com uso de monofilamento de Semmes-Weinstein de 10g e diapasão de 128Hz, para avaliação da sensibilidade tátil e vibratória, além da anamnese clínica.
Para aferição dos dados relativos ao comportamento e conhecimento, foram utilizados dois questionários elaborados pelos pesquisadores, com base no Consenso Internacional do Pé Diabético(1). Para avaliação e adequação dos instrumentos, esses questionários foram apreciados por três especialistas em diabetes. Em seguida, realizou-se um pré-teste com três diabéticos vinculados ao Centro, que mostrou clareza de linguagem e adequação do instrumento, permitindo alcançar os objetivos propostos.
Cada questionário continha 24 questões fechadas de múltipla escolha, em forma de checklist. As questões apresentavam uma única alternativa de resposta verdadeira. Os instrumentos contemplavam os mesmos conteúdos, diferindo apenas na redação das questões. Eventualmente, foi realizada uma inversão na ordem de apresentação dos itens, na seqüência das alternativas e no verbo utilizado para a redação das questões, de modo a evitar que as respostas pudessem ser memorizadas pelos sujeitos.
A coleta de dados foi realizada no próprio centro, individualmente, em entrevista face-a-face, em ambiente preservado com condições adequadas de conforto. Em primeiro lugar, foi aplicado o questionário de comportamento, solicitando-se que os sujeitos respondessem às questões sem se preocuparem com o fato de as respostas serem corretas ou não, mas que reproduzissem os cuidados com os pés realizados no domicílio. Em seguida, foi realizado o exame físico dos pés(1). Na seqüência, aplicou-se o questionário de conhecimento. Esse instrumento foi aplicado por último, de modo a não influenciar a avaliação que o sujeito deveria fazer de seu comportamento.
O comportamento e o conhecimento foram mensurados pela soma dos escores individuais, sendo cada questão correspondente a um ponto, totalizando 24 pontos.
Para a organização e análise dos dados, os mesmos foram codificados e digitados em uma planilha do programa Excel e, posteriormente, transportados para o programa SPSS versão 11.5. Para apresentação dos resultados, utilizamos a estatística descritiva.
RESULTADOS
Caracterização sócio-demográfica e clínica
Em relação aos dados sócio-demográficos, das 55 (100%) pessoas diabéticas que compuseram a amostra 72,7% eram do sexo feminino, na faixa etária compreendida de 29 a 79 anos. A média foi de 59,7 anos, sendo que 56,4% apresentaram idade superior a 60 anos. Quanto à idade, 33,3% dos homens e 40,0% das mulheres encontravam-se na faixa etária de 60 a 69 anos, perfazendo 38,2% da amostra estudada. Quanto ao tipo de diabetes, 96,4% referiram diabetes tipo 2.
Em relação ao grau de instrução, 41% dos participantes tinham até oito anos de estudos. Quanto à renda familiar, 52,7% referiram de três a cinco salários mínimos e 20,0% de um a dois salários mínimos, perfazendo 72,7% de pessoas com rendimento familiar considerando baixo. No que se refere ao tempo de diagnóstico de diabetes, verificou-se que 40,0% dos participantes tinham entre seis e dez anos e 32,7% de um a cinco anos, com média de 9,7 anos.
Quanto ao tratamento para o controle do diabetes, a totalidade dos sujeitos referiu seguir a dieta como parte da terapêutica; 65,0% praticavam atividade física e 74,5% utilizavam antidiabéticos orais para controle da doença; 36,4% faziam uso de insulina.
No que se refere às condições clínicas de risco para as complicações do diabetes, verificamos que 70,9% tinham hipertensão arterial, 50,9% catarata, 30,9% doença vascular periférica, 23,6% retinopatia e 16,4% infarto agudo do miocárdio. Importa ressaltar, que 63,6% das pessoas diabéticas apresentaram um índice de massa corporal maior do que 30 kg/m2, caracterizando obesidade.
Caracterização das alterações que predispõem ao desenvolvimento do Pé Diabético
Na Tabela 1 encontram-se os dados referentes às alterações dermatológicas, circulatórias, neuropáticas autonômicas, neuropáticas motoras e neuropáticas sensitivas que predispõem a pessoa diabética a desenvolver complicações nos pés.
Quanto às alterações decorrentes das alterações neuropáticas sensitivas, identificadas mediante a realização dos testes de sensibilidade vibratória, de sensibilidade tátil e o teste do reflexo de Aquileu, constatou-se que, dos 55 sujeitos, 98,2% tiveram a sensibilidade vibratória presente. Um único sujeito não apresentou sensibilidade local na cabeça metatarseana. Quanto à sensibilidade tátil, 40% apresentaram ausência de sensibilidade ao monofilamento de 10g em pelo menos um ponto, dos 10 pontos testados, conforme os parâmetros recomendados(13-14). Todos os sujeitos apresentaram sensibilidade preservada no teste do reflexo de Aquileu.
Comportamento em relação aos cuidados com os pés
Ao investigar o comportamento apresentado pelos sujeitos em relação aos cuidados essenciais com os pés, os resultados mostraram que o somatório dos escores obtidos para as questões corretas acerca dos cuidados adequados foi baixo. A média encontrada foi de 12,9, sendo a pontuação mínima de 7,5 pontos e a máxima de 18 pontos. Importa assinalar que 36,4% dos sujeitos acertaram menos de 50% das questões. Na Figura 1 verificam-se os comportamentos adequados e inadequados acerca dos cuidados essenciais com os pés para as 24 questões investigadas.
Em relação aos comportamentos adequados, 78,2 não utilizam bolsa de água quente nos pés, 78,2% verificam o calçado por dentro antes de usá-lo, 70,9% realizam a secagem dos espaços interdigitais quando os pés ficam molhados, 65,4% usam calçados de couro, 60,0% usam calçado macio e confortável e 60,0% nunca andam descalços.
Ao analisar os comportamentos inadequados, verificou-se que 98,2% usam calçado aberto em casa e para sair, 89,1% usam calçados com ou sem costura, 85,4% removem calos com lixas inadequadas ou produtos químicos, 83,6% cortam as unhas de maneira inadequada, rente ao dedo e redonda, 83,6% compram calçado pela manhã ou no início da tarde; 80,0% usam meias com costura e escuras, 78,2% não hidratam os pés diariamente, 69,1% retiram cutículas, 67,3% não têm hábito de examinar os pés diariamente e 63,6% hidratam os pés entre os dedos.
Conhecimento em relação aos cuidados com os pés
Quanto ao conhecimento apresentado pelos sujeitos em relação aos cuidados essenciais com os pés, o somatório dos escores obtidos para as questões corretas foi satisfatório. A média encontrada foi de 16,6, sendo a pontuação mínima de 10 pontos e a máxima de 22 pontos; 65,4% dos sujeitos obtiveram de 54,2% a 75,0% de acertos.
Na Figura 2 verifica-se o conhecimento correto e errado acerca dos cuidados essenciais com os pés, de acordo com as 24 questões investigadas.
Reportando ao conhecimento correto para o cuidado com os pés, todos os sujeitos investigados referiram verificar o calçado antes de usá-lo, 94,5% reconhecem a importância da lavagem diária dos pés, 87,3% responderam que é importante enxugar os espaços interdigitais, 83,6% reconhecem a necessidade de nunca andar descalço, 81,8% referiram que os pés devem ser examinados diariamente e 54,5%, que as unhas devem ser cortadas corretamente.
Quanto ao conhecimento errado em relação aos cuidados essenciais com os pés, 72,7% não mencionam a hidratação dos pés diariamente, 58,2% desconheciam o horário para comprar os calçados e 56,4%, o tipo de sabonete para lavagem dos pés.
DISCUSSÃO
Em relação às variáveis sócio-demográficas, constatou-se predomínio do sexo feminino (72,7%). Quanto à faixa etária, houve predominância de sujeitos entre 60 e 69 anos (38,2%). Em relação ao sexo e faixa etária, os sujeitos mantiveram características semelhantes às descritas em estudos não randomizados(15-17), que mostram a predominância de mulheres. Importante ressaltar, que em estudos de prevalência no Brasil e em Ribeirão Preto-SP não houve diferenças significativas entre os sexos(18-19).
Em relação à escolaridade, encontrou-se um baixo grau de instrução: 41% dos sujeitos completaram no máximo oito anos de estudo. A baixa escolaridade pode dificultar, tanto o acesso às informações como a compreensão dos mecanismos complexos da doença e de seu tratamento, restringindo as oportunidades de aprendizagem quanto aos cuidados com a saúde(20-21). Em relação à renda familiar, a maioria (72,7%) recebe até cinco salários mínimos, sendo que geralmente a receita doméstica provém de aposentadoria ou pensão do idoso diabético.
Em relação às variáveis clínicas, 96,4% dos diabéticos eram do tipo 2. A predominância de idosos diabéticos do tipo 2 neste estudo impõe a necessidade de repensar as estratégias educativas e assistenciais, pois o envelhecimento caracteriza-se por mudanças físicas, psíquicas e sociais que acometem indivíduos com sobrevida prolongada(22). Idosos, com freqüência, apresentam déficits cognitivos, com diminuição da capacidade intelectual, alterações da memória, do raciocínio lógico e do juízo crítico.
Quanto ao tempo de diagnóstico de diabetes, 40% tinham entre 6 e 10 anos, com média de 9,7 anos. Quanto maior o tempo de diagnóstico de diabetes, maior a probabilidade de desenvolver neuropatia diabética e úlceras nos pés. Estudo mostra que, após 20 anos de diabetes, as pessoas têm grande chance de apresentar doença vascular periférica, sendo fundamental a identificação dos fatores de risco(23).
A associação entre o tempo de diabetes e as complicações crônicas indica que a neuropatia diabética está presente de 8% a 12% no estabelecimento do diagnóstico e após 20 a 25 anos, em torno de 50% a 60%, nas pessoas diabéticas do tipo 2(24).
Ao investigar o seguimento da dieta prescrita, todos os sujeitos referiram realizá-la por orientação de nutricionista ou médico; 65% estavam praticando algum tipo de atividade física, como caminhada e musculação; 74,5% utilizavam antidiabéticos orais e 36,4% faziam uso de insulina. Na literatura encontram-se dados semelhantes quanto à utilização de agente oral (68,5%) e insulina (31,5%)(25). Estudo realizado no Brasil mostrou que cerca de 22% dos pacientes que tinham a doença não faziam qualquer tipo de tratamento(18). Outro estudo, realizado em Salvador-BA, mostrou que 30,5% dos diabéticos mencionaram fazer o tratamento de forma irregular(26).
Ao analisar os fatores de risco, encontrou-se que 70,9% apresentavam hipertensão arterial, 49% dislipidemia, 24% retinopatia e 31% doença vascular periférica. Quanto à obesidade, é importante ressaltar que 63,6% das pessoas diabéticas apresentaram um índice de massa corporal acima de 30kg/m2. O Consenso Brasileiro sobre Diabetes destaca que pequena redução de peso cerca de 5% a 10% leva uma melhora significativa nos níveis pressóricos e na redução da mortalidade cardio-circulatória.
Em relação às condições de risco para o desenvolvimento de ulcerações nos pés, destacaram-se as seguintes alterações: onicomicose, unha encravada, corte inadequado das unhas, edema, varizes, pulso tibial alterado, ressecamento dos pés, fissura, dedo em garra, acentuação do arco plantar, elevação do dorso plantar, proeminência metatarsiana, calos, formigamento, adormecimento e cãibras.
Há que se considerar que as alterações dermato-locais são reflexos também de entraves de ordem social e econômica enfrentados pelas pessoas diabéticas para a aquisição de calçados, palmilhas, cremes, entre outros artefatos para a prevenção de problemas nos pés. Estudo que investigou problemas relacionados aos pés encontrou que 71,7% das pessoas apresentavam boa higiene dos pés, porém se constatou anidrose em 49%, enquanto 48% tinham unhas espessas e hipertrofiadas(27).
Outro estudo identificou problemas de deformidades nos pés de idosos; além disso, 81,4% também apresentaram calosidades(28). As deformidades preexistentes nos dedos, como hálux em martelo, metatarsos comprimidos e protusões ósseas, são propensas à ruptura, que podem levar à infecção em diabéticos. As lesões nos nervos motores resultam em deformidades como dedos em garra, dedos sobrepostos, entre outros(29). O dedo em garra foi encontrado em 31,7% dos pacientes, dedos sobrepostos em 23,3% e proeminência metatarseana em 18.3%(30). Além disso, encontrou-se uso de calçados inadequados em 75% e o corte inadequado das unhas em 65%.
A pessoa diabética que apresenta fatores de risco para o desenvolvimento de complicação nos pés deve usar calçado apropriado, ou fazê-lo sob medida, com características padronizadas pelo Consenso Internacional do Pé Diabético(1). Os calçados inadequados predispõem os pés a traumas extrínsecos e contribuem como fator precipitante em até 85% dos casos de ulcerações nos pés(2).
Em relação à sensibilidade tátil, obteve-se que 29% dos sujeitos estudados apresentaram três a dez pontos com ausência de sensibilidade, o que sugere risco quanto à sensibilidade protetora plantar.
Ao analisar os comportamentos adequados em relação aos cuidados essenciais com os pés, encontrou-se que mais de 50% dos sujeitos realizam a secagem dos espaços interdigitais, não utilizam bolsa de água quente, usam calçado macio e confortável, verificam os calçados antes de usá-los. Esses resultados estão em concordância com os obtidos por outros autores(30), que concluíram que os diabéticos sabiam da necessidade dos cuidados adequados com os pés, porém o comportamento de autocuidado era inadequado, apesar de mais de 60% utilizarem calçados fechados e de 85% referirem lavar os pés com água e sabão e enxugá-los adequadamente.
Ao investigar os comportamentos inadequados em relação aos cuidados essenciais com os pés foi identificado que mais de 50% dos sujeitos não realizam hidratação dos pés, porém realizam a hidratação entre os artelhos, o que favorece a disseminação de um processo fúngico; não examinam os pés diariamente, realizam o corte de unha no formato redondo e rente ao artelho, utilizam meias escuras e com costuras, retiram cutículas, utilizam calçados abertos no domicílio e fora dele, removem calos sem indicação médica e com material inapropriado.
Outro estudo(30) também refere que a maioria das pessoas diabéticas consideram importante o cuidado com os pés na prevenção de complicações, porém apenas 50% os examinam diariamente. As justificativas encontradas para as dificuldades em relação ao exame dos pés relacionavam-se ao tempo de diagnóstico de diabetes há menos de um ano; a falta de reconhecimento de que têm problemas nos pés; o exame é realizado somente quando há retorno no ambulatório; as pessoas diabéticas não acreditam na necessidade de examinar os pés; problemas advindos com o avanço da idade dificultam a inspeção dos pés e ausência de apoio familiar. A falta de reconhecimento por parte das pessoas diabéticas quanto à importância da adequação dos calçados também foi observada pelas autoras(30), que constataram que, apesar da informação oferecida, 19,1% ainda andavam descalças.
Os dados obtidos no presente estudo são preocupantes, uma vez que se detectou que falta à pessoa diabética reconhecer a dimensão do risco real com relação aos pés. Cabe, ainda, destacar a falta de percepção de que as alterações, especialmente quanto à estrutura motora do pé e as dermato-locais, constituem risco para ulcerações nos pés. As pessoas diabéticas seguem orientações de forma fragmentada, desconhecendo que os riscos estão associados aos comportamentos adotados.
Os resultados obtidos são convergentes com os achados de outros estudos recentes, que vêm destacando a necessidade de que os profissionais de saúde voltem sua atenção para a avaliação cuidadosa e regular dos pés das pessoas diabéticas(31). Além disso, mais uma vez é evidenciado que é preciso intensificar a oferta de atividades educativas como estratégia para maximizar o autocuidado, lembrando que a manutenção de um bom controle glicêmico é fator fundamental, que alicerça todas as outras medidas de prevenção para o pé diabético.
CONCLUSÃO
Este estudo evidencia o modo como as pessoas diabéticas realizam os cuidados essenciais com os pés, bem como o conhecimento adquirido ao longo da trajetória de convívio com a doença. Os dados mostraram que esse conhecimento nem sempre se traduz na adoção de ações de autocuidado para a prevenção de problemas relacionados aos pés. Isto aponta para a necessidade de considerarmos as particularidades de cada sujeito e sua interação com o meio ambiente para o delineamento das intervenções educativas. É importante que os profissionais de saúde compreendam que esse eventual descompasso entre conhecimento e comportamento não deve ser interpretado como um obstáculo intransponível, mas sim como um dos desafios fundamentais que precisam ser enfrentados.
É importante que a equipe de saúde busque estratégias que motivem as pessoas diabéticas a adotarem comportamentos adequados acerca dos cuidados com os pés e a encontrarem caminhos para superar as barreiras na adoção desses comportamentos.
O conhecimento adquirido sobre a doença e os cuidados essenciais com os pés não garante a adoção e a manutenção de comportamentos adequados, contudo pode predispor à busca de saúde, o que nos incentiva a manter o processo educativo.
No entanto, os resultados obtidos impõem a necessidade de mudança de paradigma de uma educação tradicional para uma educação crítica, na qual o sujeito é privilegiado como co-partícipe do processo reflexivo, e o eixo da educação se desloca do plano abstrato da informação para o plano concreto da ação e comportamento.
Artigo recebido em 07/02/2008 e aprovado em 07/04/2008
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
14 Abr 2009 -
Data do Fascículo
Fev 2009
Histórico
-
Aceito
07 Abr 2008 -
Recebido
07 Fev 2008