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Nascimento, Vinicius (org.). Perspectiva dialógica nos estudos de tradução e interpretação da língua de sinais [Dialogic Perspective in Sign Language Translation and Interpretation Studies]. São Paulo: Hucitec, 2023. 254 p. (Coleção Licores, v. 7).

Nascimento, Vinicius. Perspectiva dialógica nos estudos de tradução e interpretação da língua de sinais [Dialogic Perspective in Sign Language Translation and Interpretation Studies]. São Paulo: Hucitec, 2023. 254 p. (Coleção Licores, v. 7)

Dirigida pelos professores doutores Beth Brait/PUC-SP e Jean Carlos Gonçalves/UFPR, a coleção LiCorEs traz em seu acervo obras que discutem variadas formas de expressão, a partir de estudos da linguagem, do corpo e da estética. Daí o título bastante sugestivo, pois, para que seja integralmente apreciado, o licor deve ser sorvido em pequenos goles, de modo que a bebida, ao tocar diferentes partes da língua de quem o aprecia, permite sentir todos os aspectos de seu sabor.

Com este recente livro, Perspectiva dialógica nos estudos de tradução e interpretação da língua de sinais, organizado por Vinícius Nascimento, a experiência não é diferente. Com seus oito capítulos, além da apresentação e do prefácio, o livro oferece ao leitor um conteúdo rico e profundo acerca dos estudos da interpretação e tradução em língua de sinais. Sorvê-lo vagarosamente é necessário para que o leitor seja todo tocado pela complexidade da temática. A leitura dessa obra é, em si, uma experiência ética e estética de enorme importância não só para a esfera acadêmica dos estudos da linguagem, como para a vida em sociedade.

Vinícius Nascimento é doutor e mestre em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem, pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Tem bacharelado em Fonoaudiologia, também pela mesma instituição e pós-doutorado em Linguística pela Universidade de São Paulo (USP). É professor da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) com atuação no eixo de tradução e interpretação do curso de Bacharelado em Tradução e Interpretação em Libras e Língua Portuguesa; professor permanente do Programa de Pós-graduação em Estudos da Tradução da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC); coordenador do Laboratório de Tradução Audiovisual da Língua de Sinais, também da UFSCar; líder do Grupo de Estudos Discursivos da Língua de Sinais (GEDiLS/ UFSCar/CNPq); pesquisador no campo dos estudos da tradução e interpretação em língua de sinais; tradutor e intérprete de LIBRAS.

Vinícius tem espírito agregador e dialógico. Neste livro, reúne autores que são profissionais da área dedicados à pesquisa, aspecto que considero fundamental para a produção científica de qualquer área de conhecimento: estudos que partem de atividades humanas - neste caso específico, atividades em que pessoas se comunicam por línguas distintas - para a elas retornarem com a responsabilidade de transformar realidades. Ainda que tenhamos alargado a produção científica da área, há muito o que fazer no que diz respeito aos direitos de cidadão assegurados às pessoas surdas. Este livro soma-se a esta produção com destaque, porque aborda diversos temas ainda sensíveis e necessários de serem conhecidos não apenas por aqueles que já estão no campo dos estudos da tradução, e especialmente os estudos da tradução e interpretação em língua de sinais, mas sobretudo pelo público que pouco conhece esta área de conhecimento e realidade social. Meu desejo é de que o tema ecoe por um público cada vez mais amplo.

Em sua apresentação, sustentado pela teoria dialógica bakhtiniana, Vinícius Nascimento apresenta a atividade de tradução como uma das mais complexas e fascinantes, “aquela que promove e permite o diálogo inconcluso entre comunidades que se comunicam por línguas distintas” (p. 10). Ao mobilizar diferentes culturas, valores e conhecimentos, o tradutor é colocado num lugar ainda cheio de questões e, por isso, cada vez mais estudado sob diferentes aspectos: semióticos, discursivos, interacionais, laborais. Para o organizador, a perspectiva bakhtiniana, base da análise dos temas presentes em todos os capítulos, é a que permite um olhar para essa atividade humana como uma prática discursiva.

Adail Sobral, autor do prefácio do livro, é tradutor profissional trabalhando no trânsito entre diferentes línguas: português, francês, inglês e espanhol, em várias áreas das ciências humanas e da saúde. Com um texto primoroso, apresenta os autores do livro, destacando o caráter político de seus trabalhos. Para ele, os textos ali reunidos “criam espaços de resistência, seja dando visibilidade a narrativas silenciadas, seja possibilitando narrativas em outras línguas” (p. 20), bem como valorizam a vida em sua diversidade.

Concordo com Sobral quando diz que “não se trata de estudos acadêmicos ingênuos, mas sim declarações de que o mundo dota de sentido a academia que o estuda” (p. 20). Há, ainda, na sociedade, inúmeros exemplos de situações de apagamento de sujeitos, tanto dos surdos quanto dos intérpretes, de desconhecimento da complexidade da língua de sinais, de desvalorização de um fazer, de mecanismos de exclusão do diferente. Ainda é frágil a compreensão do lugar do intérprete, não só pela comunidade ouvinte, como por vezes pelos próprios intérpretes.

Buscando visar a um público maior para a leitura deste livro, é necessário que se diga que o que une todos os tradutores e intérpretes de língua de sinais (TILS) é a batalha constante pelo reconhecimento e valorização do diferente. A escolha pela perspectiva dialógica da tradução coloca o tradutor invariavelmente diante de uma tomada de posição: não há fazer neutro. Todos os agentes envolvidos no ato da tradução ou interpretação são historicamente determinados, constituídos e atravessados por vozes sociais, que o mobilizam. “Ato responsável” é uma expressão própria do pensamento bakhtiniano, que se liga também ao sentido de responsivo. A responsabilidade, para Bakhtin, é essencialmente dialógica, porque cada ato responsável envolve o reconhecimento do outro. E é da experiência do encontro com o outro que se forma a consciência responsável.

Como diz Ponzio, no prefácio de Para uma filosofia do ato responsável, “a compreensão responsiva salienta a conexão entre compreensão e escuta, escuta que fala, que responde, mesmo que não imediata e diretamente; por meio da compreensão e pensamento participante” (Ponzio, 2010, p. 11). Há, no ato tradutório e interpretativo, um processo de construção de sentidos, em que estão presentes duas culturas distintas e um sujeito singular, o tradutor, numa situação concreta marcada por um tempo e um espaço.

Neiva de Aquino Albres é autora do capítulo intitulado “O movediço lugar da tradução: contribuições da perspectiva dialógica da linguagem”, que abre o livro com a proposta muito bem-sucedida de apresentar os estudos sobre tradução e interpretação com base na perspectiva dialógica do discurso, situando a Libras como “língua que corporifica e coloca em centralidade os sujeitos” (p. 41). Doutora em Educação Especial, entre muitas outras atividades acadêmicas e científicas, tem se dedicado a pesquisas no campo da análise de implementação de educação inclusiva e de educação para surdos. Neste capítulo, afirma que o tradutor está num campo movediço, pois tem de se mover de uma língua para outra, considerando valores e culturas de ambos os lados e, além disso, o contexto em que os discursos estão sendo produzidos. Contexto é, com certeza, e como salientou Sobral no prefácio, o aspecto mais trabalhado por todos os autores. Há sempre algo específico de cada contexto que deve ser considerado pelo tradutor e intérprete de língua de sinais (TILS) em sua tradução ou interpretação.

Vejamos as seguintes situações hipotéticas, mas verossímeis: (a) numa audiência judicial, o juiz não se dirige ao requerente da ação, porque acha que, por ele ser surdo, não vai entender a sentença e encaminhamentos do processo. Então, decide falar só com a intérprete, como se o requerente não estivesse na sala, o que o constrange; (b) em uma instituição educacional, um intérprete acompanha uma garota, em uma aula, em que quase todos os alunos estão cantando uma música cheia de palavrões. O intérprete, que conhece a menina e sabe de sua timidez, resolve omitir os palavrões da interpretação da música. Todos os alunos riem da situação, menos ela, que fica sem entender o motivo de tanta gargalhada; (c) a menina surda que sempre gostou de teatro, só foi entender, de fato, o que acontecia num palco, quando assistiu a uma peça em que os intérpretes participavam da cena, junto aos atores. Isso fez toda diferença para que ela entendesse o sentido de pertencimento; (d) um professor estranhou o fato de ter de passar o conteúdo e material de suas aulas, com antecedência, para o intérprete. Achou-o incompetente. Não basta estar na aula para saber o que vai interpretar? O que fazer: seguir conversando com o juiz ou, de algum modo, mostrar-lhe que o diálogo deve envolver o requerente? Qual o sentido de o intérprete estar ou não no palco acompanhando os atores? O que acarreta não interpretar tudo o que se passa na sala de aula? Interpretar é um ato espontâneo e imediato que não requer preparação?

As tomadas de decisão, sobretudo na interpretação, por serem imediatas, não se referem apenas à escolha do sinal a ser usado. É preciso ter consciência das condições de produção, circulação e recepção dos discursos traduzidos ou interpretados, pois tais decisões envolvem diferentes dimensões de alteridade e, portanto, diferentes dimensões éticas e estéticas.

Vânia de Aquino Albres Santiago é doutora em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem. Atua como consultora em acessibilidade e educação para surdos. Também é docente no curso de Pós-graduação em Tradução e Interpretação Libras/Português do Instituto Singularidades. Em seu capítulo, “Atividades de tradução, interpretação e guia-interpretação: o ético e o estético”, discorre sobre essas dimensões, buscando compreender as relações e as representações axiológicas de mundo envolvidas nas atividades de tradução, interpretação e guia-interpretação. Para tanto, assume, respaldada em Bakhtin, que todo ato responsável une ética e estética. Cada ato carrega em si, uma escolha consciente advinda de valores e intenções, determinado pela realidade histórica e vivenciado como acontecimento único. Analisar as atividades citadas implica compreender as condições de produção, circulação e recepção no interior de diferentes esferas de atividade humana e diferentes gêneros discursivos. Daí a necessidade de se ter conhecimento qualificado da atividade humana em questão.

Atividade humana também é o ponto de partida da teoria bakhtiniana. Não há estudo da linguagem em uso fora da atividade humana. Compreender o que seja, a partir da perspectiva de Bakhtin e o Círculo, é tomá-la como relacional, ética e criativa, portanto, dialógica. E é, nesse sentido, que todos os autores dos textos são unânimes em dizer que o tradutor não se limita em atuar na dimensão abstrata das línguas envolvidas. O caráter dialógico do pensamento bakhtiniano, presente em todo o livro, é o que sustenta o trabalho do tradutor, construtor de pontes entre diferentes mundos e realidades.

A partir desse horizonte comum, o autor de cada capítulo discorre sobre sua esfera de estudo e atuação e, nesse sentido, são recorrentes os conceitos de gênero discursivo, enunciado concreto, alteridade, desenvolvidos, no entanto, a partir das peculiaridades e complexidade de cada esfera e de cada atividade.

Tais conceitos o leitor verá desenvolvidos por Vinícius Nascimento, em seu capítulo, intitulado “O desenrolar do novelo conceitual bakhtiniano na formação de tradutores audiovisuais da Libras”. Para o autor, a compreensão de quaisquer interações entre homens e o mundo, em situações reais e concretas, muito se enriquece a partir da perspectiva dialógica bakhtiniana que dá origem à Análise Dialógica Discursiva, defendida por Brait (2008BRAIT, Beth. Análise e teoria do discurso. In: BRAIT, B. (org.). Bakhtin, outros conceitos-chave. São Paulo: Editora Contexto, 2008. p. 9-31.). E não há de ser diferente para a atividade de tradução e interpretação da língua de sinais. No decorrer de seu capítulo, Vinícius Nascimento explicita porque usou o termo novelo conceitual. Para ele, não há como usar um conceito isolado, na medida em que todos estão relacionados na concepção originária de Bakhtin e integrantes do Círculo, aqui destacados, Volóchinov e Medviédev.

Alguns capítulos tratam de temáticas diversas dentro de uma mesma esfera de atividade, ofertando ao leitor um aprofundamento valoroso.

Na esfera educacional, temos Rodrigo Custódio da Silva, cujo capítulo intitulado “Gêneros do discurso em libras videossinalizada da esfera acadêmica na perspectiva bakhtiniana” fala da necessidade de se ampliar a produção de materiais educacionais para estudantes surdos otimizarem seus processos de aprendizagem. Rodrigo é doutor em Linguística pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e, atualmente, atua como professor do curso de graduação da UFSC. A partir do conceito de gêneros discursivos, o autor discorre sobre a elaboração de material em Libras videossinalizada, em sete gêneros mais frequentes na esfera acadêmica, a saber, dicionários e glossários; materiais didáticos; teses e dissertações; monografias; artigos científicos; resumos e provas. Com esse estudo minucioso, visa à ampliação de ingresso e permanência de estudantes surdos na esfera educacional, em todos os níveis. O que pode parecer óbvio, como uma diversificação de materiais educativos na língua primeira do surdo, ainda não é realidade.

Também Priscila Regina Gonçalves de Melo Giamlourenço e Cristina Broglia Feitosa de Lacerda, com o capítulo intitulado “A produção e a posição discursiva do TILS no processo tradutório no campo educacional”, apontam que, nas instituições federais de ensino superior, a necessidade de aprimoramento do trabalho dos TILS é urgente. Falta de familiaridade com o conteúdo, desconhecimento da área de formação do estudante, falta de termos técnicos podem gerar problemas na compreensão dos conteúdos, dificultando o trabalho do intérprete. Prejuízo no trabalho do intérprete, prejuízo também na formação do estudante surdo, que encontra dificuldades de inserção nas esferas de trabalho de seu interesse. Priscila Regina Gonçalves de Melo Giamlourenço, psicopedagoga, é doutora em Educação Especial pela Universidade Federal de São Carlos. Cristina Broglia Feitosa de Lacerda, fonoaudióloga, é doutora pela Universidade Estadual de Campinas, professora da Universidade Federal de São Carlos no curso de Licenciatura e Pós-graduação em Educação Especial e tem larga experiência com grupos internacionais de pesquisa entre Itália, Portugal e Espanha.

Ainda que a pesquisa seja em outra esfera de atividade, na mesma direção de se analisar as condições de preparo para o ingresso no mundo do trabalho, Beth Brait, Amanda Assis e Luana Manini, no capítulo intitulado “O papel fundamental do TILS no acesso do surdo à justiça: uma perspectiva verbo-visual dialógica”, abordam a falta de equidade entre candidatos surdos e ouvintes para vagas em concursos públicos. Provas acessíveis para estudo, na internet, são oferecidas em língua portuguesa, mas não em Libras, o que coloca o surdo em desvantagem em relação às oportunidades de acesso aos serviços públicos. Beth Brait é ensaísta, crítica e professora associada da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), atuando nos cursos de Pós-graduação de Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem e Literatura e Crítica Literária. Amanda Assis é mestranda em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem da PUC-SP e atua nos temas interpretação de libras, TILS, janela de libras e interpretação audiovisual. Luana Manini é mestre em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem, advogada, docente no Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (SENAC) e membro efetivo da Comissão de Direitos Humanos da Pessoa com Deficiência da OAB.

Na esfera midiática e de cultura, os estudos mostram que o surdo também se encontra em desvantagem em relação ao ouvinte.

Carolina Fernandes Rodrigues Fomin, que estuda profundamente a atuação dos TILS no teatro, aborda em seu capítulo, “A interpretação para Libras de enunciados sonoros no teatro e as notas de interpretação”, a tradução em Libras dos efeitos sonoros que compõem o todo da cena teatral. Sabemos que, dentro da teoria bakhtiniana, o enunciado concreto é intrinsecamente constituído pela porção verbal e pela porção extraverbal. Brait (2013BRAIT, Beth. Olhar e ler: verbo-visualidade em perspectiva dialógica. Bakhtiniana. Revista de Estudos do Discurso, vol. 8(2), p. 43-66, dez. 2013. https://doi.org/10.1590/S2176-45732013000200004. Acesso 11 de março de 2024.
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) amplia esse conceito quando destaca em suas pesquisas a importância da visualidade na construção de sentidos de diferentes textos. Uma cena teatral é essencialmente, na concepção de Brait, verbo-visual: ao texto somam-se as luzes, figurino, objetos postos em cena, cenário e efeitos, todos contribuindo para a construção de sentidos do espetáculo. Como sinalizar os efeitos sonoros, para que a experiência teatral seja plena para os espectadores surdos, é uma das contribuições de Fomin para o aprimoramento do trabalho do TILS no teatro. Carolina Fernandes Rodrigues Fomin é doutora em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem; arquiteta de formação, tem especialização em Acessibilidade e em Tradução e Interpretação em Libras. Atualmente trabalha como intérprete de Libras na área cultural e é coordenadora do curso de Pós-graduação em Tradução e Interpretação em Libras/Português no Instituto de Educação Superior de São Paulo - Singularidades, Brasil.

Natalia Francisca Frazão e Ana Claudia Balieiro Lodi, com seu capítulo “Interpretação na esfera televisiva: o intérprete surdo em foco”, falam da importância da presença de um intérprete surdo em programas de entrevistas na televisão, pois é ele que vai trazer à equipe um olhar mais apurado aos enunciados em Libras, de modo a assegurar maior qualidade à interpretação. Além disso, elas descrevem passo a passo como se deu a interpretação de uma entrevista realizada na TV Cultura, elencando todos os aspectos que foram levantados para garantir ao surdo uma compreensão maior do diálogo que aconteceu entre entrevistador e entrevistado. Ana Claudia Balieiro Lodi, fonoaudióloga de formação, é doutora em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem pela PUC-SP e livre-docente pela Universidade de São Paulo (USP); atualmente é professora associada da Universidade de São Paulo, atuando nos cursos de Licenciatura da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto/Departamento de Educação, Informação e Comunicação (FFCLRP/Dedic) e no Programa de Pós-graduação em Educação (PPGEdu) e participa de grupo de pesquisa internacional, no Uruguai. Natalia Francisca Frazão, administradora de formação, é mestre no Programa de Pós-Graduação em Educação pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (USP). Atua como Intérprete de Apoio, Tradutora e Intérprete de Libras às esferas jornalística e midiática pela Fundação Padre Anchieta - Centro Paulista de Rádio e TV Educativas (TV Cultura).

A composição de autores deste livro pode ser comparada aos círculos bakhtinianos no que diz respeito à formação de seus integrantes e à contribuição para a produção científica de uma época de modo colaborativo. Aqui, há profissionais de áreas como administração, arquitetura, educação, direito, fonoaudiologia, linguística, psicopedagogia unidos em diálogo sobre linguagem e, especificamente, comunidade surda, língua de sinais, inclusão.

Compreender a necessidade e a complexidade da inserção do surdo com o sentido de pertencimento em todas as esferas de atividade humana parece-me ser o resultado maior da leitura deste livro e aí está seu maior mérito. Todos os capítulos mostram o quanto seus autores estão profundamente engajados nesse intuito, com o máximo rigor científico.

Há alguns anos, ministrei uma disciplina introdutória da perspectiva dialógica bakhtiniana, no curso de Pós-graduação em Tradução e Interpretação, no Instituto Singularidades. Lembro-me de que, na primeira aula de uma das primeiras turmas do curso, uma participante declarou, em sua apresentação ao grupo, que gostaria de ver a Libras circulando em nosso país, assim como vemos uma caneta esferográfica disponível nos balcões de estabelecimentos públicos espalhados por todas as regiões brasileiras. Eu jamais esqueci essa imagem. Seu desejo de equiparar Libras à presença de canetas à disposição em todo e qualquer balcão era, antes, uma denúncia da ausência de acessibilidade, como também do cerceamento ao direito de ir e vir daqueles pertencentes a comunidades que se comunicam por línguas distintas da oralidade. Muita coisa mudou, mas a luta pela inclusão do surdo na dinâmica da vida em sociedade ainda é grande. Vinicius Nascimento nos alerta sobre isso, em seu capítulo já citado, descrevendo o quanto a preparação e os embates são intensos em torno da colocação das janelas de Libras nos programas de TV. Há uma enorme diferença entre existir por força da lei e existir por direito.

Felizmente livros como esse nos ajudam a reconhecer a complexidade desse fazer para que possamos valorizá-lo e exigi-lo como obrigatório, em qualquer instituição, em qualquer situação em que haja a possibilidade da presença de pessoas usuárias de Libras.

REFERÊNCIAS

  • BRAIT, Beth. Análise e teoria do discurso. In: BRAIT, B. (org.). Bakhtin, outros conceitos-chave. São Paulo: Editora Contexto, 2008. p. 9-31.
  • BRAIT, Beth. Olhar e ler: verbo-visualidade em perspectiva dialógica. Bakhtiniana. Revista de Estudos do Discurso, vol. 8(2), p. 43-66, dez. 2013. https://doi.org/10.1590/S2176-45732013000200004 Acesso 11 de março de 2024.
    » https://doi.org/10.1590/S2176-45732013000200004
  • PONZIO, Augusto. A concepção bakhtiniana do ato como dar um passo. In: BAKHTIN, Mikhail. Para uma filosofia do ato responsável. Tradução aos cuidados de Valdemir Miotello e Carlos Alberto Faraco. São Carlos: Pedro e João Editores, 2010. p. 9-38.
  • Declaração de disponibilidade de conteúdo

    Os conteúdos subjacentes ao texto da pesquisa estão contidos no próprio manuscrito.
  • Pareceres

    Tendo em vista o compromisso assumido pela Bakhtiniana. Revista de Estudos do Discurso com a Ciência Aberta, a revista publica somente os pareceres autorizados por todas as partes envolvidas.

Disponibilidade de dados

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Maio 2024
  • Data do Fascículo
    Oct-Dec 2024

Histórico

  • Recebido
    31 Jan 2024
  • Aceito
    16 Abr 2024
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