Acessibilidade / Reportar erro

Bioética e Eras: um microcosmo relevante

Resumo

O objetivo deste artigo é apresentar uma reflexão sobre conceitos e aplicações da bioética, sua relação com o desenvolvimento da competência moral de profissionais de saúde, assim como sugerir estratégias para mitigar dissonâncias éticas e choque de paradigmas, as quais podem tornar-se facilitadoras de outros protocolos ou instituições. Trata-se de relato de experiência sobre o processo de elaboração de protocolo local de aceleração da recuperação cirúrgica cardíaca pediátrica. Durante esse processo, a equipe de saúde apresentou pontos-chave de discussão e dissonância relacionados a acesso venoso, indução anestésica, presença dos pais e controle da dor. Diversas razões foram apresentadas e interpretadas conforme as quatro principais correntes filosóficas científicas. Foi necessário considerar e revisar os princípios bioéticos, principalmente o da autonomia aplicado a menores, a inter-relação entre os princípios e sua hierarquia de importância. Reforça-se assim a importância da educação continuada e o papel das comissões de ética médica.

Palavras-chave
Bioética; Ética médica; Anestesia; Anestesia em procedimentos cardíacos; Delírio do despertar; Atitude do pessoal de saúde; Temas bioéticos

Abstract

The objective of this article is to present a reflection on the concepts and applications of bioethics, its relationship with the development of the moral competence of health professionals, as well as to suggest strategies to mitigate ethical dissonances and clash of paradigms, which can become facilitators of other protocols or institutions. This is an experience report on developing a local protocol to accelerate pediatric cardiac surgical recovery. During this process, the health personnel presented critical points of discussion and dissonance related to venous access, anesthetic induction, parental presence, and pain control. Several reasons were presented and interpreted according to the four main scientific philosophical currents. Considering and reviewing bioethical principles was necessary, especially the autonomy applied to minors and the interrelationship between the principles and their hierarchy of importance. This reinforces the importance of continuing education and the role of medical ethics committees.

Keywords
Bioethics; Ethics, medical; Anesthesia; Anesthesia in cardiac procedures; Emergence delirium; Attitude of health personnel; Bioethical issues

Resumen

Este trabajo reflexiona sobre los conceptos y aplicaciones de la bioética, su relación con el desarrollo de la competencia moral de los profesionales sanitarios, además, sugiere estrategias para mitigar las disonancias éticas y el choque de paradigmas que pueden convertirse en facilitadores de otros protocolos o instituciones. Este informe de experiencia aborda el proceso de desarrollo de un protocolo local sobre aceleración de la recuperación quirúrgica cardíaca pediátrica. Durante este proceso, el equipo sanitario presentó puntos de discusión y disonancia relacionados con acceso venoso, inducción anestésica, presencia de los padres y control del dolor. Se presentaron e interpretaron varias razones según las cuatro principales corrientes filosóficas científicas. Se consideró y revisó los principios bioéticos, especialmente el de la autonomía aplicada a los menores, la interrelación entre los principios y su jerarquía de importancia. Esto refuerza la importancia de la educación continua y el papel de los comités de ética médica.

Palabras clave
Bioética; Ética médica; Anestesia; Anestesia en procedimientos quirúrgicos cardíacos; Delirio del despertar; Actitud del personal de salud; Discusiones bioéticas

O protocolo recuperação pós-cirúrgica melhorada enhanced recovery after surgery (Eras) consiste em um conjunto de medidas centradas no paciente, que são realizadas por equipe multidisciplinar e visam melhorar a recuperação, reduzir a resposta ao estresse cirúrgico, otimizar a função fisiológica e diminuir o tempo de internação e complicações pós-operatórias. Desde os primeiros relatos de Kehlet 11. Kehlet H, Mogensen T. Hospital stay of 2 days after open sigmoidectomy with a multimodal rehabilitation programme. Br J Surg [Internet]. 1999 [acesso 14 fev 2024];86: 227-30. DOI: 10.1046/j.1365-2168.1999.01023.x
https://doi.org/10.1046/j.1365-2168.1999...
, o Eras tem evoluído bastante e ganhado grande notoriedade no meio médico, a ponto de ter uma sociedade própria – a Eras Society –, e, com o passar do tempo, diversas especialidades e sociedades juntaram-se à causa, contribuindo com seus próprios protocolos.

Os protocolos Eras em cirurgia cardíaca pediátrica fornecem uma abordagem estruturada multidisciplinar baseada em evidências que abrange todos os aspectos dos cuidados perioperatórios, a fim de otimizar a recuperação de uma criança após a cirurgia 22. Fuller S, Kumar SR, Roy N, Mahle W, Romano J, Nelson J et al. The American Association for Thoracic Surgery Congenital Cardiac Surgery Working Group 2021 consensus document on a comprehensive perioperative approach to enhanced recovery after pediatric cardiac surgery. J Thorac Cardiovasc Surg [Internet]. 2021 [acesso 14 fev 2024];162(3):931-54. DOI: 10.1016/j.jtcvs.2021.04.072
https://doi.org/10.1016/j.jtcvs.2021.04....
. Protocolos são conjuntos de medidas potencialmente benéficas, mas cuja sistemática não pode culminar em um sistema rígido. Portanto, o médico sempre será responsável pelo atendimento, devendo conformar-se ou modificar o caminho planejado com base nas necessidades individuais e no melhor interesse da criança.

A esse respeito, o Código de Ética Médica 33. Conselho Federal de Medicina. Código de ética médica: Resolução CFM n° 2.217, de 27 de setembro de 2018. Modificada pelas Resoluções CFM nº 2.222/2018 e 2.226/2019. Diário Oficial da União [Internet]. Brasília, 2018 [acesso 14 fev 2024]. Disponível: https://tny.im/S9McE
https://tny.im/S9McE...
, em seu capítulo III, diz:

Art. 3º Deixar de assumir responsabilidade sobre procedimento médico que indicou ou do qual participou, mesmo quando vários médicos tenham assistido o paciente.

Art. 4º Deixar de assumir a responsabilidade de qualquer ato profissional que tenha praticado ou indicado, ainda que solicitado ou consentido pelo paciente ou por seu representante legal.

Dada essa responsabilidade intransferível do ato médico, não é surpreendente que o cirurgião ou anestesiologista responsável pela cirurgia sejam os principais vetores dos desvios de protocolo 44. Roulin D, Muradbegovic M, Addor V, Blanc C, Demartines N, Hübner M. Enhanced recovery after elective colorectal surgery: reasons for non-compliance with the protocol. Dig Surg [Internet]. 2017 [acesso 14 fev 2024];34(3):220-6. DOI: 10.1159/000450685
https://doi.org/10.1159/000450685...
.

Muitas barreiras são postas à cooperação interprofissional, tais como falta de pessoal, resistência a mudanças nos conceitos cirúrgicos tradicionais, baixa adesão e colaboração dos pacientes, assim como falta de gestão unificada e de planos operacionais efetivos para equipe multidisciplinar 55. Wang D, Liu Z, Zhou J, Yang J, Chen X, Chang C et al. Barriers to implementation of enhanced recovery after surgery (Eras) by a multidisciplinary team in China: a multicentre qualitative study. BMJ Open [Internet]. 2022 [acesso 14 fev 2024];12(3):e053687. DOI: 10.1136/bmjopen-2021-053687
https://doi.org/10.1136/bmjopen-2021-053...

6. Cohen R, Gooberman-Hill R. Staff experiences of enhanced recovery after surgery: systematic review of qualitative studies. BMJ Open [Internet]. 2019 [acesso 14 fev 2024];9(2):e022259. DOI: 10.1136/bmjopen-2018-022259
https://doi.org/10.1136/bmjopen-2018-022...

7. Seow-En I, Wu J, Yang L, Tan J, Seah A, Foo F et al. Results of a colorectal enhanced recovery after surgery (Eras) programme and a qualitative analysis of healthcare workers' perspectives. Asian J Surg [Internet]. 2021 [acesso 14 fev 2024];44(1):307-12. DOI: 10.1016/j.asjsur.2020.07.020
https://doi.org/10.1016/j.asjsur.2020.07...

8. Wong DJN, Harris SK, Moonesinghe SR. Cancelled operations: a 7-day cohort study of planned adult inpatient surgery in 245 UK National Health Service hospitals. Br J Anaesth [Internet]. 2018 [acesso 14 fevereiro 2024];121(1):730-8. DOI: 10.1016/j.bja.2018.07.002
https://doi.org/10.1016/j.bja.2018.07.00...
-99. Pearsall EA, Meghji Z, Pitzul KB, Aarts M, McKenzie M, McLeod R, Okrainec A. A qualitative study to understand the barriers and enablers in implementing an enhanced recovery after surgery program. Ann Surg [Internet]. 2015 [acesso 14 fev 2024];261(1):92-6. DOI: 10.1097/SLA.0000000000000604
https://doi.org/10.1097/SLA.000000000000...
. Protocolos locais bem estabelecidos, baseados em evidências e disponíveis aos profissionais por meio de educação continuada são aceitos com mais facilidade e promovem o princípio bioético da justiça, uma vez que um maior número de pacientes receberá tratamento igualitário padronizado, em vez de embasado em critérios individuais, que podem diferir bastante conforme a equipe atendente.

Por meio de relato de experiência sobre o processo de elaboração de um protocolo Eras local, este artigo pretende apresentar uma reflexão sobre os conceitos e aplicações da bioética e sua relação com o desenvolvimento da competência moral dos profissionais de saúde durante a implementação de protocolos de aceleração da recuperação cirúrgica. Além disso, sugerem-se estratégias para mitigar dissonâncias éticas e choques de paradigmas, a fim de facilitar o estabelecimento de outros protocolos ou a aplicação de protocolos em outras instituições.

O programa

Um grupo de colaboradores foi montado para elaborar um programa institucional com base no projeto Eras em um hospital cardiológico voltado a cirurgias cardíacas pediátricas (Eras-PED/INC). A primeira fase consistiu em propor um conjunto de intervenções clínicas abrangentes, multimodais e multiprofissionais que fossem baseadas em evidências, associadas a engajamento familiar e aplicadas sinergicamente no pré, intra e pós-operatórios de grupos de pacientes específicos.

O programa Eras-PED/INC foi também inspirado no modelo de atenção centrada no paciente (ACP), com perspectiva ampliada no cuidado em saúde, que inclui a participação de pacientes/familiares no cuidado e humanização na relação profissional-paciente, dentro de uma prática interprofissional colaborativa (PIC), proposta pelo Sistema Único de Saúde (SUS).

Podem ser incluídos no programa pacientes com idade entre 30 dias e 18 anos, agendados para cirurgias cardíacas congênitas eletivas de baixa complexidade, classificadas no escore de mortalidade da Society of Thoracic Surgeons e da European Association for Cardiothoracic Surgery (STS-EACTS) como STAT 1 ou 2, e que aceitem participar do programa Eras-PED/INC. São excluídos pacientes em estado crítico, com comorbidades que sabidamente afetam a velocidade de recuperação, que se recusam a participar do programa, com escore ecocardiográfico de lesão residual acima de 2 e com evolução desfavorável na cirurgia ou pós-operatório.

Após extensa revisão da literatura e consultas a profissionais locais, determinaram-se as principais intervenções propostas e iniciou-se uma série de reuniões para debatê-las. Diferentes pontos de vista foram apresentados, e muitos conceitos, modificados. O Quadro 1 sumariza os tipos de intervenção e as principais ações específicas propostas.

Quadro 1
Tipos de intervenção e principais ações específicas propostas

Diferentes concepções

Para Platão 1010. Platão. Protágoras. [s.l]: Mimética; 2019 (Box Grandes Obras de Platão - Ebook), virtude é um conhecimento, e sua busca deve seguir pela vida inteira, enquanto para Aristóteles 1111. Aristóteles. Ética a Nicômaco. Jandira: Principis; 2021. trata-se não de mero conhecimento, mas de ação, sendo necessário praticá-la constantemente como um hábito. A busca da virtude é individual, mas pode ser apoiada por ferramentas que tanto criam hábitos virtuosos quanto educam continuamente o ser humano. Quanto mais prevenirem conflitos de julgamento entre membros da equipe clínica, pacientes e familiares, mais eficazes serão.

O comportamento médico muitas vezes pode ser influenciado pela tirania da tradição, pois o ser humano age conforme o que aprendeu e resiste a mudanças em maior ou menor grau. Assim, toda vez que o conhecimento não provê evidências suficientes para a solução de alguma questão, entra em cena o domínio de autoridades reverenciadas, e o indivíduo irá seguir a opinião de alguém que admira: determinado pesquisador, um clínico mais experiente ou até a conduta de uma instituição mais renomada que a sua. Diferentes paradigmas e visões sociais de mundo, conforme a educação recebida e identificação pessoal de cada profissional, influenciam na implantação de protocolos.

Quanto a isso, Alderson e colaboradores 1212. Alderson P, Bowman D, Brierley J, Dedieu N, Elliott M, Montgomery J, Wellesley H. Living bioethics, theories and children's consent to heart surgery. Clin Ethics [Internet]. 2023 [acesso 14 fev 2024];18(4):418-26. DOI: 10.1177/14777509221091086
https://doi.org/10.1177/1477750922109108...
trazem excelente reflexão sobre diversas linhas de pensamento em pesquisa relacionada a cirurgia cardíaca pediátrica e a bioética viva. Essas influências filosóficas podem ser aplicadas não somente a pesquisadores, mas também a profissionais da assistência, que em última análise são os intérpretes dessa ciência no dia a dia.

A medicina ocidental baseia-se em antigas tradições influenciadas por Hipócrates, Cícero ou Aristóteles. Durante a formação médica, há predominância do paradigma positivista, segundo o qual se aprende a fazer um diagnóstico, chegar a um consenso baseado em leis universais, prescrever e melhorar o prognóstico 1212. Alderson P, Bowman D, Brierley J, Dedieu N, Elliott M, Montgomery J, Wellesley H. Living bioethics, theories and children's consent to heart surgery. Clin Ethics [Internet]. 2023 [acesso 14 fev 2024];18(4):418-26. DOI: 10.1177/14777509221091086
https://doi.org/10.1177/1477750922109108...
. Os positivistas, na tradição iluminista de Hume, Compte e Durkheim, buscam objetividade livre de valores e preferem aplicar regras gerais claras baseadas em evidências, importando-se principalmente com desfechos julgados mais relevantes, como por exemplo a mortalidade.

Por esse ângulo, a aderência a um protocolo médico será guiada quase exclusivamente pelo grau de evidência científica em eventos críticos. Até o momento, metanálises não revelaram impacto significativo na mortalidade do Eras; só nos dias de estadia, taxa de complicações e satisfação em cirurgias gerais em adultos 1313. Turaga AH. Enhanced recovery after surgery (Eras) protocols for improving outcomes for patients undergoing major colorectal surgery. Cureus [Internet]. 2023 [acesso 14 fev 2024];15(17):e41755. DOI: 10.7759/cureus.41755
https://doi.org/10.7759/cureus.41755...
. Na população pediátrica ainda não há evidências fortes, o que é um subterfúgio para não aceitação por profissionais.

Não houve diferença significativa na ocorrência de complicações e na readmissão em trinta dias. Por outro lado, foram bem menores nos grupos Eras o tempo de internação, o volume de líquidos intraoperatórios, o uso de opioides no pós-operatório, o tempo até a primeira defeca- ção, o tempo até a dieta regular, o tempo até a interrupção da ingestão de líquidos intravenosos e os custos 1414. Arena S, Di Fabrizio D, Impellizzeri P, Gandullia P, Mattioli G, Romeo C. Enhanced recovery after gastrointestinal surgery (Eras) in pediatric patients: a systematic review and meta-analysis. J Gastrointest Surg [Internet]. 2021 [acesso 14 fev 2024];25(11):2976-88. DOI: 10.1007/s11605-021-05053-7
https://doi.org/10.1007/s11605-021-05053...
.

Adeptos da hermenêutica, seguindo Kant, Weber e Heidegger, já passam a reconhecer maiores diferenças entre as ciências naturais e sociais. Ao aumentar o foco sobre opiniões e experiências pessoais, é possível fazer análises complexas a respeito de entendimentos individuais. Essas medidas podem aumentar o bem-estar emocional e a satisfação do paciente, o que é bem aceito por esse grupo, a despeito de evidências menos robustas.

A teoria crítica de Marx, Adorno, Gramsci e Habermas rompe com tradicionais matrizes cartesianas e visa toda uma mudança social no controle de decisões e recursos a fim de partilhá-los de forma mais equitativa. Os teóricos críticos aderem mais facilmente a protocolos que tenham critérios de inclusão bastante amplos, baixos custos e boa adequação a serviços públicos.

O funcionalismo, influenciado por Durkheim, Talcott Parsons e Merton, é a crença de que tudo geralmente funciona para o bem maior de todos. Essa teoria sociológica enfatiza a importância da harmonia e estabilidade social para o funcionamento da sociedade, presumindo um consenso conservador de normas e valores partilhados. Os funcionalistas aceitam hierarquias e possíveis desigualdades na inclusão de pacientes, quando tais ferramentas parecem apoiar um funcionamento mais eficiente do estabelecimento de saúde.

Certo relativismo naturalista explica como as mesmas discordâncias relacionadas a questões ontológicas grandes, como uma pandemia, vacinas, mudanças climáticas e sustentabilidade, existem também em um microcosmo tão específico no tempo e espaço como o de implantação de um protocolo local, em um estabelecimento de saúde específico, envolvendo pessoas com formação científica semelhante.

Uma característica humana é ter a incapacidade de dizer o que a realidade é, ao mesmo tempo que se é capaz de dizer o que a realidade não é, o que é possível graças à constatação dos próprios erros na tentativa de “construção” teórica dessa realidade. Porém como conciliar tudo isso, uma vez que existem várias realidades diferentes? Cada posição sociocultural traz uma cosmologia inerente a determinado grupo, povo e cultura, até atingir o âmbito individual das próprias experiências 1515. Almeida MWB. Anarquismo ontológico e verdade no antropoceno. Ilha: Revista de Antropologia [Internet]. 2021 [acesso 14 fev 2024];23(1):10-29. DOI: 10.5007/2175-8034.2021.e78405
https://doi.org/10.5007/2175-8034.2021.e...
.

Justiça social

Tais protocolos de recuperação acelerada são baseados mais em medidas de segurança do paciente do que em aquisição de tecnologias que impactam custos. Portanto, podem ser aplicados em diferentes estabelecimentos de saúde do sistema público, privado ou filantrópico, independentemente do aporte de recursos financeiros, promovendo assim equidade no atendimento, sem diferenciação da condição social.

Em sistemas de saúde superlotados, carentes de recursos, equipamentos e leitos, as listas de espera podem durar anos. Assim, diminuir o tempo de internação de uma cirurgia eletiva pode significar a disponibilização de um leito em uma epidemia de dengue, e reduzir o tempo de ventilação mecânica é liberar um respirador para um caso de covid-19. Além disso, pode-se simplesmente agilizar o atendimento do próximo caso da fila, que talvez esteja prestes a perder o tempo ideal para correção de sua patologia cardíaca. Poupar recursos é usá-los sabiamente.

Os critérios de inclusão são bastante amplos e favorecem a maioria dos pacientes cirúrgicos diretamente. Medidas pré-operatórias simples inclusas no protocolo Eras para diminuição de transfusões e melhor resultado, como tratamento da anemia ferropriva e encaminhamento ao serviço de nutrição quando peso-altura tem escore Z menor que -3, também contribuem para tratamento de doenças típicas da desigualdade social.

O problema da autonomia

O jejum atenuado, além de favorecer a recuperação metabólica pós-operatória, diminui o desconforto e a ansiedade dos pacientes. Protocolos de não reposição de perdas pelo jejum, evitando-se a venóclise nos casos que não forem extremamente graves, também facilitam a aceitação do ato anestésico pela criança, uma vez que este é indolor. A equipe de implementação da instituição onde se realizou o trabalho aqui relatado apontou a necessidade de venóclise prévia como o principal ponto de discussão e não aderência aos protocolos.

Pacientes mais graves, principalmente com cardiopatia cianótica grave, que necessitam de hemodiluição, beneficiam-se de hidratação venosa prévia. A titulação da pré-medicação e a indução venosa são consideradas bastante seguras, poupam tempo e demandam menos esforço do anestesiologista, que muitas vezes está sozinho com uma série de intervenções simultâneas a serem realizadas no paciente.

São válidas as reflexões sobre a atuação profissional, principalmente no setor público, no qual há déficit de pessoal e sobrecarga de trabalho, embora essas questões estejam entremeadas com a crença pessoal e a comodidade de fazer o que for mais prático. Assim, houve casos em que foi solicitado retorno do paciente à enfermaria para realização do acesso venoso e, só então, permitida sua readmissão no centro-cirúrgico. Apesar de menos “agradável” ao paciente, essa conduta traz possíveis benefícios de segurança sob uma visão funcionalista e paternalista na realidade distópica de muitos sistemas de saúde.

Beauchamp e Childress 1616. Beauchamp T, Childress J. Principles of biomedical ethics. 4ª ed. Oxford: Oxford University Press; 1994. não situam a autonomia como o único valor a ser levado em conta na bioética médica, nem o respeito à autonomia é considerado por eles como o único imperativo moral existente. Encontrar o equilíbrio certo entre autonomia e proteção é um desafio.

O Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/1990) 1717. Brasil. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências. Diário Oficial da União [Internet]. Brasil, 27 set 1990 [acesso 14 fev 2024]. Disponível: https://tny.im/MrLVe
https://tny.im/MrLVe...
tem como doutrina a proteção integral, que é regida por três princípios gerais: prioridade absoluta, melhor interesse e municipalização. Essa lei discorre sobre um conjunto de responsabilidades parentais e do Estado que focam no melhor interesse das crianças e dos adoles- centes. Porém não se deve esquecer que situações de vulnerabilidade demandam reconhecer todos como agentes autônomos, segundo as capacidades já desenvolvidas, e que qualquer pessoa com autonomia diminuída tem direito a proteção.

A autonomia pode ser vista ao longo do espectro entre o imperativo categórico kantiano de “decidir com base na razão pura” e a concepção naturalista de Mill, de “autogoverno” e direito à autodeterminação, como aponta Kuhnen 1818. Kuhnen TA. Autonomia na bioética médica: a resposta do principialismo de Beauchamp e Childress à crítica de O'Neill ao triunfo da autonomia. RBB [Internet]. 2012 [acesso 14 fev 2024]; 8(1-4):67-82. DOI: 10.26512/rbb.v8i1-4.8156
https://doi.org/10.26512/rbb.v8i1-4.8156...
. O’Neill 1919. O'Neill O. Autonomy and trust in bioethics. J R Soc Med. [Internet]. 2002 [acesso 14 fev 2024]; 95(8):423-4. Disponível: https://tny.im/i6FSc
https://tny.im/i6FSc...
critica o fato de que a autonomia, na prática, se converteu em mera exigência do consentimento informado, pois, sem preocupação com o modo como a escolha é feita (se de fato envolve reflexão e ponderação), a autonomia do paciente se reduz a um simples direito de aceitar ou recusar um tratamento. A equivalência entre o consentimento informado e a autonomia é denominada por O’Neill 1919. O'Neill O. Autonomy and trust in bioethics. J R Soc Med. [Internet]. 2002 [acesso 14 fev 2024]; 95(8):423-4. Disponível: https://tny.im/i6FSc
https://tny.im/i6FSc...
de concepção de autonomia mínima.

A autonomia é baseada no único conceito de capacidade de tomar uma decisão por si próprio. Independentemente da estratégia proposta ou de discussões teóricas em torno da idade em que as competências para tomada de decisão ou consentimento estão plenas, para este conceito existir, é necessário mais de uma opção de escolha. Não se trata apenas da dicotomia entre aceitar ou não o tratamento, mas informar que existe uma miríade de possibilidades.

Por questões óbvias, quando se oferece uma opção indolor e sem picadas, qualquer criança vai optar por ela. Tal opinião deve ser considerada como pedra angular na escolha da técnica, e questões mais delicadas referentes a segurança devem ser discutidas a fundo com os responsáveis legais.

Alderson e colaboradores 1212. Alderson P, Bowman D, Brierley J, Dedieu N, Elliott M, Montgomery J, Wellesley H. Living bioethics, theories and children's consent to heart surgery. Clin Ethics [Internet]. 2023 [acesso 14 fev 2024];18(4):418-26. DOI: 10.1177/14777509221091086
https://doi.org/10.1177/1477750922109108...
apontam que o médico-chave para gerir a recusa de uma criança à cirurgia cardíaca pediátrica eletiva é o anestesista. A partir de 4 anos de idade, há praticamente unanimidade por não usar métodos de restrição para viabilizar a indução, de forma que, caso haja forte resistência à anestesia, a cirurgia cardíaca não emergencial poderá ser cancelada.

Assim, uma equipe multidisciplinar deve trabalhar com essas crianças até que haja empatia suficiente antes da cirurgia. Além disso, anestesistas cardíacos valorizam reuniões clínicas multidisciplinares regulares, fazem análise crítica de casos problemáticos e garantem que as políticas centradas no paciente sejam cumpridas por todos os membros da equipe 1212. Alderson P, Bowman D, Brierley J, Dedieu N, Elliott M, Montgomery J, Wellesley H. Living bioethics, theories and children's consent to heart surgery. Clin Ethics [Internet]. 2023 [acesso 14 fev 2024];18(4):418-26. DOI: 10.1177/14777509221091086
https://doi.org/10.1177/1477750922109108...
.

Tratando o binômio criança-família

O engajamento do paciente e da família pode ser útil para reduzir a ansiedade, promover a participação ativa e aumentar a satisfação com o cuidado (Recomendação IIa) 22. Fuller S, Kumar SR, Roy N, Mahle W, Romano J, Nelson J et al. The American Association for Thoracic Surgery Congenital Cardiac Surgery Working Group 2021 consensus document on a comprehensive perioperative approach to enhanced recovery after pediatric cardiac surgery. J Thorac Cardiovasc Surg [Internet]. 2021 [acesso 14 fev 2024];162(3):931-54. DOI: 10.1016/j.jtcvs.2021.04.072
https://doi.org/10.1016/j.jtcvs.2021.04....
. Na prática clínica aqui relatada, em geral, após esclarecimento, orientação e breve avaliação das condições psicológicas, um familiar é encorajado a entrar com a criança no centro cirúrgico. Esse responsável fica ao lado do paciente ou com este no colo e muitas vezes pode mesmo segurar a máscara facial para indução inalatória, que em geral ocorre de forma bem suave.

Essa prática leva a um sentimento de segurança muito maior pela criança, facilitando o assentimento. Dados da literatura variam, mas mostrou-se que pais calmos com crianças calmas e cooperativas com mais de 4 anos obtiveram os maiores benefícios 2020. Manyande A, Cyna AM, Yip P, Chooi C, Middleton P. Non-pharmacological interventions for assisting the induction of anaesthesia in children. Cochrane Database Syst Rev. 2015 [acesso 14 fev 2024];2015(7):CD006447. DOI: 10.1002/14651858.CD006447.pub3
https://doi.org/10.1002/14651858.CD00644...
. Ainda há dados conflitantes sobre se a prática traz ganhos na redução da ansiedade pré-operatória ou na adesão da anestesia 2121. Shih MC, Elvis PR, Nguyen SA, Brennan E, Clemmens CS. Parental presence at induction of anesthesia to reduce anxiety: a systematic research and meta-analysis. J Perianesth Nurs. 2023 [acesso 14 fev 2024];38(1):12-20. DOI: 10.1016/j.jopan.2022.03.008. Epub 2022 Jul 25
https://doi.org/10.1016/j.jopan.2022.03....
.

Muitas famílias também se sentem reconfortadas por estarem junto com seus protegidos em um momento tão marcante, ainda mais sendo parte ativa na atenuação do sofrimento psíquico inerente à situação. Da mesma maneira, a presença da família é encorajada tão logo possível após o despertar. Stargatt e colaboradores 2222. Stargatt R, Davidson AJ, Huang GH, Czarnecki C, Gibson M, Stewart S et al. A cohort study of the incidence and risk factors for negative behavior changes in children after general anesthesia. Paediatr Anaesth [Internet]. 2006 [acesso 14 fev 2024];16(8):846-59. DOI: 10.1111/j.1460-9592.2006.01869.x
https://doi.org/10.1111/j.1460-9592.2006...
identificaram vários fatores que contribuem para o comportamento desadaptativo pós-operatório, os quais incluem ansiedade dos pais, idade mais jovem, admissão durante a noite e casos em que houve alguma discussão com anestesiologistas durante o preparo.

O benefício potencial da presença parental na indução anestésica (PPIA) geralmente depende da faixa etária das crianças, sendo questionado em bebês com menos de 6 meses de idade com ansiedade de separação menos acentuada. O mesmo acontece com crianças cooperativas em idade escolar que preferiram que lhes dissessem a verdade e se adaptaram bem ao novo ambiente desafiador, sendo capazes de construir confiança no pessoal médico. Por outro lado, o PPIA pode proporcionar alguma forma de alívio aos pais acompanhantes, em consonância com o instinto biológico de um pai que protege seus filhos de ameaças potenciais, ao poder observá-los sendo tratados pelas mãos seguras de um anestesista 2323. Zainal Abidin H, Omar SC, Mazlan MZ, Hassan M, Isa R, Ali S et al. Postoperative maladaptive behavior, preoperative anxiety and emergence delirium in children undergone general anesthesia: a narrative review. Glob Pediatr Health [Internet]. 2021 [acesso 14 fev 2024];8:2333794X211007975. DOI: 10.1177/2333794X211007975
https://doi.org/10.1177/2333794X21100797...
.

O ponto de insegurança da equipe médica apresentado à implementação dessa rotina foi a preocupação quanto a potencializar e “empoderar em demasia” pais já ansiosos, acarretando consequências jurídicas desnecessárias. Acresce-se a isso uma complexa insegurança jurídica com relação ao direito de registro de imagens da equipe e do menor, não só como instrumento preparatório para futuro litígio programado antes mesmo de acontecer o dano, mas muitas vezes simplesmente por um comportamento pós-moderno de querer registrar tudo em plataformas como Instagram, Facebook, TikTok etc. Até mesmo um momento de sofrimento e ansiedade do próprio filho, uma boa história de superação, dá muitas curtidas nos stories do Instagram.

Um ponto doloroso

A analgesia é fundamental no protocolo Eras. O controle da dor está presente nas tradições médicas mais antigas. “Sedare dolorem opus divinum est” é uma máxima popularmente associada a Hipócrates. A medicina ainda sofre sequelas adversas do dualismo da metafísica cartesiana, ótica segundo a qual são as pessoas, e não os corpos, que sofrem 2424. Rich BA. A legacy of silence: bioethics and the culture of pain. J Med Humanit [Internet]. 1997 [acesso 14 fev 2024];18(4):233-59. DOI: 10.1023/a:1025697920944
https://doi.org/10.1023/a:1025697920944...
. Embora os corpos sejam a fonte dos impulsos nociceptivos, o sofrimento, produzido ou não pela dor física, é vivenciado por pessoas e, portanto, é subjetivo.

Se existisse apenas o reino físico e o mental, seriam categoricamente separados. Para Veattch 2525. Veatch RM. The patient-physician relation. Bloomington: Indiana University Press; 1991., a medicina é tida como ciência objetiva, pertencente ao domínio do físico. Consequentemente, se o sofrimento é subjetivo e vivenciado dentro da consciência individual, então existe em outro domínio, com o qual a medicina clínica não tem comércio.

Recentemente tem havido grande aversão a opioides, devido à inabilidade de seus prescritores, medo de parada respiratória e medo de provocar dependência química – e toda a implicação religiosa e puritana relacionada a este último. Além disso, a recente epidemia de dependência química relacionada a fentanil é tema de debate em diversas sociedades mundo afora. Esses fatores podem colocar em segundo plano os valores bioéticos de beneficência e não maleficência relativos ao alívio da dor.

Estratégias multimodais conseguem reduzir bastante a dor, consequentemente diminuindo o uso de opioides e acelerando o despertar e o tempo de ventilação mecânica, o que novamente confirma o compromisso com os princípios da não maleficência e da beneficência. Isso abrevia o tempo de dependência total dos profissionais de saúde e do equipamento, aumentando a sensação de autonomia e independência do binômio menor-família.

Porém, para sucesso dessa estratégia, a educação dos pais a respeito da técnica deve ser muito bem estabelecida. Já foi visto que a expectativa da maioria das famílias é ter o filho sedado profundamente 2626. Harvey KA, Kovalesky A. Post-operative pain and comfort in children after heart surgery: a comparison of nurses and families pre-operative expectations. J Pediatr Nurs [Internet]. 2018 [acesso 14 fev 2024];43:9-15. DOI: 10.1016/j.pedn.2018.07.014
https://doi.org/10.1016/j.pedn.2018.07.0...
, pois no imaginário popular assim a criança estaria sem dor e mais confortável, o que ressalta a necessidade de fazer a diferenciação entre hipnose e analgesia para os responsáveis.

Resguardando ainda mais a bioética principalista

O controle adequado da dor e a sedação leve por drogas que não comprometem o desenvolvimento neuropsíquico e ao mesmo tempo previnem o delirium, como a dexmedetomidina, abolem a necessidade de práticas antigas, mas ainda comuns, como restrição do paciente por contenção mecânica. Tal prática seria considerada ilegal em diversas situações em pacientes adultos e viola todos os princípios bioéticos: respeito à autonomia da pessoa; beneficência, que atua no melhor interesse do paciente a longo prazo; não maleficência e justiça.

A sedação pesada e a ocorrência involuntária de delirium agem diretamente nos três fundamentos da teoria da ação autônoma de Faden e Beauchamp, conforme descrevem Naik e colaboradores 2727. Naik AD, Dyer CB, Kunik M, McCullough LB. Patient autonomy for the management of chronic conditions: a two-component re-conceptualization. Am J Bioeth [Internet]. 2009 [acesso 14 fev 2024];9(2):23-30. DOI: 10.1080/15265160802654111
https://doi.org/10.1080/1526516080265411...
, impedindo a compreensão, promovendo ações não intencionais e levando à perda da voluntariedade. Uma meta-análise recente identificou como fatores de risco para delirium pediátrico: ventilação mecânica (razão de probabilidade [OR] 6,02; intervalo de confiança [IC] 95% 4,43-8,19), uso de restrições físicas (OR 4,67; IC 95% 1,82-11,96), uso de benzodiazepínicos (OR 4,10; IC 95% 2,48-6,80), opiáceos (OR 2,88; IC 95% 1,89-4,37), esteroides (OR 2,02; IC 95% 1,47-2,77) ou medicação vasoativa (OR 3,68; IC 95% 1,17-11,60) 2828. Ista E, Traube C, Neef M, Schieveld J, Knoester H, Molag M et al. Factors associated with delirium in children: a systematic review and meta-analysis. Pediatr Crit Care Med [Internet]. 2023 [acesso 14 fev 2024];24(5):372-81. DOI: 10.1097/PCC.0000000000003196
https://doi.org/10.1097/PCC.000000000000...
.

O uso do protocolo Eras na anestesia e cirurgia cardíaca pediátrica foca justamente menor tempo de ventilação mecânica, técnicas poupadoras de opioides e benzodiazepínicos, além de uniformizar o controverso uso de esteroides para essas cirurgias e maior estabilidade hemodinâmica pós-operatória.

Focando o futuro

Pacientes com cardiopatia congênita têm risco elevado para desenvolver distúrbio de estresse pós-traumático após internações e procedimentos médicos, que podem durar muitos anos, com prevalência de 12-31% 2929. Meentken MG, van Beynum IM, Legerstee JS, Helbing W, Utens El. Medically related post-traumatic stress in children and adolescents with congenital heart defects. Front Pediatr [Internet]. 2017 [acesso 14 fev 2024];5:20. DOI: 10.3389/fped.2017.00020
https://doi.org/10.3389/fped.2017.00020...
. Práticas e protocolos humanizados, que reduzem o estresse tanto metabólico como mental, minimização da dor e sofrimento e uso otimizado da farmacologia, diminuindo delirium, pesadelos e distúrbios do sono, podem ter impacto crucial na redução de experiências negativas. O protocolo Eras restringe várias práticas médicas consideradas desnecessárias, salvaguardando esses indivíduos em desenvolvimento de implicações futuras a longo prazo.

Considerações finais

Após reflexão sobre os dilemas apresentados durante a confecção e implementação do protocolo local, possíveis facilitadores podem ser aventados:

  1. Focar na educação continuada. À medida que o conhecimento vai se sedimentando, algumas práticas são mais aceitas, e outras caem em desuso pelos profissionais de maneira espontânea, sem necessidade de imposição pelo gestor.

  2. Realizar reuniões de discussão sobre temas-chave bioéticos, como autonomia de menores, controle parental e casos de recusa, que em geral não são abordados por equipes especializadas.

  3. Pedir ajuda à comissão de ética médica. Quase nunca a comissão de ética médica local é acionada durante a elaboração de protocolos locais. Elaboradores e revisores focam a coleta de evidências científicas, muitas vezes esquecendo-se de analisar aspectos humanos, éticos e sociais.

Dificilmente equipes especializadas recorrem a instâncias de ética profissional de maneira preventiva para solucionar dilemas. É atribuição da comissão de ética médica colaborar com os conselhos regionais na tarefa de educar, discutir, divulgar e orientar os profissionais sobre temas relativos à ética médica. Tal interdisciplinaridade entre a bioética teórica e a bioética viva, prática, seria fundamental para diminuir pontos conflituosos entre diferentes interpretações dos membros da equipe de saúde.

Referências

  • 1
    Kehlet H, Mogensen T. Hospital stay of 2 days after open sigmoidectomy with a multimodal rehabilitation programme. Br J Surg [Internet]. 1999 [acesso 14 fev 2024];86: 227-30. DOI: 10.1046/j.1365-2168.1999.01023.x
    » https://doi.org/10.1046/j.1365-2168.1999.01023.x
  • 2
    Fuller S, Kumar SR, Roy N, Mahle W, Romano J, Nelson J et al. The American Association for Thoracic Surgery Congenital Cardiac Surgery Working Group 2021 consensus document on a comprehensive perioperative approach to enhanced recovery after pediatric cardiac surgery. J Thorac Cardiovasc Surg [Internet]. 2021 [acesso 14 fev 2024];162(3):931-54. DOI: 10.1016/j.jtcvs.2021.04.072
    » https://doi.org/10.1016/j.jtcvs.2021.04.072
  • 3
    Conselho Federal de Medicina. Código de ética médica: Resolução CFM n° 2.217, de 27 de setembro de 2018. Modificada pelas Resoluções CFM nº 2.222/2018 e 2.226/2019. Diário Oficial da União [Internet]. Brasília, 2018 [acesso 14 fev 2024]. Disponível: https://tny.im/S9McE
    » https://tny.im/S9McE
  • 4
    Roulin D, Muradbegovic M, Addor V, Blanc C, Demartines N, Hübner M. Enhanced recovery after elective colorectal surgery: reasons for non-compliance with the protocol. Dig Surg [Internet]. 2017 [acesso 14 fev 2024];34(3):220-6. DOI: 10.1159/000450685
    » https://doi.org/10.1159/000450685
  • 5
    Wang D, Liu Z, Zhou J, Yang J, Chen X, Chang C et al. Barriers to implementation of enhanced recovery after surgery (Eras) by a multidisciplinary team in China: a multicentre qualitative study. BMJ Open [Internet]. 2022 [acesso 14 fev 2024];12(3):e053687. DOI: 10.1136/bmjopen-2021-053687
    » https://doi.org/10.1136/bmjopen-2021-053687
  • 6
    Cohen R, Gooberman-Hill R. Staff experiences of enhanced recovery after surgery: systematic review of qualitative studies. BMJ Open [Internet]. 2019 [acesso 14 fev 2024];9(2):e022259. DOI: 10.1136/bmjopen-2018-022259
    » https://doi.org/10.1136/bmjopen-2018-022259
  • 7
    Seow-En I, Wu J, Yang L, Tan J, Seah A, Foo F et al. Results of a colorectal enhanced recovery after surgery (Eras) programme and a qualitative analysis of healthcare workers' perspectives. Asian J Surg [Internet]. 2021 [acesso 14 fev 2024];44(1):307-12. DOI: 10.1016/j.asjsur.2020.07.020
    » https://doi.org/10.1016/j.asjsur.2020.07.020
  • 8
    Wong DJN, Harris SK, Moonesinghe SR. Cancelled operations: a 7-day cohort study of planned adult inpatient surgery in 245 UK National Health Service hospitals. Br J Anaesth [Internet]. 2018 [acesso 14 fevereiro 2024];121(1):730-8. DOI: 10.1016/j.bja.2018.07.002
    » https://doi.org/10.1016/j.bja.2018.07.002
  • 9
    Pearsall EA, Meghji Z, Pitzul KB, Aarts M, McKenzie M, McLeod R, Okrainec A. A qualitative study to understand the barriers and enablers in implementing an enhanced recovery after surgery program. Ann Surg [Internet]. 2015 [acesso 14 fev 2024];261(1):92-6. DOI: 10.1097/SLA.0000000000000604
    » https://doi.org/10.1097/SLA.0000000000000604
  • 10
    Platão. Protágoras. [s.l]: Mimética; 2019 (Box Grandes Obras de Platão - Ebook)
  • 11
    Aristóteles. Ética a Nicômaco. Jandira: Principis; 2021.
  • 12
    Alderson P, Bowman D, Brierley J, Dedieu N, Elliott M, Montgomery J, Wellesley H. Living bioethics, theories and children's consent to heart surgery. Clin Ethics [Internet]. 2023 [acesso 14 fev 2024];18(4):418-26. DOI: 10.1177/14777509221091086
    » https://doi.org/10.1177/14777509221091086
  • 13
    Turaga AH. Enhanced recovery after surgery (Eras) protocols for improving outcomes for patients undergoing major colorectal surgery. Cureus [Internet]. 2023 [acesso 14 fev 2024];15(17):e41755. DOI: 10.7759/cureus.41755
    » https://doi.org/10.7759/cureus.41755
  • 14
    Arena S, Di Fabrizio D, Impellizzeri P, Gandullia P, Mattioli G, Romeo C. Enhanced recovery after gastrointestinal surgery (Eras) in pediatric patients: a systematic review and meta-analysis. J Gastrointest Surg [Internet]. 2021 [acesso 14 fev 2024];25(11):2976-88. DOI: 10.1007/s11605-021-05053-7
    » https://doi.org/10.1007/s11605-021-05053-7
  • 15
    Almeida MWB. Anarquismo ontológico e verdade no antropoceno. Ilha: Revista de Antropologia [Internet]. 2021 [acesso 14 fev 2024];23(1):10-29. DOI: 10.5007/2175-8034.2021.e78405
    » https://doi.org/10.5007/2175-8034.2021.e78405
  • 16
    Beauchamp T, Childress J. Principles of biomedical ethics. 4ª ed. Oxford: Oxford University Press; 1994.
  • 17
    Brasil. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências. Diário Oficial da União [Internet]. Brasil, 27 set 1990 [acesso 14 fev 2024]. Disponível: https://tny.im/MrLVe
    » https://tny.im/MrLVe
  • 18
    Kuhnen TA. Autonomia na bioética médica: a resposta do principialismo de Beauchamp e Childress à crítica de O'Neill ao triunfo da autonomia. RBB [Internet]. 2012 [acesso 14 fev 2024]; 8(1-4):67-82. DOI: 10.26512/rbb.v8i1-4.8156
    » https://doi.org/10.26512/rbb.v8i1-4.8156
  • 19
    O'Neill O. Autonomy and trust in bioethics. J R Soc Med. [Internet]. 2002 [acesso 14 fev 2024]; 95(8):423-4. Disponível: https://tny.im/i6FSc
    » https://tny.im/i6FSc
  • 20
    Manyande A, Cyna AM, Yip P, Chooi C, Middleton P. Non-pharmacological interventions for assisting the induction of anaesthesia in children. Cochrane Database Syst Rev. 2015 [acesso 14 fev 2024];2015(7):CD006447. DOI: 10.1002/14651858.CD006447.pub3
    » https://doi.org/10.1002/14651858.CD006447.pub3
  • 21
    Shih MC, Elvis PR, Nguyen SA, Brennan E, Clemmens CS. Parental presence at induction of anesthesia to reduce anxiety: a systematic research and meta-analysis. J Perianesth Nurs. 2023 [acesso 14 fev 2024];38(1):12-20. DOI: 10.1016/j.jopan.2022.03.008. Epub 2022 Jul 25
    » https://doi.org/10.1016/j.jopan.2022.03.008
  • 22
    Stargatt R, Davidson AJ, Huang GH, Czarnecki C, Gibson M, Stewart S et al. A cohort study of the incidence and risk factors for negative behavior changes in children after general anesthesia. Paediatr Anaesth [Internet]. 2006 [acesso 14 fev 2024];16(8):846-59. DOI: 10.1111/j.1460-9592.2006.01869.x
    » https://doi.org/10.1111/j.1460-9592.2006.01869.x
  • 23
    Zainal Abidin H, Omar SC, Mazlan MZ, Hassan M, Isa R, Ali S et al. Postoperative maladaptive behavior, preoperative anxiety and emergence delirium in children undergone general anesthesia: a narrative review. Glob Pediatr Health [Internet]. 2021 [acesso 14 fev 2024];8:2333794X211007975. DOI: 10.1177/2333794X211007975
    » https://doi.org/10.1177/2333794X211007975
  • 24
    Rich BA. A legacy of silence: bioethics and the culture of pain. J Med Humanit [Internet]. 1997 [acesso 14 fev 2024];18(4):233-59. DOI: 10.1023/a:1025697920944
    » https://doi.org/10.1023/a:1025697920944
  • 25
    Veatch RM. The patient-physician relation. Bloomington: Indiana University Press; 1991.
  • 26
    Harvey KA, Kovalesky A. Post-operative pain and comfort in children after heart surgery: a comparison of nurses and families pre-operative expectations. J Pediatr Nurs [Internet]. 2018 [acesso 14 fev 2024];43:9-15. DOI: 10.1016/j.pedn.2018.07.014
    » https://doi.org/10.1016/j.pedn.2018.07.014
  • 27
    Naik AD, Dyer CB, Kunik M, McCullough LB. Patient autonomy for the management of chronic conditions: a two-component re-conceptualization. Am J Bioeth [Internet]. 2009 [acesso 14 fev 2024];9(2):23-30. DOI: 10.1080/15265160802654111
    » https://doi.org/10.1080/15265160802654111
  • 28
    Ista E, Traube C, Neef M, Schieveld J, Knoester H, Molag M et al. Factors associated with delirium in children: a systematic review and meta-analysis. Pediatr Crit Care Med [Internet]. 2023 [acesso 14 fev 2024];24(5):372-81. DOI: 10.1097/PCC.0000000000003196
    » https://doi.org/10.1097/PCC.0000000000003196
  • 29
    Meentken MG, van Beynum IM, Legerstee JS, Helbing W, Utens El. Medically related post-traumatic stress in children and adolescents with congenital heart defects. Front Pediatr [Internet]. 2017 [acesso 14 fev 2024];5:20. DOI: 10.3389/fped.2017.00020
    » https://doi.org/10.3389/fped.2017.00020

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    23 Set 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    15 Fev 2024
  • Revisado
    02 Maio 2024
  • Aceito
    03 Jun 2024
Conselho Federal de Medicina SGAS 915, lote 72, CEP 70390-150, Tel.: (55 61) 3445-5932, Fax: (55 61) 3346-7384 - Brasília - DF - Brazil
E-mail: bioetica@portalmedico.org.br