Acessibilidade / Reportar erro

Migrânea vestibular: aspectos clínicos e epidemiológicos Como citar este artigo: Morganti LOG, Salmito MC, Duarte JA, Bezerra KC, Simões JC, Ganança FF. Vestibular migraine: clinical and epidemiological aspects. Braz J Otorhinolaryngol. 2016;82:397-402.

Resumo

Introdução:

Migrânea vestibular (MV) corresponde a um dos mais frequentes diagnósticos em otoneurologia, o que justifica a importância de seu estudo, embora tenha sido apenas recentemente reconhecida como entidade nosológica.

Objetivo:

Analisar os perfis clínico e epidemiológico dos pacientes atendidos em um ambulatório de migrânea vestibular.

Método:

Estudo retrospectivo, observacional e descritivo, com análise de prontuários dos pacientes do ambulatório de MV.

Resultados:

O ambulatório é composto por 94,1% de mulheres e 5,9% de homens, com média de idade 46,1 anos. O tempo de cefaleia foi superior ao de vertigem em 65,6% dos pacientes. Observou-se correlação entre os sintomas e o período menstrual. A maioria (61,53%) dos indivíduos apresentou algum sintoma auditivo, sendo o zumbido o mais frequente, embora a audiometria tenha sido normal em 68,51%. A vectoeletronistagmografia apresentou-se normal em 67,34%, enquanto 10,20% apresentaram hiporreflexia e 22,44% hiperreflexia vestibular. Exames eletrofisiológicos não mostraram alterações na maioria dos pacientes. Glicemia dejejum e curva glicêmica foram normais para a maioria dos pacientes, enquanto a curva insulinêmica mostrou-se alterada em 75% dos indivíduos. 82% dos indivíduos com MV apresentaram alguma alteração relativa ao metabolismo dos carboidratos.

Conclusão:

Migrânea vestibular acomete, predominantemente, mulheres de meia idade, com cefaleia migranosa e vertigem, sendo a primeira de instalação mais precoce. O exame físico no período intercrise, bem como as avaliações auditiva e vestibular, mostram-se, geralmente, normais. O tipo de alteração vestibular mais observado foi a hiperreflexia labiríntica. A maioria os indivíduos avaliados apresentou alterações relativas ao metabolismo dos carboidratos.

PALAVRAS-CHAVE:
Migrânea vestibular; Vertigem; Transtornos de enxaqueca; Tontura

ABSTRACT

INTRODUCTION:

Vestibular migraine (VM) is one of the most often common diagnoses in neurotology, but only recently has been recognized as a disease.

OBJECTIVE:

To analyze the clinical and epidemiological profile of patients with VM.

METHODS:

This was a retrospective, observational, and descriptive study, with analysis of patients' records from an outpatient VM clinic.

RESULTS:

94.1% of patients were females and 5.9% were males. The mean age was 46.1 years; 65.6% of patients had had headache for a longer period than dizziness. A correlation was detected between VM symptoms and the menstrual period. 61.53% of patients had auditory symptoms, with tinnitus the most common, although tonal audiometry was normal in 68.51%. Vectoelectronystagmography was normal in 67.34%, 10.20% had hyporeflexia, and 22.44% had vestibular hyperreflexia. Electrophysiological assessment showed no abnormalities in most patients. Fasting plasma glucose and glycemic curve were normal in most patients, while the insulin curve was abnormal in 75%. 82% of individuals with MV showed abnormalities on the metabolism of carbohydrates.

CONCLUSION:

VM affects predominantly middle-aged women, with migraine headache representing the first symptom, several years before vertigo. Physical, auditory, and vestibular evaluations are usually normal. The most frequent vestibular abnormality was hyperreflexia. Most individuals showed abnormality related to carbohydrate metabolism.

Keywords:
Vestibular migraine; Vertigo; Migraine disorders; Dizziness

Introdução

A associação entre migrânea e sintomas vestibulares é conhecida há muito tempo, e tornou-se mais evidente após estudo sistematizado, realizado em 1984 por Kyan e Hood.11. Kayan A, Hood JD. Neuro-otological manifestations of migraine. Brain. 1984;107:1123-42.

Migrânea e vertigem são entidades clínicas comuns que afetam, respectivamente, 14 e 7% da população geral. Sua ocorrência concomitante deveria ser de 1%, caso se desse ao acaso. Entretanto, estudos epidemiológicos recentes indicam que 3,2% da população apresentam tanto migrânea como vertigem.22. Lempert T, Neuhauser H, Daroff RB. Basic and clinical aspects of vertigo and dizziness. Ann N Y Acad Sci. 2009;1164: 242-51.,33. Lempert T, Neuhauser H. Epidemiology of vertigo, migraine and vestibular migraine. J Neurol. 2009;256:333-8. Tal fato pode ser atribuído a dois fatores: síndromes vertiginosas (doença de Menière, vertigem posicional paroxística benigna e tontura relacionada à ansiedade), que são mais comuns em migranosos quando comparado a controles; e migrânea vestibular (MV).22. Lempert T, Neuhauser H, Daroff RB. Basic and clinical aspects of vertigo and dizziness. Ann N Y Acad Sci. 2009;1164: 242-51.

3. Lempert T, Neuhauser H. Epidemiology of vertigo, migraine and vestibular migraine. J Neurol. 2009;256:333-8.
-44. Neuhauser H, Leopold M, von Brevern M, Lempert T. The interrelations of migraine, vertigo, and migrainous vertigo. Neurology. 2001;56:436-41.

Migrânea vestibular é uma entidade descrita em 1999 por Dieterich e Brandt,55. Dieterich M, Brandt T. Episodic vertigo related to migraine (90 cases): vestibular migraine? J Neurol. 1999;246:883-92. e corresponde a uma variante de migrânea cujos principais sintomas são vestibulares. MV é mais comum em indivíduos sem aura, e acomete predominantemente mulheres, na frequência de até 5:1.44. Neuhauser H, Leopold M, von Brevern M, Lempert T. The interrelations of migraine, vertigo, and migrainous vertigo. Neurology. 2001;56:436-41.,66. Furman JM, Marcus DA, Balaban CD. Vestibular migraine: clinical aspects and pathophysiology. Lancet Neurol. 2013;12: 706-15. O sintomas vestibulares típicos surgem vários anos após o início da doença, quando a cefaleia pode ser menos frequente ou mesmo ausente.44. Neuhauser H, Leopold M, von Brevern M, Lempert T. The interrelations of migraine, vertigo, and migrainous vertigo. Neurology. 2001;56:436-41.,22. Lempert T, Neuhauser H, Daroff RB. Basic and clinical aspects of vertigo and dizziness. Ann N Y Acad Sci. 2009;1164: 242-51. O aparecimento de sintomas vestibulares no lugar da cefaleia é especialmente observado em mulheres na perimenopausa.77. Park JH, Viirre E. Vestibular migraine may be an important cause of dizziness/vertigo in perimenopausal period. Med Hypotheses. 2010;75:409-14.

A associação temporal entre os sintomas migranosos (cefaleia, foto e fonofobia) e o sintomas vestibulares é variável, inclusive em um mesmo indivíduo.66. Furman JM, Marcus DA, Balaban CD. Vestibular migraine: clinical aspects and pathophysiology. Lancet Neurol. 2013;12: 706-15. Episódios de MV podem ser desencadeados pelos mesmos fatores considerados gatilhos para a cefaleia da migrânea, como menstruação, sono irregular, estresse, atividade física, desidratação, certos alimentos e bebidas, além de estimulação sensorial intensa.66. Furman JM, Marcus DA, Balaban CD. Vestibular migraine: clinical aspects and pathophysiology. Lancet Neurol. 2013;12: 706-15.,88. Neuhauser H, Lempert T. Vertigo and dizziness related to migraine: a diagnostic challenge. Cephalalgia. 2004;24: 83-91.

Critérios diagnósticos para MV foram propostos por Neuhauser em 200144. Neuhauser H, Leopold M, von Brevern M, Lempert T. The interrelations of migraine, vertigo, and migrainous vertigo. Neurology. 2001;56:436-41. e revisados em 2012 pela Bárány Society, em conjunto com a International Headache Society, que a incluíram, em 2013, em um apêndice na terceira edição da Classificação Internacional de Cefaleias, como um primeiro passo para novas entidades (fig. 1).99. Lempert T, Olesen J, Furman J, Waterston J, Seemungal B, Carey J, et al. Vestibular migraine: diagnostic criteria. Consensus document of the Bárány Society and the International Headache Society. Rev Neurol (Paris). 2014;170:401-6.,1010. Headache Classification Committee of the International Headache Society (IHS). The International Classification of Headache Disorders, 3rd edition (beta version). Cephalalgia. 2013;33:629-808.

Figura 1
Critérios diagnósticos. Lempert T, Olesen J, Furman J, Waterston, Seemungal B, Carey J et al. Vestibular migraine: Diagnostic criteria Consensus document of the Bárány Society and the International Headache Society. Rev Neurol (Paris). 2014;170:401-6.

O exame físico dos pacientes com migrânea vestibular geralmente apresenta-se normal no período intercrise. Durante os episódios da doença, por outro lado, frequentemente se observa nistagmo posicional ou espontâneo, com características de acometimento periférico ou central.66. Furman JM, Marcus DA, Balaban CD. Vestibular migraine: clinical aspects and pathophysiology. Lancet Neurol. 2013;12: 706-15.,1111. von Brevern M, Zeise D, Neuhauser H, Clarke AH, Lempert T. Acute migrainous vertigo: clinical and oculographic findings. Brain. 2005;128:365-74. A vectoeletromistagmografia é quase sempre normal, sendo relatados até 20% de hipofunção labiríntica unilateral.66. Furman JM, Marcus DA, Balaban CD. Vestibular migraine: clinical aspects and pathophysiology. Lancet Neurol. 2013;12: 706-15.,1212. Celebisoy N, Gökçay F, Sirin H, Biçak N. Migranous vertigo: clinical, oculographic and posturographic findings. Cephalalgia. 2008;28:72-7. A avaliação auditiva, da mesma forma, apresenta-se normal na maioria dos pacientes.66. Furman JM, Marcus DA, Balaban CD. Vestibular migraine: clinical aspects and pathophysiology. Lancet Neurol. 2013;12: 706-15. Diante de alterações labirínticas, faz-se necessário excluir outros diagnósticos otoneurológicos.

O objetivo do presente estudo foi analisar os perfis clínico e epidemiológico dos pacientes atendidos no ambulatório de migrânea vestibular do serviço de Otoneurologia da disciplina de Otologia e Otoneurologia do Departamento de Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP).

Método

Trata-se de estudo transversal, observacional e descritivo, realizado no ambulatório de migrânea vestibular da disciplina de Otologia e Otoneurologia do Departamento de Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP).

Foram selecionados prontuários dos pacientes do ambulatório de MV, desde a sua criação, em fevereiro de 2011, até junho de 2013.

Os pacientes foram analisados quanto aos dados epidemiológicos, como gênero, idade, profissão e naturalidade, além das características clínicas da doença, história médica pregressa e resultados de exames laboratoriais, auditivos e vestibulares. O presente estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisas da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP) (código 19615313.13.5.0000.5505).

Os testes estatísticos foram selecionados de acordo com o perfil dos dados em questão: teste de Kruskal-Wallis para comparação de mais de duas variáveis simultaneamente, teste de Mann-Whitney para comparação de variáveis duas a duas, e Teste de Igualdade de Duas Proporções, com o intuito de avaliar se a proporção de respostas de duas variáveis ou níveis é significante.

Em todas as análises, foram aceitos intervalo de confiança (IC) de 95% e p < 0,05. Foram utilizados os softwares SPSS V17, Minitab 16 e Excel Office 2010.

Resultados

Do total de 85 pacientes, 80 (94,1%) eram mulheres e cinco (5,9%) homens, com idades variando entre 19 e 79 anos - média de 46,1 anos e mediana de 47 anos.

O tempo de início dos sintomas é apresentado na figure 1. O sintoma cefaleia apresentou-se, em média, 7,3 anos mais precoce em relação à tontura. Observou-se, ainda, que 65,6% dos pacientes apresentaram tempo de cefaleia superior ao de vertigem.

Observou-se que cefaleia e tontura ocorreram de forma concomitante na maioria dos pacientes, como observado na figure 1.

A maioria dos pacientes apresentou episódios de tontura com frequência maior que semanal (tabela 1).

Tabela 1
Aspectos gerais dos sintomas dos pacientes com migrânea vestibular

A piora da cefaleia no período menstrual foi relatada pela maioria das pacientes. O mesmo pôde ser observado em relação à tontura, embora sem significância estatística (tabela 1).

Quarenta e oito de 78 pacientes (61,53%) referiram algum sintoma auditivo, e alguns apresentaram mais de um sintoma (tabela 2).

Tabela 2
Distribuição de sintomas auditivos em pacientes com migrânea vestibular

Cinquenta e quatro pacientes foram submetidos ao exame de audiometria tonal, com resultado normal em 37 (68,51%) indivíduos. Perda auditiva neurossensorial foi a alteração mais frequentemente observada (tabela 3).

Tabela 3
Achados à audiometria tonal em pacientes com migrânea vestibular

Vectoeletronistagmografia foi realizada em 49 pacientes, e apresentou-se normal na maioria dos indivíduos. Dentre as alterações, a hiperreflexia vestibular foi a mais encontrada, como demonstrado na tabela 4.

Tabela 4
Achados à vectoeletronistagmografia em pacientes com migrânea vestibular

O potencial evocado auditivo de tronco encefálico (PEATE) mostrou-se alterado em dois (10,5%) de 19 pacientes submetidos ao exame. Em ambos, a alteração apresentada foi o aumento do limiar eletrofisiológico.

O potencial evocado miogênico vestibular (VEMP) cervical foi estudado em 17 pacientes, sendo observadas alterações em três (17,6%) (tabela 5).

Tabela 5
Distribuição dos resultados do potencial evocado miogênico vestibular cervical em pacientes com migrânea vestibular

De 81 pacientes, 49 (60,4%) apresentavam alguma comorbidade, e, dentre elas, a hipertensão arterial sistêmica (HAS) foi a mais prevalente (tabela 6). Quatro prontuários não apresentavam tais informações.

Tabela 6
Distribuição de comorbidades em pacientes com migrânea vestibular

Com relação à avaliação metabólica, foram solicitadas curvas glicêmica e insulinêmica para todos os indivíduos sem diagnóstico de diabetes mellitus. Para os sabidamente diabéticos, foi solicitada dosagem de glicemia de jejum.

Informações sobre a glicemia de jejum de 57 pacientes, com e sem diabetes, foram obtidas. Desses, 71,92% apresentaram valores normais e 28,08% alterados (p < 0,001). Valores entre 100 e 125 mg/dL (tolerância diminuída à glicose) foram observados em 21,75%, enquanto 7,01% apresentaram glicemia de jejum maior que 125 mg/dL (diabetes mellitus).1313. American Diabetes Association. Classification and diagnosis of diabetes. Diabetes Care. 2015;38:S8-16.

Cinquenta e três pacientes, todos sem diagnóstico prévio de diabetes mellitus, foram submetidos ao teste oral de tolerância a glicose, com ingestão de 75 g de dextrosol. Após 120 minutos, 77,4% desses indivíduos apresentaram valores normais de glicemia (< 140 mg/dL e > 55 mg/dL), contra 22,6% alterados (p < 0,001) - 11,32% (n = 6) que apresentaram tolerância diminuída à glicose (140-199 mg/dL), e 5,6% (n = 3) dos indivíduos apresentaram diabetes mellitus (glicemia acima de 200 mg/dL).1313. American Diabetes Association. Classification and diagnosis of diabetes. Diabetes Care. 2015;38:S8-16. Três indivíduos (5,6%) apresentaram glicemia menor que 55 mg/dL (hipoglicemia) aos 120 minutos.1313. American Diabetes Association. Classification and diagnosis of diabetes. Diabetes Care. 2015;38:S8-16.

Foi realizada curva insulinêmica em 43 pacientes, também sem diagnóstico de diabetes mellitus. Como resultado, 74,5% apresentaram valores alterados, contra 25,5% com exames normais (p < 0,001), segundo critérios de Kraft.1414. Kraft JR. Detection of diabetes mellitus in situ (occult diabetes). Lab Med. 1975;6:20-2.,1515. Serra AP, Lopes KC, Dorigueto RS, Ganança FF. Blood glucose and insulin levels in patients with peripheral vestibular disease. Braz J Otorhinolaryngol. 2009;75:701-5. Hipoinsulinismo (insulinemia < 50 µU/mL em todas as medidas) foi observado em 17 (39,5%) indivíduos. A soma dos valores de 120 e 180 minutos foi maior que 60 µU/mL em sete (16,27%) indivíduos (curva tipo II de Kraft). A média desses valores foi, respectivamente, 64,3 e 23,4 µU/mL.1414. Kraft JR. Detection of diabetes mellitus in situ (occult diabetes). Lab Med. 1975;6:20-2.,1515. Serra AP, Lopes KC, Dorigueto RS, Ganança FF. Blood glucose and insulin levels in patients with peripheral vestibular disease. Braz J Otorhinolaryngol. 2009;75:701-5. Em oito exames pôde-se observar pico retardado de insulina, em 120 ou 180 minutos (curva tipo III de Kraft).1414. Kraft JR. Detection of diabetes mellitus in situ (occult diabetes). Lab Med. 1975;6:20-2.,1515. Serra AP, Lopes KC, Dorigueto RS, Ganança FF. Blood glucose and insulin levels in patients with peripheral vestibular disease. Braz J Otorhinolaryngol. 2009;75:701-5.

No total, 82,22% dos pacientes apresentaram alguma alteração relativa ao metabolismo dos carboidratos, considerando diabetes, hipoglicemia, tolerância diminuída a glicose, hipoinsulinismo e diabetes oculto, segundo critérios de Kraft.1313. American Diabetes Association. Classification and diagnosis of diabetes. Diabetes Care. 2015;38:S8-16.,1414. Kraft JR. Detection of diabetes mellitus in situ (occult diabetes). Lab Med. 1975;6:20-2.

Os valores médios de glicemia, insulinemia, hemoglobina, lípides e creatinina encontram-se na tabela 7.

Tabela 7
Avaliação metabólica dos pacientes com migrânea vestibular

Discussão

O presente estudo avaliou, de forma transversal, as características dos pacientes com diagnóstico de migrânea vestibular. Observou-se uma maior prevalência entre as mulheres, predominantemente entre a 5ª e a 6ª décadas de vida (média 46,1 anos), corroborando dados da literatura.22. Lempert T, Neuhauser H, Daroff RB. Basic and clinical aspects of vertigo and dizziness. Ann N Y Acad Sci. 2009;1164: 242-51.

3. Lempert T, Neuhauser H. Epidemiology of vertigo, migraine and vestibular migraine. J Neurol. 2009;256:333-8.
-44. Neuhauser H, Leopold M, von Brevern M, Lempert T. The interrelations of migraine, vertigo, and migrainous vertigo. Neurology. 2001;56:436-41.,66. Furman JM, Marcus DA, Balaban CD. Vestibular migraine: clinical aspects and pathophysiology. Lancet Neurol. 2013;12: 706-15. A instalação dos sintomas vertiginosos mais tardiamente, quando comparado à cefaleia, também pôde ser confirmada.22. Lempert T, Neuhauser H, Daroff RB. Basic and clinical aspects of vertigo and dizziness. Ann N Y Acad Sci. 2009;1164: 242-51.,33. Lempert T, Neuhauser H. Epidemiology of vertigo, migraine and vestibular migraine. J Neurol. 2009;256:333-8.,66. Furman JM, Marcus DA, Balaban CD. Vestibular migraine: clinical aspects and pathophysiology. Lancet Neurol. 2013;12: 706-15.

A tontura apresentou-se, em média, sete anos após o início da dor. A piora da cefaleia no período menstrual, bastante conhecida entre mulheres com diagnóstico de migrânea (50-60% doas casos), foi também observada em nossa amostra.1616. Jensen R, Stovner LJ. Epidemiology and comorbidity of headache. Lancet Neurol. 2008;7:354-61.,1717. International Association for the Study of Pain 2011 Annual Report. Migraine and hormonal changes. Available from: http://iasp.files.cms-plus.com/Content/ContentFolders/GlobalYearAgainstPain2/HeadacheFactSheets/9-HormonalChanges.pdf [cited 05.12.13].
http://iasp.files.cms-plus.com/Content/C...
O mesmo ocorreu com a relação vertigem vs. menstruação. Entretanto, para esta última, não foi demonstrada relação estatística, o que pode ter ocorrido devido ao reduzido tamanho da amostra, ou pelo início da vertigem após a menopausa em grande número de pacientes.66. Furman JM, Marcus DA, Balaban CD. Vestibular migraine: clinical aspects and pathophysiology. Lancet Neurol. 2013;12: 706-15.

A maioria dos pacientes referiu ocorrência concomitante de cefaleia e vertigem, e tais sintomas ocorreram de forma isolada em 14% deles. Nesses casos, equivalentes migranosos como foto e fonofobia, ou aura, devem acompanhar os episódios vestibulares em, no mínimo, 50% dos episódios, para que se caracterize a MV. Caso contrário, pode ser definida migrânea vestibular provável.44. Neuhauser H, Leopold M, von Brevern M, Lempert T. The interrelations of migraine, vertigo, and migrainous vertigo. Neurology. 2001;56:436-41.,99. Lempert T, Olesen J, Furman J, Waterston J, Seemungal B, Carey J, et al. Vestibular migraine: diagnostic criteria. Consensus document of the Bárány Society and the International Headache Society. Rev Neurol (Paris). 2014;170:401-6.,1010. Headache Classification Committee of the International Headache Society (IHS). The International Classification of Headache Disorders, 3rd edition (beta version). Cephalalgia. 2013;33:629-808. Dentre os indivíduos avaliados 77% revelaram apresentar episódios de MV mais de uma vez por semana.

Sintomas auditivos foram observados em 61,53% dos indivíduos, sendo o zumbido a principal queixa. Entretanto, a avaliação auditiva por meio da audiometria tonal mostrou-se inalterada em 68,51% dos pacientes. A perda auditiva, quando presente, foi, predominantemente, do tipo neurossensorial, bilateral, simétrica, descendente e leve. Achados semelhantes foram relatados por Radtke e col., que atribuíram à MV uma perda auditiva bem mais lenta quando comparada à observada na doença de Menière.1818. Radtke A, von Brevern M, Neuhauser H, Hottenrott T, Lempert T. Vestibular migraine: long-term follow-up of clinical symptoms and vestibulo-cochlear findings. Neurology. 2012;79: 1607-14.

A avaliação vestibular por meio da vectoeletronistagmografia foi, na maior parte das vezes, normal, em concordância com achados da literatura.66. Furman JM, Marcus DA, Balaban CD. Vestibular migraine: clinical aspects and pathophysiology. Lancet Neurol. 2013;12: 706-15.,1818. Radtke A, von Brevern M, Neuhauser H, Hottenrott T, Lempert T. Vestibular migraine: long-term follow-up of clinical symptoms and vestibulo-cochlear findings. Neurology. 2012;79: 1607-14. A alteração mais frequentemente observada, entretanto, foi a hiperreflexia vestibular bilateral, seguida da unilateral. Alguns autores citaram a hipofunção labiríntica unilateral como a alteração mais frequente.66. Furman JM, Marcus DA, Balaban CD. Vestibular migraine: clinical aspects and pathophysiology. Lancet Neurol. 2013;12: 706-15.,1818. Radtke A, von Brevern M, Neuhauser H, Hottenrott T, Lempert T. Vestibular migraine: long-term follow-up of clinical symptoms and vestibulo-cochlear findings. Neurology. 2012;79: 1607-14. Radtke e col. encontraram 16% de hipofunção unilateral, 4% de hiporreflexia bilateral e o mesmo valor para hiperreflexia bilateral, após um follow-up de nove anos.1818. Radtke A, von Brevern M, Neuhauser H, Hottenrott T, Lempert T. Vestibular migraine: long-term follow-up of clinical symptoms and vestibulo-cochlear findings. Neurology. 2012;79: 1607-14.

Com relação à avaliação eletrofisiológica, tanto o PEATE como o VEMP mostraram-se normais para a maioria dos indivíduos.

Observamos uma maior prevalência de hipotireoidismo em nossa amostra (7,4%), quando comparado à população geral brasileira (1,5%)1919. Brenta G, Vaisman M, Sgarbi JA, Bergoglio LM, Andrada NC, Bravo PP, et al. Diretrizes clínicas práticas para o manejo do hipotiroidismo. Arq Bras Endocrinol Metab. 2013;57: 265-99. (p < 0,001). Para todas as demais comorbidades avaliadas - hipertensão arterial, dislipidemia, depressão, diabetes, epilepsia - não se observou diferença estatisticamente significante.2020. Indicadores e Dados Básicos DataSUS - 2012. Available from: http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/idb2012/matriz.htm#risco [cited 05.12.13].
http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/idb2012...

21. Kolankiewicz F, Giovelli FMH, Bellinaso ML. Study of lipidic profile and prevalence of dyslipidemias in adult. Rev Bras Anal Clin. 2008;40:317-20.
-2222. Viana MC, Andrade LH. Lifetime prevalence, age and gender distribution and age-of-onset psychiatric disorders in São Paulo metropolitan area, Brazil: results from the São Paulo megacity mental health survey. Rev Bras Psiquiatr. 2012;34: 249-60.

A maioria dos pacientes portadores de MV apresentou glicemia de jejum e em 120 minutos, após administração de 75 g de dextrosol, normal.1313. American Diabetes Association. Classification and diagnosis of diabetes. Diabetes Care. 2015;38:S8-16. Entretanto, observou-se alteração na curva insulinêmica em 75% dos indivíduos e 82.22% apresentaram alguma alteração relativa ao metabolismo dos carboidratos.1313. American Diabetes Association. Classification and diagnosis of diabetes. Diabetes Care. 2015;38:S8-16.

14. Kraft JR. Detection of diabetes mellitus in situ (occult diabetes). Lab Med. 1975;6:20-2.
-1515. Serra AP, Lopes KC, Dorigueto RS, Ganança FF. Blood glucose and insulin levels in patients with peripheral vestibular disease. Braz J Otorhinolaryngol. 2009;75:701-5.

MV é uma entidade recentemente descrita, cujo diagnostico é estritamente clínico. A presença de sintomas comuns a outras doenças otoneurológicas, aliada à ausência de um teste objetivo que a defina, torna seu diagnóstico, muitas vezes, desafiador.

Alterações nas curvas glicêmica e/ou insulinêmica de indivíduos ainda sem o devido diagnóstico podem induzir à supervalorização da alteração metabólica como causa primária da disfunção vestibular. O equívoco pode, ainda, ser reforçado pela boa resposta do indivíduo ao tratamento clínico, o qual inclui orientações dietéticas, e quanto à prática de atividade física. Sabe-se, entretanto, que tais medidas fazem parte da primeira linha do tratamento profilático da migrânea vestibular, o que justificaria a melhora dos sintomas dos pacientes assim orientados.

Conclusão

Migrânea vestibular acomete, predominantemente, mulheres de meia-idade com história de cefaleia migranosa e vertigem, sendo a primeira de instalação mais precoce. O exame físico no período intercrise e as avaliações auditiva e vestibular geralmente mostram-se normais. O tipo de alteração vestibular mais observado foi a hiperreflexia labiríntica. A maioria dos indivíduos avaliados apresentou alteração relativa ao metabolismo dos carboidratos.

References

  • 1
    Kayan A, Hood JD. Neuro-otological manifestations of migraine. Brain. 1984;107:1123-42.
  • 2
    Lempert T, Neuhauser H, Daroff RB. Basic and clinical aspects of vertigo and dizziness. Ann N Y Acad Sci. 2009;1164: 242-51.
  • 3
    Lempert T, Neuhauser H. Epidemiology of vertigo, migraine and vestibular migraine. J Neurol. 2009;256:333-8.
  • 4
    Neuhauser H, Leopold M, von Brevern M, Lempert T. The interrelations of migraine, vertigo, and migrainous vertigo. Neurology. 2001;56:436-41.
  • 5
    Dieterich M, Brandt T. Episodic vertigo related to migraine (90 cases): vestibular migraine? J Neurol. 1999;246:883-92.
  • 6
    Furman JM, Marcus DA, Balaban CD. Vestibular migraine: clinical aspects and pathophysiology. Lancet Neurol. 2013;12: 706-15.
  • 7
    Park JH, Viirre E. Vestibular migraine may be an important cause of dizziness/vertigo in perimenopausal period. Med Hypotheses. 2010;75:409-14.
  • 8
    Neuhauser H, Lempert T. Vertigo and dizziness related to migraine: a diagnostic challenge. Cephalalgia. 2004;24: 83-91.
  • 9
    Lempert T, Olesen J, Furman J, Waterston J, Seemungal B, Carey J, et al. Vestibular migraine: diagnostic criteria. Consensus document of the Bárány Society and the International Headache Society. Rev Neurol (Paris). 2014;170:401-6.
  • 10
    Headache Classification Committee of the International Headache Society (IHS). The International Classification of Headache Disorders, 3rd edition (beta version). Cephalalgia. 2013;33:629-808.
  • 11
    von Brevern M, Zeise D, Neuhauser H, Clarke AH, Lempert T. Acute migrainous vertigo: clinical and oculographic findings. Brain. 2005;128:365-74.
  • 12
    Celebisoy N, Gökçay F, Sirin H, Biçak N. Migranous vertigo: clinical, oculographic and posturographic findings. Cephalalgia. 2008;28:72-7.
  • 13
    American Diabetes Association. Classification and diagnosis of diabetes. Diabetes Care. 2015;38:S8-16.
  • 14
    Kraft JR. Detection of diabetes mellitus in situ (occult diabetes). Lab Med. 1975;6:20-2.
  • 15
    Serra AP, Lopes KC, Dorigueto RS, Ganança FF. Blood glucose and insulin levels in patients with peripheral vestibular disease. Braz J Otorhinolaryngol. 2009;75:701-5.
  • 16
    Jensen R, Stovner LJ. Epidemiology and comorbidity of headache. Lancet Neurol. 2008;7:354-61.
  • 17
    International Association for the Study of Pain 2011 Annual Report. Migraine and hormonal changes. Available from: http://iasp.files.cms-plus.com/Content/ContentFolders/GlobalYearAgainstPain2/HeadacheFactSheets/9-HormonalChanges.pdf [cited 05.12.13].
    » http://iasp.files.cms-plus.com/Content/ContentFolders/GlobalYearAgainstPain2/HeadacheFactSheets/9-HormonalChanges.pdf
  • 18
    Radtke A, von Brevern M, Neuhauser H, Hottenrott T, Lempert T. Vestibular migraine: long-term follow-up of clinical symptoms and vestibulo-cochlear findings. Neurology. 2012;79: 1607-14.
  • 19
    Brenta G, Vaisman M, Sgarbi JA, Bergoglio LM, Andrada NC, Bravo PP, et al. Diretrizes clínicas práticas para o manejo do hipotiroidismo. Arq Bras Endocrinol Metab. 2013;57: 265-99.
  • 20
    Indicadores e Dados Básicos DataSUS - 2012. Available from: http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/idb2012/matriz.htm#risco [cited 05.12.13].
    » http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/idb2012/matriz.htm#risco
  • 21
    Kolankiewicz F, Giovelli FMH, Bellinaso ML. Study of lipidic profile and prevalence of dyslipidemias in adult. Rev Bras Anal Clin. 2008;40:317-20.
  • 22
    Viana MC, Andrade LH. Lifetime prevalence, age and gender distribution and age-of-onset psychiatric disorders in São Paulo metropolitan area, Brazil: results from the São Paulo megacity mental health survey. Rev Bras Psiquiatr. 2012;34: 249-60.
  • Como citar este artigo: Morganti LOG, Salmito MC, Duarte JA, Bezerra KC, Simões JC, Ganança FF. Vestibular migraine: clinical and epidemiological aspects. Braz J Otorhinolaryngol. 2016;82:397-402.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul-Aug 2016

Histórico

  • Recebido
    21 Maio 2015
  • Aceito
    17 Jun 2015
Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial. Sede da Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico Facial, Av. Indianópolia, 1287, 04063-002 São Paulo/SP Brasil, Tel.: (0xx11) 5053-7500, Fax: (0xx11) 5053-7512 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revista@aborlccf.org.br