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Resultados cirúrgicos e audiológicos de próteses ancoradas no osso: comparação de duas técnicas cirúrgicas Como citar este artigo: Amaral MS, Santos FR, Danieli F, Massuda ET, Reis AC, Hyppolito MA. Surgical and audiological results of bone-anchored hearing aids: comparison of two surgical techniques. Braz J Otorhinolaryngol. 2022;88:533-38.

Resumo

Introdução:

As próteses auditivas ancoradas ao osso têm se tornado a opção de tratamento mais viável para indivíduos com perda auditiva condutiva ou mista, incapazes de se beneficiar de aparelhos auditivos convencionais ou cirurgia da orelha média.

Objetivo:

Comparar os resultados cirúrgicos e audiológicos entre as técnicas minimally invasive Ponto surgery e incisão linear com preservação de tecidos moles em usuários de próteses auditivas ancoradas ao osso.

Método:

Foi feito um estudo retrospectivo de janeiro de 2017 a junho de 2018. Foram incluídos no estudo 42 pacientes adultos candidatos para cirurgia de prótese auditiva ancorada ao osso unilateral com o sistema Ponto. Os comprimentos de implante e pilar usados variaram de 3–4 milímetros e de 6–14 milímetros, de acordo com a espessura óssea e subcutânea dos participantes, respectivamente.

Resultados:

Foram feitas 22 cirurgias com uso da técnica minimally invasive Ponto surgery (52,4%) e 20 (47,6%) com incisão linear. A idade média dos indivíduos implantados com técnicas minimally invasive Ponto surgery e incisão linear foi de 42 e 33,3 anos, respectivamente. Dez homens (45,5%) e 14 (70%) mulheres foram implantadas com técnicas minimally invasive Ponto surgery e incisão linear, respectivamente. Não houve diferenças entre os limiares audiométricos em campo livre e as pontuações de reconhecimento de palavras monossilábicas dos sujeitos, quando comparadas as duas técnicas cirúrgicas. A técnica minimally invasive Ponto surgery reduziu significantemente o tempo cirúrgico em comparação com a técnica de incisão linear. Não houve diferenças entre as duas tecnicas cirúrgicas para complicações cutâneas maiores (Holgers 3 e 4), que ocorreram em 18,18% para MIPS e em 25% para incisão linear. Os indivíduos incluídos no grupo da técnica minimally invasive Ponto surgery apresentaram aspecto cosmético superior, sem cicatriz cirúrgica ou sutura adicional.

Conclusão:

Os resultados cirúrgicos e audiológicos foram satisfatórios e não se correlacionaram com a técnica cirúrgica empregada em todos os indivíduos. Quando comparada à incisão linear, a técnica minimally invasive Ponto surgery apresentou tempo cirúrgico reduzido e resultados estéticos superiores no seguimento pós-operatório.

PALAVRAS-CHAVE
Audição; Perda auditiva; Condução óssea; Próteses auditivas ancoradas ao osso

Abstract

Introduction:

The bone-anchored hearing system has become the most viable treatment option for subjects with conductive or mixed hearing loss, who are unable to benefit from conventional hearing aids or middle ear surgery.

Objective:

To compare the surgical and audiological outcomes between the minimally-invasive Ponto surgery and a linear incision with soft tissue preservation techniques in bone-anchored hearing system recipients.

Methods:

A retrospective study was carried out from January 2017 to June 2018. Forty-two adult patients eligible for unilateral bone-anchored hearing system surgery with the Ponto system were included in the study. The implant and abutment lengths used varied from 3 to 4 mm and from 6 to 14 mm, according to the bone and skin thickness of the participants, respectively.

Results:

Twenty-two surgeries were performed using the minimally invasive Ponto surgery technique (52.4%) and 20 (47.6%) using the linear incision. The mean age of the subjects implanted with minimally invasive Ponto surgery and linear incision techniques were 42.0 and 33.3 years old, respectively. Ten male (45,5%) and 14 (70%) female patients were implanted using minimally invasive Ponto surgery and the linear incision techniques, respectively. There were no differences between pure tone audiometric thresholds and monosyllabic word recognition scores of the subjects, when comparing both surgical techniques. The minimally invasive Ponto surgery technique significantly reduced the surgical time compared to the linear incision technique. There were no differences between both surgical techniques for skin-related complications; (Holgers 3 and 4) which occurred in 18.8% for MIPS and in 25% for linear incision. Subjects included in the minimally invasive Ponto surgery technique group showed a superior cosmetic outcome, with no surgical scar or additional sutures.

Conclusion:

The surgical and audiological outcomes were satisfactory and were not correlated to the surgical technique selected in all subjects. When compared to the linear incision, the minimally invasive Ponto surgery technique showed reduced surgical time and superior esthetic outcomes in the postoperative follow-up.

Keywords
Hearing; Hearing loss; Bone conduction; Bone-anchored hearing system

Introdução

As próteses auditivas ancoradas no osso (BAHS) constituem um método de reabilitação auditiva implantável já usado efetivamente, desde 1977, quando foram introduzidas por Tjellstr¨om e Carlsson. Esses dispositivos consistem em sistemas que estimulam a orelha interna e usam a transmissão sonora por via óssea. É um sistema composto por implante de titânio e áudio processador, com ou sem pilar, percutâneo ou transcutâneo, capaz de decodificar os sons e transmiti-los diretamente para a cóclea. Têm como características, tempos cirúrgicos curtos e baixas taxas de complicações, podem ser indicadas para pacientes com perda auditiva condutiva, mista ou surdez unilateral sensorioneural que não obtêm benefício com as técnicas de reabilitação auditiva por via aérea, por meio do uso do aparelho auditivo convencional ou por cirurgias de orelha média.11 Tjellström A, Lindström J, Hallén O, Albrektsson T, Brånemark PI. Osseointegrated titanium implants in the temporal bone. A clinical study on bone-anchored hearing aids. Am J Otol. 1981;2:304–10., 22 Bahmad F Jr, Cardoso CC, Caldas FF, Barreto FF, Chelminski MAS, Hilgenberg AMDS, et al. Hearing rehabilitation through bone-conducted sound stimulation: preliminary results. IntArch Otorhinolaryngol. 2019;23:12–7., 33 Kara A, Guven M, Sinan Yilmaz M, Demir D, Adigul Ç, Durgut M, et al. Comparison of two different bone anchored hearing instruments: Baha-5 vs ponto-plus. Acta Otolaryngol. 2019;139:517–21. As BAHS, por sistema percutâneo, são constituídas de três elementos, um implante de titânio inserido cirurgicamente no processo mastoideo ou escamoso do osso temporal, poucos milímetros acima da linha temporal, uma estrutura de apoio implantada através na pele (pilar ou abutment), conectada ao implante por um parafuso, e um processador de som ancorado a essa estrutura. O implante é fixado por meio de roscas ao osso e se integra ao crânio por um processo de osteointegração pelo crescimento do tecido ósseo em contato com a superfície de um implante de titânio.44 Calon TGA, Johansson ML, de Bruijn AJG, van den Berge H, Wagenaar M, Eichhorn E, et al. Minimally invasive ponto surgery versus the linear incision technique with soft tissue preservation for bone conduction hearing implants: a multi-center randomized controlled trial. Otol Neurotol. 2018;39: 882–93. O processador de som é ativado após 15 a 90 dias de pós-operatório. O audioproces-sador recebe o som, converte-o em vibrações e usa o crânio como condutor para transmiti-lo diretamente para a cóclea, evita a transmissão por via área e exclui, assim, o conduto auditivo externo e a orelha média.55 Ghossaini SN, Roehm PC. Osseointegrated auditory devices: bone-anchored hearing aid and PONTO. Otolaryngol Clin North Am. 2019;52:243–51., 66 Den Besten CA, Bosman AJ, Nelissen RC, Mylanus EA, Hol MK. Controlled clinical trial on bone-anchored hearing implants and a surgical technique with soft-tissue preservation. Otol Neurotol. 2016;37:504–12., 77 Kohan D, Ghossaini SN. Osseointegrated auditory devices-transcutaneous: sophono and Baha attract. Otolaryngol Clin North Am. 2019;52:253–63. A adaptação do audio-processador, nesse caso, é feita por conexão direta, via pilar percutâneo.88 Cass SP, Mudd PA. Bone-anchored hearing devices: indications, outcomes, and the linear surgical technique. Oper Tech Oto-layngol Head Neck Surg. 2010;21:197–206.

Com o propósito de melhorar os resultados e evitar complicações, tanto o projeto do implante como a técnica cirúrgica evoluíram. No início, o tecido subcutâneo da pele ao redor do pilar e dos folículos pilosos era removido. Posteriormente, foi introduzida a técnica de incisão linear sem redução de partes moles.99 Hultcrantz M. Outcome of the bone-anchored hearing aid procedure without skin thinning: a prospective clinical trial. Otol Neurotol. 2011;32:1134–9.

Em 2011, Hultcrantz et al.99 Hultcrantz M. Outcome of the bone-anchored hearing aid procedure without skin thinning: a prospective clinical trial. Otol Neurotol. 2011;32:1134–9. descreveram um procedimento cirúrgico minimamente invasivo para a prótese ancorada em osso da marca PontoTM, do fabricante Oticon Medical, em que foi feita punção dérmica de 5 mm para remover tecido mole necessário para acomodar o pilar. Essa técnica é conhecida como técnica MIPS (minimally invase Ponto surgery).

A literatura descreve como complicações das próteses ancoradas em osso: sangramento, deiscência da ferida (abertura espontânea dos pontos cirúrgicos ou da cicatriz ao longo da linha de incisão cirúrgica), dor persistente, necrose do retalho, falha na osteointegração (que pode levar à perda do implante), trauma e complicações cutâneas, essas são as mais frequentes apresentadas por autores com índices que variam de 15%–48,5% dos casos,44 Calon TGA, Johansson ML, de Bruijn AJG, van den Berge H, Wagenaar M, Eichhorn E, et al. Minimally invasive ponto surgery versus the linear incision technique with soft tissue preservation for bone conduction hearing implants: a multi-center randomized controlled trial. Otol Neurotol. 2018;39: 882–93.,77 Kohan D, Ghossaini SN. Osseointegrated auditory devices-transcutaneous: sophono and Baha attract. Otolaryngol Clin North Am. 2019;52:253–63. No Brasil, poucos são os estudos que avaliam a influência da técnica cirúrgica nos resultados cirúrgicos e suas potenciais complicações. Com o intuito de oferecer informações mais precisas em relação às técnicas cirúrgicas disponíveis para a cirurgia de implantação das próteses ancoradas em osso e as possíveis complicações inerentes a elas, este estudo teve como objetivo verificar os resultados cirúrgicos e audiológicos e estudar as complicações cirúrgicas e cutâneas com as duas técnicas (MIPS e incisão linear), ambas com preservação de tecidos moles.

Método

Foi feito estudo retrospectivo de pacientes submetidos à cirurgia para colocação de próteses ancoradas em osso, de janeiro de 2017 a junho de 2018, em um serviço de saúde auditiva do Estado de São Paulo. A escolha da técnica cirúrgica foi aleatória.

O estudo foi aprovado pelo comitê de ética em pesquisa institucional sob o protocolo n 01508318.5.0000.5440.

Foram incluídos sujeitos implantados unilateralmente e excluídos aqueles submetidos a mais de um procedimento no mesmo ato cirúrgico, pacientes submetidos ao implante de próteses ancoradas no osso bilateralmente e aqueles portadores de patologias ósseas ou dermatológicas que pudessem causar dificuldade à osteointegração, ou influenciar a cicatrização da ferida cirúrgica.

Os dados obtidos na coleta envolveram informações sobre: idade, sexo, orelha implantada, etiologia, características audiológicas de cada paciente no pré- e pós-cirúrgico (limiar auditivo em campo sonoro e teste de percepção de fala), técnica cirúrgica usada, tempo de duração da cirurgia e complicações cirúrgicas e cutâneas observadas por pelo menos seis meses de seguimento após a cirurgia.

Para avaliar as complicações cutâneas, usou-se a classificação proposta por Holgers et al.:1010 Mulvihill D, Kumar R, Muzaffar J, Currier G, Atkin M, Esson R, et al. Inter-rater reliability and validity of Holgers scores for the assessment of bone-anchored hearing implant images. Otol Neurotol. 2019;40:200–3.,1111 Holgers KM, Tjellstrom A, Bjursten LM, Erlandsson BE. Soft tissue reactions around percutaneous implants: a clinical study on skin-penetrating titanium implants used for bone-anchored auricular prostheses. Int J Oral Maxillofac Implants. 1987;2:35–9. Grau 0 = sem reação adversa; Grau 1=pele com eritema; Grau 2 = pele com eritema e secreção; Grau 3 = tecido de granulação; e Grau 4 = inflamação ou infecção que resultou na remoção do pilar. As complicações cutâneas foram divididas em complicações menores (Graus 1 e 2) e maiores (Graus 3 e 4).1212 Peñaranda D, Garcia JM, Aparicio ML, Montes F, Barón C, Jiménez RC, et al. Retrospective analysis of skin complications related to bone-anchored hearing aid implant: association with surgical technique, quality of life, and audiological benefit. Braz J Otorhinolaryngol. 2018;84:324–31.

Os dados audiométricos coletados foram referentes a audiometria feita em campo livre, pela média das frequências 500, 1000, 2000 e 4000 Hz e comparadas nos períodos de pré-operatório e após três meses de pós-operatório. Para a análise de percepção de fala foi aplicado o teste de palavras monossílabas proposto por Lacerda.1313 Lacerda AP. Clinical audiology. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 1976. p. 199. Para controle da variável relacionada ao equipamento propriamente dito, nos dois grupos estudados, foram usados somente implantes da marca Ponto (Oticon MedicalTM) com pilares montados.

Análise estatística

Os resultados descritivos foram apresentados como média e desvio-padrão, ou mediana e intervalo interquartil (IIQ) nas situações em que a distribuição foi assimétrica. O teste qui-quadrado foi usado para comparar sexo e o teste t de Student para comparar a idade entre os grupos. Nas demais comparações entre grupos usou-se o teste de Mann-Whitney. As comparações entre tempos de pré- e pós-cirúrgico foram obtidas por meio do teste de soma de postos sinalizados de Wilcoxon. O teste de proporção foi aplicado para testar o escore de Holgers entre os grupos. O software R versão 3.5.2 foi usado para todas as análises. Adotou-se o nível de significância de 5%.

Resultados

Foram feitas 42 cirurgias de próteses ancoradas em osso unilaterais, de janeiro de 2017 a junho de 2018, em 22 sujeitos foi aplicada a técnica cirúrgica MIPS (52,4%) e em 20 (47,6%) a de incisão linear.

A idade mínima, máxima e média no ato cirúrgico está representada na tabela 1, nas duas técnicas cirúrgicas. Não se observou diferença entre os grupos com relação à idade (p = 0.14).

Tabela 1
Características demográficas e cirúrgicas dos sujeitos (n = 42)

Foram feitas 10 cirurgias em sujeitos do sexo feminino pela técnica MIPS e 14 pela de incisão linear. Não houve diferença entre os grupos com relação ao sexo (p = 0,56). Também foram feitas 10 cirurgias na orelha direita e 10 na orelha esquerda para a técnica MIPS e 10 na orelha direita e 12 na orelha esquerda para a incisão linear. Não havendo diferença estatística quanto à orelha implantada (p = 1,00) (tabela 1).

As causas que levaram à necessidade da cirurgia também estão apresentadas na tabela 1. Verificou-se que a etiologia mais frequente esteve relacionada a eventos do pós-operatório de cirurgia otológica que impediam o paciente de usar a amplificação por via aérea, ocorreu em 31,8% para a técnica MIPS e 40% para a incisão linear.

Os resultados audiométricos nas fases pré- e pós-cirurgia estão apresentados na tabela 2. Os dados foram obtidos pela audiometria de campo sonoro na média das frequências 500, 1000, 2000 e 4000 Hz. Nas fases pré-cirurgia sem o dispositivo e pós-cirurgia com a prótese ancorada em osso, no período de regulagem e programação de uso habitual do sujeito. Não houve diferença na média dos limiares auditivos entres as diferentes técnicas cirúrgicas (pré- e pós-cirurgia). Entretanto, observou-se melhoria significativa da audição para as duas no pós-operatório, já na ativação do audio-processador (tabela 2).

Tabela 2
Média dos limiares auditivos dos sujeitos, nas fases pré e pós cirúrgicas, para as duas técnicas usadas (n = 42)

Os testes de percepção de fala nas fases pré e pós-cirúrgica estão apresentados na tabela 3, para as duas técnicas. Foi possível detectar melhoria dos resultados dos testes de percepção de fala (TPF) para os dois grupos, quando comparadas as duas fases (p = 0,0011 e p = 0,004). Não se verificou diferença ao se compararem as duas técnicas cirúrgicas nas fases pré- e pós-operatória (p = 0,86 e 0,81, respectivamente).

Tabela 3
Resultados dos testes de percepção de fala nas fases pré e pós cirurgia, com as duas técnicas cirúrgicas usadas (n =42)

O tempo de duração do procedimento cirúrgico para cada técnica está representado na tabela 4. Observou-se diferença significante entre os grupos com relação ao tempo cirúrgico (p = 0,0078), que foi menor na técnica MIPS.

Tabela 4
Distribuição dos sujeitos em relação ao tempo cirúrgico em minutos por técnica cirúrgica (n = 42)

Em relação às complicações cirúrgicas apresentadas, verificamos que as complicações cutâneas (Holgers ≥ 1)1010 Mulvihill D, Kumar R, Muzaffar J, Currier G, Atkin M, Esson R, et al. Inter-rater reliability and validity of Holgers scores for the assessment of bone-anchored hearing implant images. Otol Neurotol. 2019;40:200–3.,1111 Holgers KM, Tjellstrom A, Bjursten LM, Erlandsson BE. Soft tissue reactions around percutaneous implants: a clinical study on skin-penetrating titanium implants used for bone-anchored auricular prostheses. Int J Oral Maxillofac Implants. 1987;2:35–9. estiveram presentes nas duas técnicas cirúrgicas, ou seja, na técnica de incisão linear em 9 de 20 sujeitos submetidos à cirurgia (45%) e na técnica MIPS em 10 sujeitos de 22 operados (45%). Além dessas complicações cutâneas que ocorreram em até 6 meses de seguimento pós-operatório (resolvidas na sua totalidade), verificamos descrição de sangramento intraoperatório em um paciente submetido a cada técnica cirúrgica, ou seja, 5% na técnica de incisão linear e 4,5% na técnica MIPS. Contudo, esses sangramentos, por terem sido de pequena intensidade, não foram consideradas no rol de complicações. Foi também observado um caso de trauma seguido de extrusão da prótese em paciente submetido à cirurgia de incisão linear, que também não foi considerado complicação visto que não tem relação com a técnica cirúrgica feita.

As complicações cutâneas pós-operatórias estão apresentadas na tabela 5, separadas em complicações menores (Holgers 1 e 2) e complicações maiores (Holgers 3 e 4). Usou-se a classificação proposta por Holgers et al.1111 Holgers KM, Tjellstrom A, Bjursten LM, Erlandsson BE. Soft tissue reactions around percutaneous implants: a clinical study on skin-penetrating titanium implants used for bone-anchored auricular prostheses. Int J Oral Maxillofac Implants. 1987;2:35–9.

Tabela 5
Distribuição das complicações cutâneas, de acordo com a classificação de Holgers, para as duas técnicas cirúrgicas usadas (n = 42)

Não houve diferença quando comparadas as duas técnicas em relação às complicações cutâneas (p = 0,8275).

Discussão

Os grupos estudados, distintos pelas técnicas cirúrgicas usadas (MIPS e incisão linear), foram uniformes em relação à idade, ao sexo e à orelha operada. Portanto, essas variáveis não interferiram nos resultados do presente estudo. Essa homogeneidade dos grupos amostrais também foi apresentada por Steehler et al.,1414 Steehler MW, Larner SP, Mintz JS, Steehler MK, Lipman SP, Griffith S. A comparison of the operative techniques and the postoperative complications for bone-anchored hearing aid implantation. IntArch Otorhinolaryngol. 2018;22:368–73. que estudaram 90 sujeitos submetidos à cirurgia de prótese ancorada em osso e compararam cinco técnicas cirúrgicas usadas para implantação desses dispositivos.

Observamos que a idade média foi de pacientes adultos em ambos os grupos, consideradas as limitações para a indicação da cirurgia de prótese ancorada no osso em crianças. Para a inserção do implante de titânio é necessária uma espessura mínima da calota craniana, maior ou igual a 3 mm.1515 Roman S, Nicollas R, Triglia JM. Practice guidelines for bone-anchored hearing aids in children. Eur Ann Otorhinolaryngol Head Neck Dis. 2011;128:253–8. No Brasil, a portaria ministerial n° 2776/GM/MS, de 18 de dezembro de 2014, indica a cirurgia em crianças acima de cinco anos.1616 Brazil. Ministerial Ordinance n° 2.776/GM. December, 18, 2014. Approves general guidelines, expands and incorporates procedures for Specialized Care for People with Hearing Disabilities in the Unified Health System (SUS). Federal Official Gazette. Ministry of Health, December 19, 2014; 2014.

Os resultados do presente estudo corroboram os da literatura, se considerarmos as etiologias que levaram à necessidade da indicação da prótese ancorada no osso. Calon et al.44 Calon TGA, Johansson ML, de Bruijn AJG, van den Berge H, Wagenaar M, Eichhorn E, et al. Minimally invasive ponto surgery versus the linear incision technique with soft tissue preservation for bone conduction hearing implants: a multi-center randomized controlled trial. Otol Neurotol. 2018;39: 882–93. relatam como etiologia mais frequente a surdez condutiva adquirida, presente em 78,8% para a técnica MIPS e 83,3% para a incisão linear. Essa maior porcentagem pode ser pelo fato de que em seu estudo as etiologias foram divididas em apenas três grupos: adquirida condutiva, surdez unilateral e surdez condutiva congênita. Além disso, entre as causas que levaram à necessidade da cirurgia, apenas sete tiveram como indicação perdas auditivas sensorioneurais, o que pode refletir uma característica dos serviços públicos no Brasil, consideradas as indicações específicas determinadas pelo Ministério da Saúde. As 35 etiologias restantes foram decorrentes de alterações de orelha média e externa, semelhantemente à maioria dos estudos clínicos, em que a maioria de casos é de surdez tipo condutiva como indicação de prótese auditiva ancorada no osso.1414 Steehler MW, Larner SP, Mintz JS, Steehler MK, Lipman SP, Griffith S. A comparison of the operative techniques and the postoperative complications for bone-anchored hearing aid implantation. IntArch Otorhinolaryngol. 2018;22:368–73.

Observou-se melhoria audiológica significante quando comparados o pré- e o pós-cirúrgico (tabelas 2 e 3), tanto para a média dos limiares auditivos como para os testes de percepção de fala; confirmou-se, assim, a indicação da cirurgia das próteses ancoradas no osso nos dois grupos estudados, de acordo com a literatura pertinente.22 Bahmad F Jr, Cardoso CC, Caldas FF, Barreto FF, Chelminski MAS, Hilgenberg AMDS, et al. Hearing rehabilitation through bone-conducted sound stimulation: preliminary results. IntArch Otorhinolaryngol. 2019;23:12–7.,77 Kohan D, Ghossaini SN. Osseointegrated auditory devices-transcutaneous: sophono and Baha attract. Otolaryngol Clin North Am. 2019;52:253–63.

Assim como nos estudos clínicos de Calon et al.44 Calon TGA, Johansson ML, de Bruijn AJG, van den Berge H, Wagenaar M, Eichhorn E, et al. Minimally invasive ponto surgery versus the linear incision technique with soft tissue preservation for bone conduction hearing implants: a multi-center randomized controlled trial. Otol Neurotol. 2018;39: 882–93. e Den Besten et al.,66 Den Besten CA, Bosman AJ, Nelissen RC, Mylanus EA, Hol MK. Controlled clinical trial on bone-anchored hearing implants and a surgical technique with soft-tissue preservation. Otol Neurotol. 2016;37:504–12. o tempo cirúrgico foi diferente nos dois grupos, menor na técnica MIPS do que na de incisão linear, considerada como uma das vantagens da MIPS, visto os efeitos adversos causados pelo tempo aumentado de exposição a anestésicos.1717 Phan K, Kim JJ, Kim JH, Somani S, Di’Capua J, Dowdell JE, et al. Anesthesia duration as an independent risk factor for early postoperative complications in adults undergoing elective ACDF. Global Spine J. 2017;7:727–34.,1818 Kim BD, Ver Halen JP, Grant DW, Kim JY. Anesthesia duration as an independent risk factor for postoperative complications in free flap surgery: a review of 1305 surgical cases. J Reconstr Microsurg. 2014;30:217–26. Outros autores apontam até que menores tempos cirúrgicos acarretam menores gastos para os serviços de saúde. Neste estudo verificou-se que, pelo fato de a técnica MIPS ser menos invasiva, o procedimento pode ser feito em nível ambulatorial, proporciona economia de 450 dólares por procedimento feito.1919 Sardiwalla Y Jufas N, Morris DP. Direct cost comparison of minimally invasive punch technique versus traditional approaches for percutaneous bone anchored hearing devices. J Otolaryngol Head Neck Surg. 2017;46:46.

Os sangramentos intraoperatórios, que no nosso estudo não foram considerados como complicação, visto que foram de pequena intensidade, estiveram presentes em 5% dos casos de cirurgia na técnica da incisão linear e 4,5% na MIPS, dados esses compatíveis com os autores que apresentam 3% para MIPS e 3,5% para a incisão linear.55 Ghossaini SN, Roehm PC. Osseointegrated auditory devices: bone-anchored hearing aid and PONTO. Otolaryngol Clin North Am. 2019;52:243–51.

As complicações cutâneas foram as mais frequentes em ambas as técnicas cirúrgicas não foram observadas diferenças entre as técnicas, o que concorda com estudos da literatura.77 Kohan D, Ghossaini SN. Osseointegrated auditory devices-transcutaneous: sophono and Baha attract. Otolaryngol Clin North Am. 2019;52:253–63. Também não houve diferença quando divididos os grupos em complicações menores (Holgers 0 a 2) e complicações maiores (Holgers 3 a 4), dados esses concordantes com a literatura.1111 Holgers KM, Tjellstrom A, Bjursten LM, Erlandsson BE. Soft tissue reactions around percutaneous implants: a clinical study on skin-penetrating titanium implants used for bone-anchored auricular prostheses. Int J Oral Maxillofac Implants. 1987;2:35–9.

A literatura aponta, ainda, que na técnica MIPS a incisão é menor e não necessita de pontos na pele e, por isso apresenta melhor estética no pós-operatório, o que poderia ser demonstrado com aplicação de questionários. Contudo essa variável (estética) não foi objeto do presente estudo.2020 Dumon T, Wegner I, Sperling N, Grolman W. Implantation of bone-anchored hearing devices through a minimal skin punch incision versus the epidermal flap technique. Otol Neurotol. 2017;38:89–96.

Conclusão

A técnica cirúrgica MIPS apresenta tempo cirúrgico menor do que a de incisão linear. Não houve diferença significante quanto às complicações de pós-operatório entre as técnicas cirúrgicas MIPS e de incisão linear. O resultado audiológico para as duas técnicas foi semelhante.

Agradecimentos

A Maria Cecília Onofre pela correção do texto e Denny M. Garcia pelo apoio estatístico.

  • Como citar este artigo: Amaral MS, Santos FR, Danieli F, Massuda ET, Reis AC, Hyppolito MA. Surgical and audiological results of bone-anchored hearing aids: comparison of two surgical techniques. Braz J Otorhinolaryngol. 2022;88:533-38.
  • A revisão por pares é da responsabilidade da Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    15 Ago 2022
  • Data do Fascículo
    Jul-Aug 2022

Histórico

  • Recebido
    11 Mar 2020
  • Aceito
    15 Jul 2020
  • Publicado
    19 Ago 2020
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