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Práticas de Numeramento em Territórios Vividos por Estudantes do Ensino Fundamental: o mapa do Adriano

Numeracy Practices in the Lived Spaces by Middle School Students: Adriano’s Map

Resumo

O artigo é fruto de uma investigação que objetivou compreender narrativas de 15 estudantes dos Anos Finais do Ensino Fundamental sobre seus territórios vividos no bairro Santa Helena, no município de Governador Valadares, Minas Gerais, quando eles/elas mobilizam práticas de numeramento nessas narrativas. Assume as contribuições teóricas de estudos sobre práticas de numeramento, reconhecendo que elas se inserem nas tessituras das práticas de letramento, em diálogo com Henri Lefebvre sobre a produção do espaço e sua tríade analítica – espaço concebido, vivido e percebido. O material empírico foi produzido durante uma oficina na qual os/as estudantes foram convidados/as a traçar, em um mapa, o itinerário que realizam de casa até a escola. Para isso, eles/as utilizaram os recursos disponibilizados pela plataforma on-line Google My Maps. Durante a oficina, identificou-se o evento O mapa do Adriano, selecionado para análise e discussão, em que o estudante, mediado pela tela de um computador, apropria-se da linguagem tecnológica própria da plataforma My Maps, acolhendo e tensionando o espaço concebido pelos criadores da plataforma com os espaços vividos/percebidos por ele no bairro. Desse modo, o estudante produz significados próprios para a produção e leitura de mapas na tela de um computador, tornando-se protagonista das práticas vividas e narradas por ele. Destaca-se que o uso da plataforma My Maps se mostra uma ferramenta potente para a produção de cartografias, para estudos que operam com os conceitos de território e práticas de numeramento e, de modo geral, para o campo da Educação Matemática.

Palavras-chave
Anos Finais do Ensino Fundamental; My Maps ; Territórios Vividos; Práticas de Numeramento; Espaço Vivido/Percebido/Concebido

Abstract

This article results from a study aimed to understand the mobilization of numeracy practices in the narratives of fifteen middle school students about their lived spaces in the Santa Helena neighborhood, in the city of Governador Valadares, Minas Gerais, Brazil. It assumes the theoretical contributions of studies on numeracy practices, recognizing that they are inserted in the fabric of literacy practices, dialoguing with Henri Lefebvre on the production of space and his analytical triad – conceived, lived, and perceived space. The empirical material was produced during a workshop in which students drew the way they take from home to school on a map, using the resources provided by the online platform Google My Maps. During the workshop, we identified the event ‘Adriano's map’. We selected it for analysis and discussion. Mediated by the computer screen, the student appropriates the technological language, typical of the My Maps platform, welcoming and tensioning the space conceived by the platform creators with the spaces lived/perceived by him in the neighborhood. Thus, the student produces his own meanings for producing and reading maps on a computer screen, becoming the protagonist of the practices he lived and narrated. My maps platform stands out as a powerful tool to produce cartography in studies that operate with the concepts of territory and numeracy practices and for the field of Mathematics Education in general.

Keywords
Middle School; My Maps ; Lived Spaces; Numeracy Practices; Lived/Perceived/Conceived Space

1 Introdução

A reflexão que aqui propomos é fruto de uma investigação que objetivou compreender narrativas de estudantes dos Anos Finais do Ensino Fundamental (AFEF) sobre seus territórios vividos no bairro Santa Helena1 1 ompreende-se narrativa na perspectiva lefebvriana na qual os sujeitos produzem o espaço em práticas cotidianas que além da materialidade são também práticas discursivas, permeadas pelo vivido, e, desse modo, tensionam discursos hegemônicos. , no município de Governador Valadares, Minas Gerais, quando eles/elas mobilizam práticas de numeramento nessas narrativas. Em nosso esforço investigativo, buscamos identificar os pertencimentos territoriais dos/as estudantes em relação ao bairro Santa Helena, as práticas de numeramento narradas por eles/elas e a correlação dessas práticas com o território vivido.

Partimos, nesse estudo, de duas premissas que o justificam. A primeira diz respeito à nossa opção por entrelaçar Matemática e territórios vividos e que se assenta no reconhecimento da importância de se assumir território como categoria de análise no campo da pesquisa e das práticas pedagógicas em Educação Matemática (Souza; Fonseca, 2018SOUZA, M. C. R. F.; FONSECA, M. C. F. R. Cenas de uma aula de matemática: território e relações de gênero na EJA. Pro-posições, São Paulo, v. 29, n. 3, p. 138-163, set./dez, 2018. Disponível em: https://doi.org/10.1590/1980-6248-2017-0048. Acesso em: 10 out. 2022.
https://doi.org/10.1590/1980-6248-2017-0...
; Faria, 2023FARIA, Ianna Patrícia Inácia. "Então a gente é o cartógrafo?": práticas de numeramento e territórios vividos por estudantes dos anos finais do Ensino Fundamental, no bairro Santa Helena, em Governador Valadares, MG. 2023. Dissertação (Mestrado em Gestão Integrada do Território). Universidade Vale do Rio Doce, Governador Valadares (MG), 2023. Disponível em: https://pergamum.univale.br/acervo/240714. Acesso em: 4 mai. 2024.
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). Nessa direção, entendemos a necessidade de maior diálogo entre escola e cidade, como preconiza Paulo Freire, pela via do direito à cidade (Freire, 1991), como também defende o filósofo Henri Lefebvre (2011)LEFEBVRE, H. O direito à cidade. São Paulo: Centauro, 2011..

A segunda premissa se assenta nas intricadas relações entre leitura, escrita e Matemática, que permeiam as práticas educativas, dentre elas, as escolares; se apresentam em avaliações sistêmicas e, nas duas últimas décadas, têm se fortalecido como objeto de atenção de pesquisadores/as no campo da Educação Matemática (Campetti; Dorneles, 2022CAMPETTI, P. H. DE M.; DORNELES, B. V. Uma Revisão Integrativa e Exploratória da Literatura para os Termos Numeralização, Numeramento e Numeracia. Bolema, Rio Claro, v. 36, n. 72, p. 308-331, jan. 2022.). Nessa premissa, assumimos e operamos conceitualmente com o termo práticas de numeramento, pelo reconhecimento do caráter sociocultural das práticas matemáticas engendradas em diferentes contextos, o que nos demanda, assim, reconhecer sua natureza discursiva, do mesmo modo como fazem os estudos desenvolvidos pelo Grupo de Estudos sobre Numeramento (GEN2 2 Grupo cadastrado no Diretório de Grupos de Pesquisa do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) desde 2005 e vinculado à linha de pesquisa em Educação Matemática do Programa de Pós-graduação em Educação: conhecimento e inclusão social da UFMG. Disponível em: https://sites.google.com/view/gen-numeramento. Acesso em: maio 2023. ).

Tais práticas estão sujeitas às pressões das sociedades em que se conformam. No nosso caso, vivemos em uma sociedade grafocêntrica, que valoriza a leitura e a escrita como instrumentos que viabilizam e/ou legitimam as práticas sociais em diferentes contextos, até mesmo naqueles que não fazem uso da tecnologia da escrita (Soares, 2001SOARES, M. Letramento: um tema em três gêneros. Belo Horizonte: Autêntica, 2001.). Além de grafocêntrica, dizemos que esta sociedade também é quanticrata, visto que essas práticas de leitura e escrita não estão imunes ao poder dos critérios e da linguagem matemáticos (Fonseca, 2014FONSECA, M. C. F. R. Numeramento. In: FRADE, I.; COSYA VAL, M.; BREGUNCI, M. (orgs.). Glossário Ceale: termos de alfabetização, leitura e escrita para educadores. Belo Horizonte: UFMG/Faculdade de Educação, 2014. p. 235-236 (Vol. 1). Disponível em: https://www.ceale.fae.ufmg.br/glossarioceale/autor/maria-da-concei-o-ferreira-reis-fonseca. Acesso em: 10 nov. 2022.
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, 2017FONSECA, M. C. F. R. Práticas de Numeramento na EJA. In: CATELLI JR., R. (org.). Formação e Práticas na Educação de Jovens e Adultos. São Paulo: Ação Educativa, 2017. p. 105-115 (Vol. 1).).

Para nossa discussão, neste artigo, trouxemos um evento de numeramento3 3 O evento de numeramento é uma opção teórico-metodológica utilizada em trabalhos desenvolvidos pelo Grupo de Estudos sobre Numeramento (GEN). No material empírico que produzimos, essa opção nos ajudou a identificar situações, cenas, informações, interações discursivas entre participantes ou seus processos interpretativos em que esses/as participantes mobilizaram ideias e representações associadas a modos de quantificar, classificar, ordenar, medir, apreciar e organizar o espaço (Grossi, 2021; Lima; Fonseca, 2022). Esses eventos não são cenas ou situações fortuitas. Inseridos em um contexto histórico, os eventos de numeramento são protagonizados por sujeitos sociais e históricos (Freire, 1992), por isso carregam e produzem uma história. que compõe o material empírico desse estudo4 4 Pesquisa aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade em que o estudo foi realizado. e que analisamos com a intenção de mostrar o pertencimento territorial desses/as estudantes em relação ao bairro Santa Helena, quando utilizam a plataforma My Maps para traçar o itinerário que realizam de casa até a escola. Nas narrativas dos/as estudantes sobre os trajetos percorridos pelo bairro, identificamos a mobilização de conhecimentos, ideias, procedimentos e recursos de expressão que associamos às práticas de numeramento escolares e que se relacionam ao território vivido por eles/as, enquanto adolescentes e moradores/as (ou frequentadores/as) do bairro.

Participaram da pesquisa 15 estudantes (sete meninas e oito meninos), com idade entre 14 e 15 anos. Desse total, 12 estudantes eram moradores do Santa Helena e três moravam em outros bairros da cidade, mas insistiram em colaborar com as atividades que seriam propostas, pois afirmaram frequentar o bairro regularmente. Eles/as pertenciam às duas turmas do 9º ano do Ensino Fundamental, da Escola Municipal Padre Eulálio Lafuente Elorz, campo de pesquisa.

O material empírico foi produzido em uma oficina na qual foram explorados recursos disponibilizados pela plataforma on-line de mapeamento colaborativo (Google My Maps) (Weber et al., 2021). A opção pelo uso dessa plataforma foi motivada pela nossa observação em outras atividades de pesquisa que realizamos com essas mesmas turmas de estudantes do 9º ano, explorando territórios vividos, e nas quais, provocados pela apresentação feita por uma das pesquisadoras no Google My Maps, os/as estudantes discutiam entre eles/elas a localização de suas casas no bairro e outros pontos de circulação no bairro Santa Helena (Souza et al., 2023). Também foi intencional a escolha do bairro, por ser o bairro com o maior número de estudantes da escola e por ser, também, um bairro marcado pela vulnerabilidade juvenil (CRISP/UFMG, 2016).

A oficina, com duração de 46min39s, ocorreu no laboratório de informática da escola e contou com a colaboração de várias pessoas (professores/as da escola, pesquisadores/as, professor de informática e o responsável pela filmagem). Ela foi gravada em áudio e em vídeo e, posteriormente, foi transcrita. Também foram feitos registros e apontamentos em diário de campo.

Embora houvesse computadores disponíveis para que cada estudante mapeasse sua vivência individualmente, alguns deles/as optaram por fazer a atividade em dupla. Nos mapas, além de representarem o itinerário que realizavam de suas casas até a escola, cada estudante (individualmente ou em dupla) também registrou seus vividos no bairro Santa Helena.

2 Delineamentos do estudo

O avanço e o estabelecimento das recentes tecnologias digitais a que temos acesso e fazemos uso (computador, rede, internet, aplicativos, redes sociais, dentre outros), têm nos demandado, cada vez mais, novas práticas sociais de leitura e de escrita em ambientes virtuais. Essas práticas estabelecem novas formas de interação entre os sujeitos que as mobilizam e os conhecimentos que são produzidos nesses ambientes. Assim, diferentes significados são produzidos, acolhidos e tensionados nessas novas formas de interação entre os sujeitos que as protagonizam e os espaços concebidos e vividos nesses ambientes.

Tomando a produção e leitura de mapas como uma prática social, reconhecendo seus diferentes contextos de uso, em nosso estudo, podemos afirmar que, ao (re)produzirem os mapas na plataforma My Maps, os/as participantes da pesquisa protagonizaram práticas de leitura e de escrita mediadas pela tecnologia, por isso, podemos nos referir a elas como práticas de letramento digital. Há mais de duas décadas, Magda Soares (2002)SOARES, M. Novas práticas de leitura e escrita: letramento na cibercultura. Educ. Soc., Campinas, v. 23, n. 81, p. 143-160, dez. 2002. Disponível em: https://www.scielo.br/j/es/a/zG4cBvLkSZfcZnXfZGLzsXb/?format=pdf⟨=pt. Acesso em: 31 mai. 2023.
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chamava a atenção para a emergência dessas novas práticas de letramento que surgiam “[...] ao lado da cultura do papel, de uma cibercultura [...]” (Soares, 2002SOARES, M. Novas práticas de leitura e escrita: letramento na cibercultura. Educ. Soc., Campinas, v. 23, n. 81, p. 143-160, dez. 2002. Disponível em: https://www.scielo.br/j/es/a/zG4cBvLkSZfcZnXfZGLzsXb/?format=pdf⟨=pt. Acesso em: 31 mai. 2023.
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, p. 144). A autora reflete que:

[...] a tela como espaço de escrita e de leitura traz não apenas novas formas de acesso à informação, mas também novos processos cognitivos, novas formas de conhecimento, novas maneiras de ler e de escrever, enfim, um novo letramento, isto é, um novo estado ou condição para aqueles que exercem práticas de escrita e de leitura na tela [...] (Soares, 2002SOARES, M. Novas práticas de leitura e escrita: letramento na cibercultura. Educ. Soc., Campinas, v. 23, n. 81, p. 143-160, dez. 2002. Disponível em: https://www.scielo.br/j/es/a/zG4cBvLkSZfcZnXfZGLzsXb/?format=pdf⟨=pt. Acesso em: 31 mai. 2023.
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, p. 152).

Nas práticas sociais de leitura e de escrita, realizadas em ambientes virtuais por meio do uso da tecnologia digital, diferentes sujeitos mobilizam modos próprios de usar a língua falada, a língua escrita e, até mesmo, a linguagem gestual (corporal). Apropriar-se da linguagem tecnológica envolve muito mais do que apenas dominar um conjunto de códigos e estruturas específicos; é significar os usos que se fazem dela, buscando compreender sua função social. Nessa perspectiva, os mapas que utilizamos e exploramos nos ambientes virtuais e a apropriação socioespacial que eles possibilitam (ou interditam) também estão atravessados por modos próprios de usar a língua e por diferentes formas de expressão, de comunicação e de representação dos espaços e lugares (Canto, 2018CANTO, T. S. Os mapas e as tecnologias digitais: novos letramentos em pauta no ensino de Geografia. Perspectiva, Florianópolis, v. 36, n. 4, p. 1186-1197, out./dez. 2018.).

Nessa mobilização da linguagem tecnológica, podemos identificar “[...] ideias, conceitos, procedimentos e argumentos quantitativos [...]” (Fonseca; Simões, 2022FONSECA, M. C. F. R.; SIMÕES, F. M. Apropriação de práticas de numeramento escolares: compreendendo aprendizagem matemática como prática discursiva. In: MAGINA, S. M. P., LAUTERT, S. L., SPINILLO, A. G. (orgs.). Processos Cognitivos e Linguísticos na Educação Matemática teoria, pesquisa e sala de aula. Brasília: SBEM Nacional, 2022. p. 25-54., p. 27) que envolvem “[...] quantificação, medição, orientação no espaço, ordenação, classificação e outras relações com o mundo que associamos ao que chamamos de ‘Matemática’ no contexto escolar [...]” (Fonseca; Simões, 2022FONSECA, M. C. F. R.; SIMÕES, F. M. Apropriação de práticas de numeramento escolares: compreendendo aprendizagem matemática como prática discursiva. In: MAGINA, S. M. P., LAUTERT, S. L., SPINILLO, A. G. (orgs.). Processos Cognitivos e Linguísticos na Educação Matemática teoria, pesquisa e sala de aula. Brasília: SBEM Nacional, 2022. p. 25-54., p. 27, aspas do original). Assim, as discussões sobre as relações entre leitura, escrita e Matemática e a adoção do conceito de práticas de numeramento interessam a esse estudo, pois não se pode tratar de apropriação da linguagem tecnológica ou apropriação socioespacial dos/as estudantes, participantes dessa pesquisa, sem considerarmos que eles/as vivem em uma sociedade grafocêntrica e quanticrata que busca parametrizar, controlar e quantificar suas ações.

Em diversas situações da vida social, as comunidades urbanas e rurais utilizam a escrita em diferentes gêneros textuais. Em seu texto sobre práticas de numeramento na EJA, Fonseca (2017)FONSECA, M. C. F. R. Práticas de Numeramento na EJA. In: CATELLI JR., R. (org.). Formação e Práticas na Educação de Jovens e Adultos. São Paulo: Ação Educativa, 2017. p. 105-115 (Vol. 1). enumera diferentes tipos e portadores de textos que estão presentes nas atividades que as pessoas participam em seu cotidiano e que interferem nos modos de organização de suas vidas. Essas práticas de leitura e escrita são permeadas por registros e inferências que envolvem quantidades, medidas, comparações, ordenações, classificações, organizações de formas, localização no espaço ou outras atividades que associamos à matemática escolar.

Segundo Fonseca (2009FONSECA, M. C. F. R. Conceito(s) de numeramento e relações com o letramento. In: LOPES, C.; NACARATO, A. (orgs). Educação matemática, leitura e escrita: armadilhas, utopias e realidade. Campinas: Mercado das Letras, 2009, p. 47-60 (Vol. 1)., p. 55), isso acontece

[...] não só porque as representações matemáticas aparecem nos textos escritos, mas porque a própria cultura escrita que permeia e constitui tais práticas é também permeada por princípios calcados numa mesma racionalidade que forja ou parametriza as práticas ditas numeradas e que é por elas reforçada.

No entanto, é possível identificar e analisar práticas de numeramento como um modo de tensionar significados em diversos sistemas linguísticos que se apresentam em solidariedade ou em disputa em uma sala de aula. Um deles é o sistema linguístico envolvido na (re)produção de mapas digitais. Quando se observam, organizam, comparam, descrevem, relacionam e registram territórios vividos em uma sociedade como a nossa, fortemente parametrizada pela cultura escrita, organizam-se informações, definem-se trajetos, selecionam-se percursos, movimentam-se e traçam-se mapas que apresentam-se como novas formas de leitura e de escrita, incluindo-se referências geográficas e matemáticas de localização e de escalas.

De acordo com Soares (2002)SOARES, M. Novas práticas de leitura e escrita: letramento na cibercultura. Educ. Soc., Campinas, v. 23, n. 81, p. 143-160, dez. 2002. Disponível em: https://www.scielo.br/j/es/a/zG4cBvLkSZfcZnXfZGLzsXb/?format=pdf⟨=pt. Acesso em: 31 mai. 2023.
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, as práticas de leitura e de escrita digitais – nelas incluímos a prática social de leitura e (re)produção de mapas – “[...] conferem um determinado e diferenciado estado ou condição de inserção em uma sociedade letrada [...]” (p. 146) aqueles indivíduos ou grupos sociais que se apropriam das novas tecnologias digitais. Além disso, segundo Gomes (2017GOMES, M. F. V. B. Cartografia Social e Geografia Escolar: aproximações e possibilidades. Revista Brasileira de Educação em Geografia, Campinas, v. 7, n. 13, p. 97-110, jan./jun., 2017., p. 101), “[...] produzir o mapa é reconhecer-se como sujeito de direito ao território e uma maneira de apropriá-lo [...]”. Com efeito, na (re)produção e leitura de mapas, identificamos os/as estudantes desse estudo posicionando-se discursivamente, narrando seus espaços e seus (não)pertencimentos territoriais, assumindo o estado e a condição de sujeitos de direitos, inseridos em uma sociedade letrada.

Nos dizeres do filósofo Henri Lefebvre (2006) a cartografia não é neutra – ela carrega as intencionalidades de quem a produz, quem lê e utiliza. Todo mapa carrega suas narrativas espaciais a serem decodificadas em texturas: “[...] As pessoas animam esses trajetos e percursos, essas redes e caminhos [caminhamentos], por narrações [relatos], por ‘presenças [...]’” (Lefebvre, 2006, p. 172, aspas do original). O autor concebe o espaço como produtor e produto, “[...] de modo que a produção e o produto se apresentam como dois lados inseparáveis e não como duas representações separáveis [...]” (Lefebvre, 2006, p. 64).

Com base nas contribuições desse autor, pode-se afirmar que pessoas produzem os territórios5 5 Ao ler a produção do autor, refletimos que o espaço, em suas construções teóricas, se apresenta consoante com estudos sobre Território, como argumenta Haesbaert (2014). Por isso, ao nos referirmos ao pensamento do autor, vamos utilizar a palavra espaço, preservando sua construção teórica, e adotamos a palavra território em outras discussões ao longo do texto. em relações sociais de produção e reprodução. O espaço não é uma coisa, não é um recipiente e sim um produto e um meio de produção. As pessoas têm o seu espaço e estão nesse espaço. Podemos pensar que o espaço não é um sujeito e nem um objeto, mas uma realidade social, um conjunto de relações e formas. Ele é, ao mesmo tempo, resultado e causa, produto e produtor, por isso novas ações ocorrem e outras surgem. “[...] O novo modo de produção se apropria do espaço preexistente, modelado anteriormente, e o organiza [...]” (Lefebvre, 2006, p.13).

À medida que nos aprofundamos nas discussões do filósofo, como pesquisadoras em Educação Matemática, fomos provocadas por suas problematizações sobre o pensamento cartesiano que impregna a Matemática escolar:

[...] Ritos e forma sacralizam o espaço escolar e o mantêm à parte da vida, sobretudo nas aulas de matemática, que não apenas são marcadas pela racionalidade de matriz cartesiana, mas a veiculam e promovem, na valorização da inteligibilidade, da abstração, do encadeamento de ideias, do rigor, da exatidão, do controle, da previsibilidade, da unicidade de respostas, da objetividade, da precisão, da perfeição [...] (Souza; Fonseca, 2018SOUZA, M. C. R. F.; FONSECA, M. C. F. R. Cenas de uma aula de matemática: território e relações de gênero na EJA. Pro-posições, São Paulo, v. 29, n. 3, p. 138-163, set./dez, 2018. Disponível em: https://doi.org/10.1590/1980-6248-2017-0048. Acesso em: 10 out. 2022.
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, p. 147).

Lefebvre (2006, p. 34, aspas do original) argumenta que “[...] o espaço cartesiano, a ‘res extensa’ absoluta, infinita, atributo divino apreendido a partir de uma só intuição porque homogênea (isotrópica) é definidor de lógicas urbanas de organização social que priorizam a racionalidade, o capital, em detrimento das pessoas e separam sujeito e espaço”. Ao tratarmos de territórios vividos e práticas de numeramento, também problematizamos essa concepção de espaço:

[...] Com efeito, o espaço cartesiano se oferece a um ‘intuitus’. O sujeito, perfeitamente definido, nascido adulto e maduro como consciência de si, portanto [donc] um tanto/até certo ponto [quelque peu] separado do ‘real’ e do ‘mundo’, não compreende/percebe/apreende [n’en saisit] menos, por milagre e intervenção divina, o ‘objeto’, o espaço, que não resulta de uma construção intelectual ou de uma elaboração do sensível, mas se dá em bloco [mais se donne d’un bloc], pureza supra-sensível, infinitude. Ao contrário da intuição cartesiana, uma lógica não determina senão uma rede de relações, constitutivas do ‘objeto’ [...] (Lefebvre, 2006, p. 399, palavras e frases em outro idioma e aspas do original).

Refletindo sobre as contribuições do autor, constatamos que os vividos territoriais dos/as estudantes não podem ser enquadrados em uma racionalidade de matriz cartesiana que, intencionalmente, busca limitar o estado e a condição desses/as estudantes como participantes ativos na produção do espaço. Portanto, sujeito e território são indissociáveis e as relações socioespaciais não se reduzem à lógica e à Matemática, como Lefebvre (2006, p. 36) enfatiza, alertando para “[...] a extrema abstração formal (o espaço lógico-matemático) [...]”. Tal abstração apresenta-se fortemente no modo como o ensino de Matemática lida com o espaço de modo geral, desvestido das relações socioespaciais.

Outra contribuição do autor para esse estudo diz respeito à tríade analítica: espaço concebido, espaço vivido e espaço percebido (Lefebvre, 2006). Para o autor, “[...] o espaço concebido, [é] aquele dos cientistas, dos planificadores, dos urbanistas, dos tecnocratas ‘retalhadores’ e ‘agenciadores’, de certos artistas próximos da cientificidade [...]” (Lefebvre, 2006, p. 66, aspas do original). Por sua vez, o espaço vivido é o de “[...] representação, ou seja, o espaço vivido através das imagens e símbolos que o acompanham, portanto, espaço dos ‘habitantes’, dos ‘usuários’, mas também de certos artistas e talvez dos que o descrevem: os escritores, os filósofos [...]” (Lefebvre, 2006, p. 66, aspas do original). O espaço percebido é o da prática social, “[...] associa estreitamente, no espaço percebido, a realidade cotidiana (o emprego do tempo) e a realidade urbana (os percursos e redes ligando os lugares do trabalho, da vida ‘privada’, dos lazeres) [...]” (Lefebvre, 2006, p. 65).

Lefebvre (2006, p. 238) nos adverte que as pessoas, além de se relacionarem socialmente e produzirem valores de uso, elas também produzem o espaço social. Nessa perspectiva, pode-se dizer que, “[...] antes de produzir (efeitos, na matéria, nos instrumentos e nos objetos), antes de se produzir (se alimentando) e de se reproduzir (pela geração de um outro corpo), cada corpo vivo é um espaço e tem seu espaço: ele aí se produz e o produz [...]”.

Por isso, ao identificarmos a perspectiva do corpo, explorada pelo autor (Lefebvre, 2006), entendemos que a tríade analítica da produção do espaço que se encontra no corpo apresenta-se como uma possibilidade para a análise pretendida nesse estudo por possibilitar explorar as tensões nas práticas de numeramento entre o concebido, presente na tela do My Maps, e que impregna a Matemática escolar, e o vivido, pois a lembrança da experiência do corpo provocada pela produção dos mapas interroga o espaço concebido.

3 A oficina na plataforma My Maps

No dia da oficina em que utilizamos a plataforma My Maps, os/as participantes do estudo foram convidados/as a irem ao laboratório de informática para que pudessem acessar a plataforma My Maps utilizando os computadores da escola. Apesar de a maioria dos estudantes desse grupo ter acesso à internet, via aparelhos celulares, o início da oficina foi marcado por dificuldades operacionais em relação ao uso do computador porque, em sua maioria, eles não têm acesso a computadores em casa. Por isso, alguns estudantes tiveram dificuldade para usar o mouse, operacionalizar as teclas e atender aos comandos que foram dados durante a oficina.

Após as explicações iniciais e o esclarecimento de dúvidas feitos pelo professor de informática e a experiência de estar frente a frente com o computador, as dificuldades apresentadas pelos/as estudantes foram logo superadas.

Antes da realização da oficina, os/as participantes foram informados sobre a necessidade de cada um criar uma conta Google para ter acesso aos serviços e recursos da plataforma My Maps. Naquele instante, foi constatado que 11 estudantes já haviam criado seus e-mails, uma vez que a maioria deles/as possuía celulares que exigiam uma conta cadastrada no Google. Na sequência, foi informado por uma das pesquisadoras que realizou previamente o contato com os/as participantes, que no dia da oficina, o professor de informática auxiliaria aqueles/as que ainda não possuíam uma conta de e-mail.

Após acompanhar a oficina, rever a gravação em vídeo e ouvir os áudios que foram registrados naquele dia, podemos afirmar que as estudantes Eliane6 6 Atribuímos nomes fictícios aos/às participantes da pesquisa para evitar, de alguma forma, a exposição de sua identidade. e Fernanda e os estudantes Leandro e João acessaram a plataforma My Maps rapidamente. Inicialmente, Melissa (que dispunha de um celular) e Paula (que não dispunha de celular) tiveram mais dificuldades para acessar a plataforma, mas, com o passar do tempo, elas foram se adaptando e conseguiram localizar no mapa seus territórios.

A estudante Paula e os estudantes Bruno e Caio, que não dispunham de celulares e, consequentemente, não tinham acesso à internet móvel, apresentaram mais dificuldades durante a oficina. Logo, ela e eles precisaram da intervenção e do apoio dos/as colaboradores/as da pesquisa em diversos momentos, durante a elaboração de seus mapas. Todo o grupo se envolveu na atividade de mapeamento de seus itinerários, narrando suas vivências no bairro Santa Helena.

No final da oficina ocorreu o evento que analisamos na próxima seção. Nomeado como O mapa do Adriano, o evento foi protagonizado pelo estudante em interação com a plataforma e com as pesquisadoras. No entanto, uma parte dele não aconteceu exatamente no dia da oficina, mas ocorreu em decorrência daquele dia, via WhatsApp, outra plataforma digital.

3.1 O mapa do Adriano

Adriano era um adolescente de 14 anos que não nasceu no bairro Santa Helena, mas aos cinco anos de idade mudou-se com sua família para morar na Rua X7 7 Atribuímos nomes fictícios a endereços e ruas do bairro Santa Helena para evitar, de alguma forma, a exposição da identidade dos/as estudantes. desse bairro. Acompanhando a gravação em vídeo e olhando o trajeto percorrido pelo estudante entre a escola e o local em que vivia, constatamos os posicionamentos do estudante ao ler o mapa, indicar nomes de ruas e, com o auxílio do mouse, simular o seu itinerário pelo bairro.

Nesse evento de numeramento, apresentamos o modo como Adriano produziu seu próprio mapa, adicionando o a pé como meio de transporte utilizado no trajeto (visto que na plataforma é possível adicionar trajetos para bicicletas ou para carros), e como identificou os trajetos percorridos por ele no bairro. Na Figura 1, apresentamos a representação do estudante:

Figura 1
– O mapa do Adriano

Inicialmente, foi orientado ao grupo de estudantes que eles iniciassem o traçado do seu itinerário a partir da localização da residência de cada um. Atendendo à recomendação, no mapa de Adriano, observamos que ele saiu de sua casa e indicou essa localização acrescentando o ícone casa, representado pela letra A. Em seguida, ele traçou um caminho até a igreja que fica localizada na Avenida Y e a representou com o ícone cruz. Na sequência, ele fez um novo traçado até o salão que fica localizado na Avenida Z e o indicou com o ícone tesoura. Por fim, ele fez um traçado do salão até a escola onde estuda, a Escola M. Padre Eulálio Lafuente Elorz, e a representou com o ícone escola.

No final da oficina, os/as estudantes fizeram o exercício de apresentar para os/as colegas o modo como seus itinerários, de casa até a escola, foram construídos. No entanto, a apresentação de Adriano foi a que mais nos pareceu fértil para explorar os vividos de um adolescente no bairro Santa Helena. Em sua narrativa, Adriano explicou para toda a turma o trajeto que construiu em seu mapa, relatou suas vivências no bairro enquanto adolescente, leu e indicou os nomes das ruas por onde passava quando saía de sua casa e se dirigia até a escola. Além disso, o estudante mostrou como selecionou os ícones e as legendas da plataforma para indicar os territórios em que ele se insere, mostrando o modo como se apropriou dos recursos disponibilizados pela tecnologia da plataforma My Maps.

Na narrativa, Adriano protagonizou práticas de letramento mediadas pela tecnologia, nas quais se inscrevem a leitura e a produção de mapas e o uso de referências relacionadas à localização. Nessa direção, o estudante também mobilizou conhecimentos matemáticos e geográficos ao identificar ruas e estabelecimentos (minha casa, igreja, salão e escola) e ao descrever seu itinerário pelo bairro. Esse protagonismo das práticas de letramento e essa mobilização de conhecimentos evidenciam Adriano apropriando-se da linguagem tecnológica, nesse caso, a linguagem própria da plataforma My Maps e das relações socioespaciais, a partir da mediação de uma tela de computador, mas também mostram o estudante acolhendo e tensionando o espaço concebido pelos criadores da plataforma com os territórios vividos por ele no bairro.

Foi durante a escuta dos áudios, a conferência das transcrições, a visualização dos vídeos e os registros no diário de campo que nos foi possível compreender como esse e outros corpos viviam no bairro, se deslocavam nele e como os corpos de outros/as adolescentes se locomoviam naquele território. Prevalece, nesse exercício analítico, o uso da tríade lefebvriana – espaço concebido, vivido, percebido – como instrumento de percepção das relações acima. Em outras palavras, o confronto entre esses âmbitos nos permite apreender as relações de (não)pertencimento, intimidade ou desconhecimento em relação ao bairro. Como será demonstrado mais adiante, quando um/a estudante interfere, discorda ou reage àquilo posto pela plataforma Google My Maps, ele/ela está impondo ao concebido o seu vivido. Não se trata mais da aceitação alienada das construções hegemônicas, mas do seu questionamento a partir de uma construção própria e particular.

Após a produção do mapa proposta na atividade, Adriano continuou explorando as e os recursos da plataforma My Maps e o estudante João, apresentando-se mais familiarizado com o uso da plataforma, informou, em voz alta, que havia outro modo de visualizar o mapa que eles haviam produzido utilizando o modo satélite. Após ouvir o comentário do colega e curioso com a informação, Adriano pediu ajuda de João para também modificar a visualização de seu mapa. Após o pedido de Adriano, João levantou de sua cadeira, que estava atrás de Adriano, e foi ajudá-lo, apontando na tela do computador onde Adriano deveria clicar para fazer com que seu mapa aparecesse no modo satélite.

A Figura 2, à esquerda, mostra João apontando na tela do computador o local em que Adriano deveria clicar com o mouse para modificar a visualização do mapa. A figura à direita mostra o trajeto construído por Adriano, que manifestou o desejo de ver o seu mapa mostrando as casas com vista aérea.

Figura 2
– O mapa de Adriano utilizando o modo satélite

No instante em que Adriano estava explorando e conhecendo os recursos da plataforma, ao construir o seu trajeto no mapa no modo satélite, uma das pesquisadoras aproximou-se dele e ambos iniciaram um diálogo sobre o trajeto que o estudante realiza de casa até a escola, fazendo a leitura do mapa:

Pesquisadora: Olha que chique, hein? Volta lá João.

[Diz apontando para a tela do computador do Adriano. Porém, quem movimenta o mouse e volta na tela é o Adriano. Adriano aproveita e mostra para a pesquisadora onde fica a sua casa].

Adriano: Oxi! A minha casa!

[Aponta Adriano com voz entusiasmada].

Pesquisadora: Cadê, Adriano? Cadê a sua casa, Adriano?

Adriano: Aqui, oh! ... É essa aqui mesmo...

Pesquisadora: Eu passei lá na porta mesmo, vi sua mãe na janela... Não foi?

[Fazendo referência ao dia da caminhada com estudantes pelo bairro Santa Helena.]

Você anda pra caramba, hein, Adriano?

[Referindo-se à distância que ele percorre para chegar à escola.]

Adriano: É um quilômetro e meio...

[Refere-se à distância de sua casa até a escola.]

Pesquisadora: Prá você vir pra escola. E no bairro, onde você anda?

Adriano: Eu venho...

Pesquisadora: É um quilômetro e meio, subindo morro, né, Adriano?

Adriano: Oiiiii?

[Com um tom de gozação, interroga o erro da pesquisadora sobre subir o morro.]

Pesquisadora: Descendo morro, né? ...

Adriano: É, aqui não conta morro, não...

[Aponta para o mapa na tela do computador.]

Pesquisadora: Não conta não, isso que eu achei estranho...

[Risos.]

(Diálogo entre o estudante Adriano e a Pesquisadora, 2022).

Ao solicitar a ajuda de João, Adriano acompanhou, de modo atento, a expertise do colega que já conhecia a plataforma, pois desejava modificar a visualização de seu mapa. Observando a movimentação de João, Adriano ficou admirado com a vista aérea de seu bairro e, inclusive, mostrou certo deslumbre ao localizar a própria casa no modo satélite:

Oxi! A minha casa! (Fala de Adriano, 2022).

Ao mapear seus deslocamentos pelo bairro utilizando o modo satélite, Adriano fez uma leitura do mapa do bairro; narrou e representou no mapa seu percurso, traçou retas e curvas, mostrando que seu corpo não transita em linha reta pelo bairro. Apesar de o bairro Santa Helena possuir muitos morros, isso não foi possível de ser mostrado na plataforma My Maps, porque ela não tem um recurso capaz de mostrar os aclives e os declives nos deslocamentos dos corpos no mapa.

A questão do morro apresenta-se na última parte do diálogo entre Adriano e a Pesquisadora, quando ela afirma que, para chegar até a escola, o estudante deveria indicar no mapa que ele estaria subindo o morro. Todavia, o estudante, em tom jocoso, questiona a pergunta da pesquisadora (Oiiiii?), porque na plataforma não é possível traçar as subidas e as descidas pelo bairro. A pesquisadora, não compreendendo o questionamento de Adriano, persistiu no erro (Descendo morro, né?), demonstrando desconhecer a impossibilidade de traçar aclives e declives com os recursos disponibilizados pela plataforma. Logo, ela foi corrigida pelo estudante que demonstrou compreender os recursos e a disposição do mapa na plataforma: É, aqui não conta morro, não...

Ao corrigir a professora e declarar a distância que percorre de sua casa até a escola, Adriano não desconsidera os aclives e os declives que realiza em seu trajeto. No processo de apropriação dos recursos disponibilizados pelo espaço concebido da plataforma, ele reconhece e, de certo modo, alerta para a impossibilidade de mostrar, no mapa, as inclinações do terreno. Assim, podemos inferir que o posicionamento do estudante o coloca em um estado e em uma condição de leitor imersivo de mapas, que ao mesmo tempo que o produz também “[...] constrói seu percurso de leitura [do próprio mapa] na própria caminhada [virtual], navegando por entre fragmentos de informações que aparecem e desaparecem num simples clicar de botões [...]” (Canto, 2018CANTO, T. S. Os mapas e as tecnologias digitais: novos letramentos em pauta no ensino de Geografia. Perspectiva, Florianópolis, v. 36, n. 4, p. 1186-1197, out./dez. 2018., p. 1189).

Durante a leitura que a pesquisadora realizou junto com o estudante, Adriano olhou o mapa planificado na tela do computador e fez uma representação de seu espaço vivido e percebido ao concebido (Lefebvre, 2006). Como já citado, lembramos que, segundo Lefebvre (2006), o espaço concebido é da ordem dos planejadores e implica em uma cientificidade, produzido na cisão sujeito objeto; entretanto, o espaço é, também, da ordem do percebido/vivido, por isso é considerado múltiplo (Lefebvre, 2011LEFEBVRE, H. O direito à cidade. São Paulo: Centauro, 2011.). Nessa perspectiva, é possível identificarmos no mapa de Adriano uma multiplicidade de espaços vividos e percebidos que constituem o deslocamento do estudante até a escola, como, por exemplo, subir e descer os morros que não constam no mapa, devido à limitação da plataforma My Maps, mas completam o longo trajeto que é percorrido pelo estudante:

É um quilômetro e meio... (fala de Adriano, 2022).

A afirmação categórica de Adriano, ao relatar a distância que ele percorre de sua casa até a escola, motivou, em outro momento, após a realização da oficina, que uma das pesquisadoras, professora de Matemática na escola, o questionasse, via WhatsApp, sobre o porquê daquela medida que ele expressou em sua fala, 1,5 km. Foi perguntado ao estudante sobre como ele chegou a essa medida e, prontamente, ele visualizou a mensagem e a respondeu. O diálogo, a seguir, capturado da tela do WhatsApp da pesquisadora, mostra a conversa que tiveram sobre o assunto.

Pesquisadora: Em um determinado momento você falou (...) que a distância da sua casa até a escola é 1 quilômetro e meio. Como você achou essa medida? Foi através do My Maps mesmo?

Adriano: Um quilômetro e meio não ksksksks. Quase 1k.

Pesquisadora: Mas como você sabe? Mediu como?

Adriano: Meu pai me disse ksksksks. Não discordo porque ele é motorista, então sabe alguma coisa.

Pesquisadora: Ahhh, tá. Entendi.

(Mensagens trocadas no WhatsApp entre Adriano e a pesquisadora, 2022).

Após a conversa entre Adriano e a pesquisadora, ainda via WhatsApp, ela pediu que o estudante utilizasse a plataforma My Maps para calcular a distância que ele percorria de sua casa até a escola. Para isso, perguntamos se ele tinha computador em casa e ele disse que não, mas informou que faria o trajeto utilizando a plataforma em seu celular. Ele enviou uma imagem da tela de seu celular (Figura 3) mostrando que a distância percorrida por ele de casa até a escola era de 1,28 km, contradizendo, assim, ambas as respostas que ele deu à pesquisadora: a distância de 1,5 km no dia da oficina e a distância de quase 1 km via WhatsApp.

Figura 3
– A distância percorrida por Adriano na plataforma My Maps

Para chegar nesse resultado, Adriano clicou no ícone régua da plataforma para medir a distância do trajeto. Em seguida, ele clicou no ícone que indicava a localização de sua casa e no ícone que indicava a localização da escola, respectivamente. O cálculo da medida realizado pela plataforma nos surpreendeu em relação a ambas as medidas dadas pelo estudante à pesquisadora em momentos distintos.

Baseado nos saberes de seu pai, Adriano afirmou, via WhatsApp, que a distância de sua casa até a escola era de quase 1k, corrigindo o comentário da professora que se norteou pela resposta do estudante no dia da oficina (Um quilômetro e meio não. Ksksksks. Quase 1k). Isso nos permite inferir que, na prática de numeramento de cálculo de distâncias, Adriano e seu pai operaram com estimativas para determinar a distância percorrida, tanto no dia da oficina quanto na interação via WhatsApp.

Não podemos afirmar, entretanto, que na interação via WhatsApp, o estudante esqueceu a medida expressada por ele no dia da oficina. Todavia, identificamos no posicionamento discursivo de Adriano, o modo como ele valida a aproximação da medida feita por seu pai. Essa legitimação dos saberes da experiência é corroborada, quando o estudante utiliza a plataforma em seu celular para calcular a distância do trajeto percorrido e encontra a medida 1,28 km, mas não refuta ou corrige a resposta dada à pesquisadora de aproximadamente 1 km. Nessa direção, Adriano sobrepõe o espaço vivido, a partir da expertise de seu pai, em relação ao espaço concebido pela plataforma.

Desse modo, o estudante tensiona a precisão da medida da plataforma no reconhecimento dos saberes da profissão paterna, por isso confia no cálculo de distância que seu pai faz e não o questiona:

Não discordo porque ele é motorista então sabe de alguma coisa.

(Mensagem de WhatsApp enviada por Adriano).

De fato, o modo como o pai de Adriano estima a distância percorrida pelo filho pode estar diretamente relacionado à sua profissão de motorista que, frequentemente, precisa lidar com distâncias e estimativas. Com efeito, os saberes da plataforma são acolhidos, mas também são confrontados com o espaço vivido e partilhado por Adriano e por seu pai.

Uma vez que há uma relação dialética entre o espaço social e o corpo, ao utilizar a plataforma My Maps, os/as estudantes são instigados com o corpo, ainda que virtualmente, a transitar pelo bairro e a mapear seus territórios vividos. Lefebvre (2006, p. 67) argumenta que a “[...] prática social considerada globalmente supõe um uso do corpo: o emprego das mãos, membro, órgãos sensoriais, gestos do trabalho e os das atividades exteriores ao trabalho. É o percebido (base prática da percepção do mundo exterior [...]) [...]”. No evento apresentado, consideramos que Adriano mobilizou práticas de numeramento em sua narrativa do vivido no bairro Santa Helena e, para isso, embora não tenha feito menção direta ao corpo em sua descrição sobre seu percurso, o estudante considerou, ainda que intuitivamente, que é o corpo que anda virtualmente pela plataforma My Maps e faz projeções socioespaciais.

Nas observações que o estudante fez durante a utilização dos recursos da plataforma, ele mobilizou conhecimentos e procedimentos matemáticos, geográficos e específicos do ambiente virtual que são parametrizados por uma mesma racionalidade cartesiana. São conhecimentos sobre: noções de ordem e sequência, lateralidade, projeção, representação simbólica, perspectivas, operacionalização com retas coordenadas, distâncias e medições, e comparações entre distâncias. Esses saberes e conteúdos, ensinados e valorizados no/pelo ambiente escolar, estão fortemente associados ao pensamento matemático, até mesmo aqueles conteúdos e saberes que estabelecem algum tipo de relação com a geografia escolar ou com conhecimentos específicos dos ambientes virtuais.

Consideramos a Matemática escolar, fortemente caracterizada pela precisão, exatidão e rigor, como um espaço concebido cientificamente por matemáticos, capaz de achatar e limitar as percepções dos sujeitos em relação aos aspectos pragmáticos, sociais e culturais engendrados nas relações de leitura e escrita na nossa sociedade e, de modo especial, na leitura e na elaboração de mapas. Ao legitimar a estimativa feita por seu pai, Adriano também confronta a exatidão, a precisão e o rigor do pensamento matemático envolvido no My Maps. Ele confronta o espaço concebido da Matemática escolar que nos é imposto com o espaço percebido/vivido por ele e por seu pai. Tensões entre um modo de pensar e o fazer Matemática, calcado na racionalidade de matriz cartesiana que impregna a matemática escolar, e outros modos de pensar e fazer Matemática, como o protagonizado por Adriano, comparecem em outros estudos que investigam práticas de numeramento (Cabral, 2015CABRAL, V. R. S. "Nada é cem por cento": usos de conhecimentos matemáticos como táticas retóricas nas práticas discursivas de adolescentes atendidos pelo Centro de Referência de Assistência Social CRAS. 2015. 219 f. Tese (Doutorado em Educação) - Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2015. Disponível em: http://hdl.handle.net/1843/BUOS-AQRMMR. Acesso em: 10 maio 2022.
http://hdl.handle.net/1843/BUOS-AQRMMR...
; Fonseca, 2017FONSECA, M. C. F. R. Práticas de Numeramento na EJA. In: CATELLI JR., R. (org.). Formação e Práticas na Educação de Jovens e Adultos. São Paulo: Ação Educativa, 2017. p. 105-115 (Vol. 1).; Souza; Fonseca, 2018SOUZA, M. C. R. F.; FONSECA, M. C. F. R. Cenas de uma aula de matemática: território e relações de gênero na EJA. Pro-posições, São Paulo, v. 29, n. 3, p. 138-163, set./dez, 2018. Disponível em: https://doi.org/10.1590/1980-6248-2017-0048. Acesso em: 10 out. 2022.
https://doi.org/10.1590/1980-6248-2017-0...
; Grossi, 2021GROSSI, F. C. D. P. "Mas eles tinha que pôr tudo aí, ó! Isso tá errado, uai! ... Seis... Eu vou mandar uma carta prá lá, que ele não tá falando direito, não!": mulheres em processo de envelhecimento, alfabetizandas na EJA, apropriando-se de práticas de numeramento escolares. 2021. 305 f. Tese (Doutorado em Educação) - Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2021. Disponível em: http://hdl.handle.net/1843/38595. Acesso em: 20 out. 2022.
http://hdl.handle.net/1843/38595...
).

Ao interpelar o espaço concebido confrontando-o com os vividos no bairro, Adriano nos convoca a interrogar sobre a necessidade de se considerar, como apontam Souza e Fonseca (2018)SOUZA, M. C. R. F.; FONSECA, M. C. F. R. Cenas de uma aula de matemática: território e relações de gênero na EJA. Pro-posições, São Paulo, v. 29, n. 3, p. 138-163, set./dez, 2018. Disponível em: https://doi.org/10.1590/1980-6248-2017-0048. Acesso em: 10 out. 2022.
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, a vida de estudantes que é, muitas vezes, silenciada no território escolar. Em se tratando de adolescentes, Cabral (2015)CABRAL, V. R. S. "Nada é cem por cento": usos de conhecimentos matemáticos como táticas retóricas nas práticas discursivas de adolescentes atendidos pelo Centro de Referência de Assistência Social CRAS. 2015. 219 f. Tese (Doutorado em Educação) - Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2015. Disponível em: http://hdl.handle.net/1843/BUOS-AQRMMR. Acesso em: 10 maio 2022.
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, ao refletir sobre práticas de numeramento para esse grupo etário, afirma a necessidade de ouvir os/as adolescentes e conhecer a forma como eles/as expressam e leem o mundo. De acordo com o relato dos/as adolescentes da pesquisa de Cabral (2015)CABRAL, V. R. S. "Nada é cem por cento": usos de conhecimentos matemáticos como táticas retóricas nas práticas discursivas de adolescentes atendidos pelo Centro de Referência de Assistência Social CRAS. 2015. 219 f. Tese (Doutorado em Educação) - Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2015. Disponível em: http://hdl.handle.net/1843/BUOS-AQRMMR. Acesso em: 10 maio 2022.
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, percebemos que, de fato, existe um distanciamento entre a linguagem matemática escolar e a linguagem matemática estabelecida no e pelo cotidiano. A autora pontua que a escola não (re)conhece esse público de pessoas adolescentes como estudantes:

[...] Comecei a considerar que hoje, no contexto escolar, temos muitas dificuldades em lidar com essas e com esses jovens. Tais dificuldades nascem do desconhecimento a respeito delas e deles, de como vivem e sentem o mundo, onde estão inseridos e de como se relacionam com os conhecimentos, entre eles, os de matemática, dentro e fora da escola [...] (Cabral, 2015CABRAL, V. R. S. "Nada é cem por cento": usos de conhecimentos matemáticos como táticas retóricas nas práticas discursivas de adolescentes atendidos pelo Centro de Referência de Assistência Social CRAS. 2015. 219 f. Tese (Doutorado em Educação) - Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2015. Disponível em: http://hdl.handle.net/1843/BUOS-AQRMMR. Acesso em: 10 maio 2022.
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, p. 26).

Os/as adolescentes dessa investigação também fazem suas leituras de mundo (Freire, 1991FREIRE, P. A educação na cidade. São Paulo: Cortez, 1991.). Nesse movimento, eles/as tensionam, confrontam e/ou se solidarizam com os conhecimentos valorizados socialmente, parametrizados por um sistema capitalista e atualmente mais tecnológico, regido pelo controle e pela precisão das informações. Embora não percebam, ao narrarem sobre seus territórios vividos, eles/as protagonizam práticas de numeramento para interrogar o espaço concebido. Em todo esse processo, Adriano e os/as demais adolescentes têm muito a nos ensinar sobre seus pertencimentos territoriais.

4 Para concluir

Embora a plataforma My Maps seja rigorosamente estruturada com ícones, recursos e layouts predeterminados, durante a leitura e a elaboração dos mapas eletrônicos na atividade proposta pelas pesquisadoras, observamos como o vivido tem a ousadia de construir sobre e tensionar a estrutura e o sentido do mapa. Em sua elaboração, Adriano definiu o próprio mapa, indicando os lugares que frequenta e aqueles que lhes são interditados, e dentre os ícones disponibilizados pela plataforma, escolheu aqueles que melhor serviam à sua construção. Desse modo, o estudante definiu a sua estrutura sobre algo que estava posto e concebido. Com efeito, o estudante produz significados próprios de pertencimento e (não)pertencimento aos territórios do bairro Santa Helena, tornando-se protagonista, assim como os colegas que participaram da oficina, das práticas vividas e das práticas narradas.

Como as práticas de numeramento são marcadas pela cultura escrita, elas se inserem nas tessituras das práticas de letramento. Essa incorporação nos possibilitou identificar como os/as estudantes, em seus posicionamentos discursivos, exploraram, se apropriaram e fizeram uso de elementos linguísticos próprios dos ambientes virtuais. Desse modo, novos significados para esses elementos foram produzidos e novas maneiras de ler um mapa na tela de um computador e registrá-lo foram engendrados. O exercício em que nos empenhamos, neste artigo, apresenta outras perspectivas de estudos sobre a plataforma My Maps, que possibilitam práticas de letramento digital e se mostram como uma ferramenta potente para a produção de cartografias, para estudos que operam com território, com práticas de numeramento e, de modo geral, para o campo da Educação Matemática.

Agradecimentos

Agradecemos às agências de fomento que subsidiaram a realização desse estudo: Capes, CNPq e Fapemig.

Referências

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    » http://dx.doi.org/10.11606/gtp.v16i1.155748
  • 1
    ompreende-se narrativa na perspectiva lefebvriana na qual os sujeitos produzem o espaço em práticas cotidianas que além da materialidade são também práticas discursivas, permeadas pelo vivido, e, desse modo, tensionam discursos hegemônicos.
  • 2
    Grupo cadastrado no Diretório de Grupos de Pesquisa do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) desde 2005 e vinculado à linha de pesquisa em Educação Matemática do Programa de Pós-graduação em Educação: conhecimento e inclusão social da UFMG. Disponível em: https://sites.google.com/view/gen-numeramento. Acesso em: maio 2023.
  • 3
    O evento de numeramento é uma opção teórico-metodológica utilizada em trabalhos desenvolvidos pelo Grupo de Estudos sobre Numeramento (GEN). No material empírico que produzimos, essa opção nos ajudou a identificar situações, cenas, informações, interações discursivas entre participantes ou seus processos interpretativos em que esses/as participantes mobilizaram ideias e representações associadas a modos de quantificar, classificar, ordenar, medir, apreciar e organizar o espaço (Grossi, 2021GROSSI, F. C. D. P. "Mas eles tinha que pôr tudo aí, ó! Isso tá errado, uai! ... Seis... Eu vou mandar uma carta prá lá, que ele não tá falando direito, não!": mulheres em processo de envelhecimento, alfabetizandas na EJA, apropriando-se de práticas de numeramento escolares. 2021. 305 f. Tese (Doutorado em Educação) - Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2021. Disponível em: http://hdl.handle.net/1843/38595. Acesso em: 20 out. 2022.
    http://hdl.handle.net/1843/38595...
    ; Lima; Fonseca, 2022). Esses eventos não são cenas ou situações fortuitas. Inseridos em um contexto histórico, os eventos de numeramento são protagonizados por sujeitos sociais e históricos (Freire, 1992FREIRE, P. Pedagogia da Esperança: um reencontro com a Pedagogia do Oprimido. São Paulo: Paz e Terra, 1992.), por isso carregam e produzem uma história.
  • 4
    Pesquisa aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade em que o estudo foi realizado.
  • 5
    Ao ler a produção do autor, refletimos que o espaço, em suas construções teóricas, se apresenta consoante com estudos sobre Território, como argumenta Haesbaert (2014)HAESBAERT, R. Viver no limite: território e multi/transterritorialidade em tempos de insegurança e contenção. Rio de Janeiro: Bertrand, 2014.. Por isso, ao nos referirmos ao pensamento do autor, vamos utilizar a palavra espaço, preservando sua construção teórica, e adotamos a palavra território em outras discussões ao longo do texto.
  • 6
    Atribuímos nomes fictícios aos/às participantes da pesquisa para evitar, de alguma forma, a exposição de sua identidade.
  • 7
    Atribuímos nomes fictícios a endereços e ruas do bairro Santa Helena para evitar, de alguma forma, a exposição da identidade dos/as estudantes.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    01 Jul 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    12 Jul 2023
  • Aceito
    10 Nov 2023
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