Como a prática de Mindfulness influencia no tratamento de pacientes com dor crônica não oncológica associado ou não a outras terapias: revisão sistemática

RESUMO

JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS:

A dor crônica tem um impacto significativo na qualidade de vida dos pacientes e o uso de terapia farmacológica muitas vezes é insuficiente. As terapias baseadas em Mindfulness (Atenção Plena) apresentam-se de diversas formas e têm sido utilizadas como estratégia no manejo dessa condição. As práticas podem conduzir a atenção ao presente, auxiliar na reinterpretação da dor e aprimorar habilidades de controle físico e emocional via córtex cingulado, somatossensorial, opérculo parietal, cúneo e ínsula anterior. O objetivo deste estudo foi avaliar a Mindfulness quanto a sua influência na qualidade de vida dos pacientes com dor crônica não oncológica e as alterações neurais que essa prática promove, como maior ou menor ativação ou variação de tamanho de áreas como a ínsula e córtex cingulado, e como estas interferem na percepção da dor, tendo como finalidade verificar a aplicabilidade da Atenção Plena como método complementar ao tratamento nesse grupo de pacientes.

CONTEÚDO:

Revisão Sistemática submetida no banco de dados PROSPERO sob o número 359011. Realizou-se a busca nas bases de dados Pubmed, Medline, LILACS e DIALNET entre 2019 e 2022 com os descritores e operador booleano [(MINDFULNESS) AND (CHRONIC PAIN)]. Incluiu-se na seleção de artigos ensaios clínicos randomizados, estudos de coorte e estudos de caso controle nos idiomas inglês, espanhol e português. O risco de viés foi avaliado pelo ROB2 e a qualidade de evidência por meio do GRADE. Após análise, 10 estudos foram avaliados como essenciais para esta revisão. Foram incluídos os artigos que abordavam intervenção em Mindfulness para dor crônica que responderam e agregaram informações à pergunta da pesquisa e excluídos os artigos que não possuem o foco em “Mindfulness” e “dor crônica”, estudos sem livre acesso e textos cujos resultados não foram publicados até a data da busca. Para analisar as terapias de Mindfulness, os estudos, em sua maioria, abordam mais de 50 pacientes e usam escalas como o Brief Pain Inventory (BPI-DPN Q4), Patient Global Impression of Change (PGIC), Five Facet Mindfulness Questionnaire (FFMQ), Chronic Pain Acceptance Questionnaire (CPAQ) e Pain Catastrophizing Scale (PCS).

CONCLUSÃO:

A prática de Mindfulness é capaz de diminuir a dor crônica e melhorar sua percepção, aceitabilidade e qualidade de vida ao possibilitar a redução do sofrimento, ansiedade e estresse associados à dor por meio de alterações neurais. Por haver limitações nos estudos com relação à população-alvo específica e à padronização de avaliação, recomenda-se que artigos futuros abordem a prática em crianças, idosos e atletas com dor crônica, além de metodologia detalhada para avaliar e promover as sessões. Ressalta-se que a Mindfulness não é uma cura para a dor crônica, no entanto apresenta segurança e eficácia em seus diferentes protocolos de aplicação, com nível de evidência similar à terapia cognitiva comportamental.

Descritores
Atenção plena; Dor; Dor crônica; Meditação.

ABSTRACT

BACKGROUND AND OBJECTIVES:

Chronic pain has a significant impact on patients’ quality of life and the use of drug therapy is often insufficient. Therapies based on Mindfulness come in different forms and have been used as a strategy to manage this condition. Practices can guide attention to the present, help reinterpret pain and improve physical and emotional control skills via the cingulate cortex, somatosensory cortex, parietal operculum, cuneus, and anterior insula. This study seeks to evaluate the results of Mindfulness in terms of its influence on the quality of life of patients with chronic non-cancer pain and the neural changes that this practice promotes, such as greater or lesser activation or variation in size of areas as insula and cingulate cortex, and how these interfere with the perception of pain, with the aim of verifying the applicability of Mindfulness as a complementary method to treatment in this group of patients.

CONTENTS:

Systematic Review submitted to PROSPERO datadase under number 359011. The search was carried out in the Pubmed, Medline, LILACS and DIALNET databases between 2019 and 2022 with the descriptors and Boolean operator [(MINDFULNESS) AND (CHRONIC PAIN)]. The selection of articles includes randomized clinical trials, cohort studies and case control studies in English, Spanish and Portuguese languages. The risk of bias was assessed using ROB2 and the quality of evidence using GRADE. After analysis, ten studies were assessed as essential for this review. Articles that addressed Mindfulness intervention for chronic pain that responded and added information to the research question were included and articles that did not focus on “Mindfulness” and “chronic pain”, studies without free access and texts whose results were not published up to the date of the search were excluded. To analyze Mindfulness therapies, the majority of studies cover more than 50 patients and use scales such as the Brief Pain Inventory (BPI-DPN Q4), Patient Global Impression of Change (PGIC), Five Facet Mindfulness Questionnaire (FFMQ), Chronic Pain Acceptance Questionnaire (CPAQ) and Pain Catastrophizing Scale (PCS).

CONCLUSION:

The practice of Mindfulness can reduce chronic pain and improving its perception, acceptability and quality of life by enabling the reduction of suffering, anxiety and stress associated with pain through neural changes. As there are limitations in the studies regarding the specific target population and standardization of assessment, it is recommended that future articles address the practice in children, the elderly and athletes with chronic pain, in addition to a detailed methodology to evaluate and promote the sessions. It should be noted that Mindfulness is not a cure for chronic pain, however it presents safety and effectiveness in its different application protocols, with a level of evidence similar to cognitive behavioral therapy.

Keywords
Chronic pain; Meditation; Mindfulness; Pain.

DESTAQUES

• A prática de Mindfulness para dor crônica possui efeito positivo para diminuir a percepção da dor.

• Estudos demonstram que há alterações em ativações neurais durante e após a prática de atenção plena impactando na sensação nociceptiva.

• A terapia de Mindfulness para dor crônica pode reduzir o uso de fármacos como opioides.

DESTAQUES

• A prática de Mindfulness para dor crônica possui efeito positivo para diminuir a percepção da dor.

• Estudos demonstram que há alterações em ativações neurais durante e após a prática de atenção plena impactando na sensação nociceptiva.

• A terapia de Mindfulness para dor crônica pode reduzir o uso de fármacos como opioides.

INTRODUÇÃO

A dor crônica (DC) é considerada um problema de saúde pública mundial que afeta predominantemente o sexo feminino e, no Brasil, tem prevalência que varia de 23,02% a 76,17% e média nacional de 45,59%¹. Ademais, está entre as 10 condições médicas mais prevalentes no mundo, sendo causadora de um maior período de incapacidade, além de desencadear estresse físico e emocional, aumentando o risco de ansiedade, depressão, maior frequência dos pacientes nos serviços de saúde e, consequentemente, mais gastos públicos¹-⁴. Sabe-se que a DC pode ser resultado de um estímulo nociceptivo mecânico, térmico ou químico. A partir disso, o corpo produz um sinal que é transmitido por fibras nervosas até chegar ao sistema nervoso central (SNC). Além disso, modificações a longo prazo no SNC podem gerar dor, mesmo na ausência de estímulos neuronais contínuos. Os sinais atingem as partes sensoriais, cognitivas e a afetividade da pessoa, e assim podem interferir no seu estado emocional³-⁶.

A cronificação da dor é definida pela Associação Internacional para o Estudo da Dor como uma condição que persiste ou recorre por no mínimo três meses. Ela pode ocorrer na ausência de lesão e pode ser decorrente de um processo mórbido⁷. Como um complexo sintoma, a DC pode ser dividida teoricamente em grupos: (1) dor primária, como a cefaleia, quando se apresenta como queixa única ou (2) dor secundária à doença subjacente, como a dor relacionada ao câncer ou a pós-traumática⁷. Diante disso, entende-se a complexidade do tratamento farmacológico do paciente com dor, o qual não é livre de efeitos adversos e que podem afetar ainda mais a qualidade de vida do indivíduo⁸-¹¹.

Posto isto, tem-se a Mindfulness (Atenção Plena) definido como uma terapia que envolve o modo de controle da própria atenção, com a qual a capacidade de percepção de cognição, emoção e sensação são melhoradas, reduzindo o sofrimento associado a dor, sem fixação em pensamentos do passado e do futuro²,⁶,⁸. Com a prática da terapia, nota-se a diminuição da ativação de áreas relacionadas à dor, como o córtex cerebral e melhora nas regiões de processamento da dor. Esse processo explicita como diferentes sinais neurais podem diminuir ou intensificar a sensação de dor e como informações sensoriais e emocionais interagem²,⁶,⁸. Essa terapia pode ser promovida por meio de uma variedade de técnicas, como Mindfulness da respiração com foco corporal consciente, que trabalha a atenção do paciente com dor na própria respiração e outras sensações corporais fisiológicas, nos movimentos da inspiração e expiração, sensações que são esquecidas no dia a dia²,⁶,⁸,¹⁰-¹³. Quando estabelecida a atenção à respiração altera-se a maneira como o paciente responde à dor, tornando-a mais tolerável²,⁶,⁸,¹⁰-¹³.

Nesse contexto, as Intervenções Baseadas em Mindfulness (MBI’s) se tornaram alvo de pesquisas visando ao manejo da dor e suas consequências. Considerando o estilo de vida atual, a intenção da prática de Mindfulness é fazer com que o praticante escolha estar plenamente atento ao seu corpo e pensamentos, e que se esforce para alcançar essa meta. Para isso, também não pode haver julgamento quanto aos sentimentos e ao conteúdo de pensamento que surgirem, aceitando todos os sentimentos, pensamentos e sensações como legítimos^10,12-14.

O objetivo deste estudo foi avaliar como a terapia de Atenção Plena influencia no processo saúde-doença do paciente com DC não oncológica, em relação à qualidade de vida e às alterações neurais promovidas pela prática de Mindfulness, as quais influenciam na percepção e no controle da dor. Além disso, busca-se sintetizar os resultados a fim de gerar informações seguras no âmbito da saúde e ampliar a problematização no cenário de Mindfulness, não o limitando às discussões de terapias integrativas e complementares.

CONTEÚDO

Esta revisão sistemática se utilizou das recomendações do Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses (PRISMA)¹⁵. A pergunta norteadora da pesquisa é: “Como a prática de Mindfulness pode influenciar no processo de saúde-doença de pacientes com dor crônica?” estruturada e organizada pelo acrônimo PICO (Tabela 1). Esta revisão sistemática foi submetida no banco de dados PROSPERO sob o número 359011.

Tabela 1
Estratégia de pesquisa PICO

Acrônimo	Usado neste estudo
P (paciente)	Pacientes com dor crônica não oncológica
I (intervenção)	Prática de Mindfulness
C (controle)	Dor crônica associada ou não a outras terapias farmacológicas ou não prévias e em andamento
O (desfecho)	Processo saúde-doença

Para a elaboração deste estudo realizou-se um levantamento em junho de 2022 nas bases de dados Pubmed, Medline, LILACS, DIALNET no período de 2019 a 2022. Os descritores empregados na busca foram selecionados a partir do dicionário Descritores em Ciências da Saúde (DeCS) e Medical Subject Heading Terms (MeSH), considerando artigos em português, espanhol e inglês, sendo os descritores e os operador booleano: [(MINDFULNESS) AND (CHRONIC PAIN)]. Priorizou-se na busca os artigos que possuem maior grau de recomendação pelo “Oxford Centre for Evidence-based Medicine”, que são “Ensaio clínico randomizado”, “Estudos de Coorte” e “Estudos de caso controle”.

Essa busca foi motivada pelo aumento da relevância do tema, evidenciado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), que em 2017 incluiu a Mindfulness nas recomendações de Práticas Integrativas e Complementares em Saúde (PICS) para a promoção da saúde mental. A Universidade de Harvard, que é reconhecida pela sua competência em produção de estudos e pesquisas relevantes para a sociedade, publicou uma nota em seu portal em 2019 sobre a crescente propagação da prática de Mindfulness. Outro indício desse amplo destaque foi que recentemente empresas como a Google^®, Intel^® e Apple^® inseriram a Mindfulness visando ao bem-estar e à produtividade no trabalho¹⁶-²⁰.

COLETA DE DADOS

A extração dos dados para o processo de elegibilidade dos estudos foi realizada utilizando-se tabelas nos programas Excel, Word e Google Docs. Após a triagem dos estudos, os artigos selecionados foram revisados e os dados foram extraídos de forma padronizada pelas autoras, identificando-se autor, ano de publicação, população, amostra, intervenção, comparador e conclusão do estudo (Tabela 2). Sistematizou-se, assim, as evidências sobre Mindfulness aplicado em pacientes que vivem com DC e sua influência nesse processo de saúde-doença.

Tabela 2
Avaliação da qualidade dos artigos pela escala GRADE

Autores/Critérios	Hussain e Said6	Garland et al.10	Seng et al.13	Seminowicz et al.24	Pardos-Gascón et al.4	Hanley, Gililland e Garland11	Brintz et al.8	Ball et al.12	Brintz et al.21	Day et al.9
Risco de viés	NG	NG	NG	NG	NG	NG	NG	NG	NG	NG
Inconsistência	NG	NG	NG	NG	NG	NG	NG	G	G	NG
Evidência indireta	NG	NG	NG	NG	NG	NG	NG	NG	NG	NG
Imprecisão	NG	NG	NG	NG	NG	NG	NG	NG	G	NG

AVALIAÇÃO DA QUALIDADE METODOLÓGICA E RISCO DE VIÉS

Para verificar a qualidade de evidência e a recomendação dos artigos incluídos aplicou-se a ferramenta Grading of Recommendations Assessment, Development and Evaluation (GRADE)²¹, que utiliza critérios específicos para avaliar os estudos, como: limitações do estudo, inconsistência de resultados, indiretividade da evidência, imprecisão e viés. O GRADE classifica as recomendações em fortes ou fracas com base na qualidade da evidência apresentada. Com a ferramenta foi observada notável confiabilidade na maioria dos estudos, exceto por uma inconsistência na aceitabilidade de um aplicativo utilizado no estudo que tem como população específica mulheres com lombalgia¹², e uma inconsistência e grave imprecisão na análise de efeitos de Mindfulness no estudo que envolveu soldados na ativa²². Esses resultados indesejáveis são justificados por haver limitação na análise e aceitabilidade da intervenção e por não ser especificada a quantidade de militares no estudo, bem como a coleta dos dados feita de forma qualitativa e subjetiva no outro estudo⁸,¹²,²².

Para a análise de viés dos estudos de ensaio clínico foi usado o Revised Cochrane risk-of-bias tool for randomized trials (ROB 2.0), ferramenta recomendada pela Cochrane. Essa ferramenta avalia o risco de viés abrangendo os domínios: viés de seleção, viés de desempenho, viés de detecção, viés de seguimento, viés de relato e outros tipos de viés. O ROB2 demonstrou baixo risco de viés em quatro dos cinco domínios, no entanto, o método de avaliação dos resultados diferiu entre os estudos, sendo obtido alto risco global.

RESULTADOS

Após a busca eletrônica, foram organizados os 84 artigos encontrados na busca inicial, revisados para verificação de duplicidade e filtrados inicialmente pelo título de forma independente pelas autoras. Destes, 50 estudos que não possuíam “Mindfulness” e “dor crônica” nos títulos foram excluídos. Na sequência, com a análise dos resumos dos 34 trabalhos filtrados, aqueles que não tinham como foco a terapia Mindfulness para pacientes com DC não oncológica foram descartados, assim como revisões e textos em que não havia seu método de pesquisa esclarecido, resultando em 4 exclusões. A seguir, efetuou-se a leitura na íntegra dos 30 artigos selecionados, permanecendo 10 estudos que respondiam à pergunta da pesquisa e foram avaliados como essenciais para esta revisão sistemática. Os artigos não gratuitos e aqueles cujos resultados ainda não haviam sido publicados também foram excluídos. Estudos em inglês ou espanhol foram traduzidos pelas próprias autoras. A busca pelos artigos selecionados foi organizada em um fluxograma (Figura 1), com o número de incluídos e excluídos em cada etapa, assim como os motivos de exclusão.

Figura 1
Fluxograma de seleção dos estudos

Na avaliação da qualidade metodológica com a escala GRADE²¹, as análises de Grave (G) ou Não Grave (NG) foram realizadas pelas 3 revisoras independentes (Tabela 2). Em dois artigos, avaliou-se inconsistência nos dados apresentados. Em um artigo avaliou-se a imprecisão dos resultados. Os outros oito artigos foram classificados como Não Grave para risco de viés, inconsistência, evidência indireta e imprecisão, sendo de alta qualidade para esta revisão. A tabela 3 mostra separadamente cada artigo.

Tabela 3
Características dos estudos incluídos

Autores	População Amostra	Intervenção	Comparador e medições	Conclusão
Hussain e Said6	Mulheres com neuropatia diabé- tica, Idade >55 anos. n=105	MM; PM; MC.	Intervalo de controle: 4, 8 e 12 semanas com as escalas BPI-DPN Q4, PGIC.	Os grupos MM e PM obtiveram uma redução significativa (p<0,05) na média de dor diária em comparação com a linha basal. O grupo MC não apresentou uma redução (p>0,05) nos escores e não apresentou uma alteração significativa na PGIC.
Garland et al.10	Pacientes com dor crônica, em uso diário de opioides. Média de idade 47 anos. n=57	MM; PM; MC.	Intervalo de controle: 1ª e 10ª semanas com o teste Go/NoGo, avaliado com FFMQ e BPI-SF.	Um maior tempo de prática de MORE previu melhoras na precisão NoGo em testes com distratores relacionados à dor (p=0,03).
Seng et al.13	Pacientes com enxaqueca. Média de idade: 40 anos. n=60	MM; MBCT; BT.	Controle: registro de dor em 30 dias com a escala HDI e MIDAS.	Nos pacientes da intervenção com o MBCT o efeito da dor grave decresceu na escala MIDAS de 88,3% do início para 66,7% (p<0,001).
Day et al.9	Pacientes com lombalgia crônica. Idade > 18 anos. n= 69	MM, MBCT, Terapia Comportamental (TC).	Intervalo de controle: 1º dia, 3 e 6 meses, avaliando seu impacto com as escalas PCS, CPAQ, PROMIS Depression Scale e FFMQ.	Pacientes relataram melhora na interferência da dor e intensidade da dor, respectivamente: no grupo MM de 31% e 44%; no grupo TC de 42% e 32%; e no grupo MBCT de 45% para os dois parâmetros.
Seminowicz et al.23	Pacientes com enxaqueca. Idade: 18-65 anos. n=98	MBSR +.	Controle: 8 semanas, depois quinzenalmente por mais 8 semanas, comparando o MBSR+ com o SMH e HIT-6.	Obteve-se redução de 50% de dias com cefaleia na intervenção com MBSR+ (p=0,0008), comparado a 23% no grupo SMH (p=0,04). Ambos os grupos apresentaram mudanças neurofisiológicas (p<0,05).
Brintz et al.8	Pacientes com dores crônicas. Idade > 18 anos. n=23	MBSR +.	Intervalo de controle: 1ª e 5ª semanas, com as escalas CPAQ, PCS e PSS-4.	Houve diminuição de intensidade (p=0,05) e interferência da dor (p=0,017), depressão (p=0,005), distúrbios do sono (p=0,001), aumento do afeto positivo (p=0,016) e da aceitação da dor (p<0,001) pós-intervenção.
Ball et al.12	Mulheres com dor pélvica crônica. Média de idade: 35 anos. n=90	MM via aplicativo Headspace.	Intervalo de controle: 1ª e 61ª semanas, coletando o feedback individual das pacientes sobre o uso do app utilizando a ferramenta NPT.	Das pacientes que usaram o aplicativo, 77% afirmaram relaxar, desestressar, concentrar-se e reavaliar a vida. Porém, não foi possível avaliar com precisão o impacto na dor devido ao uso limitado do aplicativo. A MM deve ser individualizada para ser efetiva.
Brintz et al.21	Soldados em ativa que estão em tratamento vigente para dor crônica. Idade >18 anos. n= *	MM via aplicativo The Mindfulness Training for Pain.	Intervalo de controle: diariamente, durante 8 semanas, o MM foi avaliado com feedback individual, após cada sessão utilizando as ferramentas Depression Scale, Health Survey 12 e Medicalo.	A MM foi recomendado pela Pain Management Task Force como tratamento de primeira linha e o aplicativo possibilitou atingir um maior número de soldados simultaneamente, por estar disponível online.
Pardos-Gascón et al.4	Pacientes com dores crônicas. Idade: 32-79 anos. n=57	MBCT.	Intervalo de controle: 1ª e 10ª semanas com o T-Test, a Visual Analogue Scale, Hospital Anxiety Outcomes Study Sleep Scale, Chronic Pain Self-Efficacy Scale (CPSS), CPAQ e Mindful Attention Awareness Scale.	Com a aplicação de Mindfulness houve melhora na intensidade da dor (p=0,004), qualidade de vida mental (p=0,005) e depressão (p=0,003), assim como na autoeficácia no controle dos sintomas, da dor e um efeito significativo, após a terapia, nos distúrbios do sono (p<0,05).
Hanley, Gililland e Garland11	Pacientes com dor crônica ortopédica refratários a outros tratamentos não operatórios. Média de idade: 65 anos. n=118	MD; MR; IPDCC.	Intervalo de controle: dias 2, 3, 7, 14, 21, 28 pós-operatório de artroplastia, comparando os grupos MD, MR e IPDCC, avaliando a intensidade (0-10) e aceitabilidade da dor (0-10) e o uso de opioide (questão: “você usou fármacos opioides nas últimas 24 horas?”).	A intervenção pode ser capaz de prevenir a dor pós-operatória, diminuir a interferência da dor e uso de opioides nos pacientes. Após a cirurgia, os pacientes do grupo MD relataram menor intensidade da dor (p=0,026) e menor interferência da dor (p<0,001).

= Mindfulness Meditation;Progressive Relaxation Meditation;= Meditation Control;Mindfulness-Based Cognitive TherapyWaitlist/ treatment as usual;Mindfulness based stress reduction;= Mindfulness= Mindfulness= Brief Pain Inventory;= Patient Global Impression of Change;= Five Facet Mindfulness Questionnaire;-SF = Brief Pain Inventory;= Pain Catastrophizing Scale;= Chronic Pain Acceptance Questionnaire;= Headache Disability Inventory;= Migraine Disability Assessment;= Perceived Stress Scale;= Stress Management for Headache;= Headache Impact Test;= Mindfulness-Oriented Recovery EnhancementChronic Pain Self-Effica;y ScaleNormalisation Process Theory.
• ^*
  Estudo não apresentou o número de participantes²².

Um estudo⁶ que abordou DC relacionada à neuropatia diabética incluiu 105 pacientes com esta condição, aleatoriamente distribuídos em 3 grupos Mindfulness Meditation (MM), Progressive Relaxation Meditation (PM), Meditation Control (MC), que receberam 16 sessões de atendimento durante 8 semanas. A média de idade dos participantes foi de 62,9 anos e com diagnóstico da diabetes tipo 1 ou 2 há 13 ± 1,3 anos. A duração de cada sessão semanal de Mindfulness foi de 35 minutos e a avaliação foi feita em intervalos de 4, 8 e 12 semanas com as escalas: BPI-DPN Q4 e PGIC, avaliando DC e satisfação com a técnica e impressão do paciente sobre a dor. Os grupos MM e PM obtiveram redução significativa (p<0,05) na média de dor diária comparada à basal. Ao final do estudo foi evidenciada a melhora na impressão da dor pelos escores de satisfação do paciente no grupo MM, que aumentaram significativamente (p<0,05) de 2,0±1,0 para 3,8±1,9 na semana 12 de tratamento. Inicialmente no grupo PM, o basal de satisfação era 2,1 e melhorou para 3,0 e, no grupo MC, a satisfação aumentou de 2,2 para 2,7 no mesmo período de tempo. Contudo, o grupo MC não apresentou uma redução (p>0,05) nos escores e não alterou significativamente a impressão global de mudança, a média da dor de 5,0±1,9 foi para 4,9±1,0 na semana 12 e a intensidade da dor -0,5±0,213.

Um projeto experimental⁴ espanhol aplicou a Mindfulness-Based Cognitive Therapy (MBCT) em pacientes de mais de 20 anos de idade com dores crônicas. O estudo foi composto por oito sessões semanais em grupo com duração de cerca de uma hora e meia, com avaliações pré e pós-teste. Após a comparação, o estudo indicou um resultado de efeito médio (p<0,05) com a aplicação de Mindfulness na intensidade da dor presente (p=0,004), qualidade de vida mental (p=0,005) e depressão (p=0,003), assim como na autoeficácia no controle dos sintomas (p=0,000), autoeficácia no controle da dor (p=0,000) e um efeito significativo, após a terapia, nos distúrbios do sono (p=0,000)⁴.

Um estudo sobre cefaleia crônica¹³ randomizou 60 participantes com média de 40 anos de idade aplicando tanto a MBCT como o Waitlist/Treatment as usual (WL/TAU), sendo que aproximadamente metade dos participantes estava em uso de fármacos preventivos para migrânea. Ao final, 29 pessoas completaram a MBCT e 21 completaram WL/TAU e forneceram entrevistas; 18 de 21 relataram benefícios com a intervenção e a recomendariam. Aproximadamente metade dos entrevistados da MBCT solicitou continuar o tratamento após a conclusão do estudo. De acordo com a avaliação da ferramenta MIDAS, o efeito da dor intensa decresceu de 88,3% do início para 66,7% no mês 4 (p< 0,001). Por fim, as pontuações médias do HDI diminuíram no grupo com MBCT, enquanto aumentaram no grupo controle (p=0,007). Apenas dois eventos adversos foram relatados: um participante experimentou uma lembrança vívida de um evento traumático; e outro relatou aumento da frequência e da intensidade da dor. Em conclusão, a terapia demonstrou reduzir a incapacidade relacionada à cefaleia e a incapacidade relacionada às crises de enxaqueca¹³.

Outro estudo²⁴, sobre cefaleia, foi realizado nos Estados Unidos da América com 98 pessoas entre 18 e 65 anos que preenchiam os critérios da Classificação Internacional de Cefaleias para enxaqueca. Em 50 participantes, a intervenção realizada foi a MBSR+ e, em 48, a aplicação do SMH. Ambas intervenções foram realizadas nos pacientes 2 horas semanais por 8 semanas, depois quinzenalmente por mais 8 semanas. Obteve-se redução de 50% de dias com cefaleia na intervenção com MBSR+ (p=0,0008), comparado a 23% no grupo SMH (p=0,04). Considerando a neurofisiologia, pela Ressonância Magnética (RM), ambos os grupos apresentaram diminuição do volume do córtex cingulado anterior/médio (p=0,04) e diminuição da conectividade da ínsula anterior dorsal direita com a rede de tarefas cognitivas (p=0,02). O grupo MBSR+ apresentou ativação diminuída no cúneo bilateral e no opérculo parietal direito e relatou também escores HIT-6 reduzidos em comparação com o grupo SMH (p=0,004). O impacto da dor de cabeça e intensidade de dor não diferiram entre os grupos. Conclui-se que o MBSR+ pode ser uma opção de tratamento profilático eficaz para enxaqueca episódica, assim como o ácido valproico utilizado atualmente²⁴.

A aplicação do MBSR+ foi realizada de forma adaptada em outro estudo⁸, no qual foram feitas quatro sessões semanais de 90 minutos para pacientes acima de 18 anos que afirmaram conviver com dores crônicas. Eles foram avaliados na primeira e quinta semanas por meio das escalas CPAQ, PSS-4 e PCS. Observou-se após a análise de resultados uma diminuição de intensidade (p=0,05) e interferência da dor (p=0,017), depressão (p=0,005), distúrbios do sono (p=0,001), e aumento do afeto positivo e bem-estar (p=0,016), bem como da aceitação da dor (p<0,001) após intervenção⁸.

Um estudo⁹ realizado na Austrália considerou 69 participantes com diferentes doenças ortopédicas e reumáticas que envolviam a DC como seu principal sintoma. Eles foram divididos igualmente em três intervenções (MM, MBCT e TC). A duração das sessões em grupo foi de duas horas semanais e da prática individual de 45 minutos em pelo menos seis dias da semana. As evidências mostram que a MBCT é um tratamento viável, tolerável e aceitável, com resultados semelhantes em magnitude a uma intervenção de TC, sendo que houve melhora na função física (p<0,001), nos escores de depressão (p=0,002) e ambos os grupos TC e MBCT (p=0,03) relataram melhora maior do que o grupo MM. O uso de opioides na última semana diminuiu até o acompanhamento de três meses (p=0,03), mas no pós-tratamento e no acompanhamento de seis meses não foram significativamente menores (p=0,289 e 0,065). No desfecho do estudo, a porcentagem de indivíduos que relataram melhora significativa para interferência da dor e intensidade da dor foi de, respectivamente, 31% e 44% no grupo MM, 42% e 32% no grupo TC e 45% no grupo MBCT para os dois parâmetros.

De forma complementar, outro estudo¹¹ com pacientes na média de 65 anos com dores decorrentes de condições ortopédicas usou como intervenção a MD, MR e IPDCC. As três práticas foram aplicadas uma vez por aproximadamente três semanas antes das cirurgias de prótese de quadril e joelho e tiveram duração de 20 minutos. Um total de seis questionários pós-operatórios foram administrados ao longo do mês seguinte à cirurgia, sendo aplicados no 2º, 3º, 7º, 14º, 21º e 28º dias de pós-operatório. A intensidade da dor e a interferência da dor foram medidas em escala numérica (0-10) e o uso de opioides foi medido com um único item: “Você tomou fármacos opioides nas últimas 24 horas”? Após a cirurgia, os pacientes do grupo da MD relataram significativamente menor intensidade da dor (p=0,026) nos dias pós-operatórios 14, 21 e 28, e menor interferência da dor (p<0,001) nos dias pós-operatórios 21 e 28. Os pacientes que receberam a intervenção baseada em Mindfulness no pré-operatório relataram um uso significativamente menor de opioides após 21 dias da cirurgia. Sugere-se que uma intervenção pré-operatória baseada em Mindfulness pode ser capaz de prevenir a dor pós-operatória¹¹.

Nos EUA, um estudo¹⁰ envolveu participantes que haviam feito uso diário de opioides nos últimos 90 dias que antecederam a pesquisa. Utilizou-se o método Go/NoGo Trial e as escalas FFMQ e BPI-SF para avaliar a interferência da dor nos testes na primeira e última semana pré e pós-tratamento com MORE e SG, com duração de duas horas diárias por oito semanas, além de 15 minutos praticados individualmente. Os resultados indicaram que houve mais erros quando sinais relacionados à dor estavam presentes (p=0,02) em comparação com a presença de sinais neutros, sugerindo a interferência do emocional nas respostas inibitórias. O efeito grupo × tempo × condição demonstrou que o grupo MORE experimentou melhoras significativamente maiores na precisão NoGo em tentativas com distratores relacionados à dor em relação a tentativas com distratores neutros (p=0,047); além de reduções maiores na intensidade da dor desde o pré-tratamento até o acompanhamento de três meses do que o SG (p=0,01). Maior número de minutos de prática de meditação Mindfulness ao longo do tratamento previu melhoras na precisão NoGo em testes com distratores relacionados à dor (p=0,03)¹⁰.

Um outro estudo²² envolveu soldados na ativa com grupos variáveis de até 40 participantes que foram submetidos à MM através do aplicativo The Mindfulness Training for Pain, com duração de seis sessões síncronas semanais de 60 minutos, além de materiais didáticos, meditações guiadas, recursos de Mindfulness e informações de suporte profissional. Os participantes foram avaliados mediante feedback individual após cada sessão. A intervenção foi embasada na recomendação da Pain Management Task Force e demonstrou-se relevante e sensível, mesmo tendo em vista a cultura militar ser resistente a terapias integrativas e complementares e, embora o artigo não tenha apresentado desfechos sobre os resultados para a dor em si, o estudo sugere ter potencial para ampliar o uso da MM como tratamento complementar²¹.

Por fim, um estudo¹² europeu realizado com 90 mulheres com dor pélvica crônica usou como intervenção o aplicativo Headspace para aplicar MM. A duração da sessão foi de 10 minutos nos primeiros 10 dias, 15 até o dia 20, e 20 até o dia de número 60. Das participantes, 31 foram direcionadas ao grupo de intervenção, 30 ao grupo controle ativo e 29 ao grupo que manteve cuidados usuais como fármacos. A partir disso, 10% das participantes do grupo controle relataram pouca motivação e benefício ao usar o aplicativo, tendo dificuldades com a tecnologia e outros 10% disseram que o aplicativo não reduziu a dor, mas que as colocou mais em sintonia com seus corpos e sua respiração. Uma paciente disse que o fármaco não estava funcionando, mas o aplicativo sim. Setenta e sete por cento das pacientes falaram sobre relaxar, desestressar, ou se concentrar e reavaliar a vida, assim como as que experimentaram o aplicativo sem Mindfulness. Ainda sobre as pacientes da intervenção, 20% disseram usar técnicas aprendidas, por exemplo, no trânsito ou sentando-se e fazendo uma pausa geral. Este estudo não trouxe um padrão claro em relação ao impacto da dor com o uso do aplicativo, contudo, é um alerta de como é preciso individualizar tratamentos e não encaixar pacientes em técnicas de MM generalizado¹².

DISCUSSÃO

A DC possui um impacto significativo na qualidade de vida das pessoas, pois aumenta o risco de desenvolver e agravar condições como ansiedade e depressão, além de afetar a capacidade de atividade laboral com prejuízos financeiros pela incapacidade funcional⁴,⁹,¹¹,²². Pacientes com DC possuem um estímulo persistente que influencia as áreas cerebrais, fato que é analisado na teoria do gate control, a qual sugere que a atividade cognitiva ou motivacional pode modular a sensação dolorosa⁶. Há diversas regiões cerebrais que são influenciadas pelo estímulo nociceptivo mecânico, térmico ou químico, porém as regiões primárias de processamento da dor são a ínsula, o córtex somatossensorial e o tálamo. Um estudo²⁴ que avaliou pessoas com crises de enxaqueca observou que uma das áreas cerebrais mais afetadas é a ínsula, em conjunto com o córtex pré-frontal dorsolateral esquerdo e o córtex cingulado anterior, desencadeando déficits cognitivos e emocionais nos pacientes⁶,24.

Outro estudo¹⁰ mostrou que pacientes com DC estavam mais vulneráveis a déficits de resposta nas funções cognitivas e houve atenuação da resposta relacionada ao controle inibitório nos córtices cingulado anterior e pré-motor. A ínsula é a responsável por integrar informações sensoriais, o córtex pré-frontal dorsolateral por processar informações momentâneas, o córtex cingulado anterior por regular emoção e aprendizado e o córtex pré-motor auxilia na organização dos movimentos e ações⁶,¹⁰,24. As terapias baseadas em Mindfulness modulam essa relação entre estressores agudos e respostas fisiológicas. A dor diminui agudamente com mecanismos corticais e talâmicos, como a retransmissão de sinais para os sistemas sensitivos, o controle emocional e da motricidade, influenciando a eficiência cognitiva e o controle da dor a longo prazo. As características da modulação da dor dependem do tipo de meditação e da duração dela, com diferenças singulares entre os praticantes⁶.

Há várias opções de práticas de Atenção Plena. A MR conduz a atenção para o presente ao focar na respiração, sem alterações e sem julgamento, reduzindo a intensidade da dor e o desconforto. A MD fornece um meio de exposição interoceptiva à dor; a atenção separa sensações físicas de emocionais e avaliações de dor, além de atenuar as avaliações catastróficas e afetivamente carregadas. A técnica do MORE ajuda os pacientes a reinterpretar a dor crônica como informação sensorial inócua com menos efeitos¹¹. A prática do MBSR é a intervenção dentro da Atenção Plena mais explorada, envolve o treinamento em uma variedade de habilidades, incluindo respiração, movimento e alimentação consciente, varredura corporal e práticas de compaixão. Com isso, melhora a saúde mental e física em condições como depressão, ansiedade, dor crônica e transtornos por uso de substâncias²,²². A MBCT envolve a meditação da Atenção Plena e habilidades cognitivo-comportamentais, enfrentando crenças mal-adaptáveis relacionadas à doença. Inicialmente seu objetivo era prevenir a recaída da depressão, no entanto, foi modificada para abordar uma variedade de condições cronicamente dolorosas²,¹³. Iniciantes em Mindfulness mostram aumento no processamento nociceptivo no córtex cingulado anterior e na ínsula anterior e ativação reduzida do córtex somatossensorial primário, localizado na porção anterior dos lobos parietais e responsáveis pela consciência da nocicepção. Os mais experientes diminuem a ativação das regiões do córtex pré-frontal dorsolateral e ventrolateral, região de particular importância para o sucesso da reavaliação cognitiva e melhoram as regiões primárias de processamento da dor⁶,¹⁰,24. Além disso, o aumento da eficiência cognitiva, conquistada pela prática de Mindfulness, também contribui para o controle da dor em praticantes de longo prazo^6,10,24.

O estudo¹⁰ de Atenção Plena aplicada como MORE observou o bloqueio de informações nociceptivas e da atividade cerebral corticotalâmica. No estudo²⁴ com a MBSR, nenhum efeito foi observado primariamente com neuroimagem, mas análises secundárias de todo o cérebro sugeriram aumento na eficiência cognitiva e diminuição da ativação do opérculo parietal, importante para o componente motor da fala, e do córtex visual (cuneus) durante um desafio cognitivo utilizado pelo estudo, tanto em meditadores de longo prazo quanto em indivíduos treinados em MBSR. Ademais, com a MBSR houve uma conectividade neural de repouso reduzida da ínsula anterior ao córtex parietal e ao cuneus após seu treinamento, aumentando a eficiência cognitiva e efeito de atenuação da dor pela meditação¹⁰,24. As técnicas de Mindfulness foram recomendadas como um tratamento de primeira linha para dor lombar crônica pela Veterans Health Administration, pela Army Pain Management Task Force, Agency for Healthcare Research and Quality e American College of Physicians¹¹,²², visto que, além da Atenção Plena melhorar a aceitação da dor, a inibição de resposta à dor, aprimorada com tempo de prática, diminui a evitação e catastrofização dessa sensação. A terapia também facilita identificar e tratar o estado hiperalerta perante sensação nociva⁴,¹⁰,¹¹,¹³,²². Nesse sentido, a Atenção Plena associada a um plano multidisciplinar é útil para diminuir a utilização de fármacos como os opioides¹⁰. Por meio do treinamento da Atenção Plena, os indivíduos com DC cultivam imparcialidade em relação às sensações corporais. Aumentar a atenção a sensações agradáveis em locais próximos ou distantes da dor é ponto chave no processo, o que foi mencionado também no contexto cirúrgico¹⁰,¹¹,²².

Para mais, aplicativos com foco em Mindfulness são benéficos para a ampliação da prática e são uma alternativa segura e barata aos pacientes interessados. Se comparados aos fármacos utilizados atualmente para controle da dor, os gastos necessários para terapia por apps são ínfimos¹²,¹³. O aplicativo Headspace é um exemplo que se mostra útil inclusive nos momentos escolhidos pelos pacientes quando mais precisam de alívio da dor e estresse²³. A partir disso, nota-se que as terapias Mindfulness são promissoras pela capacidade de reduzir a DC, uma vez que não apresentam risco de dependência ou abuso⁴,¹². Entretanto, a Atenção Plena é uma terapêutica que pode apresentar eventuais efeitos adversos como o aumento da dor na postura sentada, aumento da atenção à dor, adormecer durante a prática, sofrimento emocional envolvendo ansiedade, irritação e fadiga⁶,²². Somado a isso, há algumas dificuldades elencadas pelos artigos para a aplicabilidade de Mindfulness. A necessidade de um nível de escolaridade mínimo dos pacientes para seguir os comandos e a capacidade limitada de detectar os efeitos pelos aplicadores do projeto são citados como exemplos. Além disso, há a necessidade de mentores especializados, de habilidade com o manejo de aplicativos voltados à Mindfulness, de compromisso individual com o tratamento e da dedicação de tempo a cada sessão. Sendo esta última a principal razão pela recusa de participação nos estudos de intervenção de Atenção Plena¹², ²².

Apesar das limitações, há benefícios para a saúde com a prática de Mindfulness em diversos âmbitos, seja físico, mental ou espiritual¹¹. Há melhorias relacionadas à saúde mental, ao sono, à autoconsciência nas atividades diárias, ao aprimoramento da precisão em testes de memória de trabalho, ao processamento visuoespacial e à autocompaixão, além de gerar uma capacidade otimizada em acessar a sensação de calma e foco¹⁰,¹³,²².

CONCLUSÃO

A prática de Mindfulness em pacientes com DC não oncológica se demonstrou relevante pois proporciona qualidade de vida ao paciente ao possibilitar a redução da intensidade da dor, sofrimento, ansiedade e estresse associados. Isso porque a prática promove alterações neurais como diminuição do volume do córtex cingulado, ativação diminuída em ínsula, no cúneo e no opérculo parietal. Em praticantes de longa data há ativação diminuída nas regiões do córtex pré-frontal, com melhoras nas regiões primárias de processamento da dor e aumento da eficiência cognitiva que contribui para o controle da dor.

Além disso, essa prática permite diminuir custos com fármacos pela redução do uso de opioides, diminuindo a dependência de fármacos, sendo uma boa opção e uma forma de autocuidado. Embora sua aplicação seja subutilizada, possui apoio em evidências científicas e é uma terapia subsidiária segura e efetiva, podendo ser prescrita de maneira individualizada, com baixo risco e custo, com evidências para sua recomendação.

A partir deste trabalho, observou-se a necessidade de mais estudos em pacientes pediátricos, idosos e em atletas (oncológicos e não oncológicos), visto que as dores nesses grupos se associam a fatores psicossociais específicos, interferindo em como a terapia pode agir. Ademais, há a necessidade de um acompanhamento de maior duração (>1ano), maior amostra de pessoas estudadas (>100), maior detalhamento sobre histórico médico, tempo com dor e seus causadores (acidentes, amputações, doenças crônicas), uso de fármacos contínuos e de limitações diárias, para que os desfechos tenham maior impacto estatístico.

Sugere-se a pesquisadores futuros que procurem focar em um tipo e tempo de dor para que os resultados sejam mais direcionados, diminuindo vieses de intensidade, duração e frequência. Além disso, é importante a busca de métodos para avaliar as sessões de Mindfulness, com questionários padronizados e voltados a contextos específicos. Assim, futuros ensaios clínicos podem, com amostras mais ativas e estatisticamente precisas, engrandecer o entendimento e a aplicabilidade do método.

É importante ressaltar que Mindfulness não é uma cura para a DC e pode não ser eficaz para todos igualmente. Entretanto, constitui uma inovação na prática clínica e representa um acréscimo no arsenal de técnicas terapêuticas disponíveis no mundo, como parte das PICS, e tem potencial para receber maior investimento direcionado à DC.

• Fontes de fomento: não há.

REFERENCES

• ¹
  Aguiar DP, Souza CP, Barbosa WJ, Santos-Júnior FF, Oliveira AS. Prevalência de dor crônica no Brasil: revisão sistemática. BrJP. 2021;4(3):257-67.
• ²
  McClintock AS, McCarrick SM, Garland EL, Zeidan F, Zgierska AE. Brief mindfulness-based interventions for acute and chronic pain: a systematic review. J Altern Complement Med. 2019;25(3):265-278. doi:10.1089/acm.2018.0420.
  » https://doi.org/10.1089/acm.2018.0420.
• ³
  Moix J, Casado MI. Terapias psicológicas para el tratamiento del dolor crónico. Clínica y Salud. 2011;22(1):41-50.
• ⁴
  Pardos-Gascón EM, Narambuena L, Leal-Costa C, Ramos-Morcillo AJ, Ruzafa-Martínez M, van-der Hofstadt Román CJ. Effects of mindfulness-based cognitive therapy for chronic pain: a multicenter study. Int J Environ Res Public Health. 2021;18(13):6951.
• ⁵
  Goldman L, Schafer AI. Goldman-Cecil Medicina. 25a ed. V1. Rio de Janeiro: Elsevier; 2018.
• ⁶
  Hussain N, Said A. Mindfulness-based meditation versus progressive relaxation meditation: impact on chronic pain in older female patients with diabetic neuropathy. J Evid Based Integr Med. 2019;24:2515690X19876599.
• ⁷
  Treede RD, Rief W, Barke A, Aziz Q, Bennett MI, Benoliel R, Cohen M, Evers S, Finnerup NB, First MB, Giamberardino MA, Kaasa S, Korwisi B, Kosek E, Lavand’homme P, Nicholas M, Perrot S, Scholz J, Schug S, Smith BH, Svensson P, Vlaeyen JWS, Wang SJ. Chronic pain as a symptom or a disease: the IASP Classification of Chronic Pain for the International Classification of Diseases (ICD-11). Pain. 2019;160(1):19-27.
• ⁸
  Brintz CE, Roth I, Faurot K, Rao S, Gaylord SA. Feasibility and acceptability of an abbreviated, four-week mindfulness program for chronic pain management. Pain Med. 2020;21(11):2799-810.
• ⁹
  Day MA, Ward LC, Ehde DM, Thorn BE, Burns J, Barnier A, Mattingley JB, Jensen MP. A pilot randomized controlled trial comparing mindfulness meditation, cognitive therapy, and mindfulness-based cognitive therapy for chronic low back pain. Pain Med. 2019;20(11):2134-48.
• ¹⁰
  Garland EL, Bryan MA, Priddy SE, Riquino MR, Froeliger B, Howard MO. Effects of mindfulness-oriented recovery enhancement versus social support on negative affective interference during inhibitory control among opioid-treated chronic pain patients: a pilot mechanistic study. Ann Behav Med. 2019;53(10):865-76.
• ¹¹
  Hanley AW, Gililland J, Garland ER. To be mindful of the breath or pain: comparing two brief preoperative mindfulness techniques for total joint arthroplasty patients. J Consult Clin Psychol. 2022;90(7):1182-94.
• ¹²
  Ball E, Newton S, Rohricht F, Steed L, Birch J, Dodds J, Calvete CC, Taylor S, Rivas C. mHealth: providing a mindfulness app for women with chronic pelvic pain in gynaecology outpatient clinics: qualitative data analysis of user experience and lessons learnt. BMJ Open. 2020;10.
• ¹³
  Seng EK, Singer AB, Metts C, Grinberg AS, Patel ZS, Marzouk M, Rosenberg L, Day M, Minen MT, Lipton RB, Buse DC. Does mindfulness-based cognitive therapy for migraine reduce migraine-related disability in people with episodic and chronic migraine? a phase 2b pilot randomized clinical trial. Headache. 2019;59(9):1448-67.
• ¹⁴
  Vandenberghe L, Sousa ACA. Mindfulness nas terapias cognitivas e comportamentais. Rev Bras Ter Cogn. 2006;2(1):35-44.
• ¹⁵
  Shamseer L, Moher D, Clarke M, Ghersi D, Liberati A, Petticrew M, Shekelle P, Stewart LA, o Grupo PRISMA-P. Itens de Relatório Preferenciais para Protocolos de Revisão Sistemática e Meta-Análise (PRISMA-P) 2015: elaboração e explicação. BMJ 2015.349:g7647.
• ¹⁶
  Apple’s Mindful Choices Program [Internet]. [citado em 2023 May 07]. Disponível em: https://www.apple.com/apple-at-work/mindful-choices/.Intel’s Awake at Intel Program [Internet]. [citado em 2023 May 07]. Disponível em: https://www.intel.com/content/www/us/en/company-overview/awake-at-intel.html
  » https://www.apple.com/apple-at-work/mindful-choices/.Intel’s» https://www.intel.com/content/www/us/en/company-overview/awake-at-intel.html
• ¹⁷
  Google’s Search Inside Yourself Program [Internet]. [citado em 2023 May 07]. Disponível em: https://siyli.org/
  » https://siyli.org/
• ¹⁸
  World Health Organization. WHO guidelines for the management of conditions specifically related to stress [Internet]. Geneva, Switzerland: World Health Organization; 2017 [citado em 2023 May 07]. Disponível em: https://www.who.int/mental_health/emergencies/stress-management-guidelines/en/
  » https://www.who.int/mental_health/emergencies/stress-management-guidelines/en/
• ¹⁹
  Lipson JG. Mainstream meditation and million-dollar mindfulness boom. Harvard divinity school. 2019 Ago 13. Disponível em: https://hds.harvard.edu/news/2019/08/13/mainstream-meditation-and-million-dollar-mindfulness-boom
  » https://hds.harvard.edu/news/2019/08/13/mainstream-meditation-and-million-dollar-mindfulness-boom
• ²⁰
  GRADEpro GDT [Internet]. Hamilton (ON): Evidence Prime Inc.; c2021 [citado 2023 May 7]. Disponível em: https://www.gradepro.org/
  » https://www.gradepro.org/
• ²¹
  Brintz CE, Miller S, Olmsted KR, Bartoszek M, Cartwright J, Kizakevich PN, Butler M, Asefnia N, Buben A, Gaylord SA. Adapting mindfulness training for military service members with chronic pain. Mil Med. 2020;185(3-4):385-93.
• ²²
  Higgins JPT, López-López JA, Becker BJ, et al. Revised Cochrane risk-of-bias tool for cluster-randomized trials (RoB 2 CRT) Template for Completion Version of 18 March 2021 [Internet]. London (UK): Cochrane; 2021 [citado 2023 May 7].
• ²³
  Seminowicz DA, Burrowes S, Kearson A, Zhang J, Krimmel SR, Samawi L, Furman AJ, Keaser ML, Gould NF, Magyari T, White L, Goloubeva O, Goyal M, Peterlin BL, Haythornthwaite JA. Enhanced mindfulness-based stress reduction in episodic migraine: a randomized clinical trial with magnetic resonance imaging outcomes. Pain. 2020;161(8):1837-46.

Editado por

Editor associado responsável: Maria Belén Salazar Posso https://orcid.org/0000-0003-3221-6124

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  21 Jun 2024
• Data do Fascículo
  2024

Histórico

• Recebido
  04 Out 2023
• Aceito
  22 Fev 2024