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A publicação científica torna-se maior que o artigo - repositório de dados da BrJP

Há caminhos que não permitem dar meia-volta, é preciso seguir. Tais caminhos costumam impactar por suas mudanças nos processos. Eles também criam movimentos de resistência, mas os resultados vislumbrados representam benefícios e facilidades que os tornam inegáveis, portanto será preciso se adaptar. Entre esses movimentos temos a Ciência Aberta (CA) e as plataformas de Inteligência Artificial (IA). Em contrapartida às máquinas, nós, Homo sapiens, fomentamos criatividade e conhecimento, com questionamentos e reflexões filosóficas ou conceituais, com a interação social para construir a partir de afinidades e divergências. A CA já mostrou que acelera o processo de divulgação científica durante a pandemia do COVID-19, e as ferramentas de IA desenvolvem-se com objetivos afins para acesso à informação.

A CA denota um conjunto de políticas e ações voltadas à disseminação do conhecimento, principalmente em formato digital. Com o objetivo de promover inovação e avanço do conhecimento, as políticas de CA incentivam e possibilitam formas de tornar os resultados de pesquisa mais acessíveis e passíveis de reutilização e de reprodução11 Ciencia Aberta. Open Science @ Fapesp. https://www.fapesp.br/openscience/#:~:text=O%20objetivo%20da%20Ci%C3%AAncia%20Aberta,%2C%20econ%C3%B4mico%2C%20social%20e%20cultural
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. Com maior disseminação de publicações, dados, metodologias, materiais audiovisuais e processos computacionais usados e desenvolvidos no decorrer das pesquisas, estima-se uma facilitação direta na colaboração entre cientistas e no reuso de resultados.

De fato, a CA visa fomentar o avanço do conhecimento por meio de colaborações facilitadas pela disponibilização de informação em repositórios digitais públicos contendo três elementos básicos: Acesso Aberto (publicações), Dados Abertos (incluindo dados brutos, modelos, especificações e documentação) e Processos Computacionais Abertos (como software e algoritmos). A CA disponibiliza uma nova forma de desenvolver pesquisas, com forte ênfase na disseminação do conhecimento, na colaboração entre cientistas, no reuso de resultados e consequentemente na aceleração do progresso científico, tecnológico, econômico, social e cultural.

A interação entre pesquisadores fomentada pelas ações da CA está diretamente associada à experiência mundial no combate à pandemia do COVID-19. O compartilhamento dos dados, as publicações em repositórios de preprint, com as discussões abertas na avaliação entre pares, bancos de dados publicados e outras informações processuais permitiram acelerar a compreensão da fisiopatologia da doença e do vírus SARS-COV2, abordagens de tratamento e prevenção, e o desenvolvimento de várias vacinas pelo globo terrestre.

De forma lúdica, a CA é descrita por alguns como uma estratégia que “salva vidas”. Outros sugerem, em forma de anedota, que para salvar vidas é preciso ter “heróis”. Assim, segue a reflexão e uma questão fica em aberto: qual(is) seria(m) esses “super poderes” dos “heróis” que “salvam vidas” através da CA? A resposta está na essência das ações e políticas da CA: acelerar e disseminar a divulgação do conhecimento científico e promover maiores colaborações e discussões dos resultados de pesquisas. Atribui-se a compreensão do vírus e a concepção de várias vacinas aos dados e as informações publicadas em acesso aberto, inclusive por periódicos tradicionalmente de acesso pago, além das publicações em repositórios de preprint e em repositórios de dados.

O valor agregado ao desconhecido “poder” das ferramentas de IA gera insegurança em alguns e cria expectativas elevadas em outros. Porém, é importante que os dados e as informações publicados apresentem interoperabilidade para permitir que “a máquina” os acesse e leia. A arquitetura dos bancos de dados deve ser planejada em parceria entre pesquisadores, bibliotecários e profissionais da tecnologia da informação (TI). De forma prática, a organização, a publicação e a preservação dos dados impõem uma demanda extra ao pesquisador. Contudo, as informações disponibilizadas em repositórios de dados agregam valor à pesquisa. Compartilhar informações que endossam a produção de conhecimento, os dados brutos, as anotações em cadernos de laboratórios, bem como imagens e vídeos produzidos durante a realização do estudo, tem valor agregado, o que demonstra a competência dos pesquisadores e das instituições onde foram desenvolvidas as pesquisas científicas. Adicionalmente, além de fomentar parcerias, a preservação desses dados é uma responsabilidade da ciência.

A pesquisa é maior que a sucinta descrição relatada no artigo científico, além disso leitores confiam na integridade dos autores ao lerem a descrição detalhada do método, mas a possibilidade de compartilhar os dados e outros documentos conexos ao estudo científico agrega valor de confiabilidade aos autores, assim como permite o acesso a detalhes processuais extras, para além do que foi relatado no artigo científico.

Pesquisadores e autores de artigos publicados na BrJP contam com o apoio técnico de bibliotecários e equipe de TI para publicação em nosso repositório de dados hospedado junto à Scielo Data22 Repositório de dados da BrJP, hospedado no Dataverse da SciELO. https://data.scielo.org/dataverse/brbrjp
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. Assim como uma publicação de artigo científico, os dados científicos também seguem os princípios FAIR33 FAIR Principles https://www.go-fair.org/fair-principles/
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, que preconizam a localização (findability), a acessibilidade (accessibility), a interoperabilidade (interoperability) e a reutilização (reusability) dos dados. O compartilhamento dos dados em repositórios confiáveis, como o serviço prestado pela Scielo Data, também segue os princípios TRUST44 Lin D, Crabtree J, Dillo I, Downs RR, Edmunds R, Giaretta D, De Giusti M, L’Hours H, Hugo W, Jenkyns R, Khodiyar V, Martone ME, Mokrane M, Navale V, Petters J, Sierman B, Sokolova DV, Stockhause M, Westbrook J. The TRUST Principles for digital repositories. Sci Data. 2020;7(1):144. https://doi.org/10.1038/s41597-0200486-7.
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: transparência (transparency), responsabilidade (responsibility), foco no utilizador (user focus), sustentabilidade (sustainability) e tecnologia (technology). Atendendo às demandas desse grande “guarda-chuva” que representa, a CA55 Barcellos de Souza, J. Princípios da Ciência Aberta no BrJP e o estado da arte de outros periódicos científicos sobre dor BrJP. BrJP, 2023;6(4):343-5 10.5935/25950118.20230085-pt.
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se apresenta como um “caminho sem volta”, muito pela experiência mundial que levou aos avanços científicos durante os anos de pandemia. Entretanto, alguns dados sobre saúde são sensíveis e questões éticas demandam proteção ou acesso restrito para a proteção de populações vulneráveis, sobretudo quando se trata de estudos com povos indígenas. Sendo assim, cabe a reflexão prévia à publicação dos dados para garantir que sejam respeitados os princípios CARE66 Principios CARE https://www.gida-global.org/care
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: benefício coletivo (collective benefit), autoridade no controle (authority to control), responsabilidade (responsability) e ética (ethics). Para preparar os dados para compartilhar, os pesquisadores e autores devem acessar a página da Scielo Data77 Dataverse SciELO: https://data.scielo.org/
https://data.scielo.org/...
. O cadastro pode ser realizado pelo ORCID (conta Google ou GitHub). Após se cadastrarem, os pesquisadores e autores podem direcionar-se para o repositório da BrJP11 Ciencia Aberta. Open Science @ Fapesp. https://www.fapesp.br/openscience/#:~:text=O%20objetivo%20da%20Ci%C3%AAncia%20Aberta,%2C%20econ%C3%B4mico%2C%20social%20e%20cultural
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para incluir seus dados experimentais coletados, preencher os metadados e informar o tipo de licença dos dados. Alguns dados podem ser publicados com acesso restrito, tanto por questões éticas (princípios CARE) quanto por questões relacionadas a patentes. Após submetidas, as informações passam por análise e consultoria da Scielo Data para orientações de apresentação, de forma a garantir a interoperabilidade com a máquina para que os dados possam ser encontrados em ferramentas de busca.

Os pesquisadores coletam e analisam os dados e os resultados de suas pesquisas, e os bibliotecários participam na arquitetura da informação. Por fim, a equipe de TI realiza a arquitetura dos dados. Esse planejamento permite a gestão das informações para alimentar recursos de armazenamento de dados e IAs. Para criar uma visão unificada, o Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (IBICT) reúne resultados gerais (OasisBr/ IBICT)88 Portal Brasileiro de Publicações e Dados Científicos em Acesso Aberto (Oasisbr) https://oasisbr.ibict.br/
https://oasisbr.ibict.br/...
e um ecossistema da pesquisa científica (BrCris/Ibict)99 Ecossistema de Informação da Pesquisa Científica Brasileira, BrCris, acrônimo de Brazil - Current Research Information System. https://brcris.ibict.br/
https://brcris.ibict.br/...
, de modo a oferecer uma visão plural do que é um resultado de pesquisa, que não se resume ao artigo científico. A CA é acessível e o conhecimento e a informação são mais amplos do que a simples publicação de um artigo científico.

Atenciosamente,

Juliana Barcellos de Souza1

Renato Leonardo de Freitas2

1. Universidade do Estado de Santa Catarina, Florianópolis, SC, Brasil, https://orcid.org/0000-0003-4657-052X, http://lattes.cnpq.br/: 0009123389533752, E-mail: editora.brjp.2425@dor.org.br

2. Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto, SP. Brasil,https://orcid.org/0000-0003-1799-5326, http://lattes.cnpq.br/4321982079895528, E-email: rlfreitas@usp.br

REFERENCES

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    21 Jun 2024
  • Data do Fascículo
    2024
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