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Aprendendo a educação em neurociência da dor por meio do instrumento WHOQOL-Bref em sala de aula. Relato de casos

RESUMO

JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS:

Durante a graduação, os acadêmicos têm a oportunidade de aprender e compreender sobre promoção e prevenção de saúde, qualidade de vida, entre outros conceitos, mas raramente a educação em saúde é colocada nas salas de aula, em especial o entendimento da dor. Sabendo que há lacunas na formação de profissionais de saúde relacionadas ao conhecimento da dor e à utilização de metodologias pedagógicas que incentivem a construção ativa do conhecimento, o objetivo deste estudo promoveu um relato de experiência sobre o processo de entendimento e educação em neurociência da dor, por meio de um instrumento e da técnica de dramatização na vivência acadêmica de estudantes de Fisioterapia.

RELATO DOS CASOS:

Durante a realização de uma aula de Básica Complexidade, alunos do curso de Fisioterapia da Universidade de Brasília - Campus Ceilândia, foram convidados a vivenciarem um atendimento à uma população fictícia e desenvolverem explicações e ensinamentos sobre a dor e seus processos no corpo humano, utilizando o instrumento WHOQOL-Bref para avaliar a qualidade de vida do indivíduo e direcionar o seu atendimento.

CONCLUSÃO:

A experiência vivenciada por meio de simulações de casos clínicos na disciplina foi importante para a análise e discussão de questões desafiadoras como fatores psicológicos, sociais, e comportamentais no processo de educação em saúde em intervenções multi e interdisciplinar.

Descritores:
Educação em neurociência da dor; Qualidade de vida; Simulações de casos clínicos; WHOQOL-Bref

ABSTRACT

BACKGROUND AND OBJECTIVES:

During the undergraduate course students have the opportunity to learn and understand health promotion and prevention, quality of life and other concepts, but they rarely learn about health education, let alone pain. Knowing that there are gaps in the training of health professionals regarding pain, and in the use of pedagogical methodologies that encourage the active construction of knowledge, the objective of this study was to provide an experience about the process of understanding pain neuroscience education from an instrument and the role-playing technique in the academic environment of Physiotherapy students.

CASE REPORTS:

During a Basic Complexity class, Physiotherapy students from the Ceilândia campus of the University of Brasília were invited to provide care to a fictitious population and develop explanations and lessons about pain and its processes in the human body using the WHOQOL-Bref questionnaire to evaluate the quality of life of the individual and target the care accordingly.

CONCLUSION:

The experience provided by the simulation of clinical cases was important for the analysis and discussion of challenging issues such as psychological, social and behavioral factors in the health education process in multi and interdisciplinary interventions.

Keywords:
Pain neuroscience education; Quality of life; Simulation of clinical cases; WHOQOL-Bref

INTRODUÇÃO

As intervenções educacionais em torno do tema dor referem-se à empregabilidade do conhecimento da anatomia, da fisiologia e da farmacologia da dor e ao entendimento de como a correta abordagem e o tratamento do sintoma reduzem as consequências físicas e emocionais decorrentes do processo doloroso11 Moseley GL, Butler DS. Fifteen years of explaining pain: the past, present, and future. J Pain. 2015;16(9):807-13.,22 Moseley L. Combined physiotherapy and education is efficacious for chronic low back pain. Aust J Physiother. 2002;48(4):297-302..

Estudos com revisão sistemática sobre educação em neurociência da dor (END) para dores musculoesqueléticas fornecem evidências de que a END melhora a classificação adequada da dor, a incapacidade, a mobilidade, a utilização de serviços de saúde e as atitudes e comportamentos relacionados à dor como a catastrofização, o medo e a evitação33 Louw A, Zimmey K, Puentedura EJ, Diener I. The efficacy of pain neuroscience education on musculoskeletal pain: a systematic review of the literature. Physiother Theory Pract. 2016;32(5):332-55..

Por outro lado, uma questão que tem chamado a atenção de investigadores é que a nocicepção não é suficiente para evocar a dor, mas também os fatores psicossociais, que são importantes no desenvolvimento de doenças crônicas44 Moseley L. Unravelling the barriers to reconceptualization of the problem in chronic pain: the actual and perceived ability of patients and health professionals to understand the neurophysiology. J Pain. 2003;4(4):184-9.. Nesse sentido, o ensino sobre a dor passou a ser, necessário na formação de profissionais de saúde e para o manuseio criterioso do sintoma55 Louw A, Zimney K, O'Hotto C, Hilton S. The clinical application of teaching people about pain. Physiother Theory Pract. 2016;32(5):385-5..

Nesse contexto, um dos cursos da área da saúde que passa por esse processo de mudança, a fim de formar profissionais aptos para trabalhar com o Sistema Único de Saúde (SUS), é o curso de Fisioterapia.

Partindo dessa premissa e considerando que o SUS é um grande empregador dos trabalhadores em saúde, a educação de discentes deve ser estimulada para um agir humanista, crítico, reflexivo e generalista. Desse modo, com a união constante da teoria e da prática dentro da universidade, pode-se formar profissionais conscientes e engajados para modificar o ambiente em que vivem e portadores de uma atitude que modifique as mazelas em saúde66 Figueiredo TC, Rhoden EC. "Fisioterapia e a promoção da saúde": o saber em saúde a partir do ensino acadêmico. Rev Epidemiol Control Infect. 2014;4(1):32-3..

O construto multidimensional de qualidade de vida (QV) denominado World Health Organization Quality of Life (WHOQOL-Bref) foi proposto como um indicador de saúde da população. A aplicação desse instrumento é utilizada para estimular ações de promoção da saúde. Especula-se que o uso do questionário, associado à ferramenta de END, possa agregar conhecimento na interpretação das dimensões da saúde física, da psicológica, do nível de independência, das relações sociais, do meio ambiente e do padrão espiritual. Também, podem ser utilizados nas vivências acadêmicas após a elaboração de situações problemas e promover mudanças no processo de ensino e aprendizagem sobre a dor77 Fleck MP, Louzada S, Xavier M, Chachamovich E, Vieira G, Santos L, et al. [Application of the Portuguese version of the abbreviated instrument of quality life WHOQOL-bref]. Rev Saude Publica. 2000;34(2):178-83. Portuguese.,88 DeSantana JM, Souza JB, Reis FJ, Gosling AP, Paranhos E, Barboza HF, et al. Currículo em dor para graduação em Fisioterapia no Brasil. Rev Dor. 2017;18(1):72-8..

Nessa perspectiva, o estudo promoveu um relato de experiência sobre o processo de entendimento e educação no estudo da dor, por meio de um instrumento e a técnica de dramatização na vivência acadêmica de estudantes de Fisioterapia.

RELATO DOS CASOS

Para atender ao objetivo proposto, realizou-se na Universidade de Brasília - Campus Ceilândia, um estudo de cunho acadêmico por meio de experiência vivenciada.

Para isso, os acadêmicos do 6º semestre do curso de Fisioterapia foram inicialmente separados em dois grupos: aluno fisioterapeuta (AF) e aluno-paciente (AP) e, posterior a essa divisão, foram instruídos a simularem um atendimento a três casos clínicos, de tal maneira que fundamentassem as explicações/ensinamentos sobre a dor e os processos neurofisiológicos no corpo humano.

Caso 1. Paciente com 70 anos de idade, apresentava dor aos movimentos das articulações dos ombros e joelhos dificultando as atividades de vida diária como limpar a casa, cuidar do cachorro e estender roupas no varal. Relatava que não entendia o motivo da presença da dor e porque não melhorava com os fármacos que fazia uso diário. Esse paciente ouviu falar de um grupo de atividade física que acontecia 2 vezes por semana e manifestou muito interesse em entender e acreditava que a atividade física poderia melhorar a diminuição da força dos membros inferiores.

Caso 2. Paciente com 45 anos de idade, dona de casa, relatou dor na coluna lombar há 15 anos. Há 2 anos, após realizar radiografia da coluna, o médico disse que a coluna estava doente e que precisava fazer atividade física. Acreditava e relatava que poderia ter alguma hérnia de disco. A paciente não trouxe a radiografia, pois não sabia onde se encontrava. Também relatou que não gosta de fazer atividade física e não entende por que os exercícios melhoram. Queixou que não consegue pagar uma academia e que o sonho dela era ser bailarina. Apresentou dificuldades ao abaixar e carregar as compras do supermercado. Hoje pesa 105kg com estatura de 1,55cm.

Caso 3. Paciente com 65 anos de idade, aposentada e cuidadora da sua mãe com 95 anos. Realiza com sua mãe todas as atividades de vida diária e principalmente os cuidados especiais: dar banho, preparar o alimento e as caminhadas rotineiras. Queixa de cansaço muscular generalizado e dores articulares. Não consegue dormir bem, apenas 4 horas por noite. Não consegue ter um tempo para se distrair com as amigas. Mas ouviu falar do grupo de atendimento e foi em busca de entendimento da dor e o que pode ser realizado em casa para ter mais disposição.

Foi utilizado o questionário WHOQOL-Bref para avaliar a QV dos casos clínicos por meio de 26 perguntas. As perguntas número 1 e 2 sobre a QV geral e percepção de saúde, respectivamente, com pontuação de 1 a 5. As demais 24 perguntas compõem os domínios: Físico, Psicológico, Relações Sociais e Meio ambiente, com pontuações que variam também de 1 a 5 pontos, sendo necessário recodificar o valor das questões 3, 4 e 26. A média dos valores obtidos deve ser realizada a partir da somatória dos pontos, dividido pelo número de perguntas presentes em um mesmo domínio77 Fleck MP, Louzada S, Xavier M, Chachamovich E, Vieira G, Santos L, et al. [Application of the Portuguese version of the abbreviated instrument of quality life WHOQOL-bref]. Rev Saude Publica. 2000;34(2):178-83. Portuguese. (Anexo 1 Anexo 1 Teste WHOQOL-Bref Questões 1 e 2 Caso 1 Caso 2 Caso 3 1. Percepção da qualidade de vida 3 3 2 2. Satisfação com a saúde 3 3 3 Domínio I - Físico Caso 1 Média Caso 2 Média Caso 3 Média 3.Dor e desconforto 2 1,83 2 1,71 3 2,85 4.Energia e fadiga 2 2 4 5.Sono e repouso 2 2 4 6.Mobilidade 1 1 3 7.Atividades da vida cotidiana 2 2 1 8.Dependência de fármacos ou de tratamentos 1 2 3 9.Capacidade de trabalho 1 1 2 Domínio II - Psicológico Caso 1 Média Caso 2 Média Caso 3 Média 10. Sentimentos positivos 2 2,66 3 2,33 1 2,83 11. Pensar, aprender, memória e concentração 3 3 3 12. Autoestima 3 2 4 13. Imagem corporal e aparência 3 1 4 14. Sentimentos negativos 1 2 2 15. Espiritualidade/religião/crenças pessoais 4 3 3 Domínio III - Relações sociais Caso 1 Média Caso 2 Média Caso 3 Média 16. Relações pessoais 2 3,0 3 2,33 1 1,0 17. Suporte (apoio) social 2 1 1 18. Atividade sexual 2 3 1 Domínio IV - Meio ambiente Caso 1 Média Caso 2 Média Caso 3 Média 19. Segurança física e proteção 2 2,5 2 2,0 3 2,75 20. Ambiente no lar 2 2 4 21. Recursos financeiros 2 1 2 22. Cuidados de saúde e sociais: disponibilidade e qualidade 3 2 2 23. Oportunidades de adquirir novas informações e habilidades 2 2 3 24. Participação e oportunidades de recreação/lazer 3 3 4 25. Ambiente físico: (poluição/ruído/trânsito/clima) 4 1 2 26. Transporte 2 3 2 ).

Para a realização do relato de experiência, os acadêmicos produziram um vídeo com aproximadamente 10 minutos de duração e, simularam um atendimento fisioterapêutico a um paciente fictício com os seguintes objetivos:

  • Instruir o paciente para que compreenda sua própria dor (possíveis causas e quais os mecanismos neurais e cerebrais ativados);

  • Melhorar a QV por meio do entendimento da dor.

Sendo assim, o grupo AP recebeu um caso clínico da docente da disciplina e as orientações consistiam de se apropriarem do caso clínico, desenvolvendo a história da doença atual e pregressa, os sintomas, as expressões faciais, os déficits de movimentos, as quedas da própria altura, os sentimentos, as emoções, as crenças e a catastrofização.

Da mesma forma, o grupo AF foi orientado pela docente a realizar a avaliação, aplicação do questionário e posteriormente realizar o seu cálculo e discussão das intervenções para cada caso. Paralelamente, o grupo AF foi orientado a planejar e executar a END, com explicação neurofisiológica do caso clínico e orientações para o processo de educação continuada para as atividades em casa.

Durante a vivência acadêmica, o grupo AF deveria fazer uso dos dados obtidos no questionário WHOQOL-Bref e interpretar os valores de cada domínio descritos abaixo:

WHOQOL-Bref - caso 1: o domínio físico apresentou a menor média (1,83) quando comparado com os domínios psicológico, relações sociais e meio ambiente.

WHOQOL-Bref - caso 2: o domínio físico apresentou a menor média (1,71) quando comparado com os casos 1 e 3 e no domínio meio ambiente a média foi 2,0.

WHOQOL-Bref - caso 3: o domínio relações sociais demonstrou média muito baixa (1,0) quando comparado aos domínios físico, psicológico e meio ambiente.

Após a interpretação dos domínios, as orientações foram direcionadas para melhor atender as necessidades do grupo AP. Além disso, por se tratar de uma experiência no ambiente de Básica Complexidade, o grupo AF deveria incentivar a participação do indivíduo e apresentar os recursos oferecidos e que melhor se encaixavam nas necessidades individuais apresentadas pelo grupo AP.

DISCUSSÃO

As simulações com casos clínicos basearam-se no manuseio da END com o intuito de verificar as percepções alteradas sobre o conhecimento da neurofisiologia da dor e como as crenças desencadeariam o aumento de dores crônicas33 Louw A, Zimmey K, Puentedura EJ, Diener I. The efficacy of pain neuroscience education on musculoskeletal pain: a systematic review of the literature. Physiother Theory Pract. 2016;32(5):332-55.,99 Nijs J, Paul van Wilgen C, Van Oosterwijek J, van Ittersum M, Meeus M. How to explain central sensitization to patients with 'unexplained' chronic musculoskeletal pain: practice guidelines. Man Ther. 2011;16(5):413-8.,1010 Louw A, Puentedura EL, Zimney K. Teaching patients about pain: it works, but what should we call it? Physiother Theory Pract. 2016;32(5):328-31..

A QV é um construto multidimensional proposto como um indicador de saúde da população e sua interpretação é utilizada para estimular ações de promoção da saúde1111 Almeida-Brasil CC, Silveira MR, Silva KR, Lima MG, Faria CD, Cardoso CL, et al. [Quality of life and associated characteristics: aplication of WHOQOL-BREF in the context of Primary Health Care]. Cien Saúde Colet. 2017;22(5):1705-16. English, Portuguese. apresentadas pelo grupo AP.

Nessa perspectiva, o instrumento WHOQOL-Bref direcionou a abordagem educacional, enfatizando os domínios físico e relações pessoais e suas questões para serem trabalhadas pelo grupo AF. O instrumento valoriza a percepção individual, podendo avaliar a QV em diversos grupos e situações, independentemente do nível de escolaridade77 Fleck MP, Louzada S, Xavier M, Chachamovich E, Vieira G, Santos L, et al. [Application of the Portuguese version of the abbreviated instrument of quality life WHOQOL-bref]. Rev Saude Publica. 2000;34(2):178-83. Portuguese..

Ao considerar as médias no domínio físico dos casos (1, 2 e 3), obteve-se uma variação de 1,71 a 2,85, sendo que o caso 2 apresentou o menor resultado com 1,71. Esse domínio aborda as questões dor e desconforto, energia e fadiga, sono e repouso, mobilidade, atividades da vida cotidiana, dependência de fármacos ou de tratamentos, capacidade de trabalho.

A avaliação do domínio físico revelou a necessidade de acompanhar os índices de qualidade de vida nos pacientes com doenças crônicas e planejar estratégias de intervenção, já que fornecem informações importantes sobre o usuário, permitindo identificar suas prioridades e subsidiar os programas de saúde para que implementem ações efetivas e, assim, proporcionar melhor qualidade de vida aos usuários na atenção primária à saúde.

Isso se aplica na interpretação das questões apresentadas pelo caso 1, o qual demonstrou média inferior de qualidade de vida no aspecto físico quando comparado com os domínios psicológico, relações pessoais e meio ambiente. Para vários estudiosos, esse aspecto é central na qualidade de vida do idoso que sofre influências com o aumento da idade1111 Almeida-Brasil CC, Silveira MR, Silva KR, Lima MG, Faria CD, Cardoso CL, et al. [Quality of life and associated characteristics: aplication of WHOQOL-BREF in the context of Primary Health Care]. Cien Saúde Colet. 2017;22(5):1705-16. English, Portuguese.,1212 Freitas EV. Tratado de geriatria e gerontologia. 3ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2011. 1750p..

Na literatura não foram encontrados pontos de cortes que determinassem um escore abaixo ou acima. Nesse estudo foram analisadas a cópia dos escores individuais de cada respondente em cada domínio nos 3 casos e a relação com a escala de Likert de 5 itens (1= muito ruim; 2= ruim; 3= nem ruim e nem boa; 4= boa; 5= muito boa) para as 24 questões do instrumento1313 Pedroso B, Pilatti LA, Gutierrez GL, Picinin CT. Cálculo dos escores e estatística descritiva do WHOQOL-bref através do Microsoft Excel. Rev Bras Qual Vida. Ponta Grossa. 2010;2(1):31-6..

Referente à avaliação do caso 2, além de apresentar a menor média no domínio físico também revelou níveis inferiores nas médias dos domínios psicológico e meio ambiente; e a avaliação geral da percepção da qualidade de vida foi nem boa e nem ruim. Esses dados se relacionam com o estudo de três Unidades Básicas de Saúde no Rio Grande do Sul que analisaram as médias do domínio aspecto físico e concluíram que foram menores em pacientes mulheres que não viviam com companheiro e tinham alguma doença crônica1414 Castro, DFA. A. Qualidade de Vida de Gestantes assistidas pela Estratégia Saúde da Família [dissertação]. USP - Área de concentração: saúde coletiva. 2010. 196p.,1515 Azevedo AL, Silva RA, Tomasi E, Quevedo LA. Doenças crônicas e qualidade de vida na atenção primária à saúde. Cad. Saúde Pública, 2010;29(9):1774-82..

Como foi observado no caso 2, houve baixa pontuação no domínio meio ambiente para as questões de recursos financeiros e ambiente físico, e essa análise corrobora com estudos nos quais os pacientes de classes sociais mais baixas demonstraram pior qualidade de vida destacando que, no Brasil, a desigualdade na distribuição de renda, o analfabetismo, o baixo grau de escolaridade, as condições de habitação e o ambiente precário causam impactos negativos sobre a qualidade de vida e a saúde dos sujeitos1111 Almeida-Brasil CC, Silveira MR, Silva KR, Lima MG, Faria CD, Cardoso CL, et al. [Quality of life and associated characteristics: aplication of WHOQOL-BREF in the context of Primary Health Care]. Cien Saúde Colet. 2017;22(5):1705-16. English, Portuguese.,1616 Buss PM. Promoção da saúde e qualidade de vida. Ciênc Saúde Coletiva 2000;5:163-77..

A menor pontuação observada no domínio de relações pessoais do caso 3 ratifica os resultados que descreveram a percepção da qualidade de vida inferior em mulheres; pessoas mais velhas, de classe social baixa, que não viviam com companheiro e com alguma doença crônica, podendo depreender que a falta de um parceiro pode desencadear sentimentos de solidão e de isolamento e, portanto, menor bem-estar1313 Pedroso B, Pilatti LA, Gutierrez GL, Picinin CT. Cálculo dos escores e estatística descritiva do WHOQOL-bref através do Microsoft Excel. Rev Bras Qual Vida. Ponta Grossa. 2010;2(1):31-6.,1414 Castro, DFA. A. Qualidade de Vida de Gestantes assistidas pela Estratégia Saúde da Família [dissertação]. USP - Área de concentração: saúde coletiva. 2010. 196p..

Desse modo, perante a vivência estimulada dos casos clínicos, o instrumento possibilitou discutir a possível percepção subjetiva em relação à sua saúde física e psicológica, às relações sociais e ao ambiente em que vive77 Fleck MP, Louzada S, Xavier M, Chachamovich E, Vieira G, Santos L, et al. [Application of the Portuguese version of the abbreviated instrument of quality life WHOQOL-bref]. Rev Saude Publica. 2000;34(2):178-83. Portuguese.,1111 Almeida-Brasil CC, Silveira MR, Silva KR, Lima MG, Faria CD, Cardoso CL, et al. [Quality of life and associated characteristics: aplication of WHOQOL-BREF in the context of Primary Health Care]. Cien Saúde Colet. 2017;22(5):1705-16. English, Portuguese..

As estratégias educacionais baseadas em simulação têm sido bastante utilizadas para o ensino das Habilidades de Comunicação e Relacionais, principalmente na área da saúde1717 Rabelo L, Garcia VL. Role-Play para o desenvolvimento de habilidades de comunicação e relacionais. Rev Bras Educ Med. 2015;39(4):586-96.. Essas estratégias visam inserir os alunos no processo de aprendizagem por meio de uma prática assistida e orientada. A simulação permite que os discentes experimentem a representação de um evento real, com o propósito de praticar, aprender, avaliar, testar ou entender sistemas ou ações humanas1010 Louw A, Puentedura EL, Zimney K. Teaching patients about pain: it works, but what should we call it? Physiother Theory Pract. 2016;32(5):328-31.,1717 Rabelo L, Garcia VL. Role-Play para o desenvolvimento de habilidades de comunicação e relacionais. Rev Bras Educ Med. 2015;39(4):586-96..

E nesse entendimento foi possível analisar e discutir as habilidades entre os discentes nas questões que envolvem a interpretação das dimensões da saúde física, psicológica, nível de independência, relações sociais, meio ambiente e padrão espiritual1111 Almeida-Brasil CC, Silveira MR, Silva KR, Lima MG, Faria CD, Cardoso CL, et al. [Quality of life and associated characteristics: aplication of WHOQOL-BREF in the context of Primary Health Care]. Cien Saúde Colet. 2017;22(5):1705-16. English, Portuguese.,1818 Wijma AJ, van Wilgen CP, Meeus M, Nijs J. Clinical biopsychosocial physiotherapy assessment of patients with chronic pain: the first step in pain neuroscience education. Physiother Theory Pract. 2016;32(5):368-84..

As filmagens que reproduziram a END foram analisadas por meio de apresentações orais e posteriormente foi aplicado o debriefing (reflexão), considerado a parte mais importante da simulação, que permite analisar criticamente o processo de planejamento e a relação estabelecida entre AF e AP1818 Wijma AJ, van Wilgen CP, Meeus M, Nijs J. Clinical biopsychosocial physiotherapy assessment of patients with chronic pain: the first step in pain neuroscience education. Physiother Theory Pract. 2016;32(5):368-84..

As solicitações para o debriefing consistiram em expressar a cena, destacando como se sentiram durante a avaliação fisioterapêutica e como profissionais da Fisioterapia, e elencar os pontos fortes da sua atuação e os pontos que poderiam ser melhorados. O intuito da vivência acadêmica descrita foi atender as Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Fisioterapia por meio de uso das metodologias e critérios para acompanhamento e avaliação do processo ensino-aprendizagem1919 Conselho nacional de educação câmara de educação superior resolução CNE/CES 4, de 19 de fevereiro de 2002. Institui Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Fisioterapia. Diário Oficial da União, Brasília, 4 de março de 2002. Seção 1, 11p..

CONCLUSÃO

Os resultados do relato de vivência em sala de aula apontam que possivelmente a simulação de casos clínicos permite que os discentes experimentem a representação de um evento real e que o instrumento WHOQOL-Bref valorizou a percepção individual, podendo avaliar a QV em diversos grupos e situações.

  • Fontes de fomento: não há.

Anexo 1

Teste WHOQOL-Bref

Questões 1 e 2 Caso 1 Caso 2 Caso 3 1. Percepção da qualidade de vida 3 3 2 2. Satisfação com a saúde 3 3 3 Domínio I - Físico Caso 1 Média Caso 2 Média Caso 3 Média 3.Dor e desconforto 2 1,83 2 1,71 3 2,85 4.Energia e fadiga 2 2 4 5.Sono e repouso 2 2 4 6.Mobilidade 1 1 3 7.Atividades da vida cotidiana 2 2 1 8.Dependência de fármacos ou de tratamentos 1 2 3 9.Capacidade de trabalho 1 1 2 Domínio II - Psicológico Caso 1 Média Caso 2 Média Caso 3 Média 10. Sentimentos positivos 2 2,66 3 2,33 1 2,83 11. Pensar, aprender, memória e concentração 3 3 3 12. Autoestima 3 2 4 13. Imagem corporal e aparência 3 1 4 14. Sentimentos negativos 1 2 2 15. Espiritualidade/religião/crenças pessoais 4 3 3 Domínio III - Relações sociais Caso 1 Média Caso 2 Média Caso 3 Média 16. Relações pessoais 2 3,0 3 2,33 1 1,0 17. Suporte (apoio) social 2 1 1 18. Atividade sexual 2 3 1 Domínio IV - Meio ambiente Caso 1 Média Caso 2 Média Caso 3 Média 19. Segurança física e proteção 2 2,5 2 2,0 3 2,75 20. Ambiente no lar 2 2 4 21. Recursos financeiros 2 1 2 22. Cuidados de saúde e sociais: disponibilidade e qualidade 3 2 2 23. Oportunidades de adquirir novas informações e habilidades 2 2 3 24. Participação e oportunidades de recreação/lazer 3 3 4 25. Ambiente físico: (poluição/ruído/trânsito/clima) 4 1 2 26. Transporte 2 3 2

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Mar 2019

Histórico

  • Recebido
    16 Ago 2018
  • Aceito
    07 Jan 2019
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