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Divulgação científica nas mídias sociais - desafios e oportunidades

O cientista é uma figura singular, que evoca curiosidade e intriga. O que faz um pesquisador em seu laboratório? Na arte e na história o cientista é, geralmente, identificado como uma pessoa excêntrica, de muito conhecimento e de pouco convívio social por estar focado em seus experimentos e suas reflexões. Por exemplo, as imagens de representação de ícones como Albert Einstein, representado descabelado e com caretas; na literatura com a criação do “Dr. Victor Frankenstein” ou no cinema com “Doutor Brown” (Doutor Emmett Lathrop) que controla a linha temporal na trilogia “De volta para o futuro”. Mas estas são todas representações de figuras do século passado, e cientistas, pesquisadores e a própria ciência mudaram (e mudam) com o advento das mídias sociais fomentados diretamente pelo acesso à informação por meios da internet. Os cientistas estão cada vez mais próximos da comunidade.

A pesquisa, a inovação científica e inclusive os jargões - como “evidência”, “fator de risco ou de proteção” - fazem parte do vocabulário da população no começo deste século. Eventos culturais e esportivos dedicam alguns minutos ou segundos para a divulgar ciência, como a breve apresentação do exoesqueleto do projeto Andar de Novo coordenada pelo Dr Miguel Nicolelis durante a abertura da Copa do Mundo de Futebol (Brasil, 2014)11 Associação Alberto Santos Dumont para Apoio a Pesquisa (AASDAP). Interface cérebro-máquina e o projeto andar de novo. https://www.aasdap.org.br/projeto-andar-de-novo (Acesso em 12 de maio 2024).
https://www.aasdap.org.br/projeto-andar-...
. Ainda que breves, são espaços de conquista para divulgação dos resultados de pesquisas. Acontecimentos traumáticos - como a pandemia e as consequências vivenciadas pelas mudanças climáticas - trazem a voz dos pesquisadores para a mídia aberta, e inúmeros canais de comunicação audiovisuais fortalecem-se por divulgar resultados científicos e traduzir a linguagem técnica para a compreensão do público em geral. A ciência aberta foi impulsionada, principalmente durante a pandemia da COVID-19, tanto pelas trocas de informação entre pesquisadores (Preprint, compartilhamento de dados, entre outros), quanto pela necessidade de acelerar a produção de conhecimento sobe o vírus, a doença, seu tratamento e prevenção (autocuidado e vacinas) e informar a grande massa popular para o enfrentamento da própria pandemia.

No Século XXI o pesquisador (cientista) não está mais isolado nem distante da população, não é mais aquela pessoa “escondida no laboratório”. Com as mídias sociais, os pesquisadores “abrem as portas” do laboratório, seja por vídeos, imagens, áudios ou entrevistas que explicam e informam a população em geral sobre resultados, efeitos e limites de estudos científicos.

Na fase aguda da pandemia da COVID-19, nós, profissionais de saúde e pesquisadores, nos deparamos com a fragilidade da comunidade pelo acesso a notícias de desinformação que aumentavam tanto o pânico quanto a negligência da gravidade da doença causada pelo vírus. Se por um lado os pesquisadores abriram suas planilhas de dados para acelerar as trocas entre grupos de pesquisas utilizando recursos das políticas editoriais da Ciência Aberta, por outro, poucos pesquisadores e clínicos atentaram-se a necessidade de divulgar o conhecimento científico à população leiga. O volume de desinformação foi (e continua) alto. Existe uma demanda para que pesquisadores e clínicos produzam materiais de divulgação científica nas mídias sociais com informação de qualidade, reconhecendo viés, forças e limites, sem jargões (ou traduzindo-os). Durante a pandemia, a população global estava exposta e vulnerável com acesso a desinformações sensacionalistas extremistas (pânico versus negação), mas apesar das vacinas, dos tratamentos e dos óbitos, a desinformação permanece pelas mídias sociais. Para o tratamento da dor, este cenário se repete: com propostas de tratamentos milagrosos que, por vezes, são simplesmente ineficazes e por outras são nocivos levando ao agravo da doença ou por induzir à comorbidades.

As mídias sociais estão hoje entre uns dos principais meios de comunicação e informação da população alfabetizada digitalmente. Esses canais de comunicação aproximam professores, pesquisadores, ícones internacionais, pessoas de cargos públicos e políticos de organizações governamentais ou não. Entretanto, poucos são os profissionais experts em suas áreas de atuação, estudo e pesquisa que dedicam tempo para ocupar esse “espaço” nas mídias sociais. Percebe-se um excesso de informações divulgando falsas ciências, mensagens “acolhedoras” (utópicas) que fragilizam pessoas vulneráveis, pouca (ou ausência) de ética, risco financeiro, risco à saúde física e mental.

A desinformação é tanta que a Organização Mundial da Saúde estabelece o termo “infodemia” para alertar a população sobre a abundância de informações que dificultam o processo de busca por informações de fontes e orientação confiáveis22 World Health Organization, 2020. Coronavirus Disease 2019 (COVID-19) Situation Report – 13. Geneva, Switzerland: WHO. https://www.who.int/publications/m/item/situation-report---13 (Acesso em 12 de maio 2024),
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. O discurso científico precisa ocupar as mídias sociais para: divulgar a inovação, explicar o rigor desde a formulação da pergunta até a interpretação e projeção dos resultados da pesquisa, e alfabetizar a população sobre o que é a ciência, o pensamento e o conhecimento científico. A divulgação científica se inicia com a população em geral informada e compreendendo que a ciência tem limites, que requer flexibilidade para a mudança de comportamento/pensamento e que precisa ter a possibilidade de refutar hipóteses. A pesquisa delimita seu problema e contesta hipóteses. Se não há hipótese, não há o que contestar, logo, não se aplica ao pensamento científico.

A BrJP propõe em sua política editorial estratégias para facilitar a divulgação científica publicada em nossa revista. Desde o BrJP volume 5, número 3, ano 2022 os autores devem apresentar três destaques dos seus artigos, além das palavras chaves e do resumo. Os destaques do artigo tendem a motivar a leitura do manuscrito e a facilitar a divulgação cientifica das principais mensagens e evidências apresentadas pelos pesquisadores. Em 2024, encorajamos os autores a publicação de “Resumo gráfico” (Graphical Abstract) ou seja, infográficos com o destaque ao objetivo, método e principais resultados apresentados no artigo, e a produção de texto simples de divulgação científica para publicação em blogs como o Scielo em Perspectiva33 Blog Scielo em perspectiva. https://blog.scielo.org/ (Acesso em 12 de maio 2024),
https://blog.scielo.org/...
.

A ciência se fundamenta em métricas, e estas não se limitam ao método e à análise dos dados. Pesquisadores e periódicos/revistas científicas também são “analisados” por mecanismos de métricas de citação entre outros. Desta forma, existem métricas para controle da divulgação científica dos artigos publicados e citados em mídias sociais, como Altmetric (combina o número de leitores no Mendeley e as referências na CrossRef), ImpactStory e Open Science Framework (sincronizam dados de produção científica pela plataforma ORCID). Estas métricas de acesso e divulgação pelas mídias sociais requerem que a revista científica e os pesquisadores estejam indexados em outros bancos de dados. A BrJP recebeu outras indexações nesses últimos três meses44 Souza JB. Para inovar é preciso conhecer a história. BrJP. 2024;v.7:e20230097., como Google Scholar55 Google Scholar https://scholar.google.com/scholar?hl=pt-BR&as_sdt=0%2C5&-q=brjp&btnG= (Acesso em 12 de maio 2024).
https://scholar.google.com/scholar?hl=pt...
, Miguilim com Selo Diamante66 Miguilim - BrJP https://miguilim.ibict.br/handle/miguilim/8751 (Acesso em 12 de maio 2024)
https://miguilim.ibict.br/handle/miguili...
, Latindex77 Latindex - BrJP. https://latindex.org/latindex/Solr/Busqueda?idModBus=0&buscar=brjp&submit=Buscar (Acesso em 12 de maio 2024).
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, ScienceOpen88 Science Open - BrJP https://www.scienceopen.com/search#(‘v’~4_’id’~’’_’queryType’~1_’context’~null_’kind’~77_’order’~0_’orderLowestFirst’~false_’query’~’brjp’_’filters’~!*_’hideOthers’~false) (Acesso em 12 de maio 2024).
https://www.scienceopen.com/search#(‘v’~...
, CrossRef99 CrossRef - BrJP - https://search.crossref.org/?from_ui=&q=brjp (Acesso em 12 de maio 2024).
https://search.crossref.org/?from_ui=&q=...
, Mendeley1010 Mendeley - BrJP - https://www.mendeley.com/search/?query=brjp&dgcid=md_homepage (Acesso em 12 de maio 2024).
https://www.mendeley.com/search/?query=b...
e Scite1111 Scite_BrJP - https://scite.ai/journals/brazilian-journal-of-pain-1Z1MX (Acesso em 12 de maio 2024).
https://scite.ai/journals/brazilian-jour...
.

A divulgação científica é mais ampla que a divulgação dos artigos em redes sociais, blogs e outras mídias. A publicação de infográficos, fotos e vídeos em repositório de dados1212 Souza JB, Freitas RL. A publicação científica torna-se maior que o artigo - repositório de dados da BrJP. BrJP. 2024;v7 BrJP. 2024;v.7:e20240021. complementam e potencializam a dimensão da divulgação dos resultados dos artigos; além de outros materiais como PodCast e Videoaulas para facilitar disseminação do conhecimento científico e da inovação.

Em suma, a ciência no Século XXI demanda que os pesquisadores também divulguem a inovação científica nos canais de comunicação das mídias sociais. Os pesquisadores precisam sair de seus laboratórios, de suas instituições e associações científicas. A ciência não deve ser um “clube fechado” como restrição financeira para publicar os resultados de um estudo ou restrição ao acesso aos artigos. A ciência e as pesquisas em saúde no tratamento da dor delimitam seus problemas de pesquisa para propor melhorias à população.

REFERENCES

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    15 Jul 2024
  • Data do Fascículo
    2024
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