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Esporotricose animal em dois municípios de Mato Grosso do Sul - Brasil: aspectos epidemiológicos sob a perspectiva de uma só saúde

Resumo

A esporotricose humana e animal têm sido observadas em Corumbá e Ladário, Mato Grosso do Sul (MS), desde 2011. Em razão das especificidades das áreas fronteiriças e da interface humano-ambiente-animais o desenvolvimento de políticas e programas de saúde, considerando conceitos de “uma só saúde”, é um caminho para a pesquisa e a gestão da saúde. O artigo discute sobre aspectos epidemiológicos da esporotricose felina com o objetivo de dar suporte às decisões pertinentes a sua prevenção, controle e gestão da saúde pública. Coletou-se informações em prontuários veterinários, entre 2011 e 2018, totalizando 315 casos (5 cães e 310 gatos). Realizou-se o mapeamento dos casos compatíveis ou confirmados de esporotricose animal, utilizando o QGis, entretanto a perda de dados foi um aspecto limitante. Foram realizadas estatística descritiva para frequência das variáveis, métodos de análise geo-estatística e taxas de ocorrência da doença. Este é o primeiro estudo sobre esporotricose no estado, a taxa de ocorrência, em felinos, variou de 0,04% a 3,50% entre os anos de 2015 e 2018. O perfil dos gatos infectados foi: adultos jovens, machos não-castrados. Taxa de eutanásia foi 76,50%, a taxa de cura em animais tratados foi 64,90%. O maior número de casos relacionou-se a bairros mais populosos, indicando que essas seriam áreas sob maior risco. Os resultados foram fundamentais para mobilizar o poder público e a sociedade em atenção à esporotricose, mas é preciso melhorar aspectos relacionados a notificação de casos, diagnóstico laboratorial, a acompanhamento do tratamento, educação sanitária, guarda responsável e controle populacional de felinos.

Palavras-chave:
micose; saúde pública; transbordamento; zoonose

Abstract

Human and animal sporotrichosis has been observed in Corumbá and Ladário, Mato Grosso do Sul (MS), Brazil, since 2011. The unique characteristics of border areas and the human-environmentanimal interface necessitate the development of health policies and programs that incorporate One Health concepts, fostering advances in health research and management. This article examines the epidemiological aspects of feline sporotrichosis with the aim of supporting decisions pertinent to its prevention, control, and public health management. Data were collected from veterinary records between 2011 and 2018, encompassing 315 cases (five dogs and 310 cats). Mapping of compatible or confirmed cases of animal sporotrichosis was conducted using QGis, though data loss posed a significant limitation. Descriptive statistics assessed the frequency of variables, geo-statistical analysis methods, and disease occurrence rates. This study represents the first investigation of sporotrichosis in the state. The occurrence rate in felines varied from 0.04% to 3.50% between 2015 and 2018. The typical profile of infected cats was young adults that were not neutered. The euthanasia rate was 76.50%, while the cure rate for treated animals stood at 64.90%. A higher number of cases was associated with more populous neighborhoods, indicating these as higher-risk areas. The findings were crucial in engaging public authorities and the community to address sporotrichosis. However, improvements are needed in areas such as case notification, laboratory diagnosis, treatment monitoring, health education, responsible pet ownership, and population control of felines.

Keywords:
mycosis; public health; spillover; zoonosis

Resumo gráfico

1. Introdução

A esporotricose, doença causada pelo fungo dimórfico do gênero Sporothrix, tem distribuição mundial, ocorrendo especialmente em zonas tropicais e subtropicais, classificada como a micose subcutânea mais comum na América do Sul (11 Barros MBL., Schubach AO, Valle AC, Gutierrez-Galhardo MC, Conceição-Silva F, Schubach TM, Reis RS, Wanke B, Marzochi KB, Conceição MJ. Cat-Transmitted Sporotrichosis Epidemic in Rio de Janeiro, Brazil: Description of a Series of Cases. Clinical Infectious Diseases 2004; 38 (4):529-535. https://doi.org/10.1086/381200
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, 22 Hernández-Castro R, Pinto-Almazán R, Arenas R, Sánchez-Cárdenas CD, Espinosa-Hernández VM, Sierra-Maeda KY, Rodríguez-Cerdeira C. Epidemiology of clinical sporotrichosis in the Americas in the last ten years. Journal of Fungi 2022; 8(6):588. https://doi.org/10.3390/jof8060588
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).

A enfermidade, que possui caráter ocupacional, está relacionada as atividades ligadas ao cultivo e manuseio do solo. Nesse caso, a transmissão ocorre por meio da inoculação do fungo na pele e no tecido subcutâneo a partir de lesões traumáticas, com material contaminado. O gato doméstico é a principal espécie na transmissão de Sporothrix sp, entre animais e para humanos, por ter elevada carga fúngica em suas lesões, além de possuir hábitos que facilitam a inoculação do agente em animais domésticos e silvestres por meio de arranhaduras ou mordeduras de gatos infectados (33 Cruz, LCH. Complexo Sporothrix schenckii. Revisão de parte da literatura e considerações sobre o diagnóstico e a epidemiologia. Veterinária e Zootecnia. 2013; 20, 08-28. https://rvz.emnuvens.com.br/rvz/article/view/1508/1009
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, 44 Gremião IDF, Miranda LHM, Reis EG Rodrigues AM, Pereira SA. Zoonotic epidemic of sporotrichosis: cat to human transmission. PLoS pathogens 2017; 13(1): e1006077. https://doi.org/10.1371/journal.ppat.1006077
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, 55 Queiroz-Telles F., Bonifaz A., Rossow J., Chindamporn A. Sporothrix and Sporotrichosis. Encyclopedia of Infection and Immunity 2022; 2:376-396. https://doi.org/10.1016/B978-0-12-818731-9.00046-X
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).

As espécies S. brasiliensis e S. schenckii estão relacionadas tanto à transmissão zoonótica quanto à transmissão animal horizontal, mas o aumento no número de casos em humanos e em animais, detectados em áreas urbanas (66 Alvarez CM, Oliveira MME, Pires RH. Sporotrichosis: A Review of a Neglected Disease in the Last 50 Years in Brazil. Microorganisms 2022; 10:2152. https://doi.org/10.3390/microorganisms10112152
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).

A transmissão zoonótica de S. brasiliensis começou no final da década de 1990 no estado do Rio de Janeiro, que hoje apresnta situação hiperendêmica em relação a esporotricose. Epizootias persistentes foram detectadas nas regiões Sul e Sudeste do Brasil, além de relatos de surtos em vários municípios do país. A não obrigatoriedade de notificação, o diagnóstico e tratamento tardios estão entre as causas de disseminação dessa doença para pelo menos 25 estados brasileiros e países fronteiriços com a Argentina (55 Queiroz-Telles F., Bonifaz A., Rossow J., Chindamporn A. Sporothrix and Sporotrichosis. Encyclopedia of Infection and Immunity 2022; 2:376-396. https://doi.org/10.1016/B978-0-12-818731-9.00046-X
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, 66 Alvarez CM, Oliveira MME, Pires RH. Sporotrichosis: A Review of a Neglected Disease in the Last 50 Years in Brazil. Microorganisms 2022; 10:2152. https://doi.org/10.3390/microorganisms10112152
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).

Os primeiros casos de esporotricose humana em Corumbá e Ladário começaram a ser noticiados, na mídia, em 2016; embora houvesse conhecimento sobre caso animal e humano ocorrido em 2011. O Conselho Regional de Medicina Veterinária de Mato Grosso do Sul divulgou medidas de esclarecimento sobre a zoonose (77 Araújo LTR, Juliano RS Silva WA. Região fronteiriça e epidemiologia: estudo da esporotricose e sua relação na dinâmica da fronteira Brasil-Bolívia. Revista Geo Pantanal 2017; 12:97-105. https://periodicos.ufms.br/index.php/revgeo/article/view/4679
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).

A escassez de informações oficiais e evidências científicas da esporotricose nesses municípios, motivou pesquisadores a investigar aspectos da sua ocorrência, com apoio da gestão pública de saúde e dos médicos veterinários.

A peculiaridade desses municípios estarem em área de fronteira Brasil-Bolívia, foi considerado um fator determinante as investigações sobre a situação epidemiológica da esporotricose, pois não foram encontradas informações sobre casos de esporotricose humana ou animal na Bolívia.

Assim, considerou-se que, a falta de conhecimento sobre essa doença interfere diretamente na aplicação de estratégias de prevenção e controle desta zoonose, podendo resultar em importante risco de agravos à saúde pública das populações locais (88 Bruniera-Oliveira RBO, Horta MAPP, Belo VSS, Carmo EH, Verani JFS. Desenvolvimento da vigilância epidemiológica de fronteira no contexto da globalização: conceitos e marcos teóricos. Tempus-Actas de Saúde Coletiva 2014; 8(3):75-93. https://doi.org/10.18569/tempus.v8i3.1565
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).

Nesse contexto, o presente estudo teve como objetivo fornecer informações sobre a esporotricose animal com a finalidade de colaborar para o delineamento de um plano de trabalho que atenda às questões de vigilância epidemiológica, diagnóstico, tratamento, profilaxia e controle dessa enfermidade, permitindo assim a tomada de decisões que visem o aperfeiçoamento da qualidade de atenção à saúde nessa região de fronteira Brasil-Bolívia, do estado de Mato Grosso do Sul.

Além disso, supõe-se que a possibilidade de implantar programas sanitários com enfoque em “uma só saúde” favorece o controle da esporotricose por incluir ações de educação, guarda responsável de animais de estimação, tratamento de resíduos, entre tantas outras estratégias capazes de conter a disseminação do agente no ambiente e a infecção de humanos e animais (99 Thomson P, González C, Blank O, Ramírez V, Río CD, Santibáñez S, Pena P. Sporotrichosis outbreak due to Sporothrix brasiliensis in domestic cats in Magallanes, Chile: a one-health-approach study. J. Fungi 2023; 9:226. https://doi.org/10.3390/jof9020226
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).

2. Material e métodos

O estudo foi realizado em Corumbá e Ladário, municípios localizados em faixa de fronteira, apresentando relação territorial a leste (Figura 1), no lado brasileiro; a oeste, Corumbá faz fronteira com o distrito de Puerto Quijarro, pertencente à província de Germán Busch, no departamento de Santa Cruz, na Bolívia.

Figura 1
Mapa mostrando os países da América do Sul, o Brasil, e, em evidência, o Estado de Mato Grosso do Sul, com destaque para os municípios de Corumbá e Ladário.

Foram contatados 15 médicos veterinários, totalizando 83,00% do total de profissionais atuantes, que realizavam atendimentos de animais de pequeno porte em clínicas veterinárias privadas e/ou em domicílios, bem como aqueles que prestam serviço a órgãos municipais responsáveis pela vigilância epidemiológica de zoonoses nos dois municípios estudados. Tais profissionais disponibilizaram as fichas de atendimentos de casos de esporotricose em gatos, desde o ano de 2011 até o mês de julho de 2018, constando as seguintes informações: endereço do responsável pelo animal ou local onde foi encontrado o animal; idade aproximada, espécie e sexo do animal; resultado de diagnóstico clínico-laboratorial; tratamento, evolução clínica e desfecho do caso.

Os critérios diagnósticos identificados nas fichas clínicas, para considerar um caso de esporotricose animal, foram: (I) diagnóstico clínico, a partir da verificação de lesões compatíveis com quadro clínico de esporotricose; e/ou (II) diagnóstico laboratorial: crescimento de Sporothrix sp. em meio de cultivo ou detecção de células leveduriformes em exame citológico, a partir do exsudato ou fragmento de lesão cutânea.

Após concluída a coleta dos dados, o trabalho para o mapeamento dos casos foi realizado em três etapas seguintes: (I) construção do banco de dados em planilhas informatizadas utilizando software Excel® 2010 (Microsoft, Washington, EUA), (II) localização das coordenadas dos casos por meio do aplicativo Google Maps e (III) busca de coordenadas in loco com GPS (Global Positioning System).

Endereços sem descrição de número foram localizados a partir dos pontos médios dos referidos logradouros e quando não encontrado, foi considerado como perda primária.

Esses endereços não localizados pelo aplicativo (perda primária) foram verificados in loco com uso de aparelho de GPS (modelo Etrex Garmin®). Os endereços não identificados por busca presencial foram considerados perdas definitivas e foram excluídos apenas da etapa de análise geoespacial, sendo incluídos nas demais análises.

Concluída a localização das coordenadas, todas estas foram lançadas em um software livre de Sistema de Informações Geográficas (SIG) denominado QGIS versão 3.4.2, (Open Source Geospatial Foundation) que permitiu visualizar a distribuição dos casos de esporotricose.

Os resultados das fichas de atendimento foram avaliados por meio de estatística descritiva para a exposição das frequências das variáveis (espécie, sexo, idade, ocorrência ou ausência de castração, tratamento e evolução dos casos (1010 Ferreira LM, Sáfadi T, Lima RR. Técnicas da estatística espacial na análise de dados de áreas no estudo da dengue. Revista Univap, v.24, n.44, p.13-27, 2018. Doi: https://doi.org/10.18066/revistaunivap.v24i44.1920
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).

O fato de haver um caráter zoonótico na ocorrência da esporotricose e da notificação de casos humanos ser inexistente, resultou na opção por análises estatísticas que pudessem esclarecer a relação entre os espaços ocupados por animais infectados e pessoas residentes.

Nesse contexto realizou-se o teste de Correlação Linear de Pearson, como uma medida de associação linear entre variáveis: I- número de habitantes por bairro nos municípios de Corumbá e Ladário (1111 Figueiredo Filho DB, Silva Junior JA. Desvendando os Mistérios do Coeficiente de Correlação de Pearson (r). Revista Política Hoje 2009; 18(1):115-46. https://dirin.s3.amazonaws.com/drive_materias/1666287394.pdf
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) (variável independente); e II- número de casos registrados de esporotricose nos dois municípios estudados (variável dependente) nos anos de 2017 e 2018, pois foram anos com maior número de casos.

A classificação de resultados da Correlação Linear de Pearson foi utilizada conforme especificado por Dancey & Reidy (1212 Dancey C, Reidy J. Estatística Sem Matemática para Psicologia: Usando SPSS para Windows. Porto Alegre: Artmed, 2006. 608 p.), podendo ser classificada como: fraca, quando o valor de “r” corresponder entre os valores de 0,10 a 0,30; moderada, quando estiver entre 0,40 e 0,60; e forte, quando for entre 0,70 e 1,0.

Realizou-se a Análise de Regressão de Mínimos Quadrados, com a finalidade de estimar a tendência de ocorrência da doença em caso de mudanças no número total de habitantes (1313 Hill RC, Griffiths WE, Judge GG. Econometria. 2nd ed. São Paulo: Saraiva, 2003. 408p.) e obteve-se o melhor modelo de regressão: Modelo Linear.

A análise de agrupamento (clusters) nos dados estratificados (foi feita conforme a localização por bairros dos casos de esporotricose, classificando os objetos da amostragem em grupos homogêneos.

A taxa de ocorrência de esporotricose em felinos foi calculada pelo número de animais registrados, com suspeita ou diagnóstico laboratorial confirmado e georreferenciado, em razão da estimativa do número total de felinos existentes nos municípios, obtida a partir do número de animais vacinados em domicílio “casa a casa” pelo CCZ, na área urbana de Corumbá durante os anos de 2015 ao mês de julho de 2018 (Tabela 1). Foram suprimidos do cálculo: os casos de esporotricose canina, os bairros que não dispunham de informações sobre vacinações, os casos sem georreferenciamento e os bairros que não apresentaram registro de casos da doença.

Tabela 1
Número de felinos vacinados contra raiva nos bairros do município de Corumbá, MS, durante os anos de 2015 a 2018 (1º semestre).

A taxa de ocorrência do município de Ladário não foi calculada, em virtude da ausência de dados sobre a população felina e das inconsistências das fichas epidemiológicas dos casos de esporotricose fornecidas pelo NCZ do município.

3. Resultados e discussão

As consultas em fichas clínicas resultaram na detecção de 315 casos (5 cães e 310 gatos) registrados de esporotricose em animais, com diagnóstico clínico, a partir da detecção de lesões compatíveis com a doença (ulceras cutâneas múltiplas, na região da cabeça, toráx e extremidades, deformidade da face), ou com confirmação diagnóstica por meio de exames laboratoriais (citologia e isolamento microbiológico).

Observou-se que os órgãos de vigilância epidemiológica (Centro de Controle de ZoonosesCCZ e Núcleo de Controle de Zoonoses-NCZ), assim como a maior parcela dos médicos veterinários, realizam somente o diagnóstico clínico; apenas dois veterinários encaminhavam amostra clínica de animal com suspeita de esporotricose para diagnóstico laboratorial, que é feito em laboratório particular no estado de Minas Gerais.

O diagnóstico laboratorial de esporotricose em animais é necessário para se estabelecer procedimentos que evitem a disseminação para animais e humanos, bem como estabelecer rapidamente o tratamento adequado do paciente infectado. A citologia pode ser um método rápido para um diagnóstico presuntivo, associado a sinais clínicos, mas deve ser acompanhado de diagnóstico microbiológico confirmatório (33 Cruz, LCH. Complexo Sporothrix schenckii. Revisão de parte da literatura e considerações sobre o diagnóstico e a epidemiologia. Veterinária e Zootecnia. 2013; 20, 08-28. https://rvz.emnuvens.com.br/rvz/article/view/1508/1009
https://rvz.emnuvens.com.br/rvz/article/...
).

As informações contidas nos prontuários de atendimentos médico-veterinários e nas fichas dos centros de zoonoses estavam frequentemente incompletas ou ausentes, dificultando a construção de um banco de dados para estudos epidemiológicos. Do total de animais descritos (n=315), 121 (38,4%) apresentaram dados incompletos ou totalmente ausentes (n=108).

Essa situação de ausência total de informações sobre os casos de esporotricose se deu exclusivamente com animais recebidos pelo NCZ de Ladário e que foram destinados a eutanásia. Decidiu-se por aproveitar parcialmente os registros incompletos para análises descritivas de variáveis (espécie, sexo, idade, ocorrência ou ausência de castração, tratamento e evolução dos casos) e geo-localização, que serão apresentados e discutidos a seguir.

As perdas de dados relatadas no registro de casos, foi de fundamental importância para sinalizar a situação precária da vigilância epidemiológica desse município. Somente quatro cães foram incluídos nas análises descritivas e mapeamento, por apresentarem informações suficientes no prontuário clínico, um deles tinha localização em Ladário e os demais estavam distribuídos nos bairros Popular Nova, Guanã e Centro, em Corumbá.

A falta de padronização da coleta de dados, entre profissionais dos municípios estudados, reduziu a precisão para conhecimento da situação da esporotricose animal. Tal fato dificulta o processo de atendimento aos agravos à saúde e o entendimento da real situação epidemiológica desta zoonose, comprometendo negativamente a elaboração e o sucesso de programas sanitários. A cidade de São Paulo-SP estabeleceu protocolos para o clínico notificar os serviços de zoonoses municipais que atuam na identificação de casos, e disponibilizam o diagnóstico laboratorial para os casos encaminhados (1414 Silva EAD., Bernardi F, Mendes MCNC, Ferreira AAMB, Montenegro H. Esporotricose: situação na cidade de São Paulo e a importância do clínico veterinário na vigilância dessa zoonose. Boletim APAMVET 2019; 10(1):11-14. http://www.publicacoes.apamvet.com.br/PDFs/Artigos/83.pdf
http://www.publicacoes.apamvet.com.br/PD...
).

É importante reforçar nos diferentes setores de atuação profissional a necessidade de adoção de protocolos padronizados para coleta de informações sobre o atendimento à saúde animal, facilitando, quando necessário, a obtenção de dados para estudos que possam colaborar, inclusive, com a saúde pública.

Essa zoonose é exemplo de atuação no contexto de Saúde Única, com relevante papel do médico-veterinário na detecção, prevenção da transmissão e na notificação aos órgãos de vigilância de zoonoses (1414 Silva EAD., Bernardi F, Mendes MCNC, Ferreira AAMB, Montenegro H. Esporotricose: situação na cidade de São Paulo e a importância do clínico veterinário na vigilância dessa zoonose. Boletim APAMVET 2019; 10(1):11-14. http://www.publicacoes.apamvet.com.br/PDFs/Artigos/83.pdf
http://www.publicacoes.apamvet.com.br/PD...
).

Potencializar a rede de diagnóstico, no CCZ ou NCZ, e o envolvimento de agentes de saúde na vigilância ativa e educação sanitária pode ser uma alternativa para o monitoramento da esporotricose em municípios sob condições epizoóticas.

O médico veterinário tem atuação relevante na saúde pública e vigilância epidemiológica, principalmente na detecção, prevenção e controle de zoonoses, pois possui capacidade técnica de avaliar o processo saúde-doença e suas inter-relações (1515 Carvalho LRO, Rodrigues HSMC, Silveira Neto OJ, Sola MC. A atuação do médico veterinário em Saúde Pública: histórico, embasamento e atualidade. J Health Sci Inst. 2017; 35(2):131-136. https://repositorio.unip.br/wpcontent/uploads/2020/12/V35_n2_2017_p131a136.pdf
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).

A eficiente coleta de dados em saúde pública, interfere diretamente no bom desempenho da programação e atuação dos órgãos de vigilância, incluindo os CCZs e NCZs, que são unidades de saúde com atribuições destinadas à prevenção e controle das zoonoses, a partir do desenvolvimento de sistemas de vigilância sanitária, epidemiológica e ambiental em saúde (1616 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância das Doenças Transmissíveis. Manual de vigilância, prevenção e controle de zoonoses: normas técnicas e operacionais. Brasília: Ministério da Saúde, 2016. 121p. https://www.gov.br/saude/pt-br/centrais-de-conteudo/publicacoes/svsa/zoonose/manual-zoonoses-normas-2v-7julho16-site.pdf/view
https://www.gov.br/saude/pt-br/centrais-...
).

A localização por meio do aplicativo Google Maps foi realizada a partir dos 194 casos que apresentaram endereços completos na ficha clínica, houve perda primária em 12 destes casos, posteriormente 10 casos foram localizados in loco com o uso de GPS, registrando 1,03% (2/194) como perda definitiva.

As coordenadas identificadas dos 192 casos foram mapeadas. Cada círculo amarelo corresponde a um endereço com coordenada geográfica localizada, podendo cada ponto estar relacionado a presença de um ou mais animais detectados. Em Ladário, dos 121 casos detectados, apenas 12 possuíam dados completos e foram inseridos no mapa (Figura 2).

Figura 2
Imagem dos casos georreferenciados de esporotricose, de cães (n=2) e gatos (n=190), nos municípios de Corumbá e Ladário, MS, entre os anos de 2011 a 2018. Destaque para: linha vermelha: limite internacional Brasil-Bolívia; linha azul: limite intermunicipal Corumbá-Ladário.

A localização presencial das coordenadas dos casos, mostrou-se eficaz para um maior aproveitamento dos endereços que não puderam ser identificados pelo aplicativo on line. Entretanto, essa estratégia implicou em maior custo e tempo para sua realização, além da dificuldade na localização de logradouros, pela ausência ou descontinuidade na numeração das residências. A estruturação cartográfica e do SIG desses municípios, assim como a melhoria na coleta e documentação de informações dos casos identificados, proporcionariam agilidade aos estudos epidemiológicos e à tomada de decisões para intervenção em programas de saúde.

Tais afirmativas corroboram Gondim et al. (1717 Gondim GMM, Christófaro MAC, Miyashiro G. Técnico de vigilância em saúde: fundamentos: volume 2 - Rio de Janeiro: EPSJV, 2017, 270p. https://www.epsjv.fiocruz.br/sites/default/files/livro2.pdf
https://www.epsjv.fiocruz.br/sites/defau...
) que relataram situações e dificuldades para a realização de georreferenciamento, e destacaram a falta de Sistemas de Informações Geográficas (SIG) municipais estruturados, a carência de bases cartográficas digitais e cadastros oficiais de endereços, além da complexidade da infraestrutura urbana, principalmente em áreas com ocupações irregulares e favelas, onde é comum a não-padronização dos endereços.

A prefeitura de Corumbá possui um setor de geoprocessamento que atua na gestão imobiliária e que poderia fornecer coordenadas e endereços atualizados dos imóveis, facilitando o mapeamento e monitoramento de doenças no município em parceria com a secretaria de saúde.

Em Corumbá, os bairros onde houve maior concentração de casos foram: Centro, Popular Velha e Nova Corumbá (Figura 3). O Centro teve uma população declarada de 18.400 habitantes; e Nova Corumbá com 7.900, estando entre os bairros mais populosos da cidade (1818 IBGE. Instituto Brasileiro de Geografía e Estatística. Sinopse do Censo Demográfico 2010. 2011. http://censo2010.ibge.gov.br
http://censo2010.ibge.gov.br...
).

Figura 3
Número de casos de esporotricose registrados em fichas clínicas, entre os anos de 2011 a 2018, distribuídos por bairros, em Corumbá, MS. Casos de esporotricose canina (n=2) foram incluídos nos bairros Centro e Popular Nova.

Observou-se a associação entre o número de habitantes e a frequência de casos detectados conforme a localização, com coeficiente igual a 0,75 e nível de significância de p≥0,05. O coeficiente de determinação, que mede o ajustamento do modelo, é de 0,57, ou seja, 57,00% da variável dependente (casos de infecção) pode ser explicada pela variável independente (tamanho da população no bairro). O teste de análise de regressão de mínimos quadrados resultou em uma tendência de surgimento de 20 novos casos de esporotricose animal, caso haja uma variação de 10 mil habitantes.

Esses resultados podem indicar áreas prioritárias para vigilância ativa para monitoramento do registro de casos em animais e humanos, além de levantar hipóteses da importância do comportamento humano na disseminação da doença.

A partir da análise de agrupamento (clusters), observou-se a formação de dois grupos, sendo um (I) com os bairros de maior densidade populacional (Nova Corumbá, Popular Velha, Cristo Redentor e Centro); e o segundo grupo (II) com os bairros com menor densidade populacional. O agrupamento de ocorrência de infecção relacionou-se ao número de habitantes por bairro, corroborando os resultados da análise de correlação linear.

A relação entre os casos de esporotricose felina e a densidade populacional pode ser explicada pela relação direta do crescimento da população humana nas zonas urbanas, com o aumento da população de gatos não domiciliados, que têm acesso a fontes antropogênicas de alimento. Esse desequilíbrio na dinâmica populacional reflete em risco de transmissão de agentes etiológicos com potencial zoonótico ou não, além de ter um importante impacto na biodiversidade local, em função do comportamento predatório dos gatos (1919 Johann JM, Angeoletto F, Richard, E. Notas sobre a presença dos gatos domésticos nas cidades médias. Terr@ Plural. 2019; 13(3):470-478. https://revistas.uepg.br/index.php/tp/article/view/13419
https://revistas.uepg.br/index.php/tp/ar...
).

Nesse contexto torna-se fundamental uma reflexão com enfoque em conceitos de “uma só saúde”. Aspectos ecológicos da região estudada devem ser abordados: em Corumbá, o aparecimento de grandes felinos em ambiente urbano é um fato recorrente em períodos nos quais as enchentes alagam extensas áreas e esses animais silvestres atravessam o Rio Paraguai, em direção à cidade, na tentativa de encontrar abrigo e alimento.

A perturbação dos habitats tradicionais da vida selvagem, relacionada a eventos climáticos, alterações demográficas e comportamentos humanos podem expor as populações à diferentes patógenos (2020 Gamble A, Olarte-Castillo XA, Whittaker GR. Backyard zoonoses: The roles of companion animals and peridomestic wildlife. Science Translational Medicine 2023; 15(718):eadj0037. https://www.science.org/doi/10.1126/scitranslmed.adj0037
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).

A emergência e dispersão de uma doença está relacionada, entre tantos fatores, ao modo de transmissão, sobrevivência do agente infectante, potencial de amplificação e transmissão de hospedeiros. A interação de fatores de risco aumenta a probabilidade de spillover (2121 Carpouron JE, Hoog S, Gentekaki E, Hyde KD. Emerging animal-associated fungal diseases. Journal of Fungi 2022; 8(6):611. https://doi.org/10.3390/jof8060611
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). Nesse contexto, a situação descrita acima seria um potencial fator de dispersão e spillover de Sporothrix sp.

Na distribuição temporal do total de casos de esporotricose em ambos os municípios (Figura 4), observou-se um crescimento acentuado nos anos de 2017 (n=146) e 2018 (n=147), quando a distribuição mensal dos casos apresentou comportamento semelhante durante os meses de janeiro a abril, entretanto, em 2018 houve aumento no número de casos em maio.

Figura 4
Distribuição mensal do número de casos suspeitos e confirmados de esporotricose animal, entre os anos de 2011 e 2018, em Corumbá e Ladário, MS.

Figura 5
Imagem com a localização dos bairros de Corumbá, MS, que apresentaram isoladamente maior número de casos (na cor verde) e maiores taxas de ocorrência (na cor vermelha) de esporotricose felina, e essas duas características ocorrendo simultaneamente (nas cores verde e vermelha), no período de 2015 a 2018 (1º semestre).

A distribuição mensal dos casos de esporotricose não caracteriza necessariamente sazonalidade, pois a subnotificação e reconhecimento da doença interferem diretamente nesse estudo. Entretanto, considerando um tempo aproximado de 80 dias, desde a infecção, manifestação de sinais clínicos até o momento em que o animal foi encaminhado para o atendimento clínico (2222 Pereira SA, Gremião IDF, Kitada A.AB, Boechat JS, Viana PG, Schubach TMP. The epidemiological scenario of feline sporotrichosis in Rio de Janeiro, State of Rio de Janeiro, Brazil. Revista da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical 2014; 47:392-393. https://doi.org/10.1590/0037-8682-0092-2013
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) sugere-se que os animais tenham se infectado nos meses de verão, quando as temperaturas e umidade favorecem o crescimento do agente no ambiente e o fotoperíodo (12 a 14 horas de luz/da) estimula o ciclo estral das gatas e as brigas de machos para o acasalamento (2323 Freitas VLT, Rocha FMM, Ribeiro EN, Lindoso JAL, Bittencourt AA, Pivetta DNAG, Freitas-Xavier R.S. Seasonality of sporotrichosis in Brazil: A modelled analysis of the epidemic in São Paulo, 2011-2020. Mycoses 2023 ; 66(8):643-650. https://doi.org/10.1111/myc.13594
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).

Tendo como informação o número de casos georreferenciados e o número de felinos vacinados contra raiva, foi possível estimar a taxa de ocorrência por localidade, entre os anos de 2015 e 2018 (Tabela 2).

Tabela 2
Taxa de ocorrência de esporotricose felina em bairros do município de Corumbá, MS, durante os anos de 2015 a 2018 (1º semestre).

Ao estratificar a taxa de ocorrência por bairros, surgiram bairros que não se destacaram anteriormente quando avaliados a partir do número absoluto de casos de esporotricose.

Os bairros Dom Bosco, Nossa Senhora de Fátima, Centro América, Centro, Popular Velha e Popular Nova apresentaram, em ordem decrescente, as maiores frequências de casos.

Sobrepondo os bairros com maior número absoluto de casos, com os bairros que apresentaram as maiores taxas de ocorrência (Figura 4), surge uma área onde haveria maior risco para a esporotricose felina no município de Corumbá, constituída pelos bairros que apresentaram, simultaneamente, maiores números de casos e taxa de ocorrência (Centro, Centro América, Nossa Senhora de Fátima e Popular Velha).

Essas localidades seriam prioritárias para a aplicação de ações destinadas ao controle da esporotricose felina, tais como a busca ativa de casos em animais e humanos, além de ações de educação sanitária, guarda responsável e controle populacional.

Dos 315 casos identificados inicialmente nesse trabalho, 98,40% (n=310) ocorreram em felinos, e apenas cinco cães foram notificados como suspeitos da doença. Em 159 casos (50,50%) não havia referência sobre a idade dos animais; entretanto, 73,10% (114/156) dos casos ocorreram na faixa etária de 1 a 5 anos. A informação sobre o sexo do animal estava disponível em 206 (65,40%) casos, sendo 146 (70,90%) machos e 60 (29,10%) fêmeas, destacando-se que 6,30% e 3,80% desses eram castrados, machos e fêmeas, respectivamente.

O perfil da população animal acometida pela esporotricose corrobora com diferentes autores (2424 Rossi CN, Odaguiri J, Larsson CE. Clinical and epidemiological characterization of sporotrichosis in dogs and cats (São Paulo, Brazil). Semina: Ciências Agrárias 2013; 34(2):3889-3896. 10.5433/1679-0359.2013v34n6Supl2p3889
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, 2525 Rossow JA, Queiroz-Telles F, Caceres DH, Beer KD, Jackson BR, Pereira JG, Pereira SA. A one health approach to combatting Sporothrix brasiliensis: narrative review of an emerging zoonotic fungal pathogen in South America. Journal of Fungi2020; 6(4):247, 2020. https://doi.org/10.3390/jof6040247
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,2626 Maia M A, Sinhorini JA, Cortez TL, Alves LCB, Lima Júnior FEF, Wada MY, Silva AJ. Perfil Epidemiológico de Gatos com Esporotricose no Município de São Paulo (SP), 2011 a 2022. Journal of Health & Biological Sciences 2023; 11(1):1-7. 10.12662/2317-3206jhbs.v11i1.4818p1-7.2023
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), que relataram uma maior predisposição da doença em machos felinos não castrados, por apresentarem maior acesso a rua e pela facilidade de envolverem-se em brigas por território ou por fêmeas durante os períodos reprodutivos.

Houve confirmação laboratorial do diagnóstico em 21,30% (67/315) dos casos, todos avaliados por meio de citologia e cultura para pesquisa de fungo Sporothrix sp.

A importância do diagnóstico laboratorial para confirmação da doença está relacionada à implementação de medidas eficazes de prevenção e controle, assim como de aplicação de terapêutica direcionada aos animais acometidos, evitando transmissão para animais e humanos, custos desnecessários com tratamento ou mesmo efeitos colaterais para o paciente. Esse é um passo fundamental para identificar e alertar prontamente às autoridades de saúde pública, evitando situações de disseminação de zoonoses (2727 Bird BH, Mazet, JA. Detection of emerging zoonotic pathogens: an integrated one health approach. Annual Review of Animal Biosciences, 2018; 6:121-139. https://www.annualreviews.org/doi/pdf/10.1146/annurevanimal-030117-014628
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).

A eutanásia foi realizada em 241 animais (76,50%), enviados aos órgãos públicos de controle de zoonoses e 74 (23,50%) foram submetidos à tratamento. Dos animais tratados, com itaconazol e ou iodeto de potássio, 48 (64,90%) foram curados; 21 animais foram a óbito naturalmente e 5 foram encaminhados para eutanásia, posteriormente ao tratamento.

Os índices de cura e taxa de letalidade entre os animais tratados no presente estudo foram maiores que os resultados descritos por Rabello et al. (2828 Rabello VBS, Almeida MA, Bernardes-Engemann AR, Almeida-Paes R, Macedo PM, Zancope-Oliveira RM. The historical burden of sporotrichosis in Brazil: a systematic review of cases reported from 1907 to 2020. Brazilian journal of microbiology. 2022; 53(1):231-244. https://doi.org/10.1007/s42770-021-00658-1
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), que obtiveram 56,72% e 24,32%, respectivamente. Entretanto, verificaram características que não foram avaliadas no presente estudo: 13,07% de abandono do tratamento e 5,89% de falha no tratamento.

O perfil epidemiológico da esporotricose felina, descrito por Maia et al. (2525 Rossow JA, Queiroz-Telles F, Caceres DH, Beer KD, Jackson BR, Pereira JG, Pereira SA. A one health approach to combatting Sporothrix brasiliensis: narrative review of an emerging zoonotic fungal pathogen in South America. Journal of Fungi2020; 6(4):247, 2020. https://doi.org/10.3390/jof6040247
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), na cidade de São Paulo, revelou taxas de letalidade entre 1,10% e 20,50%, dependendo do bairro em que se encontravam os animais e a taxa de cura foi próximo a 50,00%.

A interação de diferentes instituições e profissionais para realizar o presente trabalho resultou na publicação da Resolução 047/2019 e da nota técnica 01/2019, orientando sobre esporotricose, com base na situação epidemiológica do município (2929 Diocorumbá, Resolução 047/2019 - GVS/SMS/PMC - Esporotricose. Edição nº1619, p.28-28, 27 de fevereiro de 2019. https://do.corumba.ms.gov.br/portal/visualizacoes/pdf/3340#/p:26/e:3340?find=esporotricose
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), além da realização do 1° Workshop de Esporotricose, em agosto de 2019, que possibilitou uma discussão técnica e informativa para médicos, enfermeiros, médicos veterinários, estudantes e ONGs que atuam na proteção animal. Isso foi determinante para avançar nos procedimentos de notificação de casos de esporotricose animal e humana, mobilização da vigilância epidemiológica, encaminhamento de amostras para o Laboratório Central (LACEN-MS) e disponibilidade de medicação para tratamento no SUS.

5. Conclusão

Os resultados encontrados possibilitam concluir que a esporotricose felina está presente nos municípios de Corumbá e Ladário, que o número de casos é proporcionalmente maior em bairros mais populosos, e que houve um aumento importante a partir de 2017. Os animais infectados são principalmente felinos adultos jovens, machos não-castrados. A maioria dos casos foi encaminhada para eutanásia, sem diagnóstico laboratorial ou tratamento, entretanto, a maioria dos animais tratados apresentou evolução satisfatória e cura.

Aspectos importantes dessa enfermidade precisam continuar sendo investigados para que possam construir uma base de dados robusta para subsidiar um programa de prevenção e controle aplicando conceitos de “uma só saúde”. Entre outros sugere-se definir as espécies de Sporothrix sp envolvidas em casos humanos e animais, monitorar a ocorrência espaço temporal dos casos e verificar se existe associação tais variáveis com dados socioeconômicos e ambientais.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    23 Set 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    10 Jan 2024
  • Aceito
    14 Maio 2024
  • Publicado
    06 Ago 2024
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