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Tipos de leite consumidos durante o primeiro ano de vida e estado nutricional de lactentes do Sul do Brasil

Types of milk consumed during the first year of life and nutritional status of infants in Southern Brazil

Resumo

Introdução

A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda o aleitamento materno exclusivo até o 6º mês de vida da criança e a sua manutenção com alimentação complementar até pelo menos os 2 anos de idade. Apesar da sua importância, a ingestão de substitutos do leite materno é altamente prevalente, sendo uma preocupação em saúde pública.

Objetivo

Avaliar a associação entre os tipos de leite ingeridos e o estado nutricional no primeiro ano de vida.

Método

Estudo longitudinal observacional com crianças brasileiras pertencentes a um estudo multicêntrico. Aos 3, 6, 9 e 12 meses de idade foram investigados os tipos de leite consumidos por meio de questionário de frequência alimentar (QFA) e foi realizada antropometria. As associações brutas e ajustadas foram avaliadas por intermédio de regressão linear.

Resultados

Das 2.965 duplas de mães-bebês rastreadas, 362 atenderam aos critérios e aceitaram participar do estudo (50% meninos). Aos 12 meses de idade, os maiores escores-z de peso para idade e de peso para comprimento foram observados nos meninos que consumiam apenas fórmula ou apenas leite de vaca. Os maiores escores-z de comprimento para idade foram encontrados entre as meninas que ingeriam apenas fórmula ou apenas leite de vaca aos 9 e 12 meses. Ambos foram comparados àqueles que ingeriam apenas leite materno nas mesmas idades.

Conclusão

Os tipos de leite consumidos associaram-se ao estado nutricional no primeiro ano de vida, sendo observadas diferenças entre os sexos. Os maiores índices antropométricos nas crianças que não recebiam leite materno chamam a atenção para a persistência futura desses desvios, em direção ao excesso de peso.

Palavras-chave:
lactente; leite materno; fórmula infantil; leite de vaca; estado nutricional

Abstract

Introduction

The World Health Organization (WHO) recommends exclusive breastfeeding up to the 6th month of life of the child and its maintenance with complementary feeding until at least 2 years of age. Despite its importance, the intake of breast milk substitutes is highly prevalent and a public health concern.

Objective

To evaluate the association between the types of milk ingested and nutritional status in the first year of life.

Method

Observational longitudinal study with Brazilian children from a multicentric study. At 3, 6, 9, and 12 months of age, the types of milk consumed were investigated using a food frequency questionnaire (FFQ), and anthropometric measurements were performed. Crude and adjusted associations were assessed by linear regression.

Results

Of the 2,965 pairs of mothers-babies screened, 362 met the criteria and accepted to participate in the study (50% of boys). At 12 months of age, higher weight-for-age and weight-for-length z-scores were observed in boys who consumed only formula or only cow's milk, compared to boys who consumed only breast milk. Higher length-for-age z-scores were found among girls who consumed only formula or only cow's milk at 9 and 12 months, compared to girls who consumed only breast milk at the same ages.

Conclusion

The types of milk consumed were associated with nutritional status during the first year of life, with differences between boys and girls. The higher anthropometric indexes in children who did not receive breastmilk call our attention to the persistence of such deviations toward excessive weight status in the future.

Keywords:
infant; maternal milk; infant formula; cow's milk; nutritional status

INTRODUÇÃO

Os primeiros 1.000 dias de vida, que representam o período da concepção até os 2 anos de idade, são essenciais para a saúde11 Victora C. Los mil días de oportunidad para intervenciones nutricionales: de la concepción a los dos años de vida. Arch Argent Pediatr. 2012;110(4):311-7. http://dx.doi.org/10.5546/aap.2012.311. PMid:22859324.
http://dx.doi.org/10.5546/aap.2012.311...
, já que ocorrem intensos crescimento e desenvolvimento infantis22 Victora CG, Bahl R, Barros AJ, França GV, Horton S, Krasevec J, et al. Breastfeeding in the 21st century: epidemiology, mechanisms, and lifelong effect. Lancet. 2016;387(10017):475-90. http://dx.doi.org/10.1016/S0140-6736(15)01024-7. PMid:26869575.
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. A nutrição durante esse período é considerada um dos principais fatores determinantes do crescimento e desenvolvimento cognitivo, metabólico e imunológico22 Victora CG, Bahl R, Barros AJ, França GV, Horton S, Krasevec J, et al. Breastfeeding in the 21st century: epidemiology, mechanisms, and lifelong effect. Lancet. 2016;387(10017):475-90. http://dx.doi.org/10.1016/S0140-6736(15)01024-7. PMid:26869575.
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. A má nutrição nessa fase da vida tem repercussões reconhecidas em curto e longo prazos22 Victora CG, Bahl R, Barros AJ, França GV, Horton S, Krasevec J, et al. Breastfeeding in the 21st century: epidemiology, mechanisms, and lifelong effect. Lancet. 2016;387(10017):475-90. http://dx.doi.org/10.1016/S0140-6736(15)01024-7. PMid:26869575.
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,33 Hales CN, Barker DJ. The thrifty phenotype hypothesis. Br Med Bull. 2001;60(1):5-20. http://dx.doi.org/10.1093/bmb/60.1.5. PMid:11809615.
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.

Sabe-se que, em condições de vida adequadas, o crescimento infantil é similar, independentemente da etnia44 Onis M. WHO child growth standards based on length/height, weight and age. Acta Paediatr Suppl. 2006;95(450 Supl):76-85. PMid:16817681.. A alimentação nos dois primeiros anos de vida é um dos fatores contribuintes a desvios observados em relação à normalidade44 Onis M. WHO child growth standards based on length/height, weight and age. Acta Paediatr Suppl. 2006;95(450 Supl):76-85. PMid:16817681.. A desnutrição na infância pode impedir que a criança atinja o seu máximo potencial de desenvolvimento cognitivo, além de estar associada ao déficit de estatura, baixa imunidade e mortalidade infantil55 Victora CG, Adair L, Fall C, Hallal PC, Martorell R, Richter L, et al. Maternal and child undernutrition: consequences for adult health and human capital. Lancet. 2008;371(9609):340-57. http://dx.doi.org/10.1016/S0140-6736(07)61692-4. PMid:18206223.
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. Por outro lado, o excesso de peso infantil tem mostrado prevalências crescentes de forma global, sendo que, em 2016, cerca de 41 milhões de crianças menores de 5 anos de idade apresentavam excesso de peso66 World Health Organization. Report of the commission on ending childhood obesity. Genebra: World Health Organization; 2016..

Embora com mecanismos ainda não bem elucidados, os desfechos antropométricos no primeiro ano de vida parecem estar diretamente relacionados com os tipos de leite consumidos durante os primeiros meses de vida, sendo que o consumo de leite materno está associado com o menor crescimento em comparação ao consumo de outros tipos de leite77 Alexander DD, Yan J, Bylsma LC, Northington RS, Grathwohl D, Steenhout P, et al. Growth of infants consuming whey-predominant term infant formulas with a protein content of 1.8 g/100 kcal: a multicenter pooled analysis of individual participant data. Am J Clin Nutr. 2016;104(4):1083-92. http://dx.doi.org/10.3945/ajcn.116.130633. PMid:27604774.
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,88 Cheng TS, Loy SL, Cheung YB, Chan JKY, Pang WW, Godfrey KM, et al. Sexually dimorphic response to feeding mode in the growth of infants, 2. Am J Clin Nutr. 2016;103(2):398-405. http://dx.doi.org/10.3945/ajcn.115.115493. PMid:26718413.
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,99 Ziegler EE, Fields DA, Chernausek SD, Steenhout P, Grathwohl D, Jeter JM, et al. Adequacy of infant formula with protein content of 1.6 g/100 kcal for infants between 3 and 12 months. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2015;61(5):596-603. http://dx.doi.org/10.1097/MPG.0000000000000881. PMid:26154030.
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.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda o aleitamento materno exclusivo até o 6º mês de vida da criança e a sua manutenção com alimentação complementar até pelo menos os 2 anos de idade1010 World Health Organization. Indicators for assessing infant and young child feeding practices: part 1: definitions: conclusions of a consensus meeting held 6-8 November 2007 in Washington DC, USA. Genebra: World Health Organization; 2008.. Além de fornecer energia e nutrientes em quantidades ideais, o leite materno possui fatores imunológicos que atuam na proteção contra infecções intestinais no início da vida22 Victora CG, Bahl R, Barros AJ, França GV, Horton S, Krasevec J, et al. Breastfeeding in the 21st century: epidemiology, mechanisms, and lifelong effect. Lancet. 2016;387(10017):475-90. http://dx.doi.org/10.1016/S0140-6736(15)01024-7. PMid:26869575.
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,1111 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção Primaria à Saúde. Departamento de Promoção da Saúde. Guia alimentar para crianças brasileiras menores de 2 anos. Brasília: Ministério da Saúde; 2019.,1212 World Health Organization. Infant and young child feeding: model chapter for textbooks for medical students and allied health professionals. Genebra: World Health Organization; 2009.. Ainda, o leite materno apresenta maior biodisponibilidade dos nutrientes e melhor digestibilidade em relação aos demais tipos de leite1111 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção Primaria à Saúde. Departamento de Promoção da Saúde. Guia alimentar para crianças brasileiras menores de 2 anos. Brasília: Ministério da Saúde; 2019..

Apesar da importância do aleitamento materno, a ingestão de substitutos do leite materno é altamente prevalente, sendo uma preocupação em saúde pública1313 Rollins NC, Bhandari N, Hajeebhoy N, Horton S, Lutter CK, Martines JC, et al. Why invest, and what it will take to improve breastfeeding practices? Lancet. 2016;387(10017):491-504. http://dx.doi.org/10.1016/S0140-6736(15)01044-2. PMid:26869576.
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. No Brasil, inquérito nacional realizado em 2006 constatou que quase 2/3 das crianças menores de 6 meses e que 3 em cada 4 crianças de 6 a 12 meses já consumiam leite de vaca1414 Bortolini GA, Vitolo MR, Gubert MB, Santos LMP. Consumo precoce de leite de vaca entre crianças brasileiras: resultados de uma pesquisa nacional. J Pediatr. 2013;89(6):608-13. http://dx.doi.org/10.1016/j.jped.2013.04.003.
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. No mesmo inquérito, observou-se que quase 1/4 das crianças menores de 6 meses e que 10% das crianças de 6 a 12 meses consumiam fórmulas infantis1414 Bortolini GA, Vitolo MR, Gubert MB, Santos LMP. Consumo precoce de leite de vaca entre crianças brasileiras: resultados de uma pesquisa nacional. J Pediatr. 2013;89(6):608-13. http://dx.doi.org/10.1016/j.jped.2013.04.003.
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. Em 2014, estimou-se que as vendas globais de todas as fórmulas infantis chegaram a aproximadamente 45 bilhões de dólares1313 Rollins NC, Bhandari N, Hajeebhoy N, Horton S, Lutter CK, Martines JC, et al. Why invest, and what it will take to improve breastfeeding practices? Lancet. 2016;387(10017):491-504. http://dx.doi.org/10.1016/S0140-6736(15)01044-2. PMid:26869576.
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.

Estudos longitudinais que verifiquem a influência do consumo de diferentes tipos de leite sobre parâmetros de crescimento de crianças em várias idades da primeira infância são escassos88 Cheng TS, Loy SL, Cheung YB, Chan JKY, Pang WW, Godfrey KM, et al. Sexually dimorphic response to feeding mode in the growth of infants, 2. Am J Clin Nutr. 2016;103(2):398-405. http://dx.doi.org/10.3945/ajcn.115.115493. PMid:26718413.
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,1515 Imai CM, Gunnarsdottir I, Thorisdottir B, Halldorsson TI, Thorsdottir I. Associations between infant feeding practice prior to six months and body mass index at six years of age. Nutrients. 2014;6(4):1608-17. http://dx.doi.org/10.3390/nu6041608. PMid:24747694.
http://dx.doi.org/10.3390/nu6041608...

16 Hopkins D, Steer CD, Northstone K, Emmett PM. Effects on childhood body habitus of feeding large volumes of cow or formula milk compared with breastfeeding in the latter part of infancy, 2. Am J Clin Nutr. 2015;102(5):1096-103. http://dx.doi.org/10.3945/ajcn.114.100529. PMid:26354544.
http://dx.doi.org/10.3945/ajcn.114.10052...

17 Gibbs BG, Forste R. Socioeconomic status, infant feeding practices and early childhood obesity. Pediatr Obes. 2014;9(2):135-46. http://dx.doi.org/10.1111/j.2047-6310.2013.00155.x. PMid:23554385.
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18 Ehrenthal DB, Wu P, Trabulsi J. Differences in the protective effect of exclusive breastfeeding on child overweight and obesity by mother’s race. Matern Child Health J. 2016;20(9):1971-9. http://dx.doi.org/10.1007/s10995-016-2015-z. PMid:27178429.
http://dx.doi.org/10.1007/s10995-016-201...
-1919 DiSantis KI, Collins BN, Fisher JO, Davey A. Do infants fed directly from the breast have improved appetite regulation and slower growth during early childhood compared with infants fed from a bottle? Int J Behav Nutr Phys Act. 2011;8(1):89. http://dx.doi.org/10.1186/1479-5868-8-89. PMid:21849028.
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. Diante disso, o objetivo deste estudo foi avaliar a associação entre o consumo de diferentes tipos de leite e os índices do estado nutricional durante o primeiro ano de vida entre crianças brasileiras pertencentes a um estudo multicêntrico.

MÉTODO

Estudo de coorte com dados de crianças brasileiras pertencentes ao Multi-Centre Body Composition Study (MBCS), que acompanhou crianças desde o nascimento até os 2 anos de idade em cinco países (África do Sul, Brasil, Paquistão, Sri Lanka e Quênia). Conforme o cálculo do tamanho da amostra, cada centro participante deveria acompanhar ao menos 150 crianças. No Brasil, as crianças foram recrutadas nas quatro maternidades existentes na cidade de Pelotas, Rio Grande do Sul, em duas fases, sendo a primeira de setembro de 2014 a fevereiro de 2015, e a segunda de março a julho de 2017.

Em todos os países, a amostra deveria ser composta por crianças que tivessem a capacidade de atingir o seu máximo potencial de crescimento. Para isso, no recrutamento, foram aplicados os seguintes critérios de elegibilidade: gestação única; mãe com idade igual ou superior a 18 anos; bebê nascido a termo (≥ 37 semanas e < 42 semanas); renda familiar de pelo menos 3 salários mínimos; residência na zona urbana do município; mãe não ser fumante pesada (fumar menos de três dias por semana antes e depois do parto); intenção de amamentar exclusivamente até os 6 meses; intenção de manter a amamentação por 12 meses ou mais; ausência de morbidade perinatal importante ou de internação em Unidade de Terapia Intensiva Neonatal.

O recrutamento das mães e bebês participantes ocorreu após o parto. Em caso de atendimento de todos os critérios de elegibilidade e aceite à participação no estudo, foram aplicadas questões sobre características maternas e do bebê, além de avaliação antropométrica do recém-nascido (peso, comprimento e perímetro cefálico), preferencialmente nas primeiras 12 horas de vida, sem ultrapassar 24 horas após o parto. Posteriormente à coleta de dados perinatais, mães e bebês foram convidados a comparecer à clínica de pesquisa três meses depois, sendo previstos ainda acompanhamentos aos 6, 9, 12, 18 e 24 meses de idade. O presente estudo utilizou dados de todos os acompanhamentos até os 12 meses de idade.

O peso e o comprimento dos bebês foram avaliados em todos os acompanhamentos. Todas as medidas foram realizadas por duas antropometristas com o bebê despido, sendo admitidas diferenças na aferição entre as antropometristas de 50 g para peso e 0,7 cm para o comprimento. Para a aferição do peso, utilizou-se de balança pediátrica Seca 376 (Seca gmbh&co. kg., Hamburg, Germany) com precisão de 5 g até 7,5 kg e de 10 g até 20 kg. Para o comprimento, foi utilizado o infantômetro Harpenden (HoltainLtd, Crymych, Wales, UK) com amplitude de medida de 300 a 1.000 mm e precisão de 1 mm. O estado nutricional foi avaliado a partir do software Anthro, considerando os indicadores de peso para idade, comprimento para idade e peso para comprimento, utilizando-se de pontos de cortes em escores-z da OMS2020 World Health Organization. WHO child growth standards: length/height for age, weight-for-age, weight-for-length, weight-for-height and body mass index-for-age, methods and development. Genebra: World Health Organization; 2006.. Nas visitas de acompanhamento, questões sobre a situação de saúde da criança no período e hábitos alimentares foram aplicadas à mãe ou ao cuidador.

O consumo de diferentes tipos de leite (materno, fórmula infantil e/ou leite de vaca), além da ingestão de alimentação complementar, foi investigado para os 28 dias anteriores à entrevista. O questionário de frequência alimentar (QFA) continha a seguinte pergunta: “Nos últimos 28 dias, quantas vezes você deu os seguintes líquidos/alimentos ao seu bebê?”. Em cada uma das idades de acompanhamento, as categorias de tipos de leite consumidos foram: apenas leite materno; leite materno e outros leites; apenas fórmula infantil; e leite de origem animal (apenas leite de vaca ou leite de vaca e outros leites). Para as análises do consumo ao longo do tempo, os tipos de leite consumidos até os 6 meses e até os 12 meses de idade foram classificados em: apenas leite materno; leite materno e outros leites; e nunca tomou leite materno.

Demais covariáveis do estudo incluíram o sexo (feminino/masculino) e o peso ao nascer (gramas) da criança, bem como variáveis maternas, sendo elas: a idade (18-29, 30-34 e ≥ 35 anos), paridade (primípara/multípara), escolaridade (fundamental incompleto, fundamental completo, médio incompleto, médio completo, superior incompleto e superior completo), ocupação (dona de casa/estudante, trabalho manual qualificado/trabalho manual não qualificado, gerencial/profissional/técnico, apoio administrativo/vendas/outros) e situação conjugal (com ou sem companheiro). Ainda, foi criado um índice de qualidade da dieta, considerando o período até os 6 meses e até os 12 meses de idade. O escore considerou o consumo diário de cada item alimentar avaliado. Até os 6 meses, considerou-se a pontuação 1 quando a criança recebia apenas o leite, independentemente do tipo, como fonte alimentar. Considerou-se zero quando houve consumo diário de chá, suco ou água, não recomendados antes dos 6 meses, para crianças em aleitamento materno e quando houve consumo de chá ou suco para os demais tipos de leite. A partir dos 6 meses, o escore alimentar avaliou apenas a alimentação complementar e variou de 0 a 5 pontos, sendo que o maior escore foi indicativo de maior índice de qualidade da dieta da criança. Pontuou-se em caso de não consumo de suco de frutas e mel ou açúcar e também quando houve o consumo de frutas, vegetais e carnes ou ovos1010 World Health Organization. Indicators for assessing infant and young child feeding practices: part 1: definitions: conclusions of a consensus meeting held 6-8 November 2007 in Washington DC, USA. Genebra: World Health Organization; 2008..

As análises foram realizadas no pacote estatístico Stata, versão 12.1. As variáveis dependentes foram apresentadas em média e desvio-padrão, e as variáveis independentes, em percentuais e respectivos intervalos de confiança de 95%. O nível de significância foi de 5% e todas as análises foram estratificadas por sexo. As associações brutas e ajustadas entre os tipos de leite consumidos aos 3, 6, 9 e 12 meses de idade e os tipos de leite consumidos até os 6 meses e até os 12 meses de idade com os desfechos de peso para idade, peso para comprimento e comprimento para idade foram investigadas utilizando-se da regressão linear. Foi empregado um modelo de ajuste para possíveis fatores de confusão definidos a partir de um modelo conceitual. No modelo, foram inseridas as seguintes variáveis: peso ao nascer da criança e idade, escolaridade, paridade, situação conjugal, ocupação materna e índice de qualidade da dieta. Na análise ajustada para avaliar o índice de comprimento para idade, também foi inserido o comprimento ao nascer junto aos outros possíveis fatores confundidores já utilizados.

O projeto de estudo foi aprovado pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP), e, antes da coleta de informações, todas as mães assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

RESULTADOS

Das 2.965 duplas de mães e bebês rastreadas nos hospitais, 471 atenderam aos critérios de elegibilidade do estudo (15,9%). Das 362 mães que aceitaram participar do estudo (76,9% das mães e bebês elegíveis), mais de 40% tinham idade entre 18-29 anos (43,7%) e a maioria (68,2%) havia completado 12 anos de estudo ou mais. Com relação à ocupação, 40,1% das mães possuíam cargo do tipo gerencial/profissional/técnico e quase a totalidade (93,7%) vivia com companheiro. A maioria (56,6%) era primípara (Tabela 1). As taxas de respostas (antropometria e questionário completo) para cada um dos acompanhamentos foram: 72,7%, 64,6%, 66,6% e 64,4% aos 3, 6, 9 e 12 meses de idade, respectivamente.

Tabela 1
Características maternas dos lactentes participantes de um estudo de composição corporal na cidade de Pelotas, Rio Grande do Sul (n = 362)

As médias de peso e comprimento ao nascer dos meninos foram de 3,22 kg ± 0,42 kg e 49,2 cm ± 1,76 cm, respectivamente, enquanto as médias das meninas foram de 3,17 kg ± 0,40 kg e 48,6 cm ± 1,67 cm. As médias de escore-z de peso para idade em ambos os sexos foram maiores do que as médias de referência da OMS somente a partir dos 6 meses. No comprimento para idade, observou-se que o peso ao nascer para as meninas foi maior no nascimento quando comparado ao padrão da OMS. Já todas as médias de escore-z de peso para comprimento foram maiores do que as da OMS em ambos os sexos nas mesmas idades (Figura 1).

Figura 1
Escore-z de peso-para-idade, comprimento-para-idade e peso-para-comprimento do nascimento aos 12 meses de idade de crianças do sul do Brasil pertencentes ao Multi-Centre Body Composition Study. Pelotas, RS (n=362).

A Tabela 2 mostra que, aos 3 meses, a maioria dos meninos e das meninas consumia apenas leite materno (58% e 65,8%, respectivamente). Aos 6 meses, pouco mais de 40% dos meninos e mais da metade das meninas ainda estavam em aleitamento materno (Tabela 2). Aos 9 meses, 27,7% dos meninos e 33,6% das meninas ainda recebiam apenas leite materno, sem adição de outros leites na dieta. Já aos 12 meses, apenas 1 em cada 5 meninos e menos de 1 em cada 3 meninas ainda eram amamentados (20,2% dos meninos e 28,6% das meninas). De forma prospectiva, observou-se que, até os 6 meses de idade, cerca de metade dos meninos (50,4%) havia recebido leite materno e também outros tipos de leite, enquanto metade das meninas (50,7%) havia recebido apenas leite materno. Até os 12 meses de idade, a maioria das crianças, de ambos os sexos, havia consumido leite materno e outros leites (75% dos meninos e 61,1% das meninas) (Tabela 2).

Tabela 2
Tipos de leite consumidos até 12 meses de idade, segundo o sexo, de lactentes participantes de um estudo de composição corporal na cidade de Pelotas, Rio Grande do Sul

As associações entre os tipos de leite consumidos pelos meninos e os parâmetros de crescimento estudados, conforme a idade, são mostradas na Tabela 3. Após o ajuste estatístico, aos 12 meses, os meninos que consumiam apenas fórmula infantil apresentaram, em média, 0,85 escore-z de peso para idade (IC95%: 0,35; 1,35) (p < 0,001) e 0,74 escore-z de peso para comprimento (IC95%: 0,24; 1,23) (p = 0,002) a mais do que aqueles que recebiam apenas leite materno. Na mesma idade, o grupo que recebia leite de origem animal apresentou 0,67 escore-z de peso para idade (IC95%: 0,13; 1,21) (p < 0,001) e 0,61 escore-z de peso para comprimento (IC95%: 0,07; 1,15) (p = 0,002) a mais do que aqueles meninos que recebiam apenas leite materno nessa idade. Com relação aos tipos de leite consumidos durante os 12 primeiros meses de vida, o índice de peso para comprimento foi, em média, 0,91 escore-z (IC95%: 0,19; 1,63) maior no grupo que nunca tomou leite materno (p = 0,009) em comparação aos que receberam apenas leite materno até os 12 meses de idade (Tabela 3).

Tabela 3
Tipos de leites consumidos e antropometria aos 3, 6, 9 e 12 meses de idade, de meninos participantes de um estudo de composição corporal na cidade de Pelotas, Rio Grande do Sul

Com relação às meninas (Tabela 4), aos 6 meses de idade, o grupo que recebia leite materno e outros leites apresentou, em média, -0,56 escore-z (IC95%: -0,99; -0,13) de peso para comprimento do que aquelas que consumiam apenas leite materno nessa idade (p = 0,115). Aos 9 meses, as meninas que consumiam apenas fórmula infantil apresentaram os índices de peso para idade, comprimento para idade e peso par comprimento, em média, 0,78 (IC95%: 0,30; 1,27) (p = 0,003), 0,61 (IC95%: 0,19; 1,04) (p < 0,001) e 0,60 (IC95%: 0,15; 1,05) (p = 0,035) escore-z a mais, respectivamente, do que aquelas que consumiam apenas leite materno nessa idade. Nessa mesma idade, as meninas que recebiam leite de origem animal apresentaram comprimento para idade, em média, 0,75 escore-z (IC95%: 0,26; 1,23) maior do que as que ingeriam somente leite materno (p < 0,001). Aos 12 meses, o grupo de meninas que recebia apenas fórmula infantil apresentou 0,71 escore-z (IC95%: 0,18; 1,23) (p = 0,010) a mais no índice de peso para idade e 0,71 escore-z (IC95%: 0,24; 1,19) a mais no índice de comprimento para idade em comparação àquelas que consumiam apenas leite materno nessa idade (p < 0,001). O comprimento para idade aos 12 meses foi, em média, 0,62 escore-z (IC95%: 0,17; 1,07) maior nas meninas que consumiam leite de origem animal (p < 0,001) em relação àquelas que ingeriam somente leite materno. Considerando a ingestão dos diferentes tipos de leite no decorrer do tempo, os escores-z de comprimento para idade mostraram-se maiores entre as meninas que nunca tomaram leite materno até os 6 meses (β = 0,73; IC95%: 0,23; 1,24) (p < 0,001) ou até os 12 meses (β = 0,78; IC95%: 0,21; 1,35) (p < 0,001) em comparação às que receberam apenas leite materno durante esses períodos (Tabela 4).

Tabela 4
Tipos de leite consumidos e antropometria aos 3, 6, 9 e 12 meses de idade, de meninas participantes de um estudo de composição corporal na cidade de Pelotas, Rio Grande do Sul

DISCUSSÃO

Este estudo verificou a associação dos diferentes tipos de leite consumidos com o estado nutricional de crianças de até 1 ano de idade. Contudo, salienta-se que os resultados não foram muito consistentes e as associações encontradas não podem ser replicadas para todas as populações. Quando se trata de avaliar as associações entre aleitamento materno e desfechos na saúde por meio de estudos observacionais, é difícil inferir causalidade por conta da confusão residual que pode estar presente. Estudos de coorte realizados em países de diferentes níveis socioeconômicos observaram que as associações encontradas naqueles países de alta renda não apareceram nos de baixa renda, sugerindo que as associações encontradas apenas refletem uma confusão por causa do padrão socioeconômico2121 Brion M-JA, Lawlor DA, Matijasevich A, Horta B, Anselmi L, Araújo CL, et al. What are the causal effects of breastfeeding on IQ, obesity and blood pressure? Evidence from comparing high-income with middle-income cohorts. Int J Epidemiol. 2011;40(3):670-80. http://dx.doi.org/10.1093/ije/dyr020. PMid:21349903.
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. Por exemplo, o efeito protetor da amamentação contra a obesidade que ocorre em países mais ricos parece não ocorrer em países pobres2222 Liese AD, Hirsch T, Von Mutius E, Keil U, Leupold W, Weiland SK. Inverse association of overweight and breast feeding in 9 to 10-y-old children in Germany. Int J Obes Relat Metab Disord. 2001;25(11):1644-50. http://dx.doi.org/10.1038/sj.ijo.0801800. PMid:11753585.
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,2323 Wallby T, Lagerberg D, Magnusson M. Relationship between breastfeeding and early childhood obesity: results of a prospective longitudinal study from birth to 4 years. Breastfeed Med. 2017;12(1):48-53. http://dx.doi.org/10.1089/bfm.2016.0124. PMid:27991826.
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,2424 Fall CH, Borja JB, Osmond C, Richter L, Bhargava SK, Martorell R, et al. Infant-feeding patterns and cardiovascular risk factors in young adulthood: data from five cohorts in low-and middle-income countries. Int J Epidemiol. 2011;40(1):47-62. http://dx.doi.org/10.1093/ije/dyq155. PMid:20852257.
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,2525 Araújo CL, Victora CG, Hallal PC, Gigante DP. Breastfeeding and overweight in childhood: evidence from the Pelotas 1993 birth cohort study. Int J Obes. 2006;30(3):500-6. http://dx.doi.org/10.1038/sj.ijo.0803160. PMid:16276362.
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. Estudo randomizado realizado no Reino Unido sugeriu que estudos observacionais eram confusos para avaliar amamentação2626 Martin RM, Kramer MS, Patel R, Rifas-Shiman SL, Thompson J, Yang S, et al. Effects of promoting long-term, exclusive breastfeeding on adolescent adiposity, blood pressure, and growth trajectories: a secondary analysis of a randomized clinical trial. JAMA Pediatr. 2017;171(7):e170698. http://dx.doi.org/10.1001/jamapediatrics.2017.0698. PMid:28459932.
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e apontou que o aleitamento não ofereceu efeito protetor para sobrepeso e obesidade2626 Martin RM, Kramer MS, Patel R, Rifas-Shiman SL, Thompson J, Yang S, et al. Effects of promoting long-term, exclusive breastfeeding on adolescent adiposity, blood pressure, and growth trajectories: a secondary analysis of a randomized clinical trial. JAMA Pediatr. 2017;171(7):e170698. http://dx.doi.org/10.1001/jamapediatrics.2017.0698. PMid:28459932.
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No presente estudo, as maiores médias de escore-z de peso para idade aos 9 e 12 meses foram observadas entre as meninas que consumiam apenas fórmula. Já as maiores médias de peso para comprimento foram encontradas nas meninas que consumiam apenas fórmula aos 9 meses e entre os meninos que nunca tomaram leite materno até os 12 meses. Ainda, as maiores médias de escore-z de comprimento para idade foram encontradas aos 9 e 12 meses entre meninas que tomavam apenas fórmula e entre as que nunca consumiram leite materno até os 6 ou 12 meses de idade.

O peso para idade é um indicador sensível a mudanças a curto prazo, útil para captar alterações em curto espaço de tempo2727 Bogin B. Human growth and development. Cambridge: Academic Press; 2012.. Neste estudo, foram encontrados maiores médias de escore-z de peso para idade em meninas que consumiam apenas fórmula aos 9 meses de idade e em ambos os sexos aos 12 meses. Pesquisa realizada nos Estados Unidos encontrou resultados semelhantes na mesma faixa etária, com maior média de peso para idade naquelas crianças que consumiam fórmula infantil99 Ziegler EE, Fields DA, Chernausek SD, Steenhout P, Grathwohl D, Jeter JM, et al. Adequacy of infant formula with protein content of 1.6 g/100 kcal for infants between 3 and 12 months. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2015;61(5):596-603. http://dx.doi.org/10.1097/MPG.0000000000000881. PMid:26154030.
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. É possível que maiores médias de peso para idade sejam observadas em crianças não amamentadas em razão do alto teor de proteína contido nas fórmulas infantis, a qual está associada ao ganho excessivo de peso na infância2828 Michaelsen KF, Greer FR. Protein needs early in life and long-term health. Am J Clin Nutr. 2014;99(3):718S-22S. http://dx.doi.org/10.3945/ajcn.113.072603. PMid:24452233.
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. Além disso, o volume de leite consumido parece ser maior quando da ingestão de fórmula e leite de vaca em comparação ao ingerido em uma mamada2929 Hester SN, Hustead DS, Mackey AD, Singhal A, Marriage BJ. Is the macronutrient intake of formula-fed infants greater than breast-fed infants in early infancy? J Nutr Metab. 2012;2012:891201. http://dx.doi.org/10.1155/2012/891201. PMid:23056929.
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. Hester et al.2929 Hester SN, Hustead DS, Mackey AD, Singhal A, Marriage BJ. Is the macronutrient intake of formula-fed infants greater than breast-fed infants in early infancy? J Nutr Metab. 2012;2012:891201. http://dx.doi.org/10.1155/2012/891201. PMid:23056929.
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sugeriram que as fórmulas infantis deveriam apresentar conteúdo energético e proteico menor do que o do leite materno, a fim de compensar o maior volume de ingestão2929 Hester SN, Hustead DS, Mackey AD, Singhal A, Marriage BJ. Is the macronutrient intake of formula-fed infants greater than breast-fed infants in early infancy? J Nutr Metab. 2012;2012:891201. http://dx.doi.org/10.1155/2012/891201. PMid:23056929.
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. Maiores médias de escore-z de peso para idade também foram encontradas no presente estudo em meninos que consumiam apenas leite de vaca aos 12 meses de idade.

O peso para comprimento é uma medida que reflete o excesso de peso e que pode indiretamente estimar a gordura corporal. Estes achados mostraram escores-z de peso para comprimento menores entre meninas de 6 meses que consumiam leite materno e outros leites quando comparadas àquelas que recebiam apenas leite materno. Em contrapartida, as médias de escore-z de peso para comprimento foram maiores para meninas que consumiam apenas fórmula aos 9 meses de idade e para os meninos que consumiam apenas fórmula ou leite de vaca aos 12 meses. Uma pesquisa que investigou padrões alimentares em crianças de 12 meses observou que o padrão alimentar de leite materno se associou a menores escores-z de peso para comprimento quando comparado ao padrão que incluiu fórmula infantil3030 Rose CM, Savage JS, Birch LL. Patterns of early dietary exposures have implications for maternal and child weight outcomes. Obesity (Silver Spring). 2016;24(2):430-8. http://dx.doi.org/10.1002/oby.21349. PMid:26717908.
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. Nos achados deste trabalho em tela, os meninos que nunca tomaram leite materno também apresentaram maiores médias de escore-z nesse índice.

O maior peso para comprimento nas crianças que consumiram substitutos do leite materno pode ser justificado pela maior densidade energética contida nesses leites em comparação ao leite materno, além do provável maior volume de leite ingerido2929 Hester SN, Hustead DS, Mackey AD, Singhal A, Marriage BJ. Is the macronutrient intake of formula-fed infants greater than breast-fed infants in early infancy? J Nutr Metab. 2012;2012:891201. http://dx.doi.org/10.1155/2012/891201. PMid:23056929.
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. Além disso, como a microbiota possui relação direta com a obesidade, o leite materno oferece ao bebê uma microbiota intestinal adequada, por meio dos Lactobacillus bifidus, bactérias benéficas que protegem o trato intestinal do recém-nascido1111 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção Primaria à Saúde. Departamento de Promoção da Saúde. Guia alimentar para crianças brasileiras menores de 2 anos. Brasília: Ministério da Saúde; 2019.. Como os substitutos do leite materno não possuem esta propriedade, é possível que parte da associação entre consumo de substitutos do leite materno e maior peso para comprimento seja em razão deste mecanismo3131 Million M, Angelakis E, Maraninchi M, Henry M, Giorgi R, Valero R, et al. Correlation between body mass index and gut concentrations of Lactobacillus reuteri, Bifidobacterium animalis, Methanobrevibacter smithii and Escherichia coli. Int J Obes. 2013;37(11):1460-6. http://dx.doi.org/10.1038/ijo.2013.20. PMid:23459324.
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. Um estudo de coorte mostrou que aumentos rápidos no peso para comprimento nos primeiros 6 meses de vida foram associados com maior risco de obesidade aos 3 anos de idade, de forma que mudanças no status de peso na infância poderiam influenciar o risco de obesidade tardia mais do que o peso ao nascer3232 Taveras EM, Rifas-Shiman SL, Belfort MB, Kleinman KP, Oken E, Gillman MW. Weight status in the first 6 months of life and obesity at 3 years of age. Pediatrics. 2009;123(4):1177-83. http://dx.doi.org/10.1542/peds.2008-1149. PMid:19336378.
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O comprimento para idade aos 9 e 12 meses foi maior nas meninas que consumiam apenas fórmula ou leite de vaca. O mesmo efeito foi detectado na análise longitudinal para as meninas que nunca tomaram leite materno nos primeiros 6 meses ou 12 meses de vida. Resultados semelhantes foram encontrados no estudo conduzido por Cheng et al.88 Cheng TS, Loy SL, Cheung YB, Chan JKY, Pang WW, Godfrey KM, et al. Sexually dimorphic response to feeding mode in the growth of infants, 2. Am J Clin Nutr. 2016;103(2):398-405. http://dx.doi.org/10.3945/ajcn.115.115493. PMid:26718413.
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, em que as meninas que receberam apenas fórmula até os 6 meses apresentaram maior ganho de comprimento para idade dos 6 aos 12 meses em comparação às que receberam apenas leite materno. O mesmo estudo apontou a importância de considerar a resposta sexualmente dismórfica ao avaliar-se o efeito dos tipos de leite ingeridos no crescimento infantil88 Cheng TS, Loy SL, Cheung YB, Chan JKY, Pang WW, Godfrey KM, et al. Sexually dimorphic response to feeding mode in the growth of infants, 2. Am J Clin Nutr. 2016;103(2):398-405. http://dx.doi.org/10.3945/ajcn.115.115493. PMid:26718413.
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. Trabalhos que avaliaram a composição do leite materno conforme o sexo da criança constataram que o leite para lactentes do sexo masculino continha cerca de 25% e 39%, respectivamente, de calorias e lipídeos a mais do que o leite para lactentes do sexo feminino. Também foram observadas diferenças significativas com relação aos lipídios bioativos, como ácido linoleico, fosfolipídios e gangliosídeos3333 Powe CE, Knott CD, Conklin‐Brittain N. Infant sex predicts breast milk energy content. Am J Hum Biol. 2010;22(1):50-4. http://dx.doi.org/10.1002/ajhb.20941. PMid:19533619.
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,3434 Thakkar SK, Giuffrida F, Cristina CH, Castro CA, Mukherjee R, Tran LA, et al. Dynamics of human milk nutrient composition of women from Singapore with a special focus on lipids. Am J Hum Biol. 2013;25(6):770-9. http://dx.doi.org/10.1002/ajhb.22446. PMid:24105777.
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. Dessa forma, a literatura indica que o leite materno se adapta às necessidades nutricionais segundo o sexo da criança2929 Hester SN, Hustead DS, Mackey AD, Singhal A, Marriage BJ. Is the macronutrient intake of formula-fed infants greater than breast-fed infants in early infancy? J Nutr Metab. 2012;2012:891201. http://dx.doi.org/10.1155/2012/891201. PMid:23056929.
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, o que não é observado nos substitutos do leite materno3535 Martin CR, Ling P-R, Blackburn GL. Review of infant feeding: key features of breast milk and infant formula. Nutrients. 2016;8(5):279. http://dx.doi.org/10.3390/nu8050279. PMid:27187450.
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. Ainda sobre essa questão, estudo que investigou se o sexo do bebê poderia prever o conteúdo energético do leite materno constatou que o leite materno se adapta ao sexo da criança conforme a demanda, que é maior no sexo masculino3333 Powe CE, Knott CD, Conklin‐Brittain N. Infant sex predicts breast milk energy content. Am J Hum Biol. 2010;22(1):50-4. http://dx.doi.org/10.1002/ajhb.20941. PMid:19533619.
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De acordo com os achados, aponta-se que maiores valores nos parâmetros de crescimento nas meninas que consumiram substitutos do leite materno podem ter sido por causa de possíveis diferenças adaptativas ao sexo existentes no leite materno, mas que inexistem nos substitutos dele e resultam em maior aporte calórico e lipídico do que o necessário, podendo levar a maior crescimento2929 Hester SN, Hustead DS, Mackey AD, Singhal A, Marriage BJ. Is the macronutrient intake of formula-fed infants greater than breast-fed infants in early infancy? J Nutr Metab. 2012;2012:891201. http://dx.doi.org/10.1155/2012/891201. PMid:23056929.
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. As elevadas quantidades de proteína contidas em algumas fórmulas infantis e no leite de vaca podem ter sido um fator contribuinte para o maior comprimento nas meninas que receberam esses leites2828 Michaelsen KF, Greer FR. Protein needs early in life and long-term health. Am J Clin Nutr. 2014;99(3):718S-22S. http://dx.doi.org/10.3945/ajcn.113.072603. PMid:24452233.
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. Ainda, deve-se considerar alterações nos níveis de leptina que podem ocorrer entre crianças não amamentadas. Um estudo que avaliou as dosagens de leptina em crianças amamentadas e não amamentadas, de ambos os sexos, constatou que as dosagens séricas de leptina diminuíram em todos os grupos aos 3 meses de idade, com exceção das meninas amamentadas3636 Treviño-Garza C, Bosques-Padilla FJ, Estrada-Zúñiga CM, Mancillas-Adame L, Villarreal-Pérez JZ, Abrego-Moya V, et al. Typical leptin fall is mitigated by breastfeeding in female infants. Arch Med Res. 2010;41(5):373-7. http://dx.doi.org/10.1016/j.arcmed.2010.08.001. PMid:20851296.
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. A diminuição dos níveis séricos de leptina nas meninas que não foram amamentadas seria um fato importante, sabendo-se que a leptina atua diretamente na homeostase energética3737 Münzberg H, Morrison CD. Structure, production and signaling of leptin. Metabolism. 2015;64(1):13-23. http://dx.doi.org/10.1016/j.metabol.2014.09.010. PMid:25305050.
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. Ainda com relação às diferenças atribuídas ao sexo, uma pesquisa realizada no Brasil apontou possível vantagem de uma menor duração da amamentação nas meninas. Nesse caso, somente no sexo feminino a duração da amamentação por mais de três meses esteve associada com o maior índice de massa livre de gordura aos 18-19 anos, avaliada por pletismografia (BOD POD™). Os autores desse estudo chamaram a atenção para o fato de que esse achado pode ser apoiado por diferenças no crescimento conforme o sexo. Em razão de as meninas apresentarem maior maturidade fisiológica ao nascer do que os meninos, os bebês do sexo masculino necessitam de maior tempo de amamentação3838 Orlandi SP, González-Chica DA, Buffarini R, Gonzalez MC, Menezes AMB, Barros FC, et al. Breastfeeding and complementary feeding associated with body composition in 18–19 years old adolescents in the 1993 Pelotas Birth Cohort. BMC Nutr. 2017;3(1):84. http://dx.doi.org/10.1186/s40795-017-0201-z. PMid:32153860.
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Todos esses fatores podem ter levado a maiores valores nos índices observados entre as meninas que receberam outros tipos de leite que não o materno nas idades mais próximas de 1 ano de vida. Cabe salientar que o crescimento acelerado na infância é preocupante, porque tem sido associado ao maior risco de doenças crônicas não transmissíveis no futuro3939 Chrestani MA, Santos IS, Horta BL, Dumith SC, Dode MASO. Associated factors for accelerated growth in childhood: a systematic review. Matern Child Health J. 2013;17(3):512-9. http://dx.doi.org/10.1007/s10995-012-1025-8. PMid:22547159.
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Algumas limitações deste estudo consistem nas perdas, tendo em vista diversos fatores operacionais, como o tempo de permanência na clínica durante a visita (um total de 3 horas, incluindo avaliações e questionários), bem como o clima frio e úmido da região no período de inverno, que geraram faltas por doenças respiratórias nas crianças. Além disso, o retorno das mães ao trabalho após o período de licença-maternidade também colaborou com as perdas. O tamanho da amostra pode ter sido pequeno para o presente estudo, uma vez que foi calculado para outros objetivos. Entretanto, estudos que utilizam restrição na seleção da amostra como estratégia de redução/eliminação da influência de possíveis confundidores são de grande utilidade nessa temática. Tal abordagem foi anteriormente utilizada no WHO Multicentre Growth Reference Study, que resultou na construção das curvas de referência de crescimento infantil, as quais são utilizadas atualmente em mais de 140 países4040 Onis M. Assessment of differences in linear growth among populations in the WHO Multicentre Growth Reference Study. Acta Paediatr Suppl. 2006;95(450 Supl):56-65. PMid:16817679.. O viés de memória pode ter sido uma limitação por conta do uso do QFA. Outra limitação deste estudo é que não foi possível calcular as quantidades de leite ingeridas pelas crianças para poder estimar as proporções de consumo entre um leite e outro. Por outro lado, incluiu-se no modelo estatístico um escore alimentar relacionado à diversidade da dieta, criado para considerar a alimentação complementar da criança. O acompanhamento longitudinal também se mostrou como uma vantagem deste estudo por ter possibilitado detectar diferenças nos desfechos em curtos espaços de tempo. Além disso, todas as medições foram feitas por uma equipe treinada e regularmente padronizada, conferindo, assim, maior precisão e confiabilidade dos resultados.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Pode-se concluir que os tipos de leite consumidos no primeiro ano de vida parecem estar associados ao estado nutricional dos lactentes. Além disso, foram constatadas diferenças significativas no estado nutricional perante o consumo de substitutos do leite materno conforme o sexo da criança. Os achados reforçaram as vantagens do leite materno sobre os outros tipos de leite, visto que aquele se adapta às necessidades nutricionais dos lactentes também conforme o sexo. Faz-se, assim, necessário reafirmar a importância do aleitamento materno nos dois primeiros anos de vida e sua superioridade sobre os outros tipos de leite. É preciso haver medidas de promoção e proteção ao aleitamento materno, além de medidas que não favoreçam a ingestão de leite de vaca por crianças que não podem ser amamentadas, considerando a falta de acesso às fórmulas infantis e condições econômicas da população.

  • Como citar: Oliveira MS, Bielemann RM, Costa CS, Valle NCJ, Santos IS. Tipos de leite consumidos durante o primeiro ano de vida e estado nutricional de lactentes do Sul do Brasil. Cad Saúde Colet, 2023; 31 (2):e31020553. https://doi.org/10.1590/1414-462X202331020553
  • Trabalho realizado no Centro de Pesquisas Epidemiológicas Dr. Amilcar Gigante, Universidade Federal de Pelotas - Pelotas (RS), Brasil.
  • Fonte de financiamento: o estudo foi financiado pela Agência Internacional de Energia Atômica – CPR / E43028.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    29 Maio 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    10 Dez 2019
  • Aceito
    02 Mar 2021
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