Resumo
O objeto teórico deste estudo é a construção teórica do ócio vicário de Veblen (1989), tendo conceitos veblenianos como fatores precedentes. Já o objeto empírico deste estudo é o filme brasileiro Que Horas Ela Volta? da roteirista e diretora brasileira Anna Muylaert (QUE HORAS, 2015), que foi premiado no Sundance Film Festival e no Film Festival Internacional de Berlim, ambos de 2015. Para confluir com a proposta metodológica interdisciplinar de Thorstein Veblen (1857-1929), esse filme é analisado em uma perspectiva historicista defendida por Kornis (1992). Utilizando as categorias “divisão de classe e suas funções”, “a mulher e a propriedade”, “riqueza e status”, “o trabalho”, “a cerimônia signo de honra”, “ócio conspícuo e distinção social”, “hereditariedade e sangue nobre”, “ócio vicário” e “contexto sócio-histórico-cultural brasileiro”, tem-se como resultado que os conceitos vebleniamos apresentam uma aderência à atual divisão de classes que poderia ser mais utilizada para compreender os fenômenos contemporâneos brasileiros. A questão do ócio vicário e do trabalho doméstico constitui tema relevante econômica e socialmente e teve um debate social recente, como exposto na discussão sobre a regulação da atividade pelo Estado. Como ponto central do trabalho vebleniano, as transformações do status quo da forma de consumo permeia o conceito de consumo conspícuo para a distinção de status e honra das classes econômicas e sociais brasileiras.
Palavras-chave: Ócio vicário; Análise fílmica; Thorstein Veblen; Institucionalismo econômico
Resumen
El objeto teórico de este estudio es la construcción teórica del ocio vicario de Veblen (1989), con conceptos veblenianos como factores precedentes. El objeto empírico de este estudio es la película brasileña Una Segunda Madre, de la guionista y directora brasileña Anna Muylaert (QUE HORAS, 2015), que fue premiada en el Sundance Film Festival y en el Festival Internacional de Cine de Berlín, ambos de 2015. Para confluir con la propuesta metodológica interdisciplinaria de Thorstein Veblen (1857-1929) la película es analizada en una perspectiva historicista defendida por Kornis (1992). Al utilizar las categorías división de clase y sus funciones; la mujer y la propiedad; riqueza y status; trabajo; la ceremonia signo de honor; ocio conspicuo y distinción social; herencia y sangre noble; ocio vicario; y contexto socio-histórico-cultural brasileño, se obtiene como resultado que los conceptos vebleniamos presentan una adhesión a la actual división de clases que podría ser más utilizada para comprender los fenómenos contemporáneos brasileños. La cuestión del ocio vicario y del trabajo doméstico constituye un tema relevante económica y socialmente y ha tenido un debate social reciente, como se expuso en la discusión sobre la regulación de la actividad por parte del Estado. Como punto central del trabajo vebleniano, las transformaciones del status quo de la forma de consumo impregnan el concepto de consumo conspicuo para la distinción de status y honor de las clases económicas y sociales brasileñas.
Palabras clave: Ocio vicario; Análisis de películas; Thorstein Veblen; Institucionalismo económico
Abstract
The theoretical object of this study is the theoretical construction of the vicarious leisure of Veblen (1989), having Veblenian concepts as previous factors. The empirical object of this study is the Brazilian film The Second Mother by Brazilian writer and director Anna Muylaert (QUE HORAS, 2015), who won the Sundance Film Festival and the Berlin International Film Festival in 2015. In order to match Thorstein Veblen's interdisciplinary methodological proposal (1857-1929), this film was analyzed in a historicist perspective advocated by Kornis (1992). Using the categories "class division and its functions", "woman and property", "wealth and status", "work", "ceremony of honor", "conspicuous idleness and social distinction", "heredity and noble blood," "vicarious idleness," and "Brazilian sociocultural-cultural context," it is possible to see that the concepts of Veblen present an adherence to the current division of classes that could be more used to understand contemporary Brazilian phenomena. The issue of vicarious leisure and housework is a relevant economic and social issue and is a recent social debate, as seen in the discussion on the regulation of activity by the State. As the central point of Veblenian work, the transformations of the status quo of the form of consumption permeate the concept of conspicuous consumption for the distinction of status and honor of the Brazilian economic and social classes.
Keywords: Vicarious leisure; Film analysis; Thorstein Veblen; Economic Institutionalism
PROPÓSITO CENTRAL DO TRABALHO
Este artigo revisita uma perspectiva pouco explorada em pesquisas sobre os estudos de Thorstein Veblen (1857-1929). Como defende Dorfman (1935), em Thorstein Veblen and his America, Veblen (1989), o patrono do institucionalismo, trouxe em sua clássica obra Teoria da classe ociosa conceitos importantes para compreender as estruturas socioeconômicas em perspectiva que oferece um contraponto às correntes teóricas clássicas e neoclássicas da economia. Para além desses conceitos, Veblen oferece em seus trabalhos uma perspectiva metodológica para a compreensão dos fenômenos socioeconômicos (SILVA, 2008).
Como argumenta Silva (2008), a obra de Veblen aponta um roteiro de pesquisa interdisciplinar. Seu trabalho proporciona um entendimento histórico da forma do pensamento social, em que se nota a crítica contra a economia neoclássica e a busca de uma compreensão com perspectivas sociológicas e históricas. A partir dessa posição interdisciplinar da sociologia econômica, Silva (2008) apresenta a visão de Veblen na aposta de uma ciência social pluralista que pudesse viabilizar novos horizontes no estudo econômico.
Para isso, o objeto teórico deste estudo é a construção teórica do ócio vicário de Veblen (1989), tendo como fatores precedentes conceitos veblenianos de riqueza, status, consumo, ócio, trabalho, propriedade, função social, distinção de classes e hereditariedade. Esses conceitos, apresentados de modo mais profundo no tópico seguinte, colaboram para a compreensão sociológica e antropológica do objeto empírico deste estudo.
O objeto empírico deste estudo é o filme brasileiro Que Horas Ela Volta?, da roteirista e diretora brasileira Anna Muylaert (QUE HORAS, 2015), que foi premiado no Sundance Film Festival e no Film Festival Internacional de Berlim, ambos de 2015. No Brasil, o filme teve cerca de 450 mil espectadores, além de ser transmitido em um canal aberto de televisão e disponibilizado na internet; além disso, obteve forte aceitação internacional, sendo vendido para 22 países, e foi cotado para concorrer ao Oscar de melhor filme estrangeiro (SCHERDIEN, BORTOLINI e OLTRAMARI, 2018). Para confluir com a proposta metodológica interdisciplinar de Veblen apresentada por Silva (2008), esse filme é analisado em uma perspectiva historicista defendida por Kornis (1992). Na análise de filmes de ficção, Kornis (1992, p. 245) argumenta sobre a “importância das características da sociedade que o produziu e o consome e da própria obra, além da relação entre os autores do filme, a sociedade e o próprio filme”. Ou seja, não se pretende analisar somente o filme e seu roteiro à luz do objeto teórico, mas sim considerando toda a estrutura produtiva e social em que ele está imbricado. Tanto o objeto empírico quanto o teórico serão descritos mais profundamente em tópicos subsequentes. Para nortear o contexto deste estudo, adotou-se a seguinte pergunta de pesquisa:
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Como a construção teórica do ócio vicário de Thorstein Veblen explica, em uma perspectiva interdisciplinar, as estruturas socioeconômicas brasileiras a partir da produção cinematográfica do filme Que Horas Ela Volta?
O filme Que Horas Ela Volta? tem sido foco empírico de vários trabalhos em diversos campos de estudo. No campo dos estudos jurídicos, Nunes e Rodrigues (2017) investigaram a história, os direitos e os a afetos do papel da empregada doméstica avaliando o caso como fenômeno comum na realidade brasileira. Já Faria (2017) discutiu gênero, trabalho doméstico e migração por meio da análise discursiva da evolução política e social das empregadas domésticas que vivem essa realidade. Além disso, Maia e Gomes (2017) analisaram o filme sob a perspectiva da hospedagem, enfocando o papel da filha da empregada que é recebida na casa dos patrões, em busca de evidenciar todos os aspectos sociais envolvidos. O estudo de J. Santos (2015) buscou analisar o trabalho doméstico feminino sob o foco do filme para compreender as questões de gênero e relações de trabalho no Brasil. Já o estudo de Ribeiro (2015) destacou questões antropológicas sobre como pensar o Brasil diante desse filme, sobre seu impacto polêmico em uma sociedade com diversos conflitos expostos por meio da película.
Já entre os estudos na área de administração se destaca Ferraz, Moura-Paula, Biondini et al. (2017), que analisou o filme sob a perspectiva da ideologia e subjetividade nas relações de trabalho. Os autores argumentam que a subjetividade das domésticas é construída a partir da ideologia que influencia a relação de trabalho e as relações comuns à esfera familiar onde estão inseridas. Essas relações da esfera familiar têm forte apelo afetivo, que dificulta a efetiva formalização da relação de trabalho, apresentando características que a diferenciam de outros setores e classes.
Outro estudo do campo da administração que relata as relações de trabalho é Scherdien, Bortolini e Oltramari (2018), que apresenta na análise do filme as relações da empregada doméstica com a família com quem trabalha há vários anos. Esse estudo busca a compreensão do momento histórico-social, traçando um panorama com os estudos de relações de trabalho. Segundo a análise, o ambiente em que se desenvolve o filme Que Horas Ela Volta? reproduz o cosmos da estrutura social brasileira e seus conflitos.
O filme Que Horas Ela Volta? é relevante do ponto de vista artístico, social e acadêmico por despertar diversos questionamentos e inquietações, inclusive no campo da administração. Entretanto, nenhum dos autores citados trabalhou o tema sob a perspectiva vebleniana utilizando as ideias de ócio vicário e consumo conspícuo.
Dentre esses fenômenos abordados no filme e que constituem fatos de discussão social, temos: 1) emigração do Nordeste para o Sudeste do Brasil em busca de melhores condições de trabalho; 2) vivências de conflito silenciadas na relação entre empregador e empregado e doméstico; 3) conflito entre classes sob a perspectiva de direitos e privilégios; 4) recente mobilidade social de classes no Brasil; 5) democratização do ensino público; e 6) assédio sexista do patriarcado social. Alguns desses temas são abordados em vários estudos (BRUNO e FREYRE, 1954; FREYRE, 1937; FREYRE, DIAS e MONTENEGRO, 1961; TEIXEIRA, 2015; TEIXEIRA, SARAIVA e CARRIERI, 2015; VOGELZANG, 2016).
Este artigo está organizado em: marco teórico; método de investigação; análise; e considerações finais. O marco teórico apresenta os conceitos de Thorstein Veblen, a construção teórica do ócio vicário e o contexto sociocultural brasileiro. Em seguida, a metodologia apresenta a caracterização da pesquisa, a descrição do objeto em estudo e a perspectiva e estrutura de análise. Por fim, a análise e as considerações finais apresentam os achados da pesquisa e a evolução para o campo de estudo, evidenciando a relevância dos conceitos e das construções teóricas centenárias de Veblen para a compreensão da realidade contemporânea brasileira.
MARCO TEÓRICO
Considerado pai do institucionalismo econômico, Thorstein Veblen é o fundador da única escola originalmente americana da economia (EKELUND e HÉRBERT, 1999). Conhecido por seu comportamento excêntrico, Veblen buscava compreender o “por quê” das coisas a partir do papel dos atores sociais que constituíam o chamado sistema de negócios (MACAGNAN, 2013). Como argumenta Macagnan (2013), Veblen rejeitou os paradigmas teóricos contemporâneos a ele impostos para construir uma nova proposta teórica. Assim, proporcionava um contraste da natureza humana com as questões racionalistas dos autores clássicos e neoclássicos. Sob essa perspectiva, seu trabalhou tornou-se importante do ponto de vista metodológico e sua crítica singular ao capitalismo (EKELUND e HÉRBERT, 1999).
Veblen adota a perspectiva evolucionária de que há uma luta entre as instituições que moldaram o passado e aquelas que tentam invadir o presente. Portanto, o processo de seleção natural das instituições passa por uma evolução das estruturas. Tais mudanças não são apenas o resultado desse processo de seleção, em que os predominantes se estabelecem, mas constituem “métodos especiais da vida e das relações humanas” (VEBLEN, 1989, p. 194).
O clássico centenário escrito por Veblen (1989) originalmente em 1899, A teoria da classe ociosa trouxe conceitos importantes para a compreensão da sociedade. Essa obra apresenta as relações entre classes e suas instituições culturais imersas em seus hábitos e costumes. Os conceitos advindos da visão vebleniana são um indexador simbólico. Rocha e Barros (2006) defendem os símbolos de status como fenômeno capaz de construir uma estrutura de diferenças entre classes. Ou seja, são séries de hábitos e costumes que se articulam por uma série de pessoas, grupos sociais, estilos de vida, gostos, perspectivas e desejos que nos envolvem a todos em um permanente sistema de comunicação de poder e prestígio na vida social. Como argumenta Macagnan (2013), na perspectiva vebleniana, o indivíduo é um agente que atua no mundo e na evolução cultural em que a classe ociosa emerge com o objetivo da apropriação dos hábitos e costumes.
Para compreender melhor, Veblen (1989) analisa o sistema social a partir de duas classes: a classe ociosa; e a classe baixa. Enquanto a classe ociosa se ocupa com atividades governamentais, esportivas, religiosas e de guerra em conjunto com os indivíduos que a rodeiam, os trabalhos braçais e industriais e as tarefas cotidianas são executadas pela classe baixa. Ao analisar a propriedade privada sob a perspectiva de Veblen (1989), percebe-se que ela é estabelecida por uma luta entre os indivíduos. A busca da propriedade privada vai além da satisfação das necessidades, representa a (re)produção de aspectos simbólicos de prestígio e estima proporcionados pelo meio social inserido. Portanto, a conquista dessas propriedades devem ser demonstrada, pois “a demonstração do consumo expressa a capacidade de propriedade” (MACAGNAN, 2013, p. 132).
Como argumenta Macagnan (2013), esse pensamento vebleniano ainda está presente nos tempos atuais. Agora com métodos refinados, mas com a mesma finalidade: conquistar a propriedade de modo predatório e não produtivo. Com isso, são desempenhados os rituais e cerimoniais a fim de demonstrar tais capacidades. Como argumentam Ekelund e Hérbert (1999, p. 488), essas instituições cerimoniais em torno da propriedade privada são caracterizadas pelo “amor ao dinheiro”.
Esse aspecto revela um fator sobre a classe ociosa. Suas relações com o ambiente produtivo é meio e não fim do processo de acúmulo de riqueza. Ao analisar a sociedade enquanto um mecanismo industrial ou econômico - e suas instituições econômicas -, Veblen (1989, p. 199) afirma que “essas instituições são métodos habituais de continuar o processo vital da comunidade em contato com o ambiente material em que vive”. Para Veblen (1989) as instituições são hábitos mentais predominantes em relações e ações particulares do indivíduo e da comunidade. Ou seja, o modus operandi da vida de um indivíduo pode ser compreendido pelo conjunto de instituições que atuam pontualmente ou de modo processual em uma sociedade. Esses hábitos mentais - instituições - são recebidos de modo hereditário, em concordância com aspectos do passado e não são totalmente coerentes com a vida no presente.
Portanto, as instituições são resultado do passado e do presente, formadas a partir da luta permanente entre hábitos antigos e novos. Como aponta Veblen (1989), a dinâmica tecnológica e os hábitos cerimoniais são forças motrizes que vão mudar a sociedade. Tais forças em disputa podem ser identificadas por seus “interesses econômicos, hábitos econômicos e mentais e se manifestam em convenções, leis, contratos, funcionalidade de transações e contratos de juros”, entre outros (MACAGNAN, 2013, p. 133). Como argumentam os veblenianos, a crítica feita por Veblen aos clássicos é porque estes compreendem o sujeito como um ser econômico maximizador de ganhos e plenamente consciente de suas ações, desde o prazer até a dor ou da satisfação ao sacrifício (MACAGNAN, 2013).
As contribuições do Veblen para economia e administração partem da metáfora evolucionista dos institucionalistas que se opõe à visão clássica de estabilidade e equilíbrio e da perspectiva de que os indivíduos pautam suas ações sobre uma racionalidade dada. Outra importante contribuição de Veblen (1989) é a abordagem metodológica interpretativista, baseada na hermenêutica e na etnografia desenvolvida por meio da análise dos hábitos e costumes da sociedade industrial de sua época (VEBLEN, 1989; SILVA, 2008; HÜBLER e LAVARDA, 2017).
O trabalho de Thorstein Veblen é fundamental para as escolas da economia institucional (ZAJDSZNAJDER, 1980; SANTOS, 2003), do institucionalismo evolucionário (HÜBLER e LAVARDA, 2017), da sociologia econômica (SILVA, 2008) e para compreender o consumo conspícuo (ostentação), tema pertinente da antropologia do consumo (RESENDE, 2017; SALLES e CAMATTA, 2014).
Para utilizar o sistema teórico de Veblen para interpretar o filme Que Horas Ela Volta? são apresentados os conceitos desenvolvidos que sustentam a análise e a construção teórica do ócio vicário, além da construção do contexto sócio-histórico-cultural do cinema brasileiro.
Categorias conceituais de Thorstein Veblen
Para Veblen (1989), a (1) Divisão de Classes passa por hábitos e costumes de uma classe ociosa que direciona os hábitos e costumes das outras classes. Com a evolução dos modelos produtivos e a transformação do indivíduo na relação com o trabalho, surgiram algumas características instituídas de carga axiológica para diferenciação dos sujeitos na organização social na visão vebleniana. Como defende Veblen (1989), historicamente, a classe ociosa é caracterizada por não ter funções ligadas à produção de bens, o que era uma expressão de superioridade. O trabalho produtivo sempre foi considerado pelas sociedades primitivas menos honroso, delegado a mulheres e escravos.
Veblen (1989) destaca 4 ocupações que influenciam a honra da classe ociosa: governamentais; guerreiras; religiosas; e esportivas. Essas ocupações assumem destaque na organização social até hoje. Um fator também mencionado por Veblen (1989) é o aspecto cultural e altruísta. A classe ociosa, por não se ocupar em trabalhos produtivos - que estariam na base da organização socioeconômica - teriam tempo para se dedicar ao desenvolvimento cultural e a obras de caridade social relacionadas ao espírito religioso. Esses atos ainda são valorizados socialmente no Brasil, detêm status de honra e nobreza.
Como destacado, nas organizações sociais primitivas, a instituição social de propriedade começa com a (2) Apropriação de Mulheres. Para Veblen (1989), a apropriação violenta de mulheres está relacionada à visão de “troféus”, símbolos de status e honra. Esse costume, para o autor, resultou no formato de casamento-propriedade, com uma estrutura familiar sob o comando de um homem.
Como ressalta Veblen (1989), a função dos homens em sociedades primitivas se reduzia consumir o que as mulheres produziam. As mulheres tinham um consumo substancial para a sobrevivência e a continuidade do trabalho. Portanto, Veblen (1989) argumenta que o consumo improdutivo é sinal de honra e proeza, requisito de dignidade humana. Com a evolução econômica, a mulher (esposa) se torna símbolo de respeito do lar. Passa a ser permitido o consumo pela mulher, para trazer honra ao lar e, por consequência, ao homem “dono” daquela família.
Como defende Veblen (1989), o papel da mulher evoluiu - no começo, em uma instituição arcaica, ela era criada e serva do homem e produtora de bens para o consumo do senhor e depois passou a consumir processos cerimoniais e bens produzidos por ele. Contudo, ela ainda permanece como uma serva, pois o dito “ser do lar” e a necessidade do consumo imposta a ela socialmente é a marca de um servo não liberto. Essas características são da classe ociosa, em classes menos abastadas, a mulher absorve certas características da classe ociosa em busca de honra semelhante, entretanto, tem trabalhos menos honrosos e, por vezes, menos remunerados do que os homens. A relação de gênero abordada faz parte da história da formação do Brasil, como destaca a obra Casa-grande & senzala (FREYRE, DIAS e MONTENEGRO, 1961), além dos trabalhos de Santos (2015), que busca compreender a relação do gênero com o trabalho doméstico, e Faria (2017), que apresenta uma reflexão sobre o contexto histórico das domésticas migrantes que abandonam suas cidades e seus lares para viver o trabalho em centros urbanos.
Para Veblen (1989), a (3) Riqueza está diretamente ligada ao status. Mesmo em sociedades mais justas em distribuição de riqueza, não é possível eliminar todas as necessidades individuais, pois a essência dessas necessidades é o desejo de sobrepôr-se aos outros na acumulação dos bens. Tal fenômeno, para Veblen (1989), deve-se à luta por honra fundada em “odiosa” comparação de prestígio entre os indivíduos.
Desse modo, a “propriedade se torna agora a prova mais evidente de um grau honorífico de sucesso como coisa distinta de realização heroica ou notável. A propriedade se torna, portanto, a base convencional da estima social” (VEBLEN, 1989, p. 33). Mesmo hoje, nenhuma posição honrosa na sociedade, de modo geral, é possível sem estar condicionada à propriedade (em seu sentido mais amplo). Assim, é necessário obter e acumular propriedades a fim de conservar a honra e o destaque social.
Os indivíduos de gostos refinados demonstram uma “contaminação espiritual” nas tarefas rotineiras, de menor valor social, historicamente atribuídas a mulheres e escravos. Essa separação no (4) Trabalho está relacionada ao conforto proporcionado pelas condições de vida. Pessoas que se ocupam de atividades desprezíveis pela e na sociedade possuem moradias baratas, dedicando-se a tarefas corriqueiras que não proporcionam espaço para dedicação a um pensamento elevado (VEBLEN, 1989).
Para tanto, existe uma emulação (tentar igualar-se) que demonstra repugnância à futilidade da classe ociosa. Os indivíduos capazes rejeitam trabalhos desvalorizados socialmente, mas aceitam trabalhos valorizados pelos indivíduos da classe ociosa, pois isso permite manter um status superior diante do grupo ao seu redor. Como argumenta Veblen (1989, p. 42) “não é bastante que o homem tenha simplesmente riqueza ou poder. É preciso que ele patenteie tal riqueza ou poder aos olhos de todos, porque sem prova patente não lhe dão os outros tal consideração”. A ideia de sucesso vebleniana está relacionada à odiosa comparação com os outros, que, portanto, é convencionada pelo objetivo da ação humana, o sucesso. Demonstrar força superior à condição essencial de vida é necessário para que o homem ocioso possa viver sem dificuldade no conforto (VEBLEN, 1989).
Veblen (1989) apresenta as práticas (5) Cerimoniais ou boas maneiras como signos de prestígio em processos de cultura e consumo, qualificando o indivíduo que exerce essa prática com uma marca de respeitabilidade nos processos culturais. Dentro do processo do trabalho, à medida que ocorreu a evolução das organizações industriais, as práticas cerimoniais foram identificadas como normas (explícitas e implícitas) que regulam a propriedade em âmbito e consciência. Cria-se, então, outro fator de separação de classes, dificultando o acesso das pessoas pobres ao espírito elevado (boas práticas) e impossibilitando que pessoas de espírito elevado sejam pobres (VEBLEN, 1989).
O (6) Ócio conspícuo é o consumo de bens sem função prática. Como defende Veblen (1989), uma das formas de distinção da classe ociosa é o consumo conspícuo, que ocorre quando o indivíduo necessita demonstrar sua riqueza por meio do que consome. Esse consumo já não se dá mais por questões de sobrevivência, mas sim de manutenção de status e honra. Desse modo, o indivíduo se esforça continuamente para manter um requinte cada vez maior no comportamento, como o consumo de uma educação singular, o consumo de artigos de luxo e as formas de consumo.
Outras características do ócio conspícuo são a posse de muitas mulheres, de serviçais que se ocupam com o conforto e a produção de bens para o senhor. O consumo de certas iguarias, artigos raros de enfeite e adorno, artigos de luxo, bebidas e comidas específicas da classe superior (inclusive o excesso de bebidas e narcóticos) é dispendioso e, portanto, atribuem, por meio do cerimonial, valores nobres e honoríficos a quem os consome (VEBLEN, 1989).
O (7) Sangue nobre é um princípio de transmissão de pai para filho(s) de modo hereditário que almeja o engessamento da mobilidade de classes sociais. Esse princípio com caráter de tradição tem condições da classe ociosa que são signos e indicativos de sangue nobre. Essa instituição do sangue nobre aliado à transmissibilidade hereditária proporcionou, junto com o desenvolvimento industrial, a concentração da propriedade em um grupo pequeno de indivíduos. Elevou-se o padrão convencional de riqueza da classe mais alta alterando todos os signos e símbolos do conceito vebleniano, como o ócio conspícuo e o ócio vicário, na medida em que a classe vicária começa a consumir símbolos de status da classe ociosa (VEBLEN, 1989).
Ócio vicário
Quando o poder aquisitivo proporciona ao indivíduo a possibilidade de ter servos que produzem para ele além do que precisa, o indivíduo cria as condições de ter servos para aumentar seu conforto realizando trabalhos domésticos (não produtivos). Essa é a instituição do ócio vicário, conceito central para este estudo e sustentado pelos conceitos apresentados anteriormente. Para Veblen (1989), o indivíduo, na pessoa do senhor, possuidor de mérito e honra, de sua posição social e respeito próprio, cria a necessidade de possuir servos especializados - que servem mais para ostentar do que para realizar os serviços que executam. Ter empregados em quantidade e qualidade é uma indexação de respeitabilidade.
Ao analisar as qualidades de bom servo vicário, Veblen (1989) define que o bom criado deve conhecer seu lugar e realizar as tarefas de modo adequado, pois o serviço doméstico é uma função “espiritual” e não mecânica. Surgem, assim, normas específicas que regulam o ócio vicário. Ter servos domésticos custa tempo e recursos e, com o passar do tempo, quem quer ocupar cargo de ócio vicário não pode ter ocupado qualquer cargo ligado ao serviço produtivo. O criado deve ser treinado para ser útil ao satisfazer o gosto do senhor pelo serviço benfeito e demonstrar domínio pelos outros empregados dependentes dele. Para além e por princípio, o criado serve para emular respeito e prestígio (VEBLEN, 1989). Logo, quando o serviçal doméstico não tem uma formação e treinamento necessários para executar a função, isso simboliza o desprestígio do senhor que o mantém, ou seja, demonstra incapacidade de obter bons empregados.
Como destaca Veblen (1989), os indivíduos da classe ociosa necessitam dedicar-se ao consumo conspícuo o que ocupa exaustivamente o seu tempo. Já a atenção dedicada à relação pessoal com os criados para emular algum grau de respeitabilidade é tida pela classe ociosa como desagradável. A presença da classe de empregados é tolerada diante de uma moral e respeitabilidade exigidas pela classe ociosa. O ócio vicário, nesses termos, só é possível com apoio em status ou serviço pago; logo, se o comportamento do criado demonstra falta de recursos, desaparece a razão principal de manter o criado (VEBLEN, 1989).
Um ponto importante é o consumo dos indivíduos encarregados do ócio vicário. Quanto maior o consumo dessa classe, maior honra seu empregador detêm. Portanto, quanto melhor o uniforme, as acomodações de trabalho, os alimentos e as condições dispostas que caracterizam o consumo vicário de bens, maior o status da classe ociosa. Esse consumo tem como razão a demonstração do senhor (empregador) de sua riqueza e honra. Entretanto, o consumo vicário nunca pode ser maior ou melhor do que o consumo conspícuo da classe ociosa (VEBLEN, 1989).
Veblen (1989) apresenta diversos conceitos para construir sua teoria que descreve o comportamento, os hábitos e os costumes da classe ociosa. Ou seja, as instituições exercidas sobre seu objeto de estudo. Além disso, como o autor argumenta, essas instituições não deixaram de existir, entretanto, modificaram seus métodos para a promulgação e sobrevivência da classe ociosa.
A partir da leitura de Veblen (1989), apresentam-se no Quadro 1 as categorias teóricas utilizadas para analisar o filme Que Horas Ela Volta?
A instituição do ócio vicário está presente dentro da construção teórica da classe ociosa e a partir do consumo conspícuo, além de suas pequenas engrenagens apresentadas, como a mulher como propriedade, a visão sobre a riqueza como status ou até a hereditariedade como engessamento da mobilidade social. Os conceitos veblenianos são inter-relacionados, como uma estrutura mental que fortalece as instituições observadas em seu trabalho. Tendo em vista que a análise dessas instituições se mostra complexa, adotou-se o conjunto de categorias teóricas apresentado no Quadro 1.
Como Silva (2008) argumenta, o próprio Veblen (1989) utilizou em seu trabalho um conjunto metodológico interdisciplinar por meio da história, sociologia e antropologia, entre outros saberes que potencializassem a interpretação das instituições. Para isso, no próximo item se apresenta o contexto sócio-histórico-cultural em que o filme Que Horas Ela Volta? foi produzido e consumido.
Contexto sócio-histórico-cultural do cinema brasileiro
O cinema brasileiro passou por uma transformação a partir da Lei do Audiovisual, em 1993, e da criação da Agência Nacional do Cinema (Ancine), em 2001, criando condições para uma produção crescente, estável e com êxitos regulares (CALDAS e MONTORO, 2006). Além disso, com certas características do movimento Cinema Novo dos anos 1960, a retomada do cinema nacional teve algumas modificações, como: o foco em uma psicologia social comparado à teleologia social do Cinema Novo; uma linguagem comercial dominada pelas telenovelas; a questão da marginalidade quanto ao foco de temáticas; e a volta do sertão e da favela, mas de modo diferenciado em relação ao Cinema Novo (CALDAS e MONTORO, 2006; SANTOS, 2015).
Um exemplo desse processo é o destaque de sucesso de bilheteria do filme Cidade de Deus (CIDADE, 2002), onde a favela é reconhecida como um território autônomo, isolado, em que existem pobres que se matam, omitindo a falta da ligação da violência com a pobreza, evidenciando a omissão da responsabilidade das classes superiores com os problemas da desigualdade (VOGELZANG, 2016).
O documentário Doméstica, muito elogiado pela crítica (DOMÉSTICA, 2013), aborda a temática doméstica de modo realístico: durante 1 semana, 7 jovens se tornaram cineastas amadores e filmaram o cotidiano de suas empregadas domésticas. O material foi entregue ao diretor Gabriel Mascaro, que compilou os momentos mais marcantes nesse documentário. A temática tem relação com fatos ocorridos em vários filmes recém-lançados no Brasil. Como argumenta Vogelzang (2016), o filme Que Horas Ela Volta? simboliza uma pós-retomada marcada pela disputa entre filmes “independentes” e os produzidos com o apoio da Globo Filmes para o público nacional. Que Horas Ela Volta? se concentra em um apelo emotivo, com a potencial posição de ascensão social da protagonista relacionada diretamente às mudanças sociais contemporâneas do Brasil. Volgelzang (2016) argumenta sobre o foco do filme para os lugares urbanos da classe média e as formas “contemporâneas” de “convivência das classes” nesses lugares. Esse filme se enquadra em uma linhagem característica de certos filmes, como O Som ao Redor (O SOM, 2013) e Casa Grande (CASA GRANDE, 2014), em que se apresentam as relações de classe no Brasil. “Esta ‘trilogia’ parece seguir o rastro histórico dos auges econômico-culturais no Brasil, de Recife por Rio de Janeiro a São Paulo” (VOGELZANG, 2016, p. 7).
Como se observa no filme Casa Grande (CASA GRANDE, 2014), as vivências da doméstica e babá demonstram as relações ainda não resolvidas socialmente, também destacadas pelo livro de Gilberto Freyre, Casa-grande & senzala (FREYRE, DIAS e MONTENEGRO, 1961). O enredo social destaca que a realidade das escravas era cuidar, amamentar e criar o filho dos patrões (donos) e, muitas vezes, ver seus próprios filhos serem maltratados e vendidos, mesmo a maior parte deles sendo filhos do patrão. Hoje, essa estrutura social de senzala ainda pode ser observada nos quartinhos dos fundos que, normalmente, são destinados às empregadas domésticas nas casas em que trabalham (VOGELZANG, 2016).
Outro fator relevante sobre a temática das domésticas são as regulações governamentais da atividade do trabalho doméstico. Como destaca Azoubel (2015), após séculos batalhando para retirar os resquícios da escravidão, finalmente foi aprovada a emenda constitucional que trouxe direitos, deveres e garantias, além de segurança jurídica, para os empregados domésticos. Ainda como argumenta Azoubel (2015), as consequências evidenciadas foram o aumento do custo para o empregador manter seu empregado doméstico, gerando demissões sem justa causa e o aumento pela demanda por diaristas. Também se observou que alguns senhores mantiveram os empregados domésticos que já trabalhavam em sua residência na informalidade, desrespeitando a atual legislação.
MÉTODO DE INVESTIGAÇÃO
Este trabalho analisa o filme Que Horas Ela Volta? sob uma perspectiva historicista defendida por Kornis (1992), à luz das construções teóricas do ócio vicário (e conceitos precedentes) de Thorstein Veblen, transitando na interdisciplinaridade vebleniana apresentada por Silva (2008), a fim de compreender os fenômenos socioeconômicos da realidade brasileira contemporânea. Para isso, o direcionamento adotado se pautou pelos estudos de Yin (2009) e Creswell (2010), para realizar uma pesquisa de caráter exploratório descritivo, de natureza qualitativa, com base em um estudo de caso. Esta seção caracteriza a pesquisa, o objeto da pesquisa e a análise de dados.
Caracterização da pesquisa
Esta pesquisa se caracteriza como um estudo de caso pelo foco de observar, assinalar, analisar e classificar os documentos referentes a um caso da sociedade, sem alterá-los, para que possam ser interpretados. Também é uma pesquisa qualitativa, pois utiliza um instrumento de levantamento e análise de documentos que confirmam essas características (CRESWELL, 2010; YIN, 2009).
Outra escolha relevante para o desenvolvimento metodológico é a visão interdisciplinar de Veblen defendida por Silva (2008). Ao compreender as instituições sociais, a economia passaria a ter um novo padrão científico, buscando a interdisciplinaridade e o diálogo com a história, sociologia e antropologia, entre outros saberes que potencializassem a interpretação das instituições. Percebe-se na obra de Veblen uma insatisfação com a rigidez disciplinar em expansão nas ciências sociais e com a demarcação de campos do conhecimento supostamente isolados. Entretanto, a perspectiva da sociologia econômica procura reestruturar essas limitações (SILVA, 2008).
Objeto
Para definir o objeto da pesquisa, buscou-se em Kornis (1992) um conceito de filmes para interpretação proposta no objetivo do trabalho. Para tal, compreende-se o filme como um documento a ser analisado. Para Le Goff e Nora (1976, p. 23) o documento é um produto de quem detinha as relações de força em determinada sociedade e reflete esse contexto social.
Em uma visão inspirada em Michel Foucault (1926-1984), Le Goff e Nora (1976, p. 25) argumentam que o documento pode ser compreendido como um monumento resultante das interações da sociedade histórica para propor, em um futuro, uma imagem de modo deliberado ou não. “No limite, não existe um documento verdade. Todo documento é mentira [...] É preciso começar por demonstrar, demolir esta montagem (a do monumento), desestruturar esta reconstrução e analisar as condições de produção dos documentos-monumentos”.
Essa definição possibilita interpretar o filme como uma construção que altera a realidade por meio de um conjunto articulado de informações: a imagem; a palavra; o som; e o movimento. Os vários elementos de um filme são recursos estéticos que formam a linguagem cinematográfica, proporcionando significado específico que transforma e interpreta aquilo que foi recortado do real (KORNIS, 1992).
Documentos
Foram utilizados diversos documentos para a realização desta pesquisa. Além do filme Que Horas Ela Volta? recorremos a outros filmes, supracitados (CASA GRANDE, 2014; O SOM, 2013; DOMÉSTICA, 2013), e trabalhos acadêmicos já realizados sobre o filme (FARIA, 2017; FERRAZ, MOURA-PAULA, BIONDINI et al., 2017; NUNES e RODRIGUES, 2017; RIBEIRO, 2015; SANTOS, 2015; SCHERDIEN, BORTOLINI e OLTRAMARI, 2018; VOGELZANG, 2016). Também foram utilizadas informações veiculadas na mídia sobre o comportamento e a recepção do filme pela sociedade. Para criar condições da análise do filme são necessárias novas técnicas que possibilitem a interpretação do que se interpõe entre a câmera e o evento filmado (KORNIS, 1992). Como argumenta Kornis (1992), o contexto de produção, exibição e recepção inclui todo um conjunto de variáveis que deve ser contempladas em uma análise do filme.
Análise e categorias de análise
Para analisar o filme é preciso compreender o “princípio de que a imagem é reflexo imediato do real e que, portanto, ela traduz a verdade dos fatos” (KORNIS, 1992, p. 243). Ainda compreendendo o filme como objeto em uma visão historicista, os filmes de ficção são objetos de análise, pois nenhum gênero de filme consegue ser a verdade em seu fim, independente do tipo de processo ou método cinematográfico que o originou (KORNIS, 1992).
Demite e Leite (2015) argumentam que a linguagem fílmica tem um aspecto de realidade estética que se relaciona com a subjetividade do indivíduo que produz e recebe enquanto expectador que pensa, interfere e transforma a história e seu processo de significação. Para analisar o filme de ficção, Ferro (1976) argumenta a necessidade de compreender as características sociais de quem o produziu, quem o consome e da própria obra, além da relação entre os autores do filme, a sociedade e o próprio filme. Assim, existe a possibilidade da compreensão do não visível. O filme, nessa visão, excede seu conteúdo, indo além da ilustração - fugindo da lógica da confirmação ou negação do documento per se.
Como argumenta Kornis (1992), há possibilidade de uma contra-história e uma contra-análise da sociedade. Assim, ultrapassa o objetivo do realizador e apresenta a ideologia de uma sociedade que “[se chega] ao caráter desmascarador de uma realidade político e social” (FERRO, 1976, p. 47).
Ao analisar o filme foram utilizadas as categorias teóricas de Veblen (1989) apresentadas no Quadro 1: (1) A divisão das classes e suas funções; (2) A mulher e a propriedade; (3) Riqueza e status; (4) O trabalho; (5) A cerimônia signo de honra; (6) Ócio conspícuo e distinção social; (7) Hereditariedade e sangue nobre; e (8) Ócio vicário - conceito central do estudo. Essas categorias emergem da obra A teoria da classe ociosa (VEBLEN, 1989), por meio de observações de comportamentos, hábitos e costumes de povos primitivos em uma proposta antropológica, histórica e sociológica de analisar relações econômicas. Essas categorias têm uma visão peculiar para Veblen (1989), exercem uma força institucionalizada sobre os indivíduos para manutenção das relações entre a classe ociosa e a classe baixa. Cada categoria conceitual funciona como uma engrenagem mental que institucionaliza funções e hábitos esperados de cada indivíduo.
Em busca de evidenciar aspectos desses conceitos latentes no filme e na sociedade, a análise é qualitativa ao comparar o enredo e os fatos destacados no filme que corroboram o comportamento da classe ociosa que consome conspicuamente o ócio vicário. Para além do filme, relatam-se pontos do impacto na sociedade e discutem-se aspectos da proposta de Veblen (1989) à luz de trabalhos relacionados.
Seguindo esses pressupostos metodológicos, propõe-se para a análise do filme a apresentação da ficha técnica, da sinopse do filme e logo em seguida a apresentação dos fatos ocorridos no filme e na estrutura social em que ele está imbricado, categorizando-os pelos conceitos e argumentos de Veblen (1989).
ANÁLISE DO FILME QUE HORAS ELA VOLTA?
Ficha técnica
Título: Que Horas Ela Volta?
Ano: 2015
País: Brasil
Gênero: Drama
Duração: 114 minutos
Roteiro: Anna Muylaert
Produção Executiva: Cláudia Buschel
Direção de Fotografia: Barbara Alvarez
Direção de Arte: Marquinho Pedroso
Montagem: Karen Harley
Sinopse
A pernambucana Val muda para São Paulo, com o objetivo de conseguir recursos para criar sua filha, Jéssica. Para isso, Val deixou sua filha no interior de Pernambuco para ser babá de Fabinho, morando em tempo integral na casa de seus patrões, Carlos e Bárbara. Treze anos depois, Jéssica lhe telefona pedindo ajuda para ir à São Paulo prestar vestibular (a mesma prova que Fabinho faria). Os chefes de Val recebem a menina de braços abertos, mas quando ela deixa de seguir certo protocolo, circulando livremente pela casa, a situação se complica.
Personagens
Val (Regina Casé) [ócio vicário], uma pernambucana que deixa sua terra natal e vai para São Paulo à procura de uma vida melhor. Ela trabalha como empregada doméstica na residência do casal Carlos e Bárbara, onde faz de tudo: lava, cozinha, põe a mesa, retira os pratos e cuida do filho do casal, Fabinho, como se fosse sua mãe. Em contrapartida foi obrigada a deixar sua filha, Jéssica, no Nordeste, não assumindo o papel afetivo de mãe.
Carlos (Lourenço Mutarelli) [classe ociosa], um artista em crise, busca na filha de Val a possibilidade de um recomeço e uma forma de ressignificar seu futuro. Acaba envolvendo-se afetivamente com Jéssica e demonstrando atos de assédio.
Bárbara (Karine Teles) [classe ociosa e esposa-propriedade] é uma estilista famosa que ocupa seu tempo em seus compromissos e, assim, sempre se ausenta da relação com seu filho e marido, sendo responsável pela coordenação dos empregados e da casa. De certo modo, Bárbara terceiriza para Val os cuidados com o filho.
Fabinho (Michel Joelsas) [classe ociosa por hereditariedade] é o filho criado pela empregada, que se dedica a ele como não pôde se dedicar à sua filha. Está na mesma fase de vida de Jéssica e vai prestar vestibular para a mesma instituição de ensino que ela.
Jéssica (Camila Márdila) [ponto de conflito: não é classe ociosa e não se considera ócio vicário] é a filha da empregada que vai para São Paulo prestar vestibular para Arquitetura. Não se adapta às condições de filha da empregada e não reconhece Val como sua mãe, inicialmente. Questiona as regras e normas da casa. Envolve-se em um relacionamento de desejo com Carlos e Fabinho, o que incomoda Bárbara.
Categorias de análise de Thorstein Veblen
A divisão de classes e suas funções
O filme apresenta em seu enredo a relação entre classes: patrão e empregado. As características estão diretamente ligadas ao histórico social do Brasil, como o fato da personagem Val ser nordestina e ter de ir para São Paulo para “ganhar a vida”, em busca de sustentar sua filha. Entre a relação de classes se evidenciam características da classe ociosa, representada pelos patrões, e do ócio vicário, representado pela empregada doméstica. O ponto de ruptura é justamente a filha da empregada, que questiona a falta de mobilidade social e hereditariedade relatada por Veblen. A personagem Jéssica põe em questão as práticas cerimoniais que diferenciam as classes aqui analisadas. A todo momento, Jéssica questiona essas práticas cerimoniais carregadas de regras, hábitos e costumes que diferenciam o patrão do empregado e evidencia a tentativa da classe ociosa emular uma respeitabilidade que é colocada em questão no filme, como o discurso de Val de considerar-se um pouco mãe de Fabinho e os patrões considerarem Val praticamente membro da família. Quando analisamos a situação de Val ter dado um presente para sua patroa e esta, em certa situação do filme, desqualificar o presente, revela-se o que existe de silencioso: há costumes e hábitos diferenciados entre as classes.
Por detrás dessas situações, a realidade do Brasil também consistia em colocar a diferenciação de classes em cheque. A lei recentemente aprovada para a regularização das empregadas domésticas simboliza um ganho histórico de uma classe que, desde a escravidão, não tinha legitimidade dentro da organização política e social do Estado. Após anos de ganhos sociais, onde houve significativa redução das desigualdades entre as classes sociais (ascensão econômica de significativa parcela da população), percebe-se no país que as diferenças ainda são enormes. Na última eleição para presidente, os votos e debates demonstraram forte polarização entre Nordeste e Sudeste - pobres x ricos; esquerda x direita, entre outras. Como proposto por Kornis (1992), pode-se compreender o filme como resultado desses conflitos entre classes e a maneira como tais classes consomem o filme. Diversas pessoas que se reconhecem como sendo do Nordeste, pobre e de esquerda se identificaram com as histórias da personagem Val. A própria diretora e roteirista, Anna Muylaert, baseou o filme em histórias que acompanhou durante anos de sua vida. O roteiro demorou 18 anos para ficar pronto, segundo Anna Muylaert (RIBEIRO, 2015). Além disso, o posicionamento midiático demonstrou desacordos sociais na reação ao assistir o filme, que geraram polêmicas por todo país. Houve empregados e patrões que negaram as situações conflituosas retratadas no filme, enquanto outra parcela social se identificou com os conflitos evidenciados por Jéssica.
Araújo e Lopes (2017, p. 209) descrevem um relato da blogueira Cynara Menezes, do blog Socialista Morena, sobre um diálogo entre uma mãe e filha logo após assistir o filme:
Ela conta que observou a conversa entre a moça do caixa e uma cliente e que, quando foi atendida, questionou a jovem sobre o relacionamento entre as duas, ao que ouviu: “Não, é minha mãe. É que ela trabalha como babá a semana toda, só vai para casa domingo de manhã. E a gente só se vê quando ela vem aqui no supermercado comprar alguma coisa”.
O desconforto gerado pelo filme se deve a sua proposição realística. Anna Muylaert destacou em uma entrevista sua proposta de representar o reflexo da sociedade (PEIXOTO, 2015). Outro relato é da jornalista Nina Lemos, da revista Trip, sobre sua experiência de ter assistido o filme no exterior. Em seu relato, Lemos (2015) destaca a percepção dos alemães sobre o filme, por não acreditarem que a relação entre patrão e empregado fosse desse jeito no Brasil:
Estou em um cinema em Kreuzberg, Berlim, e eu sei que é assim na vida real no meu país. A plateia, formada por brasileiros e alemães, dá risos nervosos. Desconfio que os risos nervosos sejam mais de brasileiros como eu, que conhecem bem essa situação e sabem que a escravidão existe no Brasil de uma maneira sinistra. E de uma forma que a gente ainda não foi capaz de acabar. [...] Na saída, encontro uma amiga brasileira, também acompanhada de namorado europeu, e ela me diz: “deu um pouco de vergonha”. Concordamos que a vergonha é total.
A relação conflituosa entre a classe ociosa e o ócio vicário é algo que faz parte do cerne da realidade brasileira, desde sua origem (FREYRE, DIAS e MONTENEGRO, 1961). Em outro relato descrito por Araújo e Lopes (2017, p. 211), a professora universitária e blogueira Lola Aronovich, do blog Escreva, Lola, Escreva, conta um relato de uma jovem sobre o filme: “sim, eu sou Jéssica [...] Jéssica foi praticamente meu puro e simples retrato. Nunca me senti tão fortemente identificada com algum personagem como me senti com Jéssica”.
O relato da jornalista Ingrid Fagundez (2015), traz a ex-diarista Maria Lima, na época representante do sindicato da categoria:
Sim [a história é real], e a história é velha porque todas nós somos imigrantes, viemos do Nordeste para São Paulo à procura de uma vida melhor. É uma história já antiga, conhecida e reconhecida mundialmente. E achei muito bom. Tudo é verdade. Ela querer ser mãe do filho da outra, a história de fazer parte da família, o que não é coisa nenhuma. Sempre tem uma relação de desigualdade.
O aspecto evidenciado no relato da Maria Lima se refere às questões subjetivas e afetivas do gênero no trabalho doméstico. Ao analisar o filme do ponto de vista organizacional e sobre as relações de trabalho, Ferraz, Moura-Paula, Biondini et al. (2017, p. 273) argumentam que existe uma estrutura de valores e ideias que possibilitam a naturalização dessas relações entre classes em busca de sustentar a exploração e opressão na possibilidade de “ser da família sem ser da família”. A afetividade é uma ideologia que encobre as relações de trabalho existentes e esconde o que Veblen (1989) compreende como a mulher enquanto propriedade ou o consumo conspícuo do ócio vicário. Ou seja, “ser na família opera-se pela efetivação das práticas atribuídas às mulheres na sociedade patriarcal: cuidar, limpar, alimentar etc., que permite a Val ser ‘mãe’ sem ser genitora” (FERRAZ, MOURA-PAULA, BIONDINI et al., 2017, p. 273). A seguir, observa-se a mulher enquanto propriedade.
A mulher e a propriedade
A questão de gênero é tratada no filme de modo tangenciado. Entretanto, para Veblen (1989), na origem do ócio vicário está a mulher, como também trabalhado por Gilberto Freyre (FREYRE, DIAS e MONTENEGRO, 1961) na origem da família brasileira. Quando os patrões consideram Val praticamente parte da família, identifica-se um hábito de que Val é uma propriedade e, por consequência, hereditária - Jéssica também. Quando Carlos, o patrão, apaixona-se por Jéssica, identificamos o acúmulo de riqueza, algo evidenciado por Veblen (1989) quando defende que mulher, no sentido de propriedade, pode ser acumulada para simbolizar riqueza. A juventude e vivacidade de Jéssica seria um símbolo de status que Carlos deseja e ele não vê nada que possa atrapalhar esse desejo - mesmo sendo casado. Nesse sentido, é possível que Bárbara possa ser trocada pelo marido, porque ela, enquanto propriedade de Carlos, segundo os conceitos veblenianos [ócio vicário e casamento-propriedade],vai perdendo seu valor simbólico de status e honra para Jéssica.
Ao analisar o trabalho doméstico nas músicas populares brasileiras, Teixeira e Mafra (2014) concluíram que o trabalho doméstico faz parte de um imaginário relacionado a subalternidade do indivíduo e objetificação sexual deliberada dessa mulher, corroborando o conceito de mulher-propriedade de Veblen (1989). Como Ferraz, Moura-Paula, Biondini et al. (2017, p. 273) argumentam, “a divisão sexual do trabalho, que também é desdobramento da divisão social do trabalho, constitui elementos presentes na subjetividade do ser doméstica no Brasil. E ser doméstica é estar em um lugar de inferioridade na estrutura das relações sociais”.
A questão de gênero se encontra na gênese do filme, escrito e dirigido por uma mulher, além de ter mulheres como personagens centrais: Val, Bárbara e Jéssica. Essas mulheres representam uma lógica social e de como atitudes mínimas podem perturbar tal lógica e denunciar atitudes naturalizadas (SANTOS, 2015). São 3 mulheres e 3 realidades diferentes, em que há um abismo social que as separa dentro das classes. Santos (2015, p. 348) argumenta que é preciso quebrar com os discursos universalizantes e entender as interseccionalidades, pois “não existe apenas um ‘ser mulher’, mas várias possibilidades de existência feminina relacionada a todos os outros fatores que formam a identidade de cada uma”.
O enredo extrapola a película e o seguimento cinematográfico brasileiro, dominado por homens, foi foco de conflito. A diretora Muylaert enfrentou uma polêmica quando 2 diretores tiveram comportamento grosseiro, preconceituoso e desrespeitoso em uma entrevista de apresentação do filme, tendo de retratar-se posteriormente. Um dos diretores teve seus filmes suspensos do circuito da cidade em questão durante 1 ano e o caso foi amplamente divulgado pela mídia (RIBEIRO, 2015).
Riqueza e status
Para Veblen (1989), é por meio da demonstração de riqueza que se adquire o status. A forma de demonstrar a riqueza se encontra nas características de consumo que diferenciam as classes. Esses dois dispositivos criam a possibilidade de diferenciação de classes: não basta ser rico, é necessário demonstrar sua riqueza. O filme tem diversos momentos em que são reveladas essas diferenciações; em suma, fica a cargo de Bárbara definir quais são os espaços e hábitos determinados para os empregados.
Há uma cena emblemática no filme (aos 49 minutos e 53 segundos): o encontro de Jéssica e Carlos no ateliê. Carlos relata para Jéssica que parou de pintar quadros e que não sabe ao certo por quê. Jéssica o questiona sobre como faz com o dinheiro e se é Bárbara que sustenta a casa. Carlos sorri, fumando um cigarro, e diz:
Sei que não parece, mas a grana é minha, meu pai trabalhou muito, juntou muita grana e eu herdei isso.
Ou seja, o personagem de Carlos é um legítimo perpetuador da classe ociosa de Veblen (1989). A relação dos indivíduos do filme com o trabalho demonstra a distinção social deles, como se discute no item seguinte.
O trabalho
A relação dos patrões com o trabalho mostra as principais ocupações da classe ociosa. Carlos, um artista em crise não se ocupa com questões produtivas, mas sim com o acúmulo de conhecimentos não produtivos que o diferencia enquanto classe, como evidencia sua discussão com Jéssica sobre arte. Carlos frequenta clubes, dedica-se a arte, música e questões ligadas ao ócio.
Bárbara, apesar de dedicar-se ao seu trabalho, apresenta sinais de emulação da não futilidade de suas ocupações. Entretanto, ela é estilista, uma função que determina direções do consumo conspícuo, atividade classificada por Veblen (1989) como não produtiva e de destaque e honra social. No filme, Bárbara concede entrevistas e realiza jantares com pessoas nobres da sociedade, ocupando-se com questões de honra e fortalecendo, assim, a ideia de classe ociosa. O filho não tem ocupação produtiva, dedica-se apenas a acumular cultura para se diferenciar e efetivar sua posição enquanto classe ociosa, já definida pelo status da família. Bárbara terceiriza a criação do filho para Val, pois tarefas cotidianas não devem ser exercidas pela classe ociosa. Em boa parte do enredo, Bárbara se ocupa das cerimônias sociais, que servem para gerar mais honra e prestígio.
A cerimônia signo de honra
Os hábitos e costumes determinados diferenciam os patrões dos empregados. Onde dormir, como se vestir, quais espaços da casa se pode usar ou não, tudo isso faz parte do sistema axiológico proposto por Veblen (1989). Mesmo trabalhando há mais de 10 anos para a família, Val nunca pôde utilizar a piscina; na emblemática cena da piscina, como signo de liberdade, ela entra na piscina (mesmo sendo uma atitude de quebra de decoro) e liga para Jéssica para falar o que está sentindo. Rompe-se, aí, uma barreira entre patrão e empregada.
Outra cena emblemática ocorre quando Jéssica, por brincadeira, cai na piscina e Bárbara manda trocar a água, em claro sinal de desprezo por tudo o que a classe inferior utiliza, podendo causar desonra para a família. Em seguida, Jéssica questiona Val sobre o que não pode:
Jéssica: Não sei onde tu aprendeu essas coisas, fica falando não pode isso, não pode aquilo. Tava escrito num livro, como é? Quem te ensinou? Chegou aqui, ficaram te explicando essas coisas?
Val: Isso aí ninguém precisa explicar, não, a pessoa já nasce sabendo o que pode, o que é que não pode. Tu parece que é de outro planeta. (Cena, 1 minuto e 4 segundos)
Pode parecer ficção, entretanto, após o filme ocorreram diversos relatos dessas cerimônias de distinção. Como argumentam Araújo e Lopes (2017, p. 213), “têm coisas que a gente nasce sabendo”, ao descrever o relato da Gabriela Nascimento Ananias, do blog Blogueiras Negras:
Eu era a obediente filha da empregada, por isso recebia caixinha de água de coco. Enquanto minha irmã, a da cabeça raspada, recebia áridas broncas de minha avó por ter utilizado o gel de cabelo [a caralha de um gel de cabelo!] do filho da patroa, no banheiro do filho da patroa, enquanto esteve no trabalho com minha avó, também empregada doméstica. Nunca mais ela pôde transitar por esse mundo, nem como a neta-da-empregada, justamente porque ela não entendeu tim-tim por tim-tim o que gente como a gente precisa saber desde que nasce (ARAÚJO e LOPES, 2017, p. 214).
Outro relato descrito por Araújo e Lopes (2017, p. 214) foi de Jéssica Moreira, do blog Gelédes:
A linha tênue que mantém a empregada na cozinha quando o dia é de festa [...] o andar que separa o quartinho sem ventilação do quarto luxuoso de hóspedes [...] o presentinho que substitui o salário digno, que sempre fica aquém daquilo que cada babá, empregada doméstica - mensalista ou diarista - realmente deveria receber segundo as leis que regem essas profissões. Mas o “quase” é também a manutenção da terceirização do trabalho doméstico, o mesmo que deveria ser dividido igualmente entre os membros de uma família.
Como argumentam Ferraz, Moura-Paula, Biondini et al. (2017, p. 269), o que fica evidenciado são as relações sociais antagônicas de classe. Na prática de ser trabalhadora, ensinaram-lhe seu lugar na hierarquia social. Para além, conforme argumenta Veblen (1989), as cerimônias servem única e exclusivamente para distinção social. Quando Bárbara começa a ser ameaçada pela presença antagônica de Jéssica, ela exige em todos os aspectos ritos e cerimônias que diferem a classe ociosa do ócio vicário. Bárbara diz para Val que mandou trocar a água da piscina por causa de um rato, diz que Jéssica não pode ocupar mais o quarto de hospedes, pois vai receber uma visita na outra semana, diz que Jéssica não pode mais circular em certos cômodos da casa. Além da distinção pelo consumo apresentada a seguir.
Ócio conspícuo e distinção social
Um dos fortes pressupostos de Veblen (1989) é que a divisão de classes se dá por meio do consumo conspícuo. São as características do consumo que refletem a qual classe o indivíduo pertence. Dentro desse propósito, existem duas formas básicas: o consumo conspícuo e o consumo vicário, como abordado na construção teórica.
Como se evidencia no filme, o consumo conspícuo é o realizado pelos patrões para sinalizar o status e a honra da família, por exemplo: sorvete importado, quarto de visitas, motorista, jardineiro, jantares, obras de arte e até o consumo de entorpecente por Fabinho. Outro ponto evidente dessa diferenciação de consumo surge quando Val diz que Jéssica vai prestar vestibular na mesma universidade que Fabinho. Bárbara diz que é uma universidade difícil e levanta dúvidas sobre a capacidade de Jéssica.
Comparando com a realidade, a autora trouxe o fenômeno da democratização das universidades públicas, que tem ocorrido por meio de políticas sociais dos governos progressistas, como: ProUni, Cotas, Fies e Pronatec, entre outros. Existe um conflito de classes que esconde uma lógica meritocrática que Veblen (1989) aborda, como o consumo de cultura. Historicamente, as classes inferiores não puderam consumir educação de qualidade e as universidades públicas foram frequentadas, em sua maioria, por uma classe social de elevado poder aquisitivo. A autora do filme conseguiu trazer o debate, a desconstrução de que a educação de qualidade é pra quem teve um investimento dispendioso de tempo e recursos em educação, como no caso de Fabinho. Entretanto, quem conquista a oportunidade é Jéssica, mediante esforço pessoal. É evidente que esse debate foi tratado de modo raso pelo filme e que, na realidade social, existe uma luta para a democratização do Ensino Superior público, o que acontece por meio de disputa de políticas públicas.
O fato de Jéssica passar no vestibular e Fabinho não levanta diversas questões. O filme demonstra o desagrado de Bárbara quando a filha de Val presta vestibular para a mesma instituição de ensino que Fabinho. Logo após o resultado - Jéssica passa no vestibular e Fabinho não -, Bárbara propõe uma viagem de intercâmbio para Fabinho. Para os conceitos veblenianos, essa proposta de Bárbara sinaliza a classe ociosa modificando seu consumo para sempre se diferenciar das outras classes. Fabinho ganha uma viagem para o exterior logo após não passar no vestibular, firmando a oportunidade de diferenciação cultural. Independente da forma, a classe ociosa utiliza o consumo conspícuo para se destacar.
Logo, o consumo vicário se observa pelo consumo dos empregados, que gera uma diferenciação entre as classes, como: o tipo de hospedagem dos empregados (quartinho de Val), o tipo de sorvete mais barato para os empregados, o jogo de xícaras que não serve para os patrões, a proibição da utilização da piscina, a casa que Val aluga para Jéssica morar (que fica na periferia da cidade) e outras formas diferenciadas de consumo já citadas.
A realidade da questão do consumo é tão forte que, com base na lógica de Veblen (1989), pode-se interpretar a ascensão de uma classe por meio da democratização do consumo originada por políticas públicas, como valorização de renda e facilitação de crédito. As classes inferiores também precisavam demonstrar a elevação de status pelo consumo, refletindo na produção cultural e criando uma “moda ostentação”, com valorização de marcas e produtos historicamente consumidos pela classe ociosa - nota-se esse fenômeno da “ostentação” na produção cultural dedicada a essa classe emergente (SALLES e CAMATTA, 2014). Entretanto, como já abordado, a classe ociosa modifica seus padrões de hábitos e consumo para se destacar novamente.
Hereditariedade e sangue nobre
Hereditariedade e sangue nobre também são abordados no filme de modo tangenciado. Todos os hábitos e costumes exigidos e praticados por Val são esperados de Jéssica. Quando Jéssica chega à casa dos patrões e questiona a prática cerimonial, começam a surgir desconfortos. A própria Val cobra um comportamento de Jéssica do tipo “têm coisas que a gente nasce sabendo”. Ao mesmo tempo, Carlos demonstra fazer parte da classe ociosa por questões hereditárias. Herdeiro de grande patrimônio, mantenedor do lar construído para lhe dar prestígio e honra, em que se dedica a questões não produtivas.
Quando Veblen (1989) define as características do ócio vicário, ele fala sobre “saber o seu lugar” na estrutura de classes. Outro fato relacionado à hereditariedade é o engessamento da mobilidade de classes. Espera-se de Jéssica um comportamento igual ao de Val; ou seja, que ela não gere desequilíbrio social dentro da realidade do filme. Val sofre ao romper com toda a estrutura de ócio vicário que sempre foi naturalizada para a manutenção da instituição das classes definidas por Veblen (1989).
Ócio vicário
O ócio vicário agrupa todas as características já descritas. O papel da classe baixa, servir a classe ociosa no trabalho não produtivo para o conforto e a emulação de prestígio e honra, é uma instituição que persiste na sociedade brasileira. Veblen (1989) descreve o ócio vicário como a evolução da sociedade primitiva para o início de uma sociedade baseada em consumo conspícuo. Na sociedade primitiva, o trabalho produtivo e ordinário era realizado pelas mulheres e pelos escravos. Quando Veblen (1989) analisa tribos indígenas, argumenta que o homem era responsável pela caça e pela defesa da tribo enquanto as mulheres eram responsáveis pela produção e preparação de alimentos. O índio que tivesse destaque pela caça e pela guerra poderia possuir mais mulheres, em sinal de prestígio e honra.
Na evolução dessa instituição, Veblen (1989) aponta as sociedades feudais e pré-industriais, em que quanto mais empregados, maior a honra do senhor, da casa e da família. Esses empregados devem receber treinamento sobre os rituais, as práticas cerimoniais e até utilizam vestimentas que os distinguem das classes baixas. O ser ócio vicário é diferente do ser trabalhador produtivo, por estar próximo dos ritos e cerimônias da classe ociosa, não podendo assemelhar-se à classe produtiva. É permitido e incentivado o consumo conspícuo pelo ócio vicário, entretanto, tal consumo não pode superar em símbolos de prestígio o consumo da classe ociosa.
Portanto, além de uma relação de capital e trabalho, também há uma relação de consumo, ao contrário de vários estudos que analisaram o filme sob a ótica das relações de trabalho. Os fatores subjetivos podem ser compreendidos como a complexa relação da classe ociosa se manter enquanto tal, diante da classe baixa na evolução histórica. Até quando se observa a própria classe ociosa usufruindo de trabalhadoras domésticas, como relata uma das histórias do documentário Doméstica (DOMÉSTICA, 2013). O serviço doméstico, como exposto pela perspectiva vebleniana, é um item de consumo conspícuo que diferencia classes não só no Brasil, mas no mundo, constituindo item de questionários socioeconômicos. O que se tornou diferencial foram as características do ócio vicário, que passou a ter cada vez mais atributos que reproduzem signos de distinção. Alguns exemplos comuns podem ser observados no imaginário das novelas brasileiras, que colocam mordomos com sotaque e hábitos europeus como símbolo de distinção. Ou quando o imaginário ilustra o doméstico como “parte da família”, romantizado em uma axiologia afetiva diante da relação econômica. Ou seja, a instituição do ócio vicário como parte do consumo conspícuo é emulada em todas as classes que almejam distinção social. Todas as classes, em algum momento, desejam ter o ócio vicário.
O debate social em busca da profissionalização do trabalho doméstico e a quebra da visão romantizada do ócio vicário na sociedade é observado de modo diferenciado no filme Que Horas Ela Volta?Veblen (1989) e seus conceitos colaboram para compreender os hábitos, os costumes e as crenças do passado que disputam espaço com os hábitos, os costumes e as crenças da atualidade. Dentro dessa perspectiva, o papel de Jéssica representa essa quebra de institucionalidade em direção a uma nova perspectiva de sociedade, que está em disputa em um discurso de empoderamento e ascensão social.
É interessante observar que Veblen (1989), em seu texto centenário, consegue, por meio da interdisciplinaridade, analisar as instituições que compõem as classes. Os conceitos veblenianos proporcionam uma interpretação atual e necessária para a compreensão dos fenômenos brasileiros relatados no filme - enquanto reflexo parcimonioso do real - e observados nos conflitos intensificados após as eleições de 2014. A disputa está em todos os lugares e os conflitos causados pela mudança de pensamento proposta por Jéssica no filme é algo corriqueiro em uma sociedade que busca se transformar, ao mesmo tempo que insiste em manter os hábitos, os costumes e as tradições das classes ociosas veblenianas retratadas.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com base na pergunta norteadora e no objetivo proposto, analisou-se o filme Que Horas Ela Volta? em uma perspectiva historicista defendida por Kornis (1992), à luz das construções teóricas do ócio vicário (e conceitos precedentes) de Thorstein Veblen, em uma perspectiva interdisciplinar vebleniana apresentada por Silva (2008), a fim de compreender os fenômenos socioeconômicos da realidade brasileira contemporânea.
Dentro das contribuições que este estudo apresenta temos uma perspectiva ainda não adotada pra analisar o filme com base nas relações de trabalho no campo da administração, como os trabalhos de Ferraz, Moura-Paula, Biondini et al. (2017) e Scherdien, Bortolini e Oltramari (2018). Ferraz, Moura-Paula, Biondini et al. (2017) abordam a questão da ideologia e subjetividade do trabalho em uma perspectiva crítica marxista, colaborando nas questões submersas na sociedade diante do trabalho doméstico. Já Scherdien, Bortolini e Oltramari (2018) apresentam uma análise do microcosmos das relações hierárquicas entre classes e conflitos entre ricos e pobres, homens e mulheres e patrões e empregados. Em todos os conflitos pertinentes da sociedade brasileira. Entretanto, nenhum desses trabalhos apresenta uma visão do institucionalismo evolucionário, em busca de evidenciar os hábitos, os costumes e as crenças em disputa na sociedade. Como aponta Veblen (1989), o trabalho doméstico é a instituição do ócio vicário que está na origem das primeiras organizações sociais. Outro ponto relevante é a visão do ócio vicário como item de consumo conspícuo. O trabalho doméstico per se é desejado como signo de distinção social e prestígio, algo emulado até pelas classes baixas.
Em uma visão antropológica do consumo, o trabalho apresenta de modo tangenciado uma visão da sociedade brasileira diante do consumo conspícuo. A ascensão social realizada de modo majoritário pela democratização do consumo fortaleceu a busca das classes baixas de emular os hábitos e costumes da classe ociosa para gerar distinção e prestígio. O fenômeno contemporâneo da ostentação, presente em músicas, filmes e diversas produções culturais, reflete o consumo conspícuo (SALLES e CAMATTA, 2014).
O filme evidencia essas instituições da classe ociosa ainda presentes na realidade nacional. Tais aspectos produzem um desconforto social para quem assiste, seja no Brasil ou no exterior, conforme a reação relatada. O trabalho doméstico não está relacionado a consumir um serviço, mas consumir pessoas. Logo, é comum ouvir frases como “eu tenho empregada” da mesma forma que dizemos “eu tenho máquina de lavar”. Entretanto, com o papel da personagem Jéssica, esses hábitos entram em conflito com uma visão nova que tem aderência social, como se observa nos depoimentos sobre o filme.
A visão do institucionalismo econômico e de uma sociologia econômica de Veblen (1989) apresenta uma metodologia latente para os fenômenos sociais contemporâneos. Não é possível analisar diversos fenômenos sem compreender a lógica interdisciplinar histórica, política, econômica e social. Analisar o consumo ou as relações de trabalho sem observar seus preceitos antropológicos e históricos enfraquece a perspectiva das instituições sociais e despreza uma compreensão da mudança dos hábitos e costumes sociais no tempo, variável fundamental para as ciências sociais. As correntes do mainstream da administração já observam a necessidade de ampliar as possibilidades de análise diante dos fenômenos sociais para criar novas perspectivas, como o próprio Veblen (1989) fez. Além disso, é necessário compreender o papel de Jéssica, ou dessa nova geração que se posiciona diante de diversos paradigmas sociais.
De modo geral, pode-se dizer que os resultados do estudo foram bastante relevantes, pois demonstraram que os conceitos vebleniamos apresentam uma aderência à atual divisão de classes que poderia ser mais utilizada para compreender os fenômenos contemporâneos brasileiros. A questão do ócio vicário e do trabalho doméstico constitui tema de extrema relevância econômica e social e tem um debate social recente, como exposto na discussão sobre a regulação da atividade pelo Estado. Como ponto central do trabalho vebleniano, as transformações no status quo da forma de consumo permeiam o conceito de consumo conspícuo para a distinção de status e honra das classes econômicas e sociais brasileiras.
O filme, como produto histórico da uma sociedade que o produziu e o consome, não apresenta posicionamentos coesos na sociedade. Há quem o defenda e quem o critique. Entretanto, o debate levantado está harmonicamente alinhado com os debates vivenciados nas organizações políticas e sociais brasileiras. Portanto, o método historicista defendido por Kornis (1992) corrobora a interdisciplinaridade vebleniana para a interpretação social. O filme, mesmo de ficção, pode revelar diversas facetas estruturais e é capaz de interpretar e modificar posições sociais. Exemplos disso são as polêmicas surgidas em relação ao filme, como as declarações da representante de uma associação patronal de empregadoras domésticas, que argumentou sobre as inverdades no filme - na realidade, não haveria tantos conflitos como abordado -, ou o comportamento dos 2 diretores que, de modo sexista e desrespeitoso, tiveram destaque em uma entrevista da diretora do filme.
Em apresentações e entrevistas pelo país, Anna Muylaert obteve diversos retornos de pessoas que se identificaram com a realidade de Val e Jéssica. Isso levou a diretora a destacar publicamente a importância de políticas sociais desenvolvidas no país. O papel de Jéssica no reconhecimento das estruturas tradicionais de manutenção de classes (mesmo que não conscientemente) é algo a ser destacado na sociedade. Vivemos parte desses conflitos e, de certo modo, a construção teórica do ócio vicário ajuda a compreender e a evidenciar caminhos para pensarmos de modo sistemático, metodológico e científico o presente, com vistas a modificar o futuro - possibilidade que permeia as ciências sociais.
Limitações e novas possibilidades de pesquisa
A limitação da pesquisa está no fato de ser um estudo de caso e pela subjetividade das análises contidas em uma pesquisa qualitativa. Entretanto, abrem-se possibilidades de utilização dos conceitos veblenianos na interpretação de fatos de modo sistemático e em uma perspectiva qualitativa. Outra limitação da análise é a visão maniqueísta sobre meritocracia demonstrada no filme, onde o esforço individual é superestimado na relação de Fabinho e Jéssica no vestibular (SCHERDIEN, BORTOLINI e OLTRAMARI, 2018). Essa visão leva o debate sobre equidade sociais para um campo superficial.
Tanto a análise fílmica (FERRO, 1976; KORNIS, 1992; LE GOFF e NORA, 1976) como a perspectiva vebleniana são estratégias de estudo que possibilitam novos trabalhos. Como evidenciado, o cinema nacional está vivendo uma fase produtiva e questionadora. Diversas questões levantadas pelos filmes influenciam hábitos da administração que poderiam ser objetos de análise. Por exemplo, como é retratada a visão da gestão ou do administrador nos filmes nacionais e internacionais.
A metodologia vebleniana possibilita uma visão ampliada e profunda sobre fenômenos em análise, como as relações de poder dentro da sociedade, o consumo conspícuo, a manutenção das instituições da classe ociosa e até as relações de trabalho. Além disso, existem possibilidades no campo de gestão pública sobre políticas públicas que influenciaram os fenômenos relatados no filme Que Horas Ela Volta? e, também, de realização de estudos no campo dos hábitos e costumes dos conceitos veblenianos das classes sociais contemporâneas, sistematizados em uma perspectiva quantitativa, que pode evidenciar ainda mais a relevância dos conceitos veblenianos.
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
30 Maio 2019 -
Data do Fascículo
Apr-Jun 2019
Histórico
-
Recebido
10 Nov 2017 -
Aceito
17 Ago 2018