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Organização alternativa: da crítica da organização a organização da crítica

Organización alternativa: de la crítica de la organización a la organización de la crítica

Resumo

O termo “organização alternativa” (OA) tem sido, frequentemente, utilizado de forma assistemática, remetendo a concepções intuitivas e de senso comum. Ao mesmo tempo, autores que o utilizam aspiram incorporar a crítica como elemento distintivo de práticas organizativas. O presente ensaio objetiva problematizar a concepção de OA, buscando na literatura elementos que permitam conceber a crítica como componente das práticas de organizar. Para tanto, foi necessário situar o enfrentamento dos problemas da realidade social, sem cair em concepções dogmáticas ou relegar as OAs a uma posição de subordinação. No intuito de contribuir com a discussão, este ensaio apresenta uma compilação de perspectivas críticas encontradas na literatura que trata da OA, acrescida da abordagem relativamente recente da crítica imanente (CI), conforme concebida por Rahel Jaeggi (2018). Trata-se de uma perspectiva dialética não essencialista, que toma como ponto de partida as reivindicações e condições postas na realidade social, para responder aos problemas e às crises que se colocam em contexto. Portanto seu potencial transformador centra-se nas próprias práticas de organizar, procurando transformá-las. Essa perspectiva aponta para uma concepção de organização como mediadora na solução parcial de problemas decorrentes das contradições da realidade social.

Palavras-chave:
Organização alternativa; Crítica imanente; Tipo ideal; Prefiguração; Filosofia da diferença

Resumen

El término “Organización Alternativa” (OA) se ha utilizado a menudo de forma poco sistemática, remitiendo a concepciones intuitivas y de sentido común. Al mismo tiempo, los autores que lo utilizan aspiran a incorporar la crítica como elemento distintivo de las prácticas organizativas. Este ensayo pretende problematizar el concepto de OA, buscando en la literatura elementos que permitan concebir la crítica como un componente de las prácticas organizativas. Para ello, fue necesario situar la confrontación de los problemas de la realidad social, sin caer en concepciones dogmáticas o relegar la OA a una posición de subordinación. Con el fin de contribuir a la discusión, este ensayo presenta el conjunto de perspectivas críticas encontradas en la literatura que aborda la OA, añadiendo el enfoque relativamente reciente de la crítica inmanente, tal como la concibe Rahel Jaeggi (2018). Se trata de una perspectiva dialéctica no esencialista que toma como punto de partida las reivindicaciones y condiciones planteadas en la realidad social, respondiendo a los problemas y crisis que surgen en el contexto. A partir de ahí, el potencial transformador recae sobre las propias prácticas de organización, buscando transformarlas. Esta perspectiva apunta a un concepto de organización mediadora de soluciones parciales a los problemas que surgen de las contradicciones de la realidad social.

Palabras clave:
Organización alternativa; Crítica inmanente; Tipo ideal; Prefiguración; Filosofía de la diferencia

Abstract

The term “alternative organization” (AO) has often been used unsystematically, referring to intuitive and common-sense notions. At the same time, authors who use it strive to incorporate critique as a distinctive element of organizational practice. This essay aims to problematize the concept of open access by searching the literature for elements that allow critique to be conceived as a component of organizing practices. It was necessary to situate the confrontation with the problems of social reality without falling into dogmatic conceptions or relegating OA to a position of subordination. This essay contributes to the debate by presenting a set of critical perspectives found in the literature dealing with OA, adding the relatively recent approach of immanent criticism, as conceived by Rahel Jaeggi (2018). This is a non-essentialist, dialectical perspective that takes the claims and conditions posed in social reality as its starting point, responding to the problems and crises that arise in the context. From there, the transformative potential falls on the practices of organizing themselves and seeks to transform them. This perspective points to a concept of organization that mediates partial solutions to problems arising from the contradictions of social reality.

Keywords:
Alternative organization; Immanent critique; Ideal type; Prefiguration; Philosophy of difference

INTRODUÇÃO

As críticas às práticas de gestão e às formas de organização capitalista não são, de forma alguma, recentes. Os “pais fundadores” da Sociologia, notadamente Durkheim, Marx e Weber, à sua maneira, expuseram consequências negativas advindas da corporação capitalista moderna, apontando para sua desumanização, anomia e exploração. No Brasil, autores como Maurício Tragtenberg, Guerreiro Ramos e Prestes Motta foram pioneiros em denunciar o management como ideologia, o controle social e o poder disciplinador da burocracia, a assimilação acrítica de teorias e as políticas cognitivas1 1 Para uma síntese dessas contribuições, ver Paes de Paula (2008). . No contexto dos Critical Management Studies (CMS), diversos problemas da “organização” e da gestão são repetidamente citados para justificar a necessidade de abordagens dos efeitos negativos da gestão e pesquisa organizacional crítica (Alvesson et al., 2009Alvesson, M., Bridgman, T., & Willmott, H. (2009). The Oxford handbook of critical management studies. Oxford University Press.). Para produzir reflexões críticas na área do Management e Estudos Organizacionais (MOS), os pesquisadores tendem a recorrer aos autores autodeclarados críticos das áreas da Sociológica e da Filosofia, dirigindo essas reflexões aos contextos organizacionais e aos instrumentos de gestão. As diferentes formas de “crítica”, no entanto, dirigem-se a objetos distintos, assumem diferentes pressupostos, produzem múltiplas explicações dos fenômenos e indicam variadas formas de enfrentar os problemas.

Associamo-nos a Rahel Jaeggi (2018Jaeggi, R. (2018). Critique of forms of life. The Belknap Press of Harvard University Press.) em sua definição de crítica como aspecto subjetivo dos fracassos normativos (aspecto objetivo), que desperta a disposição contestatória a respeito da situação, dos agentes ou da própria norma. A crítica pode, por exemplo, enfatizar a contingência e a abertura do social, bem como analisar instituições e organizações “em movimento permanente”, sujeitas a “contínuas transformações, mudanças e rupturas” (Hartz, 2017Hartz, R. (2017). Von anderen organisationen: ein essay über perspektiven kritischer organisationsforschung. Managementforschung, 27(1), 167-191., p. 169). Ela se dirige a um estado de coisas articuladas socialmente, questionando a necessidade de serem como são. Quando entende os contextos sociais como intrinsecamente normativos, a crítica aparece vinculada à violação de normas, aplicando-se à formação ou ocorrência correspondente e indicando a possibilidade de responsabilização. Ao mesmo tempo, a recente história dos eventos de crise - 2008, Primavera Árabe, direitos das minorias, ascensão da extrema direita etc. - é também a história de expectativas frustradas, de falta de alternativas e de consequente desvalorização da crítica abrangente, voltada às formas da totalidade social.

No âmbito multidisciplinar do MOS, a organização alternativa (OA) tem se destacado como uma das vertentes críticas. A perspectiva “alternativa” tornou-se particularmente influente a partir da década de 1970, quando movimentos sociais assim qualificaram suas práticas como forma de contraposição ao establishment corporativo. Dentre estas estavam, organizações feministas (Freeman, 1972Freeman, J. (1972). The tyranny of structurelessness. Berkeley Journal of Sociology, 17(73), 151-164.), ecologistas, regionalistas e antiglobalização (Sicinski & Wemegah, 1983Sicinski, A., & Wemegah, M. (1983). Alternative Ways of Life in Contemporary Europe. The United Nations University.). Além disso, ocorreu o movimento de contracultura de “escolas livres” (Swidler, 1979Swidler, A. (1979). Organization without authority: dilemmas of social control in free schools. Harvard University Press.), clínicas médicas, comunas jurídicas, imprensa alternativa, moradias comunitárias (Case & Taylor, 1979Case, J., & Taylor, R. (1979). Co-ops, communes and collectives: experiments in social change in the 1960s and 1970s. Pantheon Books.), etc. Práticas “alternativas” foram utilizadas na tentativa de superar a alienação pessoal e social advindas das divisões sociais instauradas entre “atores e espectadores”, “pensadores e fazedores”, “produtores e clientes” (Sicinski & Wemegah, 1983); de transpor as restrições e bloqueios ao desenvolvimento da personalidade humana decorrentes da ordem burocrática (Case & Taylor, 1979); e de defender formas democráticas de organização econômica (Rothschild-Whitt, 1979Rothschild-Whitt, J.(1979). The collectivist organization: an alternative to rational-bureaucratic models. American Sociological Review, 44(4), 509-527.).

Atualmente, o adjetivo assume uso mais amplo e pulverizado. Organização alternativa é utilizada como sinônimo de uma variedade de termos, tais como: organização “não capitalista” (Parker et al., 2014Parker, M., Cheney, G., Fournier, V., & Land, C. (2014). The Routledge companion to alternative organization. Routledge.), “alimentação alternativa”, referindo-se a diferentes formas de produção e distribuição de alimentos (Michel, 2020Michel, S. (2020). Collaborative institutional work to generate alternative food systems. Organization, 27(2), 314-336.), “organização fora do eixo”, que aponta a “existência de uma multiplicidade de experiências sociais desperdiçadas pelo discurso dominante” (Barcellos et al., 2017Barcellos, R. de M, Dellagnelo, E. H. L., & Salles, H. K. de. (2017). Reposicionando conceitos: a organização fora dos eixos. Revista de Administração de Empresas, 57(1), 10-21.), “iniciativas solidárias” denotando fluxos de solidariedade socioespacial entre unidades autônomas de resistência (Daskalaki & Kokkinidis, 2017Daskalaki, M., & Kokkinidis, G. (2017). Organizing solidarity initiatives: a socio-spatial conceptualization of resistance. Organization Studies, 38(9), 1303-1325.), dentre outros. Tal popularidade não foi acompanhada de uma consolidação de fundamentos teóricos e epistemológicos. A imprecisão conceitual2 2 Problemas advindos de impressões conceituais é um tema recorrente na área de MOS. Ver Faria (2017). e a apreensão por meio de diferentes perspectivas teóricas são recorrentes, afinal, nem sempre é fácil decidir o que é “alternativo” (Parker et al., 2014Parker, M., Cheney, G., Fournier, V., & Land, C. (2014). The Routledge companion to alternative organization. Routledge., p. 34). Embora a indeterminação terminológica contribua para a disseminação de formas e arranjos organizacionais diversos, descompromissados com pressupostos onto-epistêmicos, a ausência de arcabouço teórico sistemático, voltado aos problemas da realidade, compromete e fragiliza o campo.

A fim de identificar conceitos e perspectivas teóricas associados ao termo na área de MOS, realizamos, em fevereiro de 2021 uma pesquisa bibliográfica sistemática3 3 Foram considerados apenas os estudos primários, ou seja, as investigações originais que trazem dados empíricos inéditos. Assim, foram excluídos as chamadas de trabalhos, book reviews, editoriais e artigos teóricos. em portais de periódicos da área. Por meio dela, empreendemos uma busca aos termos “organização alternativa”, “organizações alternativas”, “alternative organization”, “alternative organizations”. Foram contempladas as revistas Academy of Management, Organization, Organization Studies, Ephemera, Organização e Sociedade (O&S), Cadernos EBAPE.BR, Revista de Administração de Empresas (RAE), Revista de Administração Contemporânea (RAC), Revista de Administração Mackenzie (RAM) e Farol - Revista de Estudos Organizacionais e Sociedade. Foram identificados 195 resultados, 108 passaram pela triagem e 36 artigos foram considerados elegíveis.

O resultado significativo foi a identificação de uma dissociação entre a frequência do uso e a preocupação dos autores em definir o termo “conceitualmente” (Bourdieu et al., 2007Bourdieu, P., Chamboredon, J., & Passeron, J. (2007). Ofício de sociólogo: a construção da metodologia na pesquisa. Ed. Vozes.). Apenas 12 artigos apresentaram definições explicitas e com notáveis diferenças entre si: apesar de, 8 referenciarem The Routledge Companion to Alternative Organization (Parker et al., 2014Parker, M., Cheney, G., Fournier, V., & Land, C. (2014). The Routledge companion to alternative organization. Routledge.), cada artigo enfatizou um aspecto diferente, privilegiando a discussão sobre características distintivas, sem explicitar sua coerência em relação aos fundamentos da teoria que explica o fenômeno. Dentre a diversidade de referenciais teóricos, dos 36 artigos elegíveis, Martin Parker foi o autor mais citado (24), seguido de George Edward Cheney (20). Outros nomes também foram citados: Gibson-Graham (14), Joyce Rotschild-Whitt (9) e Marianne Maeckelbergh (8).

Para enfrentar a desarticulação da adjetivação “alternativa”4 4 Em vez de buscar constituir um arcabouço sistemático para o conceito de “organização alternativa”, alguns autores o utilizaram de forma idiossincrática ou criaram conceitos. Nossa posição é de que o adjetivo “alternativa” possui potência política em si mesmo, que pode ser observada em sua frequente mobilização por distintos movimentos sociais. Assim como a defesa de “falta de alternativa” é também evocada por aqueles que buscam perpetuar a ordem convencionada. O enriquecimento teórico do conceito de “organização alternativa” tem o potencial de auxiliar na sistematização da pesquisa acadêmica e promover a interlocução entre academia e as atividades de agentes sociais. , este ensaio realiza uma discussão sobre as formas de constituição da crítica, introduzindo uma nova abordagem com potencial de superar algumas das limitações identificadas. A análise da literatura mostra o fenômeno organizacional alternativo em três principais registros de crítica: tipo ideal, prefiguração, filosofia da diferença. Por fim, apresenta-se uma abordagem ainda estranha ao MOS, nomeada crítica imanente. A ideia é examinar cada uma das três perspectivas identificando suas ausências e limitações, com destaque à perspectiva da crítica imanente, que permitiria pensar a crítica à organização como uma possibilidade de organização da crítica.

ORGANIZAÇÃO ALTERNATIVA COMO TIPO IDEAL

A OA foi primeiramente abordada como tipo ideal no artigo “The Collectivist Organization: an alternative to rational-bureaucratic models”, de Joyce Rothschild-Whitt (1979Rothschild-Whitt, J.(1979). The collectivist organization: an alternative to rational-bureaucratic models. American Sociological Review, 44(4), 509-527.). Nos anos 1970, os EUA testemunharam uma proliferação de organizações que pretendiam satisfazer necessidades sociais sem recorrer à autoridade burocrática. Essas organizações buscariam se definir com base na vontade de seus membros de construir alternativas às instituições estabelecidas, oferecendo serviços com baixa necessidade de capital, como: clínicas médicas, escolas, coletivos jurídicos, de mídia e pesquisa, cooperativas de alimentos, livrarias, comunas, etc.

Motivada por uma percepção de escassez de pesquisas sociais nessa área, Rothschild-Whitt (1979Rothschild-Whitt, J.(1979). The collectivist organization: an alternative to rational-bureaucratic models. American Sociological Review, 44(4), 509-527.) identificou semelhanças estruturais em diferentes organizações coletivistas. Com isso, delineou um tipo ideal de democracia-coletivista, cuja lógica da racionalidade substantiva antagonizava a burocracia e se mostrava capaz de satisfazer aspirações “alternativas” de seus membros. Se a matriz weberiana tem a dominação como elemento incontornável, Rothschild-Whitt (1979) admite que a organização coletivista aspira estar livre de dominação, devido à autoridade coletivizada. As propriedades estruturais das organizações coletivistas democráticas opõem-se às burocráticas em oito dimensões: (1) autoridade; (2) regras; (3) controle social; (4) relações sociais; (5) recrutamento e progressão; (6) estrutura de incentivos; (7) estratificação social; (8) diferenciação. Algumas limitações afetariam a efetivação da democracia, implicando custos sociais à medida que “[...] o ideal democrático-coletivista fosse alcançado” (Rothschild-Whitt, 1979Rothschild-Whitt, J.(1979). The collectivist organization: an alternative to rational-bureaucratic models. American Sociological Review, 44(4), 509-527., p. 518), ao buscar evitar o viés normativo associado à sociedade burocrática circundante. Dentre os custos sociais, destacam-se: (1) tempo: visto que democracias demandam tempo para a sua implantação; (2) consenso: a necessidade de alcançá-lo pode levar à homogeneização do grupo; (3) intensidade emocional: as relações pessoais poderiam constituir ameaça; (4) indivíduos não democráticos; (5) diferenças individuais poderiam restringir a capacidade da organização de realizar seus ideais igualitários.

Rothschild-Whitt (1979Rothschild-Whitt, J.(1979). The collectivist organization: an alternative to rational-bureaucratic models. American Sociological Review, 44(4), 509-527.) explica que, ao contrastar democracia coletivista com burocracia racional, enfatiza as diferenças de forma categórica, ofuscando diferenças de graduação. Daí a proposição de um contínuo de formas organizacionais, que vai da democracia coletivista até a burocracia hierárquica, numa concepção ainda influente nos estudos de OA, referenciada em trabalhos como Barros e Michaud (2019Barros, M., & Michaud, V. (2019). Worlds, words, and spaces of resistance: democracy and social media in consumer co-ops. Organization, 27(4), 578-612.), Bretos e Errasti (2017Bretos, I., & Errasti, A. (2017). Challenges and opportunities for the regeneration of multinational worker cooperatives: lessons from the Mondragon Corporation - a case study of the Fagor Ederlan Group. Organization, 24(2), 154-173.), Fischer et al. (1993Fischer, T., Dantas, M., Silva, M. de F. L. E. & Mendes, V. L. (1993). Olodum: a arte e o negócio. Revista de Administração de Empresas, 33(2), 90-99.), Hensmans (2021Hensmans, M. (2021). How digital fantasy work induces organizational ideal reversal? Long-term conditioning and enactment of digital transformation fantasies at a large alternative bank. Organization, 28(1), 132-163.), Rodgers et al. (2016Rodgers, D., Petersen, J., & Sanderson, J. (2016). Commemorating alternative organizations and marginalized spaces: the case of forgotten Finntowns. Organization, 23(1), 90-113.) e Varman e Chakrabarti (2004Varman, R., & Chakrabarti, M. (2004). Contradictions of democracy in a workers’ cooperative. Organization Studies, 25(2), 183-208.).

Rothschild-Whitt (1979Rothschild-Whitt, J.(1979). The collectivist organization: an alternative to rational-bureaucratic models. American Sociological Review, 44(4), 509-527.) encontra na teoria weberiana um recurso normativo metacrítico capaz de mostrar que novas organizações possuem “mecanismos sociais” diferentes que podem representar uma solução ao problema da ordem da totalidade. As OAs constituiriam uma alternativa ao autoritarismo legitimado nas hierarquias burocráticas, ou uma ordem social sem dominação. No entanto, evidencia-se uma contradição na construção de um modelo de organização democrática por meio da subsunção da diferença e da alteridade à figura soberana “coletiva”. Nesse caso, sobretudo, observa-se a impropriedade metodológica de constituir um modelo com base na figura weberiana do tipo ideal, posto que o modelo produz “[...] uma cópia que faz pleonasmo com o real e que, ao ser obtida por simples procedimento de ajustamento e extrapolação, não leva de modo algum ao princípio da realidade que imita” (Bourdieu et al., 2007Bourdieu, P., Chamboredon, J., & Passeron, J. (2007). Ofício de sociólogo: a construção da metodologia na pesquisa. Ed. Vozes., p. 68). O tipo ideal seria uma “ficção coerente”, abstração que parte de realidades singulares tornando-se vazia de conteúdo, em favor de uma maior univocidade dos conceitos e suas relações (Weber, 2015Weber, M. (2015). Economia e sociedade(Vol. 1). UnB.). A forma “ideal” não se confunde com a projeção utópica, não constitui meta ou objetivo a ser alcançado, tampouco permite uma dedução da realidade. Por isso, convém não a tratar como um ‘em si mesmo’ ou amostra de um conjunto, mas como elemento privilegiado para a compreensão de um conjunto de transformações. O tipo ideal permite a elaboração de inferências ou “geração de hipóteses”, exatamente porque, como explicam Bourdieu et al. (2007Bourdieu, P., Chamboredon, J., & Passeron, J. (2007). Ofício de sociólogo: a construção da metodologia na pesquisa. Ed. Vozes., p. 66), ele “[...] se mede em relação à realidade e se define com precisão ao determinar precisamente a diferença que o separa do real”.

A construção de um tipo ideal poderia ajudar a compreender as transformações produzidas pelas iniciativas de certos grupos sociais, mas, jamais poderia indicar a existência real, nos termos de Rothschild-Whitt (1979Rothschild-Whitt, J.(1979). The collectivist organization: an alternative to rational-bureaucratic models. American Sociological Review, 44(4), 509-527.). Ao tomar a “organização coletivista” como uma “transformação” isolada de outras, em vez da criação de um tipo ideal expressando formalmente as implicações do desenvolvimento de relações sociais orientadas pela racionalidade substantiva, tem-se um modelo de organização democrática, redutor da democracia a procedimentos formais de tomada de decisão. Obliterado dos demais componentes da sociedade capitalista de mercado, cujas instituições reverberam a racionalidade instrumental, o modelo supõe organizações coletivistas e democráticas, capazes de suprimir relações de dominação simplesmente pela vontade dos sujeitos.

No Brasil, Maurício Serva (1997Serva, M. (1997). A racionalidade substantiva demonstrada na prática. Revista de Administração de Empresas, 37(2), 18-30.), empreendendo análise semelhante, esforça-se por caracterizar empiricamente manifestações da razão substantiva em organizações produtivas, a partir das teorias de Guerreiro Ramos e Jürgen Habermas, construindo um contínuo de intensidade da racionalidade substantiva. Serva (1997Serva, M. (1997). A racionalidade substantiva demonstrada na prática. Revista de Administração de Empresas, 37(2), 18-30., p. 25) explica que os “[...] polos extremos do continuum [...] denotariam [...] a existência improvável de uma organização totalmente regida pela razão substantiva ou pela razão instrumental”. A escala tem valor heurístico ou puramente referencial, “[...]permite ao leitor exercitar teoricamente hipóteses sobre no que resultaria uma progressão retilínea na direção de quaisquer das extremidades do continuum” (Serva, 1997Serva, M. (1997). A racionalidade substantiva demonstrada na prática. Revista de Administração de Empresas, 37(2), 18-30., p. 25). O quadro de análise de Serva (1997Serva, M. (1997). A racionalidade substantiva demonstrada na prática. Revista de Administração de Empresas, 37(2), 18-30.) vem sendo utilizado, no país, em diversos trabalhos sobre a racionalidade nas organizações (Serva et al., 2015Serva, M., Caitano, D., Santos, L., & Siqueira G.. (2015). A análise da racionalidade nas organizações - um balanço do desenvolvimento de um campo de estudos no Brasil. Cadernos EBAPE.BR, 13(3), 434-437.).

Em contraponto, Paes de Paula (2009Paes de Paula, A. P. (2009). Ser ou não ser, eis a questão: a crítica aprisionada na caverna de Platão. Cadernos EBAPE.BR, 7(3), 492-503., p. 501) enfatiza que Ramos “[...] afirmou corajosamente que não há emancipação possível para os homens nas organizações econômicas”. De fato, no paradigma paraeconômico (Ramos, 2022Ramos, A. G. (2022). A nova ciência das organizações: reconceituação da riqueza das nações. Enunciado Publicações., p. 173), “[...] ambientes isonômicos experimentais” conformam organizações da sociedade civil - tais como associações de estudantes, comunidades urbanas, associações artísticas e religiosas. Nele as “organizações produtivas” restringem-se à esfera instrumental da economia. O próprio Ramos (2022Ramos, A. G. (2022). A nova ciência das organizações: reconceituação da riqueza das nações. Enunciado Publicações.) alerta sobre os perigos da operacionalização de abordagens históricas macrossociais em pesquisa empírica microssocial. O autor denuncia a perda de sentido das categorias identificadas como fenômenos abrangentes, como a alienação e a razão, quando transformadas em quadros conceituais para a “validação empírica” no contexto de práticas restritas em uma organização.

ORGANIZAÇÃO ALTERNATIVA COMO PREFIGURAÇÃO

Utilizado inicialmente por Carl Boggs (1977), o termo prefiguração designa a incorporação de formas de relações sociais, tomada de decisão, cultura e experiência humanas, dentro da prática política em curso de um movimento social, como uma antecipação do objetivo final desse movimento. Alçou notoriedade com o trabalho de Winifred Breines (1989Breines, W. (1982). Community and organization in the new left, 1962-1968: the great refusal. Praeger.) sobre a Nova Esquerda, nos anos 1960, associado à constituição da “comunidade” dentro dos movimentos sociais, em permanente tensão com as formas instrumentais do poder autoritário. Recusando manobras parlamentares e manipulação burocrática, os experimentos igualitários e cooperativos constituiriam uma diferença política na busca por prefigurar, nas práticas efetivas, os valores que pretendem disseminar - liberdade, igualdade e comunidade. Recentemente, a política prefigurativa emerge como autodescrição entre pessoas engajadas nos movimentos alterglobalização e Occupy (Swain, 2019Swain, D. (2019). Not not but not yet: present and future in prefigurative politics. Political Studies, 67(1), 47-62.). Na área de MOS, a prefiguração é associada a OA por diversos pesquisadores (Bryer, 2019Bryer, A. (2019). Making organizations more inclusive: the work of belonging. Organization Studies, 41(5), 641-660.; Cheney, 2021Cheney, G. (2021). Alternative organization and alternative organizing. Critical Management. http://www.criticalmanagement.org/node/3182
http://www.criticalmanagement.org/node/3...
; Daskalaki & Kokkinidis, 2017Daskalaki, M., & Kokkinidis, G. (2017). Organizing solidarity initiatives: a socio-spatial conceptualization of resistance. Organization Studies, 38(9), 1303-1325.; Jaumier, 2016Jaumier, S. (2016). Preventing chiefs from being chiefs: an ethnography of a co-operative sheet-metal factory. Organization, 24(2), 218-239.; Kokkinidis, 2015Kokkinidis, G. (2015). Spaces of possibilities: workers’ self-management in Greece. Organization, 22(6), 847-871.; Land & King, 2014Land, C., & King, D. (2014). Organizing otherwise: Translating anarchism in a voluntary sector organization. Ephemera, 14(4), 923-950.; Reedy et al., 2016Reedy, P., King, D., & Coupland, C. (2016). Organizing for individuation: alternative organizing, politics and new identities. Organization Studies, 37(11), 1553-1573.; Reinecke, 2018Reinecke, J.(2018). Social movements and prefigurative organizing: confronting entrenched inequalities in occupy London. Organization Studies, 39(9), 1299-1321.; Zanoni et al., 2017Zanoni, P., Contu, A., Healy, S., & Mir, R. (2017). Post-capitalistic politics in the making: The imaginary and praxis of alternative economies. Organization, 5(24), 575-588.).

A tradição da “ação direta” enfatiza a importância da ação exemplar em demonstrar outras formas de ação, em oposição a uma única forma possível, como expresso na célebre frase de Thatcher (1980Thatcher, M. (1980, May 21). Speech to conservative women’s conference. https://www.margaretthatcher.org
https://www.margaretthatcher.org...
) durante seu discurso na conferência das mulheres conservadoras: “There is no Alternative” (TINA). Se políticas conservadoras reforçam a descrença em alternativas, deve-se combatê-las mostrando a efetividade prática de outros modos de agir, constituindo uma oposição entre política prefigurativa e estratégica: “[...] devemos lutar contra o poder ou ser a mudança?” (Polletta, 2002Polletta, F. (2002). Freedom is an endless meeting: democracy in American social movements. University of Chicago Press., p. 7). Essa bipolaridade entre “estratégia” e “prefiguração” resulta da tensão entre o compromisso bottom-up da democracia participativa e a necessidade de uma organização formal para implementar mudanças políticas. A saída tem sido defender a prefiguração como alternativa estratégica, contestando a insuficiência da ação direta. Organizações participativas descentralizadas de base local produzem benefícios ao estabelecer laços de solidariedade, criar métodos e estruturas organizacionais inovadoras e desenvolver habilidades políticas (Polletta, 2002). Nesse caso, os movimentos dos anos 1960 foram tanto prefigurativos quanto estratégicos.

Para Maeckelbergh (2011Maeckelbergh, M. (2011). Doing is believing: Prefiguration as strategic practice in the alterglobalization movement. Social Movement Studies, 10(1), 1-20.) “estratégia” é moldada por teorias comunistas e socialistas de mudança social, que postulam uma marcha linear em direção a um momento futuro, com caminhos e objetivos predeterminados. Já a prefiguração seria considerada cultural, desorganizada e sem nenhum objetivo além da promulgação de novas relações culturais, no aqui e agora, entre os atores do movimento. O autor defende uma perspectiva processual da estratégia, em favor de práticas graduais de mudança social. Isso ocorre à medida que atores sociais experimentam e sedimentam estruturas mais democráticas e inclusivas. Assim, a prefiguração seria estratégica na substituição de estruturas de governança, por seu papel mediador na criação de estruturas diversas (com múltiplos objetivos) e horizontais. Ela será mais estratégica quanto mais contemplar duas práticas cruciais: o confronto com as estruturas políticas existentes; e o desenvolvimento de alternativas. Nesta última, dada a necessidade de manter objetivos múltiplos, abertos e específicos ao contexto, a prefiguração pode ser considerada a única estratégia viável.

Para Swain (2019Swain, D. (2019). Not not but not yet: present and future in prefigurative politics. Political Studies, 67(1), 47-62.), a tensão fundamental está na forma de decretar o futuro no presente, ou seja, entre a prefiguração guiada pelos fins e a que elimina os fins. A primeira leva ao dilema prático entre “[...] tentar viver de acordo com um ideal que é impossível de alcançar nas sociedades como elas atualmente são, ou reconhecer que este ideal é apenas um objetivo, e trabalhar para alcançá-lo” (Swain, 2019Swain, D. (2019). Not not but not yet: present and future in prefigurative politics. Political Studies, 67(1), 47-62., p. 53). Ao tomar o futuro como já alcançado, os movimentos arriscam derivar do objetivo de transformação social - que realmente os tornam políticos e não apenas um estilo de vida alternativo - ou viver seus “ideais” em bolhas de isolamento. Ao assumir seus ideais como objetivos, os grupos arriscam promover uma lógica estratégica consequencialista, subordinando toda a mediação prática aos objetivos. No entanto, a ação presente deveria igualmente “[...] cumprir e criar os padrões de uma sociedade futura que é radicalmente diferente dela, e esse equilíbrio delicado parece propenso ao colapso” (Swain, 2019Swain, D. (2019). Not not but not yet: present and future in prefigurative politics. Political Studies, 67(1), 47-62., p. 54).

A prefiguração, ao “eliminar os fins”, agência a relação com o devir visando “desmoronar o futuro no presente” (Swain, 2019Swain, D. (2019). Not not but not yet: present and future in prefigurative politics. Political Studies, 67(1), 47-62., p. 55). A experimentação é forma privilegiada de resistir a objetivos políticos determinados, porque os fins são potencialmente rearticuláveis, emergem da prática, são provisórios, específicos do contexto e potencialmente sujeitos a revisão e exame crítico no processo de sua promulgação.

Se as tentativas de incorporar práticas futuras desempenham um papel formativo ou educacional (Swain, 2019Swain, D. (2019). Not not but not yet: present and future in prefigurative politics. Political Studies, 67(1), 47-62.), práticas prefigurativas definir-se-iam por seu caráter pedagógico, pois preparam e aceleram a implantação de alternativas. Assim, é possível representar novos fins com a identificação e elaboração de maneiras específicas de aprimoramento por meio dos processos de atuação prática, cujas tentativas proporcionam alternativas antes impensáveis. No entanto, permanece uma diferença entre a tentativa de promulgação e sua realização bem-sucedida. Embora seja possível uma reflexão retrospectiva para identificar a contribuição dos estágios anteriores sob a perspectiva dos estágios posteriores, não seria possível antecipar todo o processo (Swain, 2019Swain, D. (2019). Not not but not yet: present and future in prefigurative politics. Political Studies, 67(1), 47-62.).

Ainda que a incorporação de uma noção de formação, ancorada em uma teoria da aprendizagem, pudesse representar um recurso capaz de responder às acusações de falta de resultado da tradição da “ação direta”, é preciso salientar que esse desenvolvimento é considerado apenas do ponto de vista local. Os praticantes e teóricos rejeitam a possibilidade de articular considerações estruturais, dirigidas a alguma forma de totalidade, seus problemas são sempre compreendidos de maneira contingente e seus critérios avaliativos ficam restritos às perspectivas locais de pequena escala. A pequena escala é, principalmente, qualitativa, na medida em que abdica da compreensão das dinâmicas de forças situadas em outra escala, isto é, sob a forma de totalidade.

A política prefigurativa teria o mérito de tentar resolver problemas com experimentações práticas, sem criar modelos. No entanto, revela sua insuficiência como programa político e teórico. Fraser e Jaeggi (2020Fraser, N., & Jaeggi, R. (2020). Capitalismo em debate: uma conversa na teoria crítica. Boitempo.) alertam que a mudança por meio de uma política “prefigurativa” localizada tende a se tornar uma prática “pequeno-burguesa”, por menos hierárquica que seja, pois, cada coletivo continuará a ser uma empresa competindo com outras no mercado. No final, coletivos acabam substituindo indivíduos e empresas no que, de outra forma, é ainda o sistema de mercado - a menos que alguma estrutura abrangente adicional possa ser instituída para regular as relações entre os atores.

ORGANIZAÇÃO ALTERNATIVA E A FILOSOFIA DA DIFERENÇA

A proposta pós-capitalista de Gibson-Graham (2006Gibson-Graham, J. K. (2006). Postcapitalist Politics. University of Minnesota Press.) considera como principais déficits e desafios da política econômica a necessidade de produção de uma nova linguagem para ampliar o campo das possibilidades econômicas, o autocultivo de sujeitos que podem desejar e realizar outras formas de economia, e a busca colaborativa de experimentação econômica. Advogam a “feitura” de um novo imaginário político econômico, que pressupõe certas formas de ser, atuações de poder, modos de agregação, conexão e caminhos de mudança, com a utilização da ressignificação ontológica como uma técnica de pensamento voltada a uma política de possibilidade. Essa abordagem, denominada ler para a diferença, é utilizada como ponto de partida para trazer visibilidade à variedade de práticas não capitalistas, que definham à margem da representação econômica. Deleuze e Guattari são particularmente importantes para o desenvolvimento dessa abordagem (Gibson-Graham, 2006Gibson-Graham, J. K. (2006). Postcapitalist Politics. University of Minnesota Press.), porque instalam a diferença e a diferenciação como força centrípeta ontológica geradora, contrária à atração da essência ou identidade.

Assim como a política prefigurativa, a proposição de uma política pós-capitalista é muito influente entre os autores do campo das OAs, sendo referência importante para diversos autores (Bousalham & Vidaillet, 2018Bousalham, Y., & Vidaillet, B. (2018). Contradiction, circumvention and instrumentalization of noble values: how competition undermines the potential of alternatives. Organization, 25(3), 401-427.; Daskalaki & Kokkinidis, 2017Daskalaki, M., & Kokkinidis, G. (2017). Organizing solidarity initiatives: a socio-spatial conceptualization of resistance. Organization Studies, 38(9), 1303-1325.; Esper et al., 2017Esper, S., Cabantous, L., Barin-Cruz, L., & Gond, J. (2017). Supporting alternative organizations? Exploring scholars’ involvement in the performativity of worker-recuperated enterprises. Organization, 24(5), 671-699.; Farias, 2017Farias, C. (2017). Money is the root of all evil - or is it? Recreating culture through everyday neutralizing practices. Organization Studies, 38(6), 775-793.; Husted & Plesner, 2017Husted, E., & Plesner, U. (2017). Spaces of open-source politics: physical and digital conditions for political organization. Organization, 24(5), 648-670.; Land & King, 2014Land, C., & King, D. (2014). Organizing otherwise: Translating anarchism in a voluntary sector organization. Ephemera, 14(4), 923-950.; Pansera & Fressoli, 2021Pansera, M., & Fressoli, M.(2021). Innovation without growth: frameworks for understanding technological change in a post-growth era. Organization, 28(3), 380-404.; Paranque & Willmott, 2014Paranque, B., & Willmott, H. (2014). Cooperatives - saviours or gravediggers of capitalism? Critical performativity and the John Lewis Partnership. Organization, 21(5), 604-625.; Reedy et al., 2016Reedy, P., & Learmonth, M. (2009). Other possibilities? The contribution to management education of alternative organizations. Management Learning, 40(3), 241-258.; Willatt, 2018Willatt, A. (2018). Re-envisaging research on ‘alternatives’ through participatory inquiry: Co-generating knowledge on the social practice of care in a community kitchen. Ephemera, 18(4), 767-790.; Zanoni et al., 2017Zanoni, P., Contu, A., Healy, S., & Mir, R. (2017). Post-capitalistic politics in the making: The imaginary and praxis of alternative economies. Organization, 5(24), 575-588.). Essa perspectiva constitui a base do verbete ‘AO’ na obra The Routledge Companion to Alternative Organization (Parker et al., 2014Parker, M., Cheney, G., Fournier, V., & Land, C. (2014). The Routledge companion to alternative organization. Routledge.).

A releitura para a diferença oferece uma teoria fraca da economia, pouco melhor que uma descrição, ou simplesmente um conjunto de categorias e conceitos. Sua política de possibilidades busca criar novas positividades econômicas no terreno negativo do “sujeito” e do “lugar”, cujos engajamentos práticos compreendem três momentos distintos entrelaçados: uma política da linguagem, uma política do sujeito e uma política de ação coletiva (Gibson-Graham, 2006Gibson-Graham, J. K. (2006). Postcapitalist Politics. University of Minnesota Press., p. xxxii).

O pensamento pós-estruturalista introduz a indecidibilidade última do significado e do poder constitutivo do discurso como um meio para questionar ideias e práticas dominantes, proporcionando aberturas para formas alternativas e emergentes de prática e poder. Essa teorização tem a vantagem de não reduzir o que agrega em categorias, mas de se estender até os limites toleráveis pelas pesquisadoras com relação à dimensionalidade e ao detalhe. Para que essa reformulação ontológica não seja confundida com a afirmação simplista de que é possível considerar tais práticas externas à materialidade do capitalismo ou das práticas estatais repressivas, as autoras explicitam sua orientação como um reenquadramento que encoraja a negar a realidade fundamental, estrutural ou universal do estatuto ontológico das forças da ordem.

Em relação à política do sujeito, tratam de uma dimensão subjetiva de abertura inspirada na teoria foucaultiana5 5 Principalmente nos trabalhos: “A ética do cuidado de si como prática da liberdade” e “História da Sexualidade, Vol. 2 - O Uso dos Prazeres”. . Relatam potenciais estratégias de superação de hábitos de pensar que bloqueiam a possibilidade - como os prazeres da amizade, da confiança, do convívio afetuoso, incluindo-se aí também táticas de sedução, bajulação e alistamento -, para o que, é necessário o desenvolvimento de um interesse pela imprevisibilidade, contingência, experimentação, ou mesmo um apego aos limites da compreensão e às possibilidades de fuga (Gibson-Graham, 2006Gibson-Graham, J. K. (2006). Postcapitalist Politics. University of Minnesota Press.). Afirmam que experiências de cultivo e autocultivo, se praticadas com regularidade, podem traduzir desvios momentâneos de afeto negativo para positivo em um estado de ser mais permanente.

A política de ação coletiva envolveria esforços conscientes coordenados para construir um novo tipo de realidade econômica. Isso requer uma visão ampla do que é possível, uma análise cuidadosa do que pode ser utilizado para iniciar o processo de construção, a coragem de fazer uma avaliação realista do que pode atrapalhar o sucesso e a decisão de avançar, com uma mistura de desrespeito criativo e cautela protetora. As iniciativas empíricas selecionadas ilustram os argumentos para a não recusa de financiamento de governos, agências internacionais, fundações ou parceiros colaboradores, mesmo que não compartilhem os mesmos valores e objetivos. A cooptação não é uma condição decorrente da associação ao poder, mas uma ameaça que exige exercício vigilante de autoescrutínio e autocultivo de práticas éticas (Gibson-Graham, 2006Gibson-Graham, J. K. (2006). Postcapitalist Politics. University of Minnesota Press.).

Gibson-Graham (2006Gibson-Graham, J. K. (2006). Postcapitalist Politics. University of Minnesota Press.) desenvolvem uma nova linguagem de diversidade radical das relações econômicas e a conceituam em termos de três práticas. Na primeira, decompõem categoricamente as transações mercadológicas - mercados livres, natural e artificialmente protegidos, monopolizados, regulados e nichos -, os mercados alternativos - mercados informais, clandestinos, trocas entre e dentro de cooperativas, comércio “justo”, sistemas de comércio local, moedas alternativas - e as transações não mercadológicas - trocas domésticas, doações, auxílios pagos pelo Estado, caça e pesca, roubo. Na segunda, discriminam as formas de trabalho remunerado - trabalho assalariado formal, contratos com carga horária reduzida, serviços temporários, trabalho sazonal e trabalho familiar -, as formas alternativas de remuneração - trabalho por conta própria, trabalho cooperativo, trabalho no regime de permuta - e o trabalho não remunerado - trabalho doméstico, cuidados familiares, trabalho voluntário, trabalho escravo. Por fim, diferenciam empreendimentos capitalistas - empresa familiar, empresa privada, empresas de sociedade anônima e multinacionais -, empreendimentos capitalistas alternativos - empresa estatal, empresa comprometidas com causas ecológicas e responsabilidade social, organizações sem fins lucrativos, cooperativas - e empreendimentos não capitalistas - estabelecimentos agrícolas feudais, produtores independentes, autônomos e comunitários.

A abordagem da “leitura para a diferença” fundamenta a coexistência de uma multiplicidade de relações econômicas que, devido à sua abertura ao contexto e à contingência, não poderiam ser previamente determinadas. A disparidade de poder não pode ser assumida a priori, mesmo entre uma corporação multinacional e uma ONG, entre a caça e a pesca para subsistência e as transações mercadológicas, entre o trabalho remunerado e o trabalho por permuta. A teoria da economia fraca não pressupõe relações estruturadas, mas observa as maneiras pelas quais as relações são produzidas de forma diversa, com geografias, histórias e práticas éticas específicas (Gibson-Graham, 2006Gibson-Graham, J. K. (2006). Postcapitalist Politics. University of Minnesota Press.).

Ora, cabe questionar a “[...] necessidade de uma nova linguagem da economia para ampliar o campo da possibilidade econômica” (Gibson-Graham, 2006Gibson-Graham, J. K. (2006). Postcapitalist Politics. University of Minnesota Press., p. xxiii), uma vez que a diversidade econômica já é praticada e as condições (sociais, políticas, culturais, tecnológicas) para a experiência de uma economia diversa já estão presentes. Não é fácil entender a indispensabilidade do exercício de alargamento do imaginário se ele recai sobre formas de relações econômicas já praticadas. Ao conceber termos coexistentes e independentes, as autoras pensam um rol de categorias disponíveis à escolha: produção econômica (ex.: empresa privada) e reprodução social (ex.: cuidados domésticos); exploração (ex.: trabalho remunerado) e expropriação (ex.: trabalho não remunerado). Perde-se, assim, a interdependência entre os termos, seu enraizamento histórico e integração à ordem social vigente. Perde-se, enfim, o engate ao processo histórico promotor das novas emergências.

A filosofia da diferença é antidialética por excelência, pois, conforme Safatle (2019Safatle, V. (2019). Dar corpo ao impossível: o sentido da dialética a partir de Theodor Adorno. Autêntica Editora., p. 51), “[...] as formas da unidade e da identidade não são formas do pensamento, são formas reais contra as quais se batem nossos desejos, nossos corpos, nossas atividades, nossas falas, no sentido de formas fundamentais para os processos de produção da sociedade capitalista”. Assim, Gibson-Graham (2006Gibson-Graham, J. K. (2006). Postcapitalist Politics. University of Minnesota Press.) caem na armadilha de imaginar um pensamento capaz de dispensar a mediação da realidade, ao tematizar a diferença como instrumento para produzir a liberdade.

Ao sucumbir à tentação de buscar algo “fora do capitalismo”, Gibson-Graham (2006Gibson-Graham, J. K. (2006). Postcapitalist Politics. University of Minnesota Press.) obliteram interdependências que, historicamente, compõem a ordem capitalista. Nas palavras de Nancy Fraser:

De fato, quero resistir à imagem de dentro/fora da sociedade capitalista, e aqui está o motivo. Tudo o que eu disse até este momento implica que seria errado constituir a sociedade, a política e a natureza de forma romântica, como “fora” do capitalismo e inerentemente opostas a ele. Essa visão romântica é muito defendida hoje por um número razoável de ativistas e pensadores de esquerda, incluindo feministas culturais, ecologistas radicais e neoanarquistas, assim como por alguns defensores de uma economia “plural”, “pós-crescimento”, “solidária” e popular. Muitas vezes, essas correntes tratam “cuidado”, “natureza”, “ação direta” ou “compartilhamento” como intrinsecamente anticapitalistas. Como resultado, negligenciam o fato de que suas práticas favoritas são não só fontes de crítica, como também partes constitutivas da ordem capitalista (Fraser & Jaeggi, 2020Fraser, N., & Jaeggi, R. (2020). Capitalismo em debate: uma conversa na teoria crítica. Boitempo., p. 75).

Contudo, não se trata de negar que algo poderia estar fora da “gramática totalizante” do capitalismo, pois as sociedades capitalistas institucionalizam múltiplas orientações normativas e ontológicas. Para Fraser e Jaeggi (2020Fraser, N., & Jaeggi, R. (2020). Capitalismo em debate: uma conversa na teoria crítica. Boitempo.), zonas mercantilizadas do capitalismo dependem de zonas não mercantilizadas, bem como seria possível entender de que maneira essas diferentes lógicas se informam numa teia de relações econômicas e não econômicas. Desse modo, não seria razoável tomar elementos amplamente integrados como algo de “fora” e, ainda menos, ser este o fundamento da superação da ordem capitalista.

A CRÍTICA IMANENTE COMO ORGANIZAÇÃO DA CRÍTICA

A crítica imanente (CI) vincula-se a premissas metodológicas da teoria hegeliana, a qual, em sua crítica a Kant, opõe-se ao uso de categorias definidas a priori - dogmaticamente -, em favor do uso de formas institucionalizadas de conhecimento - práticas históricas - como ponto de partida (Stahl, 2013Stahl, T. (2013). What is Immanent Critique? SSRN Working Papers. http://ssrn.com/abstract=2357957
http://ssrn.com/abstract=2357957...
). Essa metodologia teria seguido, por meio de Marx, com a teoria crítica, a psicanálise (Jaeggi, 2018Jaeggi, R. (2018). Critique of forms of life. The Belknap Press of Harvard University Press.) e os pensadores da Escola de Frankfurt, notoriamente no trabalho de Theodor Adorno (Stahl, 2013Stahl, T. (2013). What is Immanent Critique? SSRN Working Papers. http://ssrn.com/abstract=2357957
http://ssrn.com/abstract=2357957...
). Contemporaneamente, essas premissas são defendidas por diversos autores autodeclarados críticos, como Axel Honneth (2001Honneth, A. (2001). Reconstructive social critique with a genealogical reservation. Graduate Faculty Philosophy Journal, 22(2), 3-12.), Nancy Fraser e Rahel Jaeggi (2020Fraser, N., & Jaeggi, R. (2020). Capitalismo em debate: uma conversa na teoria crítica. Boitempo.), Vladimir Safatle (2019Safatle, V. (2019). Dar corpo ao impossível: o sentido da dialética a partir de Theodor Adorno. Autêntica Editora.), entre outros. Embora não seja uma abordagem recente, referências à CI não são frequentes na área de MOS6 6 Uma busca na Organization Studies pelo termo “immanent critique”, em 01/07/2022, retornou apenas quatro resultados; apenas um dos artigos (Curtis, 2014) à crítica imanente aparecia como abordagem teórica/metodológica. Na publicação Organization, a busca retornou apenas oito resultados e também apenas um dos artigos (Hancock, 2022) à crítica imanente aparecia como abordagem teórica/metodológica. Na RAE, Organização & Sociedade e Farol, a pesquisa não encontrou nenhum resultado. (Curtis, 2014Curtis, R. (2014). Foucault beyond fairclough: from transcendental to immanent critique in organization studies. Organization Studies, 35(12), 1753-1772.; Hancock, 2022Hancock, P. (2022). Employee recognition programmes: an immanent critique. Organization, 31(2), 381-401.; Hartz, 2017Hartz, R. (2017). Von anderen organisationen: ein essay über perspektiven kritischer organisationsforschung. Managementforschung, 27(1), 167-191.). Apesar disso, Hartz (2017Hartz, R. (2017). Von anderen organisationen: ein essay über perspektiven kritischer organisationsforschung. Managementforschung, 27(1), 167-191.) entende que poderiam ser classificadas como CI algumas contribuições do neoinstitucionalismo, especialmente em relação à “desmitologização das organizações”, em questionamento a alegações de racionalidade e a pesquisa organizacional como crítica genealógica.

A perspectiva de CI aqui apresentada foi proposta por Rahel Jaeggi (2018Jaeggi, R. (2018). Critique of forms of life. The Belknap Press of Harvard University Press.), em Critique of forms of life. Trata-se de uma teoria crítica das formas de vida, concebida como alternativa às teorias que impõem normas de forma arbitrária, advindas de uma reflexão filosófica, bem como ao relativismo moral e às teorias que pactuam com a ideologia liberal e o pluralismo ético das sociedades modernas, atribuindo às instituições sociais um caráter neutro (como em John Rawls e Jürgen Habermas). Jaeggi (2018) desenvolve uma maneira de avaliar moralmente as constelações sociais e as mudanças que ocorrem com elas. Para tanto, enfrenta duas principais questões: (1) a definição de uma unidade de análise denominada “forma de vida”; (2) o estabelecimento de uma crítica que escape de uma concepção geral de forma correta de vida em abstrato, bem como da possibilidade de justificativa dos valores éticos, denominada CI. A discussão aqui proposta limita-se à proposição de CI, que foi desenvolvida pela autora.

A CI é geralmente concebida por contraposição à crítica externa. Nesta última os parâmetros exteriores são utilizados para confrontar uma situação, avaliando-a segundo reivindicações que transcendem os princípios inerentes à situação. A crítica, nesse caso, visa transformar, suplantar ou reorientar o que é dado, com base em normas que lhe são impostas de fora (Jaeggi, 2018Jaeggi, R. (2018). Critique of forms of life. The Belknap Press of Harvard University Press.). Esses padrões externos, por vezes considerados critérios universais, não estão necessariamente vinculados a uma circunstância sócio-histórica específica, mas a toda forma de coexistência humana concebível. Eles são evocados por associação a crenças, ideais e valores potencialmente desejáveis, independentemente de vínculo com estruturas institucionais e sociais existentes.

Jaeggi (2018Jaeggi, R. (2018). Critique of forms of life. The Belknap Press of Harvard University Press.) ressalta a divergência sobre a afirmação de que os padrões devem ser encontrados dentro do que é criticado, daí a distinção entre crítica interna e a CI. A crítica interna tende a confrontar ideais e normas pertencentes à autocompreensão das formas sociais legítimas, aceitas e defendidas com o que efetivamente é realizado dentro delas, de modo que a realidade de certas práticas e instituições é medida em relação a esses ideais. Identificam-se inconsistências entre afirmações e fatos, entre normas e práticas aceitas, entre aparência e realidade, o que destaca as justificações e reivindicações normativas e aponta para a contradição estabelecida entre estas e o que acontece na realidade. Esse tipo de crítica visa recuperar ou restabelecer normas que foram parcialmente superadas por práticas desviantes, e reativar o sentido de seus ideais, mesmo que isso implique mudanças drásticas (Jaeggi, 2018Jaeggi, R. (2018). Critique of forms of life. The Belknap Press of Harvard University Press.).

A crítica interna teria vantagens pragmáticas e sistemáticas nas atividades da crítica social. Quando a crítica é expressa em termos já aceitos pela parte sujeita à crítica, tende a ser facilmente compreendida. Além disso, os motivos para mudar uma situação - tentar adaptar à realidade aos ideais - tornam-se intrínsecos. Essa eficácia também motiva reflexões sobre a possibilidade de a crítica social abarcar a figura do “crítico engajado”, comprometido com a comunidade e, por seus vínculos com esta, ter como pressuposição tácita o melhor interesse dessa comunidade. Uma vantagem adicional seria não haver necessidade de justificar a validade dos critérios utilizados para a crítica, uma vez que ela não se vincula a um projeto utópico de uma ordem social desejável. As vantagens expõem também os limites da crítica interna, relacionados a dois aspectos principais. Primeiro, a contradição entre normas e práticas necessita de interpretação, pois a aplicabilidade de uma norma a uma dada situação não é autoevidente. As normas não se apresentam de forma explícita e direta, é preciso articulá-las e atualizá-las pela crítica. As margens de indeterminação que exigem a atividade hermenêutica abrem um campo de conflito e tornam implausível a ideia de que o engajamento mobilizaria recursos consensuais, pois a justificação não dispensa a disputa da interpretação correta. A segunda objeção dirige-se à limitação de escopo da normatividade convencionada localmente, pois, ao indicar contradições internas de uma ordem social existente, a crítica busca reestabelecer acordos, restaurando um estado anterior. A contrapartida desse convencionalismo normativo seria um conservadorismo estrutural.

Jaeggi (2018Jaeggi, R. (2018). Critique of forms of life. The Belknap Press of Harvard University Press.) propõe, então, uma concepção de CI orientada para a crise, assumindo que a posição significativa da crítica não existirá externamente ao que é criticado. A abordagem constitui uma normatividade mais forte em comparação com o relativismo convencionalista da crítica interna, sem recorrer a concepções dogmáticas. A CI seria mobilizada por crises que ameaçam a existência de certas práticas e ideais, visando, assim, à sua transformação, nunca ao seu reestabelecimento. O procedimento parte de contextos e padrões existentes, fundamentando-se em uma compreensão específica dos efeitos das normas nas práticas sociais. Essa abordagem localiza a normatividade destas práticas em suas condições de desempenho, pressupondo que os contextos dos quais derivam seus padrões são intrinsecamente contraditórios. Por isso, a insuficiência de padrões não seria apenas contingente, mas marcada por problemas sistemáticos. Nessa abordagem, a realidade não é confrontada, nem se extrai desta um ideal predefinido. O que se busca é desenvolvê-lo por meio dos movimentos contraditórios apresentados pela realidade, combinando (1) a ideia de que o padrão da crítica reside na própria coisa; e (2) a pretensão de fornecer uma crítica que transcenda o contexto.

A CI deve ser teoricamente informada em seu esforço teórico de tornar explícitas as normas inerentes à realidade (Jaeggi, 2018Jaeggi, R. (2018). Critique of forms of life. The Belknap Press of Harvard University Press.), tendo como referência a normatividade implícita das práticas sociais: as condições funcionais normativamente carregadas de uma prática. O que se intenta não é a não realização das normas na realidade, mas a contradição interna da realidade e suas normas constitutivas, desvelando as razões sistemáticas dessa discrepância. As contradições7 7 A “contradição” - que para a crítica interna é sinônimo de “inconsistência” - torna-se uma “contradição dialética” na qual os dois componentes contraditórios de uma conexão são ao mesmo tempo constitutivamente dependentes um do outro, de modo que o que parece estar desconectado mostra-se conectado (Jaeggi, 2018). internas da realidade são marcadas por impedimentos práticos e disfuncionalidades, daí a propensão à crise vinculada a instabilidades e deficiências das práticas e instituições. As contradições diagnosticadas não colocam apenas um problema de consistência, mas relacionam-se às distorções e crises práticas. Problemas e tendências de crise apontam para questões sistematicamente inerentes à própria constelação descrita, que, por sua vez, a interrogam.

A CI não somente avalia a realidade em relação à norma, mas também a norma em relação à realidade. Ela funciona tanto como uma crítica da prática que não está em conformidade com as normas, quanto uma crítica das próprias normas. O padrão de crítica é cambiável de acordo com o processo de crítica. A contradição não pode ser eliminada pelo ajuste da realidade à norma, mas apenas por meio de uma mudança que afete ambas, buscando transformar a situação, contraditória e dilacerada pela crise, em algo novo. Portanto, a superação da unilateralidade elimina os déficits revelados pela CI e leva a uma transformação em que ambos os lados - a realidade e seu conceito, o “objeto” e sua “métrica” - sofrem mudanças (Jaeggi, 2018Jaeggi, R. (2018). Critique of forms of life. The Belknap Press of Harvard University Press.).

Nessa dinâmica catalizadora de processos experienciais e de aprendizagem, a realidade criticada é compelida, pelas experiências de fracasso ou deficiência, a embarcar no processo de mudança. Assim, fracasso e superação do fracasso assumem a forma de um movimento de diferenciação, de enriquecimento e “progresso”. O desenvolvimento que transita de uma prática deficiente a uma nova - e uma nova autocompreensão - torna-se um processo experiencial progressivamente mais rico e diferenciado, precisamente porque não envolve a destruição unilateral e a superação de uma posição errada, mas alcança uma nova posição, pela experiência do fracasso. O desenvolvimento iniciado pela CI pode, portanto, ser entendido como uma espécie de processo de resolução de problemas cuja veracidade ou plausibilidade residem no fato de conter em si o processamento da inadequação da posição anterior.

A crítica interna tem fraco poder normativo por vincular sua validade à conformidade com normas particulares e contingentes de uma ordem social. Isso a torna incapaz de justificar por que elas deveriam ser aplicadas. A força normativa e crítica da crítica externa é derivada de um padrão externo a todas as formas particulares. Na CI, a reivindicação de verdade e validade apela ao potencial racional das normas incorporadas nas práticas sociais, ainda que sob forma negativa e propensa a crises (Jaeggi, 2018Jaeggi, R. (2018). Critique of forms of life. The Belknap Press of Harvard University Press.). O caráter racional das normas pode ser estabelecido em termos de superação bem-sucedida dos problemas, crises e contradições que residem nas condições a serem criticadas. A mudança social assume o caráter de resposta - mais ou menos bem-sucedida - a crises e problemas resultantes da erosão ou obsolescência das formações sociais existentes. Essa mudança seria pensada como resultantes de processos de transformação social impulsionados pelo conflito, cuja racionalidade seria entendida e julgada como uma história da resolução de problemas. Isso ocorre em meio à história desses processos, caracterizada por aprendizagem e bloqueio de aprendizagem. Uma síntese comparativa entre crítica interna e imanente encontra-se no Quadro 1.

Quadro 1
Estrutura da crítica imanente

A ideia de uma “história de processos de resolução de problemas” pode transmitir uma falsa impressão de que estaríamos diante de uma concepção de progresso linear, o que pressupõe mudanças incrementais. No entanto, Jaeggi (2018Jaeggi, R. (2018). Critique of forms of life. The Belknap Press of Harvard University Press.) propõe uma conexão instrutiva a ser estabelecida, retrospectivamente, entre dinâmicas de continuidade e descontinuidade. Quando uma tradição em crise é confrontada com uma nova, a constelação social pode adotar a nova tradição ou produzir uma terceira, surgida da confrontação das anteriores. Ela se apresenta com uma nova estrutura interpretativa e práticas concebíveis que viabilizam a integração de mais, ou novas, experiências. A nova tradição deve apontar uma solução e articular uma explicação para a crise em questão, por meio da construção de um vínculo entre conceitos prévios e novos - antes/depois, contínuo/descontínuo. A nova solução é pragmática, funcional - resolve um problema -, hermenêutica - estabelece um novo arcabouço interpretativo - e também moral - reivindica a autoridade de ser a melhor opção. O “progresso” factual na resolução de problemas ou na superação de crises não consiste somente em refutar uma falsa condição ou superar uma disfunção, ele é medido pelo fato de que esta última pode ser narrativamente “incorporada” em retrospecto.

A possibilidade de estabelecer um padrão crítico para avaliar uma solução bem-sucedida depende da capacidade de descrevê-lo como processo de aprendizagem racional, dado que a pretensão de validade da CI reside no caráter racional do processo de transformação do qual ela se serve. No entanto, a racionalidade de um processo de aprendizagem somente pode ser definida negativamente, ou seja, pela ausência de novos bloqueios à experiência, e retrospectivamente, considerando o progresso como a negação determinada do revés. A identificação de um movimento progressista, bem como a tentativa de definir critérios para o que constitui tal movimento, não significa que a história não apresentará retrocessos. O ponto decisivo é que tal análise fornece critérios para avaliar os retrocessos e não apenas tê-los como mudanças, ou produção de diferença desprovida de qualidades valorativas. Assim, o progresso não precisa ser definido em termos positivos ou de conteúdo. O progresso é assumido como a negação determinada do revés e o desenvolvimento prático de condições de vida autodeterminadas torna evidente a medida intrínseca da racionalidade das formas de vida e de sua crítica, ainda que essa medida se oriente com base na ocorrência de processos históricos de transformação (Jaeggi, 2018Jaeggi, R. (2018). Critique of forms of life. The Belknap Press of Harvard University Press.).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A crescente presença das OAs em congressos, chamadas de trabalhos e grupos de pesquisa na área do MOS não tem sido acompanhada pelo incremento de sua definição como categoria conceitual ou sistematização teórica - enquanto objeto de pesquisa. É frequentemente empregada como termo do senso comum e em correntes teóricas concorrentes. A indeterminação terminológica pode ser um dos fatores que têm garantido seu amplo uso, permitindo que pesquisadores abordem diferentes tendências e formas emergentes, sem compromisso com pressupostos dogmáticos. No entanto, esse caráter desperta ceticismo em relação às potencialidades do conceito. Assim, em virtude da ausência de um arcabouço teórico consistente, com propostas para enfrentar os problemas da realidade, ele é relegado à situação de baixa relevância. A condição de “alternativo”, desse modo, acaba sendo assumida como uma posição de subordinação.

Para enfrentar a falta de articulação das formas de adjetivação “alternativa”, este ensaio realizou uma discussão sobre as formas de constituição da crítica, além de apresentar uma abordagem relativamente recente, com potencial de superar algumas das limitações das teorias correntes. Mostramos que Rothschild-Whitt (1979Rothschild-Whitt, J.(1979). The collectivist organization: an alternative to rational-bureaucratic models. American Sociological Review, 44(4), 509-527.) propôs a construção de um tipo ideal de “organização coletivista” para compreender as transformações organizacionais na década de 1960. No entanto, ao tomar a “organização coletivista” como uma “transformação” isolada, cria-se um modelo em vez de um tipo ideal. Esse modelo de organização “democrática” suprimiria as singularidades em favor da soberania do coletivo, supondo que, no seio de uma sociedade capitalista, seria possível constituir organizações pela vontade dos sujeitos, nas quais estariam ausentes relações de dominação.

A política prefigurativa, segunda abordagem analisada, teria o mérito de buscar, em vez de modelos, soluções para problemas organizacionais com experimentações práticas. Esse programa político e teórico parece insuficiente porque desconsidera a dinâmica de forças macrossociais; nele os problemas assumem caráter contingente e os critérios avaliativos resultam restritos a localidades específicas. Ainda que negando a hierarquia interna, cada coletivo permaneceria como agente competindo no mercado, substituindo indivíduos e empresas, como atores de um mesmo sistema de mercado.

Para contornar a limitação de não considerar as estruturas macrossociais, Gibson-Graham (2006Gibson-Graham, J. K. (2006). Postcapitalist Politics. University of Minnesota Press.) afirmam que não negam as forças que militam contra as formas de relações econômicas que caracterizam como não capitalistas. Buscam, no entanto, um modo de reenquadramento ontológico para evitar que essas forças assumam uma realidade fundamental, estrutural ou universal. Assim, as autoras elaboram uma “teoria fraca”, criando uma multiplicidade de relações econômicas, de modo que a interação entre as categorias não possa ser prevista, pois está sujeita ao contexto e à contingência. No entanto, ao recorrer a uma abordagem antidialética, em vez de criar um novo “imaginário”, acabam cometendo “um atentado à produtividade da liberdade efetiva” (Safatle, 2019Safatle, V. (2019). Dar corpo ao impossível: o sentido da dialética a partir de Theodor Adorno. Autêntica Editora., p. 51), porque decidem tematizar a diferença, antecipando a forma da liberdade inexistente na situação atual. Ao enfatizar contingências na atualização das normas, as autoras negam a sistematicidade da relação de forças. Acabam por romantizar, assim, elementos historicamente integrados à produção da ordem social, que são tratados como algo “externo” e, por essa razão, fundamento para a superação dessa mesma ordem.

Em vista de um possível avanço na organização da crítica, este ensaio introduziu o método de CI, proposto por Rahel Jaggi (2018Jaeggi, R. (2018). Critique of forms of life. The Belknap Press of Harvard University Press.), como inspiração de um arcabouço conceitual destinado a processos organizacionais alternativos, que promovam a crítica como elemento constitutivo das próprias práticas de organizar. A abordagem consiste em uma perspectiva dialética não essencialista8 8 Ou seja, em que os termos não se cristalizam em torno de identidades particulares (Jaeggi, 2018). , que leva em conta os fundamentos de indeterminação dos termos. Essa perspectiva sugere uma concepção de organização centrada no experimento crítico, em busca permanente por soluções parciais para os problemas que emergem das contradições da realidade social.

Entendemos que a perspectiva crítica implica efetivar uma concepção de organização orientada para a transformação social e capaz de indicar caminhos para as soluções dos problemas originados das contradições da realidade. Isso depende de um arcabouço teórico que articule as diferentes iniciativas, não como elementos isolados, mas como uma constelação de atividades que articulam suas diferenças em torno de pontos comuns. Evidentemente, o desenvolvimento teórico-metodológico da abordagem da CI precisa avançar a fim de fornecer um roteiro de estudo e análise para os esforços de criação de formas organizacionais. A senda nessa direção contemplaria o enriquecimento da concepção de CI pela interlocução com outros autores dessa linha, a articulação entre diferentes contradições sociais e as iniciativas que visam abordá-las, além das consequências decorrentes desse enfrentamento, e ainda o aprofundamento do debate sobre a viabilidade dessa nova referência epistemológica na área do MOS.

AGRADECIMENTOS

O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001.

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  • 1
    Para uma síntese dessas contribuições, ver Paes de Paula (2008Paes de Paula, A. P. (2008). Teoria crítica nas organizações. Thomson.).
  • 2
    Problemas advindos de impressões conceituais é um tema recorrente na área de MOS. Ver Faria (2017Faria, J. H. de. (2017). Autogestão, economia solidária e organização coletivista de produção associada: em direção ao rigor conceitual. Cadernos EBAPE.BR, 15(3), 629-650.).
  • 3
    Foram considerados apenas os estudos primários, ou seja, as investigações originais que trazem dados empíricos inéditos. Assim, foram excluídos as chamadas de trabalhos, book reviews, editoriais e artigos teóricos.
  • 4
    Em vez de buscar constituir um arcabouço sistemático para o conceito de “organização alternativa”, alguns autores o utilizaram de forma idiossincrática ou criaram conceitos. Nossa posição é de que o adjetivo “alternativa” possui potência política em si mesmo, que pode ser observada em sua frequente mobilização por distintos movimentos sociais. Assim como a defesa de “falta de alternativa” é também evocada por aqueles que buscam perpetuar a ordem convencionada. O enriquecimento teórico do conceito de “organização alternativa” tem o potencial de auxiliar na sistematização da pesquisa acadêmica e promover a interlocução entre academia e as atividades de agentes sociais.
  • 5
    Principalmente nos trabalhos: “A ética do cuidado de si como prática da liberdade” e “História da Sexualidade, Vol. 2 - O Uso dos Prazeres”.
  • 6
    Uma busca na Organization Studies pelo termo “immanent critique”, em 01/07/2022, retornou apenas quatro resultados; apenas um dos artigos (Curtis, 2014) à crítica imanente aparecia como abordagem teórica/metodológica. Na publicação Organization, a busca retornou apenas oito resultados e também apenas um dos artigos (Hancock, 2022) à crítica imanente aparecia como abordagem teórica/metodológica. Na RAE, Organização & Sociedade e Farol, a pesquisa não encontrou nenhum resultado.
  • 7
    A “contradição” - que para a crítica interna é sinônimo de “inconsistência” - torna-se uma “contradição dialética” na qual os dois componentes contraditórios de uma conexão são ao mesmo tempo constitutivamente dependentes um do outro, de modo que o que parece estar desconectado mostra-se conectado (Jaeggi, 2018).
  • 8
    Ou seja, em que os termos não se cristalizam em torno de identidades particulares (Jaeggi, 2018).
  • DISPONIBILIDADE DE DADOS

    Todo o conjunto de dados que dá suporte aos resultados deste estudo foi publicado no próprio artigo.
  • 12
    Elisângela de Jesus Furtado da Silva (Fundação Dom Cabral, Nova Lima / MG - Brasil). ORCID: https://orcid.org/0000-0002-0730-5160
  • 13
    Fabio Vizeu (Universidade Positivo, Curitiba / PR - Brasil). ORCID: https://orcid.org/0000-0003-2261-3142
  • 14
    Elisa Zwick (Universidade Federal de Alfenas, Alfenas / MG - Brasil). ORCID: https://orcid.org/0000-0002-2963-7721
  • RELATÓRIO DE REVISÃO POR PARES

    O relatório de revisão por pares está disponível neste link: https://periodicos.fgv.br/cadernosebape/article/view/91503/85939

Editado por

Hélio Arthur Reis Irigaray (Fundação Getulio Vargas, Rio de Janeiro / RJ - Brasil). ORCID: https://orcid.org/0000-0001-9580-7859
Fabricio Stocker (Fundação Getulio Vargas, Rio de Janeiro / RJ - Brasil). ORCID: https://orcid.org/0000-0001-6340-9127

Disponibilidade de dados

Todo o conjunto de dados que dá suporte aos resultados deste estudo foi publicado no próprio artigo.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    19 Ago 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    30 Dez 2022
  • Aceito
    24 Ago 2023
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