A EXPERIÊNCIA DE PACIENTES COM CÂNCER DE CABEÇA E PESCOÇO QUANTO AO AUTOCUIDADO COM A RADIODERMITE^*

RESUMO

Objetivo:

Analisar a experiência de pacientes com câncer de cabeça e pescoço quanto ao autocuidado com a radiodermite associado aos fatores sociodemográficos e clínico-patológicos.

Método:

Estudo descritivo com abordagem qualitativa, desenvolvido em um Centro de Referência de Alta Complexidade em Oncologia em Belém - Pará - Brasil. Realizado com entrevistas e análise de prontuário. Os dados foram coletados de fevereiro a abril de 2022, e tratados por análise de conteúdo de Bardin subsidiada pelo software IRAMUTEQ.

Resultados:

Emergiram três subcategorias: importância do conhecimento do paciente quanto a radioterapia; identificação dos efeitos adversos relacionados ao tratamento; e, orientação do enfermeiro quanto ao autocuidado.

Considerações Finais:

O conhecimento dos pacientes foi incipiente sobre o tratamento, efeitos adversos foram identificados pelo impacto negativo em sua autoestima e autoimagem e a orientação do autocuidado foi efetiva com a reprodução do cuidado. O estudo oportuniza a elaboração de estratégia de ensino adequada em pesquisas futuras.

DESCRITORES:
Neoplasias, Neoplasias de cabeça e pescoço; Autocuidado; Radiodermite; Enfermagem

ABSTRACT

Objective:

To analyze the experience of patients with head and neck cancer regarding self-care for radiodermatitis associated with sociodemographic and clinical-pathological factors.

Method:

A descriptive study with a qualitative approach, carried out at a High Complexity Oncology Reference Center in Belém - Pará - Brazil. It was conducted through interviews and analysis of medical records. The data were collected from February to April 2022 and processed using Bardin’s content analysis supported by the IRAMUTEQ software.

Results:

Three subcategories emerged: The importance of the patient’s knowledge about radiotherapy; Identification of adverse effects related to the treatment; and Nurses’ guidance on self-care.

Final Considerations:

The patients’ knowledge about the treatment was incipient, adverse effects were identified by the negative impact on their self-esteem and self-image, and self-care guidance was effective in reproducing care. The study provides an opportunity to develop an appropriate teaching strategy in future research.

DESCRIPTORS:
Neoplasms, Head and neck neoplasms; Self-care; Radiodermatitis; Nursing

RESUMEN

Objetivo:

Analizar la experiencia de pacientes con cáncer de cabeza y cuello sobre el autocuidado de la radiodermatitis asociado a factores sociodemográficos y clínico-patológicos.

Método:

Estudio descriptivo con enfoque cualitativo, desarrollado en un Centro de Referencia de Alta Complejidad en Oncología en Belém, Pará, Brasil. Realizado por medio de entrevistas y análisis de historias clínicas. Los datos se recopilaron de febrero a abril de 2022 y se procesaron mediante análisis de contenido de Bardin con ayuda del software IRAMUTEQ.

Resultados:

Surgieron tres subcategorías: importancia del conocimiento del paciente sobre radioterapia; identificación de los efectos adversos relacionados con el tratamiento; y orientación del enfermero sobre el autocuidado.

Consideraciones finales:

El conocimiento de los pacientes sobre el tratamiento era incipiente, ellos identificaron los efectos adversos debido al impacto negativo en su autoestima y autoimagen y la orientación de autocuidado fue efectiva dado que lograron reproducir el cuidado. El estudio contribuye a que se desarrollen estrategias de enseñanza adecuada en futuras investigaciones.

DESCRIPTORES:
Neoplasias, Neoplasias de cabeza y cuello; Autocuidado; Radiodermatitis; Enfermería

HIGHLIGHTS

Déficit de conhecimento sobre o autocuidado com radiodermatite.

A orientação do enfermeiro quanto ao autocuidado é fundamental.

Efeitos adversos impactam na autoestima e autoimagem dos pacientes.

INTRODUÇÃO

O Câncer de Cabeça e Pescoço (CCP) é o sexto que mais acomete as pessoas no mundo e apresenta como tipo histológico mais comum o carcinoma epidermóide, que corresponde a 90% dos casos. Esses tumores comprometem a cavidade oral, orofaringe, hipofaringe e a laringe, tendo como fatores de risco a exposição a carcinógenos químicos oriundos do tabaco, álcool e/ou vírus - como o Papilomavírus Humano (HPV), que está associado principalmente a tumores de orofaringe¹.

O tratamento do CCP está fundamentado em erradicar a doença, porém são comuns os casos de diagnósticos em fases avançadas, o que dificulta o alcance da cura. O plano terapêutico para esses pacientes deve ser fundamentado nos dados clínicos e classificação do tumor, sendo realizado por meio de cirurgia, quimioterapia e radioterapia, associados ou não².

A radioterapia (RT) baseia-se na utilização de radiação ionizante que danifica o material genético das células neoplásicas, afetando assim a capacidade de multiplicação e levando à apoptose³. Esta dispõe de planejamento e entrega individualizadas, sendo um evento determinístico (efeito dose-dependente), ou seja, possui uma relação entre a dose acumulada e a dimensão do dano esperado⁴.

A RT altera as etapas de maturação, proliferação e renovação celular, e provoca uma cascata inflamatória culminando em dano tecidual e uma reação na pele denominada radiodermatite. Este evento adverso ocasiona um impacto negativo na qualidade de vida do paciente no que diz respeito ao aspecto da pele, dor e desconforto, sendo que, em casos graves, há necessidade de interrupção do tratamento⁵.

A radiodermatite é classificada de acordo com os critérios do Radiation Therapy Oncology Group (RTOG) que desenvolveu o Acute Radiation Morbidity Scoring Criterial em graus: 0: sem alterações; I: ocorrência de hiperemia leve, epilação, descamação e sudorese diminuída; II: eritema doloroso, descamação úmida localizada e edema moderado; III: descamação úmida confluente e edema importante; e IV: hemorragia, ulceração e necrose⁶.

O paciente com CCP em tratamento radioterápico, necessita de aprendizado quanto ao autocuidado com a radiodermite^7,8. Sendo pertinente a Teoria do Autocuidado de Orem que se interliga a teoria do déficit do autocuidado e a dos sistemas de Enfermagem. A ideia principal é que a participação do paciente é importante para o seu cuidado e a Enfermagem deve auxiliar neste processo⁹_.

Assim sendo, o objetivo deste estudo é analisar a experiência de pacientes com câncer de cabeça e pescoço quanto ao autocuidado com a radiodermite, associado aos fatores sociodemográficos e clínico-patológicos.

MÉTODO

Trata-se de um estudo descritivo com abordagem qualitativa, desenvolvido em um Centro de Referência de Alta Complexidade em Oncologia (CACON) localizado em Belém- Pará - Brasil, no período de fevereiro a abril de 2022, especificamente no serviço de Radioterapia, onde funcionam três aceleradores lineares e atende, em média, 180 paciente/mês.

Para seleção dos participantes foram utilizados os seguintes critérios de inclusão: pacientes com diagnóstico de câncer de cabeça e pescoço em tratamento radioterápico, maiores de 18 anos, independente do sexo, fração do tratamento e, concomitância ou não com a quimioterapia. Foram excluídos os pacientes com declínio cognitivo incapacitante quanto a comunicação verbal, bem como os diagnosticados com metástase para a região da cabeça e pescoço por realizarem um número de frações de tratamento menor do que o padronizado.

A coleta de dados ocorreu de fevereiro a abril de 2022 em três etapas, a saber: na 1ª etapa foi realizado um levantamento do número de pacientes com CCP em tratamento no serviço de Radioterapia, bem como o horário em que compareciam para realizar as sessões. Posteriormente, foi realizado o convite aos participantes, sempre após a sessão de tratamento, de forma individualizada e com possibilidade de agendamento.

Na 2ª etapa após a explicação e assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) e do termo de autorização da gravação de voz, foram realizadas as entrevistas com os pacientes, em sala reservada, na presença do acompanhante/familiar, utilizando-se um roteiro semi-estruturado, de elaboração própria, com perguntas relacionadas ao perfil sociodemográfico do paciente, bem como o conhecimento do tratamento, efeitos adversos e cuidados com a região tratada. Foram utilizados códigos alfanuméricos para identificação dos participantes: CCP (P1, P2, P3), em que CCP significa câncer de cabeça e pescoço e P significa paciente.

Na 3ª etapa foram consultados os prontuários dos pacientes e, após, realizou-se a dupla checagem, consultando as fichas técnicas, com uso de instrumento próprio, foram obtidas informações sobre biópsia, cirurgia, diagnóstico, estadiamento do tumor, realização de quimioterapia concomitante, assim como o número de frações planejadas, dose diária, dose total, campo de tratamento e acessórios utilizados para otimizar a entrega de dose, para isso foi obedecida a normatização do Termo de Compromisso para Utilização de Dados e Prontuários (TCDU).

Os dados obtidos na 2° etapa foram transcritos e analisados, utilizando-se o método de análise de conteúdo, fundamentado em Bardin (2011), constituído por três etapas: pré-análise e exploração do material, tratamento dos dados e inferência e interpretação^10.

O software IRAMUTEQ (Interface de R pourles Analyses Multidimensionnalles de Textes et de Questionnaires) versão 0,7 alpha 2 para Windows, foi utilizado na segunda etapa de análise de dados; este software utiliza funções do software R e possibilita diversas formas de análises estatísticas de texto¹¹.

A utilização desse software oportunizou a análise lexicográfica por meio da Classificação Hierárquica Descendente e análise de similitude, pois as duas formas de codificação organizam o corpus e os segmentos de texto, desenvolvendo uma análise gráfica a partir da frequência das palavras de maior expressividade¹².

Considerou-se relevantes as palavras com frequência igual ou maior que a frequência média registrada (três). As classes de palavras foram representadas pelas palavras mais significativas, com uso do teste de Qui-quadrado (p valor < 0,001). Os dados sociodemográficos e clínico-patológicos, obtidos na 3ª etapa, foram estruturados em planilhas, utilizando o Microsoft Excel 2019 para análise descritiva expressa em frequência e porcentagens.

Esta pesquisa foi aprovada pelos Comitês de Ética em Pesquisa com Seres Humanos, da Universidade do Estado do Pará e do Hospital de Referência em Oncologia do Estado do Pará nº 5.150.428.

RESULTADOS

De 24 pacientes elegíveis, dois foram excluídos devido à debilidade do estado geral que impossibilitava a comunicação oral. Desta forma a amostra foi composta por 22 participantes. A contextualização clínica e socioeconômica destes são apresentadas na Tabela 1.

Tabela 1
Características clínicas e sociodemográfica dos pacientes com câncer de cabeça e pescoço em tratamento de radioterapia. Belém-PA, Brasil, 2022

Características	n	(%)
Sexo
Masculino	18	82
Feminino	4	18
Faixa etária
20 - 40 anos	5	23
41 - 61 anos	11	50
62 - 82 anos	6	27
Raça
Negra	3	14
Parda	15	68
Branca	4	18
Religião
Católica	14	64
Evangélica	6	27
Ateu	1	4
Umbandista	1	5
Escolaridade
Fundamental incompleto	12	54
Fundamental completo	2	9
Médio incompleto	3	14
Médio completo	3	14
Superior incompleto	1	5
Superior completo	1	4
Diagnósticos
Câncer de cavidade oral	2	9
Câncer de Laringe	5	23
Câncer de Nariz/pele	1	4
Câncer de nasofaringe	3	14
Câncer de orelha/pele	1	4
Câncer de Orofaringe	8	36
Linfoma cervical	1	5
Olho e orbita	1	5
Hábito
Somente tabagista	2	9
*Somente etilista	6	27
Tabagista e etilista	11	50
Não etilista e não tabagista	3	14
**Renda Familiar (salários-mínimos)
1 a 2	20	91
2 a 4	1	4,5
4 a 6	1	4,5
Total	22	100

• Fonte: dados da pesquisa (2022).
• * Etilismo: homem (14 doses de álcool ou menos por semana e não mais do que 4 doses em uma ocasião) e mulheres (7 doses ou menos por semana e não mais do que 3 em uma ocasião)13
• **Valor do salário-mínimo vigente R$ 1.212,00.

Identificou-se que 82% (18) dos participantes são do sexo masculino e a média de idade foi de 51,1 anos, variando entre 41 e 61 anos; a raça predominante foi a parda com um percentual de 68%, a religião católica com 64%. Referente à escolaridade, 54% (12) dos participantes possuíam o nível fundamental incompleto, enquanto um (4%) possuía nível superior completo. Em relação ao tipo histológico, houve predomínio de câncer de orofaringe em oito (36%), seguido de câncer de laringe em cinco (23%) participantes.

No que concerne ao hábito de etilismo e tabagismo, observou-se que 86% (19) dos participantes o possuíam, em somatória, de forma isolada (etilista: seis e tabagista: dois) e combinada, perfazendo um total de oito pacientes com esse hábito. A renda familiar predominante dos participantes foi de 1 a 2 salários-mínimos, com um percentual de 91%, enquanto de 2 a 4 salários-mínimos e, 4 a 6 salários-mínimos o estudo aponta um (4,5%) respectivamente, o que corresponde a 9% dos participantes.

Analisando o Corpus por meio do IRAMUTEQ, emergiram as seguintes categorias: “Conhecimento do tratamento e dos efeitos adversos do tratamento” e “Orientação do enfermeiro para a realização do autocuidado” expostas por meio da Classificação Hierárquica Descendente (CHD) de palavras (Figura 1).

Baseado na análise do dendrograma na Figura 1 e com foco nas palavras mais representativas, destacam-se as seguintes subcategorias (classes): A importância do conhecimento do paciente quanto à Radioterapia (classes: 2,7); Identificação dos efeitos adversos relacionado ao tratamento (classes: 3,6); Orientação do enfermeiro quanto ao autocuidado (classes: 1,8,4,5).

Figura 1
Dendrograma da Classificação Hierárquica Descendente sobre o conhecimento de tratamento, eventos adversos e orientações do enfermeiro. Belém, PA., Brasil, 2022

Importância do conhecimento do paciente quanto a Radioterapia - Classes: 2 e 7

Essa subcategoria representa uma das classes de expressão intermediária e que, somados seus percentuais, tiveram um significado importante. Essa categoria surgiu em virtude da necessidade de identificar o mínimo de conhecimento possível do paciente quanto a radioterapia para fundamentar o surgimento dos eventos adversos, esperados durante e após tratamento.

Tratamento que utiliza radiação para destruir tumores ou impedir que as células aumentem (PCCP1). Aplicação de radiação onde o câncer foi encontrado (PCCP2). Laser que penetra no corpo, na pele e não sente dor (PCCP13).

Foi observado que houve associação do tratamento com os efeitos adversos, fato que reporta o entendimento do século passado (Henry Beckerel-1900), quando utilizou o termo: dose eritema que era sugestivo de tratamento eficaz e está bem representado no transcrito:

A radioterapia é uma queimação no pescoço e nas laterais do caroço é coisa rápida para quem está com o problema (PCCP 11).

Identificação dos efeitos adversos relacionados ao tratamento: classes 3,6

Em qualquer modalidade terapêutica, há efeitos positivos e negativos, o que enfatiza a importância da orientação quanto ao que se espera do tratamento, para que o paciente tenha compreensão dos benefícios obtidos. O ponto mais relevante das entrevistas residiu nesta subcategoria, evidenciado pelo relato:

É a vermelhidão na pele (PCCP1).

Queimação e inflamação na garganta (PCCP16).

Secura na boca e o pescoço fica quente e vermelho (PCCP17).

A saliva fica grossa e a pele fica seca (PCCP18), (PCCP19).

Pelo relato acima observou-se o quanto é relevante as alterações ocasionadas pelo tratamento e o entendimento dos pacientes para o sucesso do tratamento, bem como o papel do enfermeiro nesse processo evidenciado pelo transcrito:

A enfermeira me disse que pode dar dor na vista” (PCCP 3)

Pode causar tonturas, ficar com feridas na boca e vermelhidão na pele (PCCP4).

De todos os efeitos adversos que ocorreram durante o tratamento, o de repercussão mais evidente é a radiodermatite, porém as entrevistas referentes a esse tópico específico, a expressão era desconhecida pela totalidade da amostra representada no estudo, caracterizando o déficit de conhecimento.

Orientação do enfermeiro quanto ao autocuidado-classes: 1,8,4,5

Essa subcategoria foi a de maior expressão. Evidenciou-se a importância do entendimento do paciente quanto à execução do cuidado extra hospitalar, caracterizando o autocuidado durante toda a trajetória do tratamento.

O autocuidado é de suma importância para que os efeitos adversos não tomem proporções drásticas no sentido de interromper o tratamento do paciente. Isso é caracterizado nas expressões:

Fazer compressas com chá de camomila, higiene bucal, não se expor ao sol, tomar bastante água (PCCP4).

O enfermeiro disse que não pode pegar sol para a pele não ressecar (PCCP7).

A questão da hidratação tem que tomar bastante líquido, se alimentar bem, hidratar o local com hidratante (PCCP9).

O enfermeiro disse para fazer o chá de camomila que ajuda aliviar a queimação (PCCP10).

No dendrograma apresentado na Figura 2, o corpus foi dividido em três blocos, sendo que do primeiro obteve-se a classe 2 e 7, correspondendo a 27,1%; no segundo bloco obteve-se a classe 3 e 6, correspondendo a 22,9%; e, no terceiro bloco obteve-se as classes 1,8,4 e 5, correspondendo a 54,2%. Para cada classe foi computada uma lista de palavras, geradas a partir do teste qui-quadrado (X²).

Figura 2
Dendrograma da Classificação Hierárquica Descendente - CHD com análise das frequências e qui-quadrado. Belém, PA., Brasil,

A análise de similitude (Figura 3) denota a ocorrência entre palavras e o resultado em sua conexão foi identificado numa representação gráfica. Observa-se que houve interligações semânticas entre as palavras de maior expressividade como: boca, pele, tratamento, enfermeiro, falar, efeito, água e camomila.

Figura 3:
Análise de Similitude sobre o Conhecimento do Tratamento, Efeitos adversos e orientação quanto ao autocuidado. Belém, PA, Brasil, 2022

Com a análise genérica da árvore foram estabelecidas algumas conexões, como:

O enfermeiro me orientou a vestir roupas de tecido macio, não pegar sol, passar protetor solar, fazer higiene da boca, fazer compressas com chá de camomila para a pele não ficar ressecada e beber bastante água para hidratar (PCCP 18).

Fazer os cuidados que os enfermeiros orientam como o chá de camomila, pois fazendo isso os efeitos demoram mais a aparecer (PCCP 20).

É o tratamento de radiação que penetra na nossa pele até matar aquelas células cancerígenas (PCCP 21).

A enfermeira me falou que é a pele vermelha que aparece durante o tratamento (PCCP 12).

Nos discursos, evidencia-se a importância do conhecimento e do cuidado, que devem ser dispensados aos participantes do estudo e da essência da prática do enfermeiro enquanto educador no contexto do educando em todo o percurso do tratamento radioterápico, reforçando a ideia de que o paciente é o foco do estudo.

DISCUSSÃO

O câncer de cabeça e pescoço é impactante em todos os seus aspectos, pois compromete a autoimagem, a fala, a respiração e a deglutição⁷. Os fatores de risco são determinantes no processo de desencadeamento da doença, dentre eles o uso associado de álcool e tabaco¹. Esta condição foi observada em um percentual expressivo de participantes neste estudo.

Foi identificada uma fragilidade educativa relacionada à baixa escolaridade dos participantes, este fator aumenta a responsabilidade do enfermeiro na questão do processo ensino-aprendizagem seguro e efetivo para a prática do autocuidado¹⁴.

Um estudo¹⁵ realizado em Santa Catarina (Sul do Brasil) evidenciou que, independentemente da região do Brasil, os pacientes acometidos pela patologia têm baixa escolaridade e renda familiar. No estudo em questão, a principal faixa etária acometida foi de 41 a 61 anos de idade, corroborando com os achados deste estudo. O estudo citado reforça a importância de estratégias mais adequadas para ofertar informações ao longo do tratamento, iniciando na atenção primária à saúde até a terciária.

A respeito da religião, tem-se que esta é atrelada ao caráter de crer em sua recuperação e cura da doença, uma vez que o câncer ainda é considerado por muitas pessoas como uma doença incurável com significância de fim de vida. Desse modo, a religiosidade serve de auxílio para lidar com o câncer em seu processo de história natural¹⁶.

Quanto ao conhecimento referente ao tratamento radioterápico, observou-se que as palavras mais facilmente entendidas pelos pacientes eram as mais ouvidas por eles durante o percurso do tratamento. Contudo, ainda existem dificuldades de entendimento referente ao assunto. Uma revisão de literatura¹⁷ corrobora com estes achados descrevendo as dificuldades de entendimento do paciente quanto à falta ou a informação sobre o seu tratamento.

Referente aos efeitos adversos, o público-alvo foi mais enfático nos relatos por serem alterações que comprometem o sistema respiratório e digestivo e no teste qui-quadrado observa-se que os comentários mais importantes foram na boca, onde a saliva modificou, ficando grossa.

Um estudo transversal¹⁸ no estado brasileiro de Sergipe, analisou 34 pacientes com diagnóstico de câncer de cabeça e pescoço a respeito dos eventos adversos pós radioterapia, sendo identificado que 94,1% destes apresentaram boca seca (xerostomia). Desta forma, o presente estudo destaca as repercussões negativas na vida do paciente em virtude das reações ocorridas, o que demonstra o número de classes maior no dendrograma e nas reações da boca apresentada no qui-quadrado.

Ainda sobre os efeitos do tratamento, um ponto relevante é a radiodermatite que é uma das principais toxicidades para pacientes em radioterapia. Um estudo documental¹⁹ realizado no Rio de Janeiro (Brasil) analisou 167 prontuários de pacientes com CCP submetidos a radioterapia curativa. Destes, 99,4% apresentaram radiodermatite, sendo 11,4% severas (com grau RTOG 3). A radiodermatite severa foi associada ao tipo de aparelho, técnica de tratamento e presença de comorbidades. Dos pacientes atingidos com a radiodermite grau três, 53% tiveram suspensão temporária do tratamento.

Um estudo descrito²⁰ do tipo série de casos foi realizado em Brasília-DF (Brasil) com o objetivo de descrever o impacto da radiodermatite na estética corporal de 10 pacientes com CCP submetidos à radioterapia. Todos os pacientes apresentaram sinais característicos como a epilação (nos homens), hiperpigmentação e descamação seca, que afetam a estética corporal. Esta análise reforça que tais alterações comprometem o bem-estar físico e psicológico dos pacientes. Uma vez que a região da cabeça e pescoço está sempre em exposição, a alteração estética relacionada à radiodermatite afeta de forma negativa a qualidade de vida, podendo levar ao isolamento social.

No que diz respeito às orientações de enfermagem, as quatro classes selecionadas no dendrograma, demonstram o quanto é importante a abordagem deste profissional no sentido de ajudar na identificação desses efeitos e orientar como cuidar de forma correta. Achados que são congruentes com estudos^7,8, demonstram a necessidade de o profissional enfermeiro deter conhecimento apropriado para subsidiar uma assistência segura ao paciente com câncer de cabeça e pescoço. Sendo a consulta de enfermagem essencial para minimizar a severidade dos eventos adversos e a diminuição da interrupção do tratamento pela radiodermatite¹⁹.

A limitação do estudo está vinculada ao número amostral pequeno por conta de a coleta de dados ter ocorrido em plena ação da pandemia do Covid-19, haja vista que os pacientes acometidos foram afastados do tratamento, impossibilitando a realização da entrevista, bem como pacientes com metástases para a região da cabeça e pescoço que não faziam parte da amostra pelo número reduzido de frações e aumento da dose terapêutica.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este estudo evidenciou que o conhecimento dos pacientes era bastante incipiente quanto ao tratamento, pois o conceito elaborado por eles se restringia e se correlacionava ao efeito adverso devido ao impacto negativo. Os participantes souberem identificar os efeitos adversos por serem visíveis e impactantes na autoestima e na autoimagem, repercutindo significativamente no trato aerodigestivo, ocasionando alterações no dia-a-dia. Quanto a orientação do autocuidado, houve a assimilação dos ensinamentos repassados pela enfermeira, pois a cada consulta semanal avaliava-se o autocuidado por intermédio da reprodução do paciente quanto aos ensinamentos repassados.

O estudo oportuniza a elaboração de estratégias de ensino adequadas em pesquisas futuras para atender as necessidades psicobiológicas e psicossociais dos pacientes com câncer de cabeça e pescoço submetidos a radioterapia e colabora também com o conhecimento e visibilidade do enfermeiro para a construção de produtos que alcancem o saber dos pacientes.

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  Artigo extraído da dissertação do mestrado: “A pele acometida pela radiodermatite: experiência dos familiares cuidadores e pacientes com câncer de cabeça e pescoço”, Universidade do Estado do Pará, Belém, PA, Brasil, 2022.

Editado por

Editora associada:

Dra. Luciana Nogueira

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  22 Jul 2024
• Data do Fascículo
  2024

Histórico

• Recebido
  13 Jul 2023
• Aceito
  13 Nov 2023