Open-access A influência da palmeira-leque-da-china na regeneração da Floresta Ombrófila Densa Montana na Serra da Cantareira, SP

The influence of chinese fan palm in the regeneration of the Montane Ombrophilous Dense Forest in Serra da Cantareira, SP

Resumo

A Floresta Ombrófila Densa Montana pertence ao domínio da Mata Atlântica, um importante hotspot de biodiversidade. No Brasil, a maioria dos casos de invasões biológicas deve-se a plantas terrestres, sendo essa formação vegetal a que apresenta o maior número de ocorrências. Nesse contexto está o Parque Estadual da Cantareira (PEC), em São Paulo. O PEC abriga um remanescente que apresenta focos de invasão por espécies exóticas, entre elas Livistona chinensis (N.J.Jacquin) R.Brown ex Mart., a palmeira-leque-da-China. Devido ao potencial de invasão dessa espécie, foi conduzido um estudo florístico-fitossociológico sobre o efeito de inibição da regeneração natural do componente arbóreo por indivíduos jovens de Livistona chinensis, com alturas de 3 e 6 m. Para cada palmeira, foram instaladas 8 parcelas de 1 x 1 m, distribuídas dentro de quatro quadrantes, tendo a estipe da palmeira ao centro, de forma que metade das parcelas ficaram localizadas embaixo da copa e metade ao redor. Na análise foram considerados os espécimes arbóreos e de palmeiras com altura ≥ 20 cm e com Perímetro à Altura do Peito (PAP) ≤ 15 cm. Os resultados apontaram uma drástica redução do número de indivíduos regenerantes (28,95% e 29,85% dos indivíduos amostrados) e da riqueza de espécies (16,13% e 8,33% das espécies) ocorrendo sob a projeção das copas dessas palmeiras em comparação com o entorno (71,05% e 70,15% dos indivíduos e 61,29% e 58,33% das espécies, respectivamente). O estudo mostrou o efeito de inibição de indivíduos jovens dessa espécie sobre a regeneração florestal no PEC, ao reduzir substancialmente a riqueza de espécies e a abundância de indivíduos arbóreos sob a projeção das suas copas, possivelmente por servirem de anteparo e causarem o sombreamento excessivo do local.

Palavras-Chave: Espécie exótica invasora; Sucessão ecológica; Livistona chinensis

Abstract

The Montane Ombrophilous Dense Forest belongs to Atlantic Forest’s domain, an important biodiversity hotspot. In Brazil, most of the invasion reports are related to terrestrial plants, being this forest the most affected. In this context is the Cantareira State Park (PEC), Sao Paulo. The PEC is home to a remnant that has a focus of invasion by several plant species, including Livistona chinensis (N.J. Jacquin) R. Brown ex Mart., known as Chinese Fan Palm. Given the potential for invasion of this species, a floristic-phytosociological study was conducted in order to analyse a possible inhibition effect in the natural regeneration process of the arboreous component caused by juveniles individuals of Livistona chinensis, with heights varying between 3 and 6 m. For each palm were installed 8 plots of 1 x 1 m, placed in quadrants, with the palm’s stipe in the center, in a way that half of the plots were placed under the canopy and half around the palm. In the analysis were considered arboreal and palms specimens ≥ 20 cm in height and with a Perimeter at Breast Height (PAP) ≤ 15 cm. The results pointed to a drastic reduced number of seedlings and saplings (28.95% and 29.85%) and of the species richness (16.13% and 8.33% of species) occurring under the canopies of these exotic palm trees in comparison with the surroundings (71.05% and 70.15% of the sampled individuals; and 61.29% and 58.33% of species, respectively). The study has shown the inhibiting effect of young individuals of this species on the forest regeneration in the PEC, by substantially reducing the richness of species and the abundance of arboreal individuals under the projection of their canopies, possibly because they serve as a shield and cause excessive shading of the place.

Keywords: Invasive exotic species; Ecological succession; Livistona chinensis

1 INTRODUÇÃO

Devido à grande exuberância que apresentam, palmeiras, em muitos casos, não nativas, têm sido amplamente usadas para fins paisagísticos, especialmente em ambientes tropicais (SVENNING, 2002). Muitas vezes, essas espécies não nativas, também denominadas exóticas, por não se reproduzirem na área de introdução, não representam grandes problemas, porém, dependendo do nível de naturalização que alcançam, podem se tornar invasoras, quando passam a colonizar novas áreas de forma espontânea (RICHARDSON et al., 2000).

Com relação aos impactos da invasão biológica, há espécies exóticas invasoras que se limitam à colonização de áreas degradadas e outras que competem ativamente com as espécies nativas, transformando a composição e a estrutura dos ecossistemas invadidos (RICHARDSON et al., 2000) podendo, inclusive, conduzir florestas a diferentes trajetórias sucessionais (CHAZDON, 2003, 2008b apudCHAZDON, 2016) ao alterar os padrões de dominância e de estabelecimento de espécies (BAPTISTE et al., 2019).

Com relação ao Brasil, o maior número de registros de espécies exóticas invasoras é de plantas terrestres, sendo a Floresta Ombrófila Densa a formação vegetal mais afetada. Além disso, Parque Estadual é a categoria de Unidade de Conservação de Proteção Integral que apresenta o maior número de casos e a região Sudeste do país é a mais problemática (ZILLER; DECHOUM, 2013).

Nesse contexto, insere-se o Parque Estadual da Cantareira (PEC), em São Paulo, o qual abriga um importante remanescente de Floresta Ombrófila Densa Montana, predominantemente secundária em processo de regeneração natural (SÃO PAULO, 2009). No Plano de Manejo do PEC (SÃO PAULO, 2009), foram reportados focos de invasões biológicas por 16 espécies de plantas exóticas, dentre elas, Livistona chinensis, popularmente denominada palmeira-leque-da-China.

Segundo a Base de Dados Nacional de Espécies Exóticas Invasoras (2019), a espécie Livistona chinensis (N.J. Jacquin) R. Brown ex Mart., originária da China, Bonin e Japão (LORENZI et al., 1996), apresenta risco moderado de invasão e o principal impacto apontando é o excessivo sombreamento causado pela projeção das copas (GLOBAL INVASIVE SPECIES DATABASE, 2019).

Dado o reconhecido potencial de invasão da palmeira-leque-da-China e a grande importância dos remanescentes florestais do PEC para conservação da biodiversidade da região metropolitana de São Paulo e da Mata Atlântica, o presente estudo se propôs a caracterizar a regeneração natural da Floresta Ombrófila Densa Montana no PEC, em uma área sob invasão da palmeira Livistona chinensis, e comparar os componentes da comunidade regenerante sob a projeção das copas e no entorno dessa espécie de palmeira, de forma a verificar o efeito da presença delas no processo de regeneração florestal.

2 MATERIAIS E MÉTODOS

2.1 Caracterização do local

Os estudos fitossociológicos e florísticos foram realizados na trilha da Figueira, núcleo Pedra Grande do Parque Estadual da Cantareira (PEC), no município de São Paulo, SP, por ser uma área sob invasão de palmeiras-leque-da-China. A trilha está localizada no limite entre o PEC e o Parque Estadual Alberto Löfgren (PEAL), local apontado por Miyamura et al. (2019) como potencial porta de entrada de espécies invasoras para as áreas protegidas do entorno.

2.2 Métodos

Com o intuito de comparar a regeneração florestal sob a área de projeção das copas e no entorno de palmeiras Livistona chinensis, foi amostrada a regeneração sob 10 palmeiras-leque-da-China, jovens, distribuídas de forma não agregada, sendo cinco de 3 m e cinco de 6 m de altura.

Para cada palmeira, foram instaladas 8 parcelas de 1 x 1 m, totalizando 80 parcelas, distribuídas dentro de quatro quadrantes, em formato de cruz, tendo a estipe da palmeira no centro, de forma que metade das parcelas ficassem localizadas embaixo da copa e metade ao redor, conforme o esquema apresentado na Figura 1. As parcelas do entorno foram dispostas a uma distância de, aproximadamente, 1 a 2 m da palmeira, de forma que não ficassem muito próximas, nem muito distantes da palmeira. Com relação às parcelas sob as copas, essas foram instaladas, aproximadamente, no centro do quadrante, de forma que não ficassem muito próximas ao estipe nem às bordas das folhas. As parcelas foram demarcadas com o uso de barbante e palitos de madeira.

A opção por analisar palmeiras jovens dessas classes de altura foi devido à predominância, na área de estudo, de palmeiras dessa espécie com essas características, e pelo efeito visível de haver baixa regeneração florestal sob a projeção de suas copas.

Figura 1
Esquema de distribuição das parcelas sob a área de projeção da copa (parcelas vermelhas) e no entorno (parcelas azuis) de Livistona chinensis (cruz preta)

Em cada uma das parcelas, foram identificados os indivíduos arbóreos e palmeiras em regeneração, sendo o critério de inclusão a altura ≥ 20 cm e perímetro na altura do peito (PAP) ≤ 15 cm. De cada regenerante, foram tomadas medidas de altura e de diâmetro na base, respectivamente, com o uso de fita métrica e paquímetro digital.

A identificação das espécies foi realizada pela comparação em herbários, consulta a especialistas e bibliografia específica. Para a classificação em famílias, foi utilizado o Angiosperm Phylogeny Group (APG IV, 2016). Os nomes científicos foram verificados na Flora do Brasil (2020).

Foram mensurados os parâmetros fitossociológicos Número de Indivíduos (ni), Densidade Absoluta (DA), Densidade Relativa (DR), Frequência Absoluta (FA), Frequência Relativa (FR), Dominância Absoluta (DoA), Dominância Relativa (DoR), Valor de Importância (VI) e Valor de Cobertura (VC) com o apoio do software FITOPAC 2.1 (SHEPHERD, 2010) e realizada uma série de análises comparativas entre as áreas de entorno e sob as copas.

A classificação sucessional foi feita segundo observações de campo e os trabalhos de Alves e Metzger (2006), Arzolla et al. (2010), Barretto e Catharino (2015), Bosa et al. (2015), Souza et al. (2016). Foram consideradas quatro categorias sucessionais: Pioneiras, Secundárias Iniciais, Secundárias Tardias (BUDOWSKI, 1965) e Umbrófila (CATHARINO et al., 2006; ARZOLLA et al., 2010, 2020). Espécies indeterminadas e aquelas sobre as quais não foram encontradas informações acerca da categoria sucessional não foram classificadas.

Para as análises estatísticas foram utilizados os pacotes Pandas (versão 1.1.5), Matplotlib (versão 3.3.4), Numpy (versão 1.19.2) da distribuição Anaconda Python (versão 1.6.14).

3 RESULTADOS E DISCUSSÃO

Foram contabilizados 135 indivíduos regenerantes no entorno (71,05%) e 55 sob as copas (28,95%) das palmeiras de 3 m, conforme a Figura 2. Em contrapartida, nas palmeiras de 6 m foram amostrados 94 indivíduos regenerantes no entorno (70,15%) e 40 sob as copas (29,85%). Em ambas as categorias de altura, os resultados apontaram para um menor número de regenerantes sob as copas do que no entorno.

Figura 2
Percentual de regenerantes sob a copa e no entorno de palmeiras Livistona chinensis de 3 m e 6 m

Acerca da quantidade de regenerantes por parcela sob as copas, foram observados entre zero e dois regenerantes em 50% das parcelas sob as copas das palmeiras de 3 m e 75% sob as copas das palmeiras de 6 m, conforme a Figura 3.

Em contrapartida, no entorno das palmeiras de 3 m não foram observadas parcelas com menos do que três regenerantes, enquanto que no entorno das palmeiras de 6 m apenas 15% das parcelas amostradas apresentaram entre zero e dois indivíduos, conforme a Figura 3.

O teste estatístico não paramétrico U de Mann-Whitney (CALLEGARI-JACQUES, 2007) resultou em diferenças significativas entre a quantidade de indivíduos regenerantes por parcela sob as copas e no entorno das palmeiras de 3 m (valor U = 57,5) e de 6 m (valor U = 61,5).

Figura 3
Quantidade de regenerantes por parcela sob as copas e no entorno de Livistona chinensis de 3 m e 6 m

No total, foram amostradas 30 espécies pertencentes a 17 famílias e 25 gêneros, sendo que 9 morfotipos tiveram classificação indeterminada. A família mais rica foi Myrtaceae, com 5 espécies, enquanto que as famílias mais abundantes foram Sapindaceae, com 118 regenerantes, Rubiaceae, com 85, e Arecaceae com 46 (Tabela 1).

Tabela 1
Composição florística e abundância das espécies no entorno e sob as copas de Livistona chinensis

Para ambas as categorias de altura de palmeira, a riqueza de espécies foi consideravelmente maior no entorno, visto que, aproximadamente, 60% das espécies foram amostradas apenas no entorno, conforme a Figura 4.

Figura 4
Proporção de espécies no entorno e sob as copas de Livistona chinensis de 3 m e 6 m de altura

Destacam-se, nas Figuras 5 e 6, as abundâncias, em ordem decrescente, das espécies Cupania oblongifolia, Coffea arabica e Euterpe edulis em ambas as áreas e nas duas categorias de altura de palmeiras.

Figura 5
Número de indivíduos por espécie sob as copas e no entorno de Livistona chinensis de 3 m

Figura 6
Número de indivíduos por espécie sob as copas e no entorno de Livistona chinensis de 6 m

A Figura 7 exibe, de forma agrupada e ordenada, as cinco espécies que apresentaram o maior valor de importância (VI) em cada uma das áreas analisadas. É possível observar a elevada importância, respectivamente, das espécies Cupania oblongifolia, Coffea arabica e Euterpe edulis em todas as áreas de estudo.

Figura 7
Ordem decrescente de Valor de Importância das espécies na área de estudo

Embora Cupania oblongifolia tenha apresentado o maior valor de importância em todas as áreas, esse índice foi maior sob as copas do que no entorno, conforme a Tabela 2.

Tabela 2
Parâmetros fitossociológicos para a espécie Cupania oblongifolia em diferentes situações amostradas

Na Tabela 3, é apresentada a classificação dos regenerantes por origem e por estágio sucessional. As espécies que não foram passíveis de identificação ou para as quais não foram encontrados dados na literatura sobre origem ou estágio sucessional não foram classificadas.

Tabela 3
Origem e grupo sucessional das espécies amostradas

As Figuras 8 e 9 exibem a proporção de regenerantes nativos e exóticos, respectivamente, sob as copas e no entorno das palmeiras de 3 m e 6 m. Nota-se nessas imagens a predominância de regenerantes nativos tanto nas áreas sob as copas quanto no entorno de Livistona chinensis de ambas as categorias de altura.

Figura 8
Proporção de indivíduos regenerantes nativos e exóticos sob as copas de Livistona chinensis de 3 m e 6 m

Figura 9
Proporção de indivíduos regenerantes nativos e exóticos no entorno de Livistona chinensis de 3 m e 6 m

As Figuras 10 e 11 exibem a proporção de regenerantes por classificação sucessional, respectivamente, sob as copas e no entorno das palmeiras de 3 m e 6 m. Sob as copas das palmeiras de 6 m foi observada uma elevada proporção de regenerantes secundários iniciais (60%), enquanto que nas copas das palmeiras de 3 m, aproximadamente, 70% dos regenerantes foram classificados como secundários iniciais (36,36%) e umbrófilos (34,55%). Convém destacar que não houve registro de espécies pioneiras sob as copas.

Figura 10
Proporção de indivíduos regenerantes sob as copas de Livistona chinensis de 3 m e 6 m por classificação sucessional

No entorno das palmeiras de 3 m, as espécies umbrófilas (40,74%) representaram a maior proporção de regenerantes, seguidas pelas espécies secundárias iniciais (32,59%), secundárias tardias (15,56%) e pioneiras (1,48%). No entorno das palmeiras de 6 m, foi constatada uma maior proporção de espécies secundárias iniciais (38,30%), seguidas pelas umbrófilas (30,85%), secundárias tardias (17,02%) e pioneiras (1,06%).

Figura 11
Proporção de indivíduos regenerantes no entorno de Livistona chinensis de 3 m e 6 m por classificação sucessional

Esses resultados apontam para uma menor riqueza de espécies sob as copas do que no entorno de palmeiras Livistona chinensis e também uma acentuada diferença no percentual de regenerantes em ambas as áreas, visto que o entorno apresentou mais do que o dobro de regenerantes do que as áreas sob as copas. Além disso, foi observada, nas áreas sob as copas, uma densidade significativamente menor de regenerantes por parcela. Esse efeito sobre a regeneração também foi relatado por Petri et al. (2018) no Parque Estadual Fontes do Ipiranga (PEFI), localizado em São Paulo, sendo que esses pesquisadores apontaram como possível causa o sombreamento provocado pela projeção das copas de palmeiras dessa espécie.

O efeito de menor riqueza e menor abundância de regenerantes sob copas de palmeiras também foi observado em outros estudos (DENSLOW et al., 1991; FARRIS-LOPEZ et al., 2004; WANG; AUGSPURGER, 2006; ZUCARATTO; PIRES, 2014). Zucaratto e Pires (2014), em estudos com a palmeira exótica Roystonea oleracea na Ilha Grande, Rio de Janeiro, registraram menor riqueza e abundância de plântulas sob as copas dessas palmeiras do que em áreas com ausência delas. Wang e Augspurger (2006), em Barro Colorado, Panamá, registraram densidade de regenerantes inferior e riqueza de espécies entre 23% e 27% menor sob as copas de palmeiras dos gêneros Astrocaryum, Attalea, Oenocarpus e Socratea do que em áreas sem a presença dessas palmeiras.

A baixa densidade de plântulas sob copas de palmeiras pode ser causada pela queda das folhas, arquitetura da copa (AGUIAR; TABARELLI, 2010; WANG; AUGSPURGER, 2006) e alterações microclimáticas (DENSLOW et al., 1991; FARRIS-LOPEZ et al., 2004; WANG; AUGSPURGER, 2006).

Farris-Lopez et al. (2004), em estudo em Barro Colorado, Panamá, reportaram uma redução de 27% na disponibilidade luminosa, um maior acúmulo de serrapilheira e menor densidade de regenerantes sob as copas de palmeiras da espécie Oenocarpus mapora. Além disso, em média, o número de espécies observado por parcela sob as copas foi 49% menor do que no entorno.

O efeito do sombreamento sobre o crescimento e a sobrevivência de plântulas do gênero Inga sob plantas das família Cyclanthaceae (Asplundia uncinata Harling) e Arecaceae (Asterogyne martiana Wendl. ex Burret e Geonoma cuneata Wendl. ex Spruce) foi estudado por Denslow et al. (1991) na Estação Biológica de La Selva, Costa Rica. Na ocasião, eles registraram uma menor radiação indireta sob as copas do que nas áreas de sub-bosque. A disponibilidade luminosa mensurada sob copas de palmeiras também foi inferior nos estudos conduzidos por Wang e Augspurger (2006). Além disso, em Barro Colorado, esses autores obtiveram uma relação significativa entre a densidade de regenerantes arbóreos e a abertura da copa das palmeiras analisadas.

Como o presente trabalho teve como objeto de estudo o efeito de indivíduos jovens de Livistona chinensis, não agregadas e sem efeito de folhas caídas, o que explicaria a menor abundância de regenerantes sob as copas seria, principalmente, o sombreamento e a arquitetura das copas, que pode funcionar como um anteparo, dificultando o estabelecimento de sementes.

O efeito de anteparo também foi observado por Aguiar e Tabarelli (2010), os quais propuseram que adultos de Attalea oleifera oferecem barreiras à chegada de sementes, uma vez que apresentam chuva de sementes composta, principalmente, por pequenas sementes, dispersas de forma abiótica ou por vertebrados generalistas.

No presente estudo, foi registrado um elevado valor de importância para a espécie Cupania oblongifolia em todas as áreas analisadas e, entre as espécies secundárias iniciais, essa espécie foi a que apresentou maior proporção de regenerantes, tanto sob as copas, quanto no entorno das palmeiras analisadas. No entanto, os valores de frequência relativa e dominância relativa foram mais acentuados, especialmente sob as copas das palmeiras de 6 m.

Uma observação importante é que Cupania oblongifolia é comumente classificada na literatura como secundária inicial, categoria descrita como pouco tolerante ao sombreamento. A explicação para a abundância dessa espécie sob as copas de Livistona chinensis, possivelmente, envolve certa tolerância ao sombreamento, ao menos nos estágios juvenil e plântula, a colonização dos espaços deixados entre as folhas, ou mesmo a participação de certos agentes bióticos, visto que, há relatos na literatura sobre o papel de formigas, além da avifauna, na dispersão dessa espécie em florestas no nordeste do Brasil (COSTA et al., 2007), e de Cupania vernalis em um trecho de Mata Atlântica no sudeste do Brasil (GUIMARÃES; COGNI, 2002).

Outras espécies que bastante se destacaram em valor de importância sob as copas foram Coffea arabica, uma reconhecida espécie exótica invasora do PEC, Euterpe edulis, Myrciaria floribunda, Myrcia tijucensis e Sorocea bonplandii, as quais pertencem a categorias sucessionais que apresentam tolerância ao sombreamento. Além disso, dentro da categoria Umbrófila, a espécie Coffea arabica foi a que apresentou a maior proporção tanto no entorno quanto sob as copas das palmeiras amostradas. Já na categoria Secundária Tardia, a espécie Euterpe edulis foi a que mais se destacou nas áreas amostradas, porém de forma menos intensa que Cupania oblongifolia e Coffea arabica.

O aumento da proporção de espécies secundárias iniciais sob as copas das palmeiras de 6 m foi acompanhado por uma expressiva redução da proporção de espécies secundárias tardias e umbrófilas, tendendo a uma maior homogeneização dessas áreas. Esse fenômeno mostra uma possível diminuição do efeito do sombreamento nessas palmeiras mais altas. Ainda sobre o possível efeito do sombreamento, não foram observadas espécies pioneiras, crescendo naturalmente sob as copas de Livistona chinensis.

O presente trabalho focou, principalmente, na análise da riqueza, abundância e caracterização de regenerantes sob as copas de Livistona chinensis jovens. No entanto, é importante que futuros estudos avaliem a composição da chuva de sementes e do banco de sementes formado sob as copas dessa espécie, bem como trabalhos que quantifiquem a radiação direta e indireta sob as copas, de forma a elucidar a contribuição da arquitetura da copa e do sombreamento nos efeitos observados no presente estudo.

4 CONCLUSÃO

Os resultados do presente trabalho apontam para efeitos negativos na abundância de regenerantes e riqueza de espécies, acarretados pela presença de indivíduos jovens de palmeiras-leque-da-China.

Agradecimentos

Ao CNPq, à administração do PEC e ao Instituto Florestal pelo apoio à pesquisa.

Referências

  • AGUIAR, A.; TABARELLI, M. Edge Effects and Seedling Bank Depletion: The Role Played by the Early Successional Palm Attalea oleifera (Arecaceae) in the Atlantic Forest. Biotropica, v. 42, n. 2, p. 158-166, 2010.
  • ALVES, L.F.; METZGER, J.P. A regeneração florestal em áreas de floresta secundária na Reserva Florestal do Morro Grande, Cotia, SP. Biota Neotropica, Campinas, v. 6, n. 2, 2006.
  • ANGIOSPERM PHYLOGENY GROUP - APG IV. An update of the Angiosperm Phylogeny Group classification for the orders and families of flowering plants: APG IV. Botanical Journal of the Linnean Society, v. 181, p. 1-20, 2016.
  • ARZOLLA, F.A.R.D.P. et al. Regeneração natural em clareiras de origem antrópica na Serra da Cantareira, SP. Revista do Instituto Florestal, São Paulo, v. 22, n. 1, p. 155-169, 2010.
  • BAPTISTE, A.J. et al. Secondary Succession under invasive species (Pteridium aquilinum) conditions in a seasonal dry tropical forest in southeastern Mexico. PeerJ, 2019.
  • BARRETTO, E. H. P.; CATHARINO, E.L.M. Florestas maduras da região metropolitana de São Paulo: diversidade, composição arbórea e variação florística ao longo de um gradiente litoral-interior, Estado de São Paulo, Brasil. Hoehnea, São Paulo, v. 42, n. 3, p. 445-469, 2015.
  • BASE DE DADOS NACIONAL DE ESPÉCIES EXÓTICAS INVASORAS. Instituto Hórus de Desenvolvimento e Conservação Ambiental, Florianópolis - SC. Disponível em: https://bd.institutohorus.org.br/. Acesso em: 1 nov. 2019.
    » https://bd.institutohorus.org.br
  • BOSA, D.; PACHECO, D.; PASETTO, M.R.; SANTOS, R. Florística e estrutura do componente arbóreo de uma Floresta Ombrófila Densa Montana em Santa Catarina, Brasil. Revista Árvore, Viçosa, MG, v. 39, n. 1, p. 49-58, 2015.
  • BUDOWSKI, G. Distribution of tropical american rain forest species in the light of successional processes. Turrialba, San José, v. 15, n. 1, p. 40-42, 1965.
  • CALLEGARI-JACQUES, S.M. Bioestatística: Princípios e aplicações. Porto Alegre: Artmed, 2007, p. 165-170.
  • CATHARINO, E.L.M. et al. Aspectos da composição e diversidade do componente arbóreo das florestas da Reserva Florestal do Morro Grande, Cotia, SP. Biota Neotropica , Campinas, v. 6, n. 2, 2006.
  • CHAZDON, R.L. Renascimento de florestas: regeneração na era do desmatamento. São Paulo: Oficina de Texto, 2016, 430 p.
  • COSTA, U.A.S. Dispersão de sementes por formigas em remanescentes de Floresta Atlântica Nordestina. 2007. 68 f. Dissertação (Mestrado em Biologia Vegetal) - Universidade Federal de Pernambuco. Pernambuco, 2007.
  • DENSLOW, J.S. et al. The Effect of Understory Palms and Cyclanths on the Growth and Survival of Inga Seedlings. Biotropica , v. 23, n. 3, p. 225-234, 1991.
  • GUIMARAES, P.R.; COGNI, R. Seed cleaning of Cupania vernalis (Sapindaceae) by ants: Edge effect in a highland forest in south-east Brazil. Journal of Tropical Ecology, v. 18, p. 303-307, 2002.
  • FARRIS-LOPEZ, K. et al. Influence of a common palm, Oenocarpus mapora, on seedling establishment in a tropical moist forest in Panama. Journal of Tropical Ecology , v. 20, p. 429-438, 2004.
  • FLORA DO BRASIL 2020. Jardim Botânico do Rio de Janeiro. Disponível em: http://floradobrasil.jbrj.gov.br/. Acesso em: 05 nov. 2020.
    » http://floradobrasil.jbrj.gov.br
  • GLOBAL INVASIVE SPECIES DATABASE. Livistona chinensis Disponível em: http://www.iucngisd.org/gisd/. Acesso em: 1 nov. 2019.
    » http://www.iucngisd.org/gisd
  • LORENZI, H. Palmeiras no Brasil: exóticas e nativas. Nova Odessa: Plantarum, 1996, 303 p.
  • MIYAMURA, F.Z. et al. Influência de espécies exóticas invasoras na regeneração natural de um fragmento florestal urbano. Scientia Plena, v. 15, n. 8, 2019.
  • PETRI, L. et al. Management priorities for exotic plants in an urban Atlantic Forest reserve. Acta Botanica Brasilica, v. 32, n. 4, p. 631-641, 2018.
  • SÃO PAULO (Estado). Secretaria do Meio Ambiente. Plano de Manejo do Parque Estadual da Cantareira. São Paulo: Fundação Florestal, 2009. 586 p.
  • SHEPHERD, G.J. FITOPAC. Versão 2.1. Campinas, SP: Departamento de Botânica, Universidade Estadual de Campinas- UNICAMP . 2010.
  • SOUZA, S.C.P.M. et al. A vegetação secundária em um fragmento florestal urbano: influência de exóticas invasoras na comunidade vegetal. Revista do Instituto Florestal , São Paulo, v. 28, n. 1, p. 7-45, 2016.
  • SVENNING, J. Non-Native Ornamental Palms Invade a Secondary Tropical Forest in Panama. Palms, v. 46, n. 2, 2002.
  • WANG, Y.H.; AUGSPURGER, C. Comparison of seedling recruitment under arborescent palms in two Neotropical forests. Oecologia, v. 147, n. 3, p. 533-545, 2006.
  • ZILLER, S.R.; DECHOUM, M. de S. Plantas e Vertebrados Exóticos Invasores em Unidades de Conservação no Brasil. Biodiversidade Brasileira, Brasília, v. 2, n. 3, 2013.
  • ZUCARATTO, R.; PIRES, A.S. The exotic palm Roystonea oleracea (Jacq.) O. F. Cook (Arecaceae) on an island within the Atlantic Forest Biome: naturalization and influence on seedling recruitment. Acta Botanica Brasilica , v. 28, n. 3, p. 417-421, 2014.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    20 Fev 2023
  • Data do Fascículo
    Oct-Dec 2022

Histórico

  • Recebido
    21 Nov 2021
  • Aceito
    16 Ago 2022
  • Publicado
    23 Nov 2022
location_on
Universidade Federal de Santa Maria Av. Roraima, 1.000, 97105-900 Santa Maria RS Brasil, Tel. : (55 55)3220-8444 r.37, Fax: (55 55)3220-8444 r.22 - Santa Maria - RS - Brazil
E-mail: cienciaflorestal@ufsm.br
rss_feed Acompanhe os números deste periódico no seu leitor de RSS
Acessibilidade / Reportar erro