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Fase faríngea da deglutição na disfagia pós-AVE: achados videoendoscópios e da avaliação fonoaudiológica

RESUMO

Objetivo

Investigar os achados videoendoscópios da fase faríngea da deglutição e da avaliação clínica da deglutição, entre indivíduos disfágicos com e sem AVE crônico em diferentes consistências alimentares.

Método

Trata-se de um estudo transversal e retrospectivo com base na coleta de dados dos prontuários. Foram analisados 134 exames da videoendoscopia da deglutição de pacientes disfágicos, em que foram divididos em dois grupos de acordo com o diagnóstico de AVE, na qual, foram coletados dados com relação à mobilidade e força de língua, fonação e eficiência da tosse, e os sinais faríngeos de disfagia com quatro consistências alimentares do International Dysphagia Diet Standartisation Initiative (IDDSI), para comparação entre os grupos. Para análise e classificação da gravidade dos resíduos faríngeos, foi utilizado o Yale Pharyngeal Residue Severity Rating Scale (YPRSRS) por dois profissionais independentes.

Resultados

Houve diferença significativa com a presença de resíduos faríngeos, penetração laríngea e aspiração laringotraqueal em todas as consistências avaliadas (nível 0, 2, 4 e 7) (p= <0,001), além da associação com deglutições múltiplas em líquido ralo, líquido levemente espessado e sólido (nível 0, 2 e 7) (p= 0,026).

Conclusão

Os indivíduos disfágicos com diagnóstico de acidente vascular encefálico apresentaram diferença nos sinais videoendoscópios de resíduos faríngeos, penetração laríngea e aspiração laringotraqueal independentemente da consistência alimentar avaliada, em comparação aos indivíduos disfágicos sem o diagnóstico. Assim como houve diferença no achado da deglutição múltipla apenas nas consistências de líquido ralo, líquido extremamente espessado e sólido.

Descritores:
Transtornos de Deglutição; Disfagia; Acidente Vascular Encefálico; Aspiração Respiratória; Faringe

ABSTRACT

Purpose

To investigate the outcomes of fiberoptic endoscopic evaluation of pharyngeal swallowing phase and clinical evaluation of swallowing among dysphagic individuals with and without chronic stroke in different food consistencies.

Methods

This is a cross-sectional and retrospective study based on data collection from medical records. 134 swallowing video endoscopy exams of dysphagic patients were analyzed, in which they were divided into two groups according to the diagnosis of stroke, in which data were collected regarding mobility and strength of the tongue, phonation and cough efficiency, and the pharyngeal signs of dysphagia with four food consistencies from the International Dysphagia Diet Standardization Initiative (IDDSI), for comparison between groups. To analyze and classify the severity of pharyngeal residues, the Yale Pharyngeal Residue Severity Rating Scale (YPRSRS) was used by two independent professionals.

Results

There was a significant difference in the presence of pharyngeal residue, laryngeal penetration and laryngotracheal aspiration in all consistencies evaluated (level 0, 2, 4 and 7) (p= <0.001), in addition to the association with multiple swallowing in thin liquid, slightly thickened liquid and solid (level 0, 2 and 7) (p= 0.026).

Conclusion

Dysphagic individuals diagnosed with stroke showed differences in videoendoscope signs of pharyngeal residue, laryngeal penetration and laryngotracheal aspiration, regardless of the food consistency assessed, compared to dysphagic individuals without the diagnosis. Just as there was a difference in the finding of multiple swallowing only in the consistencies of thin liquid, extremely thickened liquid and solid.

Keywords:
Deglutition Disorders; Dysphagia; Stroke; Respiratory Aspiration; Pharynx

INTRODUÇÃO

O acidente vascular encefálico (AVE) é a principal causa de morte em todo mundo(11 Avan A, Digaleh H, Di Napoli M, Stranges S, Behrouz R, Shojaeianbabaei G, et al. Socioeconomic status and stroke incidence, prevalence, mortality, and worldwide burden: an ecological analysis from the Global Burden of Disease Study 2017. BMC Med. 2019;17(1):191. http://doi.org/10.1186/s12916-019-1397-3. PMid:31647003.
http://doi.org/10.1186/s12916-019-1397-3...
), com previsão de aumento de sua incidência devido a tendência de envelhecimento da população mundial(11 Avan A, Digaleh H, Di Napoli M, Stranges S, Behrouz R, Shojaeianbabaei G, et al. Socioeconomic status and stroke incidence, prevalence, mortality, and worldwide burden: an ecological analysis from the Global Burden of Disease Study 2017. BMC Med. 2019;17(1):191. http://doi.org/10.1186/s12916-019-1397-3. PMid:31647003.
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). O AVE é categorizado em dois tipos principais, sendo o isquêmico e o hemorrágico, com três fases, denominado fase aguda nas duas primeiras semanas da lesão, fase subaguda até seis meses e fase crônica após seis meses da lesão(22 Meng PP, Zhang SC, Han C, Wang Q, Bai GT, Yue SW. The occurrence rate of swallowing disorders after stroke patients in Asia: a PRISMA-compliant systematic review and meta-analysis. J Stroke Cerebrovasc Dis. 2020;29(10):105113. http://doi.org/10.1016/j.jstrokecerebrovasdis.2020.105113. PMid:32912517.
http://doi.org/10.1016/j.jstrokecerebrov...
). A incidência da disfagia orofaríngea após o AVE, principalmente nas primeiras semanas, é de 50% dos casos(33 Simons A, Hamdy S. The use of brain stimulation in dysphagia management. Dysphagia. 2017;32(2):209-15. http://doi.org/10.1007/s00455-017-9789-z. PMid:28353151.
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), o que pode aumentar em até 78% a depender do tipo e da gravidade da lesão, além de algumas comorbidades individuais como a diabetes mellitus(11 Avan A, Digaleh H, Di Napoli M, Stranges S, Behrouz R, Shojaeianbabaei G, et al. Socioeconomic status and stroke incidence, prevalence, mortality, and worldwide burden: an ecological analysis from the Global Burden of Disease Study 2017. BMC Med. 2019;17(1):191. http://doi.org/10.1186/s12916-019-1397-3. PMid:31647003.
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).

A deglutição é um processo complexo que envolve a coordenação entre cinco pares de nervos cranianos e vinte e seis grupos musculares que, embora essa tarefa ocorra com frequência e sem esforço entre indivíduos saudáveis, os componentes motores e sensoriais da deglutição podem estar comprometidos em alguns pacientes pós-AVE(33 Simons A, Hamdy S. The use of brain stimulation in dysphagia management. Dysphagia. 2017;32(2):209-15. http://doi.org/10.1007/s00455-017-9789-z. PMid:28353151.
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). Dessa forma, algumas evidências propuseram que a lateralidade do hemisfério afetado e as lesões cerebrais na região de ínsula anterior estão associadas à maior severidade da disfagia no pós-AVE, de modo que, a região de ínsula possui conexões importantes com o córtex motor primário e suplementares, núcleo medial do tálamo e o núcleo do trato solitário que participam na mediação da deglutição orofaríngea(44 Otto DM, Ribeiro MC, Barea LM, Mancopes R, de Almeida ST. Association between neurological injury and the severity of oropharyngeal dysphagia after stroke. CoDAS. 2016;28(6):724-9. http://doi.org/10.1590/2317-1782/20162015139. PMid:27925016.
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,55 Daniels SK, Foundas AL. The Role of the Insular Cortex in Dysphagia. Dysphagia. 1997;12(3):146-56. http://doi.org/10.1007/PL00009529. PMid:9190100.
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).

O comprometimento provocado pelas lesões cerebrais advindas do AVE podem afetar tanto a fase oral quanto a fase faríngea da deglutição, a depender do grau de severidade. A fase oral envolve diferentes processos de mastigação, insalivação, qualificação, organização e propulsão do bolo alimentar que, a partir de eventuais mudanças na redução de mobilidade e força de língua, provocam incoordenação do bolo alimentar e tempo de trânsito oral aumentado, que dificultam a propulsão e sua transferência para a fase conseguinte(66 Yamada EK, de Siqueira KO, Xerez D, Koch HA, Costa MMB. A influência das fases oral e faríngea na dinâmica da deglutição. Arq Gastroenterol. 2004;41(1):18-23. http://doi.org/10.1590/S0004-28032004000100004. PMid:15499419.
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). Enquanto que, na fase faríngea, suas alterações concentram-se no atraso no tempo de início de resposta faríngea, aspirações silenciosas devido a redução no componente aferente do mecanismo de tosse e no aumento dos resíduos em recessos faríngeos após a deglutição(77 dos Santos RRD, Cola PC, Jorge AG, Peres FM, Lauris JRP, da Silva RG. Correlação entre tempo de trânsito oral e faríngeo no acidente vascular cerebral. Audiol Commun Res. 2015;20(3):198-202. http://doi.org/10.1590/S2317-64312015000300001567.
http://doi.org/10.1590/S2317-64312015000...
,88 Duncan S, McAuley DF, Walshe M, McGaughey J, Anand R, Fallis R, et al. Interventions for oropharyngeal dysphagia in acute and critical care: a systematic review and meta-analysis. Intensive Care Med. 2020;46(7):1326-38. http://doi.org/10.1007/s00134-020-06126-y. PMid:32514597.
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).

Nesse contexto, com a eficiência e a segurança da deglutição comprometidas, os pacientes disfágicos pós-AVE possuem riscos maiores de aspirar o alimento ingerido, que por consequência, quando confirmado a aspiração laringotraqueal pela avaliação instrumental, o risco aumenta 11 vezes mais de desenvolver pneumonia aspirativa, ser hospitalizado e necessitar da administração de uso de sonda nasogástrica ou gastrostomia para manter os níveis nutricionais adequados(99 Rofes L, Arreola V, Almirall J, Cabré M, Campins L, García-Peris P, et al. Diagnosis and management of oropharyngeal dysphagia and its nutritional and respiratory complications in the elderly. Gastroenterol Res Pract. 2011;2011:818979. http://doi.org/10.1155/2011/818979. PMid:20811545.
http://doi.org/10.1155/2011/818979...

10 Clarke DJ. The role of multidisciplinary team care in stroke rehabilitation. Prog Neurol Psychiatry. 2013;17(4):5-8. http://doi.org/10.1002/pnp.288.
http://doi.org/10.1002/pnp.288...
-1111 Liaw MY, Hsu CH, Leong CP, Liao CY, Wang LY, Lu CH, et al. Respiratory muscle training in stroke patients with respiratory muscle weakness, dysphagia, and dysarthria – a prospective randomized trial. Medicine (Baltimore). 2020;99(10):e19337. http://doi.org/10.1097/MD.0000000000019337. PMid:32150072.
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).

Dessa forma, ao considerar a fisiopatologia presente em todas as fases da deglutição, a hipótese levantada é que haverá diferenças na avaliação objetiva e subjetiva da deglutição entre pacientes disfágicos com e sem o diagnóstico de AVE. Portanto, o objetivo deste estudo foi investigar os achados videoendoscópios e fonoaudiológicos através da avaliação clínica, entre indivíduos disfágicos com e sem AVE crônico em diferentes consistências alimentares.

MÉTODOS

Trata-se de um estudo transversal e retrospectivo com base na coleta de dados dos prontuários. A pesquisa foi conduzida no ambulatório de otorrinolaringologia do Hospital Universitário Onofre Lopes, em que foram coletados dados nos prontuários do exame da videoendoscopia da deglutição (VED) dos pacientes acompanhados entre os anos de 2015 a 2022. Todos os participantes, ou representantes legais, assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) padrão disponibilizado pelo serviço antes da realização dos procedimentos da pesquisa. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Universitário Onofre Lopes, sob parecer n° 5.146.899. Foram coletados dados referentes à avaliação clínica fonoaudiológica e aos achados na VED.

Casuística

A amostra escolhida por conveniência entre indivíduos que buscaram atendimento nesse local foi composta por 134 participantes adultos. O primeiro grupo foi constituído por 44 indivíduos disfágicos com idade entre 37 e 97 anos, média de 67,45 (±13,9) anos e com predomínio do gênero masculino, que apresentavam histórico clínico de acidente vascular encefálico isquêmico em fase crônica, independente do tempo do diagnóstico. Os critérios de exclusão nesse grupo foram indivíduos em uso de via alternativa de alimentação, usuários de traqueostomia, histórico de tratamento oncológico, outros diagnósticos neurológicos e incapazes de seguir comandos.

Enquanto que no segundo grupo, foram incluídos indivíduos em investigação da disfagia por causa idiopática e em sua maioria adultos mais velhos. Assim, o grupo foi constituído por 90 indivíduos disfágicos com idade entre 52 a 105 anos, média de 61,88 (±15,8) anos e com predomínio do gênero feminino, que não apresentavam o histórico de AVE. Os critérios de exclusão nesse grupo foram indivíduos em uso de via alternativa de alimentação, usuários de traqueostomia, histórico de tratamento oncológico, outros diagnósticos neurológicos e incapazes de seguir comandos.

Ambos os grupos compostos por indivíduos com queixas clínicas de disfagia orofaríngea rastreados por profissionais de saúde do serviço sem um protocolo padronizado e/ou encaminhados por outros setores do próprio hospital, que realizaram o exame da VED para investigação objetiva e instrumental da deglutição.

Procedimentos

A avaliação clínica foi realizada por um fonoaudiólogo do serviço momentos antes da realização do exame instrumental. Na avaliação prévia é utilizado um protocolo próprio do serviço, na qual, é analisado aspectos miofuncionais orofaciais envolvidos na fase oral da deglutição. Para esta pesquisa foram analisados aspectos como: força e mobilidade de língua, tosse espontânea sob comando e o tempo máximo de fonação. A fraqueza lingual é observada quando o avaliador solicita que o paciente utilize a força máxima voluntária de língua contra a resistência do dedo enluvado do próprio avaliador, que apesar de ser medidas qualitativas a depender da experiência prévia de comparação da normalidade, resulta em uma baixa duração de contração muscular e diminuição rápida do movimento isométrico. Além disso, o avaliador fonoaudiólogo foi responsável por solicitar ao paciente que executasse os movimentos desejados de protrusão e lateralização com a língua, protrusão contra a resistência do dedo enluvado, produzisse uma tosse espontânea forte e emitisse o som prolongado da vogal /a/ o máximo de tempo possível, após demonstração de modelo. Foi adotado como parâmetros e critérios de normalidade a capacidade de executar corretamente os comandos desejados, manter força isométrica sobre o dedo, a eficiência subjetiva na produção da tosse (eficiente/fraca) para uma eventual limpeza faríngea e o tempo máximo de fonação cronometrado de 14s para as mulheres e 20s para homens. Todas as alterações são devidamente anotadas, e em caso de dúvida, repetida para dar prosseguimento.

O exame da videoendoscopia da deglutição é realizado por um médico residente, um otorrinolaringologista responsável e pelo fonoaudiólogo com experiência em disfagia orofaríngea, em consonância com o protocolo da instituição. É utilizado uma nasofibrolaringoscópio flexível, marca Olympus® de 3,2mm de diâmetro, com microcâmera e fonte de luz, introduzida na cavidade nasal até a região de hipofaringe. O paciente é orientado que permaneça na posição sentado durante toda realização do exame, não sendo utilizado anestésico tópico.

Ainda durante a realização do exame, o fonoaudiólogo ofertada alimentos corados artificialmente com anilina azul em diferentes consistências alimentares, seguindo esta ordem: nível 2 (líquido levemente espessado), nível 4 (líquido extremamente espessado), nível 0 (líquido ralo) e nível 7 (sólido normal), de acordo com a classificação International Dysphagia Diet Standardisation Initiative (IDDSI)(1212 Cichero JAY, Lam P, Steele CM, Hanson B, Chen J, Dantas RO, et al. Development of international terminology and definitions for texture-modified foods and thickened fluids used in dysphagia management: the IDDSI framework. Dysphagia. 2017;32(2):293-314. http://doi.org/10.1007/s00455-016-9758-y. PMid:27913916.
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), com três ofertas em uma colher metálica de 5ml. Os líquidos foram preparados em forma de suco dietético saborizado artificialmente e espessado por um espessante alimentar instantâneo de amido de milho, enquanto o alimento sólido foi constituído por uma porção de biscoito salgado de 8g.

Os três profissionais anteriormente citados, com experiência na realização do exame, foram responsáveis por interpretar, avaliar simultaneamente, por consenso e concluíram se havia presença de deglutições múltiplas, escape oral posterior, resíduos faríngeos em região de valéculas e/ou seios piriformes de acordo com a escala Yale Pharyngeal Residue Severity Rating Scale (YPRSRS)(1313 Neubauer PD, Rademaker AW, Leder SB. The yale pharyngeal residue severity rating scale: an anatomically defined and image-based tool. Dysphagia. 2015;30(5):521-8. http://doi.org/10.1007/s00455-015-9631-4. PMid:26050238.
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) (1 - Nenhum, 2 - Vestígio faríngeo, 3 - Resíduo leve, 4 - Resíduo moderado, 5 - Resíduo grave), além da presença de penetração laríngea e aspiração laringotraqueal. O resíduo foi classificado na maior ocorrência de gravidade após as três deglutições de cada consistência alimentar. Foram considerados para a análise, a partir da primeira oferta, os seguintes parâmetros: deglutições múltiplas a presença de mais de duas tentativas de deglutir a mesma oferta; escape oral posterior a presença do escape prematuro do alimento em região de hipofaringe antes de desencadear a deglutição; resíduo faríngeo a presença residual de alimento corada em região de valéculas e/ou seios piriformes a partir da primeira oferta; penetração laríngea a presença residual de alimento corado em região de pregas vocais; e aspiração laringotraqueal a passagem residual de alimento corado abaixo das pregas vocais. Toda análise aconteceu em tempo real e as imagens foram armazenadas em um computador do próprio ambulatório, para serem revisadas quantas vezes os profissionais julgassem necessárias após a realização do exame.

Para análise dos dados, foi utilizada a estatística descritiva e inferencial por meio de medidas de tendência central, proporções e frequências. Para análise das variáveis do estudo, foi utilizado o teste Kolmogorov-Smirnov para verificar a distribuição normal nas variáveis quantitativas, de modo que, para as variáveis “avaliação fonoaudiológica” e “sinais faríngeos videoendoscópios”, aplicou-se o teste Qui-quadrado de Pearson ou teste Exato de Fisher, a depender da frequência esperada por cada célula ser superior ou igual a 5. A gravidade dos resíduos foi dicotomizada em “vestígio a resíduo leve” (YPRSRS 2-3) e “resíduo moderado a grave” (YPRSRS 4-5) para comparação intragrupos, em nível de significância de 0,05.

RESULTADOS

Foram analisados 134 exames da VED, onde a amostra foi estratificada em dois grupos de acordo com o diagnóstico de AVE. Sendo, 44 indivíduos disfágicos com AVE e 90 indivíduos disfágicos sem o diagnóstico. Na Tabela 1 está representada a distribuição das variáveis e a comparação dos achados da avaliação fonoaudiológica prévia entre os grupos. Houve predomínio do gênero masculino, mobilidade de língua reduzida, força de língua reduzida e o tempo máximo de fonação reduzido no grupo de disfágicos com AVE em comparação ao grupo sem AVE.

Tabela 1
Distribuição das variáveis e comparação dos achados fonoaudiológicos entre os grupos

A Tabela 2 apresenta os achados do exame da VED, com relação à ocorrência de deglutições múltiplas, escape oral posterior, resíduos faríngeos, penetração laríngea e aspiração laringotraqueal, em diferentes consistências alimentares entre os grupos. Os resultados sugerem que o grupo de disfágicos com AVE apresentou maior ocorrência de resíduos faríngeos, penetração laríngea e aspiração laringotraqueal em todas as consistências alimentares avaliadas, em comparação ao grupo de disfágicos sem AVE. Com relação à deglutições múltiplas, houve diferença significativa em três consistências, sendo elas em líquido ralo (nível 0), líquido extremamente espessado (nível 4) e sólido normal (nível 7). Enquanto que, não houve diferença com relação ao escape oral posterior entre os grupos em todas as consistências avaliadas. Nota-se que o grupo com AVE foi o único que apresentou ocorrências de aspiração laringotraqueal em líquidos espessados e sólido.

Tabela 2
Associação dos sinais faríngeos em diferentes consistências alimentares entre os grupos

A Tabela 3 apresenta a gravidade das ocorrências dos resíduos faríngeos entre os grupos. Na análise intragrupo, houve mais ocorrências da gravidade de resíduos moderado a grave (YPRSRS 4-5) no grupo de indivíduos disfágicos com AVE, enquanto que, no grupo de disfágicos sem AVE, houve mais ocorrências da gravidade de vestígio faríngeo a resíduo leve (YPRSRS 2-3) em todas as consistências alimentares avaliadas. Essa diferença foi significativa nas consistências de líquido ralo (nível 0) e líquido levemente espessado (nível 2) no grupo com AVE.

Tabela 3
Associação entre a gravidade dos resíduos faríngeos em diferentes consistências alimentares entre os grupos

DISCUSSÃO

Foi possível verificar que indivíduos disfágicos com diagnóstico de AVE apresentaram diferença significativa entre a presença de resíduos faríngeos, penetração laríngea e aspiração laringotraqueal, independentemente da consistência avaliada, em comparação aos indivíduos disfágicos sem o diagnóstico. Em relação à gravidade dos resíduos faríngeos, o grupo com AVE apresentou maior frequência de resíduos de grau moderado a grave (YPRSRS 4-5), em comparação ao outro grupo, que apresentou maior frequência na gravidade de vestígio a resíduo leve (YPRSRS 2-3).

Sabe-se que os indivíduos com disfagia orofaríngea neurogênica apresentam resíduos faríngeos após a deglutição, pois essa alteração está relacionada com os distúrbios neuromusculares que envolvem o processo de eficiência da biomecânica da deglutição(1010 Clarke DJ. The role of multidisciplinary team care in stroke rehabilitation. Prog Neurol Psychiatry. 2013;17(4):5-8. http://doi.org/10.1002/pnp.288.
http://doi.org/10.1002/pnp.288...

11 Liaw MY, Hsu CH, Leong CP, Liao CY, Wang LY, Lu CH, et al. Respiratory muscle training in stroke patients with respiratory muscle weakness, dysphagia, and dysarthria – a prospective randomized trial. Medicine (Baltimore). 2020;99(10):e19337. http://doi.org/10.1097/MD.0000000000019337. PMid:32150072.
http://doi.org/10.1097/MD.00000000000193...
-1212 Cichero JAY, Lam P, Steele CM, Hanson B, Chen J, Dantas RO, et al. Development of international terminology and definitions for texture-modified foods and thickened fluids used in dysphagia management: the IDDSI framework. Dysphagia. 2017;32(2):293-314. http://doi.org/10.1007/s00455-016-9758-y. PMid:27913916.
http://doi.org/10.1007/s00455-016-9758-y...
). Porém, ainda são poucos estudos que comparam a presença e a gravidade dos resíduos faríngeos com outros indivíduos disfágicos sem o diagnóstico, em diferentes consistências alimentares(1414 de Souza GAD, da Silva RG, Cola PC, Onofri SMM. Resíduos faríngeos nas disfagias orofaríngeas neurogênicas. CoDAS. 2019;31(6):e20180160. http://doi.org/10.1590/2317-1782/20192018160.
http://doi.org/10.1590/2317-1782/2019201...

15 Santos RRD, Sales AVMN, Cola PC, Ribeiro PW, Jorge AG, Peres FM, et al. Associação entre presença de resíduos faríngeos e escape oral posterior e a ocorrência de penetração e aspiração no Acidente Vascular Encefálico. CoDAS. 2014;26(3):231-4. http://doi.org/10.1590/2317-1782/201420140476. PMid:25118920.
http://doi.org/10.1590/2317-1782/2014201...
-1616 Sabry A, Abou-Elsaad T. Pharyngeal residue severity and aspiration risk in stroke patient using fiber-optic endoscopic evaluation of swallowing. Folia Phoniatr Logop. 2023;75(3):158-63. http://doi.org/10.1159/000528204. PMid:36412739.
http://doi.org/10.1159/000528204...
). Essas informações tornam-se importantes para compreender a fisiopatologia desses pacientes e o processo de reabilitação da função de deglutição, tendo em vista que há evidências que os resíduos faríngeos na disfagia pós-AVE são preditivos e persistentes durante toda sua recuperação(1717 D’Netto P, Rumbach A, Dunn K, Finch E. Clinical predictors of dysphagia recovery after stroke: a systematic review. Dysphagia. 2023;38(1):1-22. http://doi.org/10.1007/s00455-022-10443-3. PMid:35445366.
http://doi.org/10.1007/s00455-022-10443-...
).

Com relação à avaliação fonoaudiológica prévia, mesmo que avaliado de forma subjetiva, a força e mobilidade de língua são medidas fundamentais para entender o processo de formação e transporte do bolo alimentar em cavidade oral. Por isso, há evidências que as lesões provenientes do AVE frequentemente resultam na fraqueza e descoordenação da língua, além de algumas relações com aspectos no processamento oral prejudicados(1818 Gittler M, Davis AM. Guidelines for Adult Stroke Rehabilitation and Recovery. JAMA. 2018;319(8):820-1. http://doi.org/10.1001/jama.2017.22036. PMid:29486016.
http://doi.org/10.1001/jama.2017.22036...

19 Daniels SK, Brailey K, Priestly DH, Herrington LR, Weisberg LA, Foundas AL. Aspiration in patients with acute stroke. Arch Phys Med Rehabil. 1998;79(1):14-9. http://doi.org/10.1016/S0003-9993(98)90200-3. PMid:9440410.
http://doi.org/10.1016/S0003-9993(98)902...
-2020 Cullins MJ, Connor NP. Reduced tongue force and functional swallowing changes in a rat model of post stroke dysphagia. Brain Res. 2019;1717:160-6. http://doi.org/10.1016/j.brainres.2019.04.023. PMid:31022397.
http://doi.org/10.1016/j.brainres.2019.0...
). Em nosso estudo, os resultados corroboram com a premissa da fraqueza lingual, visto que o grupo de disfágicos com AVE apresentou diferença significativa na mobilidade e força de língua, que em sua maioria estavam reduzidos, em comparação ao outro grupo. Assim, entende-se que os pacientes disfágicos pós-AVE desenvolvem maiores comprometimentos nos movimentos ântero-posteriores necessários para o transporte do bolo alimentar na cavidade oral, além da diminuição na força de retropropulsão desse alimento para a fase faríngea(2121 Hirota N, Konaka K, Ono T, Tamine K, Kondo J, Hori K, et al. Reduced tongue pressure against the hard palate on the paralyzed side during swallowing predicts dysphagia in patients with acute stroke. Stroke. 2010;41(12):2982-4. http://doi.org/10.1161/STROKEAHA.110.594960. PMid:21071718.
http://doi.org/10.1161/STROKEAHA.110.594...
,2222 Ono T, Kumakura I, Arimoto M, Hori K, Dong J, Iwata H, et al. Influence of bite force and tongue pressure on oro-pharyngeal residue in the elderly. Gerodontology. 2007;24(3):143-50. http://doi.org/10.1111/j.1741-2358.2007.00172.x. PMid:17696891.
http://doi.org/10.1111/j.1741-2358.2007....
). Isso ocorre devido os músculos intrínsecos da língua sofrerem redução da amplitude dos intervalos potenciais de ação motora, evidenciados pela abordagem eletrofisiológica(2323 Umay EK, Yilmaz V, Gundogdu I, Ozturk E, Gurcay E, Karaahmet O, et al. What happens to swallowing muscles after stroke?: A prospective randomized controlled electrophysiological study. Neurol India. 2019;67(6):1459-66. http://doi.org/10.4103/0028-3886.273645. PMid:31857535.
http://doi.org/10.4103/0028-3886.273645...
), o que resulta na diminuição dos movimentos da língua.

O resíduo faríngeo foi um achado importante no estudo, tendo em vista que houve diferença significativa na ocorrência e na gravidade dos resíduos faríngeos em todas as consistências alimentares entre os grupos. No grupo com AVE, houve maior ocorrência de resíduos na consistência do líquido extremamente espessado (nível 4) em grau moderado a grave, o que corrobora para a compreensão de que esses pacientes realizam deglutições ineficientes. Ademais, a classificação da gravidade dos resíduos nessa população ainda é divergente entre os estudos, visto que há evidências que relatam a presença de resíduos em grau leve(1414 de Souza GAD, da Silva RG, Cola PC, Onofri SMM. Resíduos faríngeos nas disfagias orofaríngeas neurogênicas. CoDAS. 2019;31(6):e20180160. http://doi.org/10.1590/2317-1782/20192018160.
http://doi.org/10.1590/2317-1782/2019201...
,2424 Eisenhuber E, Schima W, Schober E, Pokieser P, Stadler A, Scharitzer M, et al. Videofluoroscopic assessment of patients with dysphagia. AJR Am J Roentgenol. 2002;178(2):393-8. http://doi.org/10.2214/ajr.178.2.1780393. PMid:11804901.
http://doi.org/10.2214/ajr.178.2.1780393...
) e em outros em grau moderado a grave(2525 Wilmskoetter J, Bonilha L, Martin-Harris B, Elm JJ, Horn J, Bonilha HS. Mapping acute lesion locations to physiological swallow impairments after stroke. Neuroimage Clin. 2019;22:101685. http://doi.org/10.1016/j.nicl.2019.101685. PMid:30711683.
http://doi.org/10.1016/j.nicl.2019.10168...
,2626 Sun F, Qiao J, Huang X, He Z, Dou Z. Characteristics of post-stroke dysphagia: a retrospective study based on FEES. Brain Behav. 2023;13(8):e3161. http://doi.org/10.1002/brb3.3161. PMid:37475645.
http://doi.org/10.1002/brb3.3161...
). Essa diferença baseia-se principalmente nas características individuais da fase da doença e localização da lesão encefálica que o indivíduo sofreu, pois, há indícios de que lesões em áreas específicas do giro supramarginal, giro angular, giro pós-central e regiões corticais parieto-temporais possuem associações com maior presença de resíduos faríngeos(2626 Sun F, Qiao J, Huang X, He Z, Dou Z. Characteristics of post-stroke dysphagia: a retrospective study based on FEES. Brain Behav. 2023;13(8):e3161. http://doi.org/10.1002/brb3.3161. PMid:37475645.
http://doi.org/10.1002/brb3.3161...
), o que indica áreas envolvidas na gravidade da disfagia nesses indivíduos.

Outro aspecto descrito na literatura relacionado aos resíduos faríngeos nessa população é a força faríngea, desencadeada pelo complexo hiolingual de elevação e abertura do esfíncter esofágico superior, descrita como fator preponderante sobre a ocorrência de resíduos faríngeos em valéculas e/ou seios piriformes(2727 Yang H, Yi Y, Han Y, Kim HJ. Characteristics of cricopharyngeal dysphagia after ischemic stroke. Ann Rehabil Med. 2018;42(2):204-12. http://doi.org/10.5535/arm.2018.42.2.204. PMid:29765873.
http://doi.org/10.5535/arm.2018.42.2.204...
). Visto que, mesmo que haja ineficiência na abertura do esfíncter esofágico superior, essa dificuldade poderia ser superada pela pressão de retropropulsão do bolo alimentar pela língua e pela excursão hiolaríngea(2828 Robbins J, Kays SA, Gangnon RE, Hind JA, Hewitt AL, Gentry LR, et al. The effects of lingual exercise in stroke patients with dysphagia. Arch Phys Med Rehabil. 2007;88(2):150-8. http://doi.org/10.1016/j.apmr.2006.11.002. PMid:17270511.
http://doi.org/10.1016/j.apmr.2006.11.00...
).

Ao que se refere ao escape oral posterior, esse foi um achado videoendoscópico que não houve diferença significativa entre os grupos, apesar do grupo com AVE apresentar cerca de 56,8% de ocorrências na consistência de líquido ralo (nível 0). Essa característica é pouco descrita nas pesquisas que avaliam a função de deglutição pós-AVE, mas que são consequências dos mecanismos de atraso na resposta faríngea, assim como das dificuldades em mobilidade e força de língua para conter o bolo alimentar em cavidade oral, evidenciado na avaliação fonoaudiológica.

Com relação aos resultados de penetração laríngea e aspiração laringotraqueal, nota-se que houve diferença significativa entre os grupos, independente da consistência avaliada, na qual, foi observado que pacientes com disfagia pós-AVE apresentaram maior frequência dessas ocorrências, o que compromete o mecanismo de segurança da deglutição(2929 Kim DY, Park HS, Park SW, Kim JH. The impact of dysphagia on quality of life in stroke patients. Medicine (Baltimore). 2020;99(34):e21795. http://doi.org/10.1097/MD.0000000000021795. PMid:32846813.
http://doi.org/10.1097/MD.00000000000217...
). Na avaliação instrumental, há evidências de que esse achado relaciona-se diretamente com a gravidade dos resíduos após a deglutição, em que, a ocorrência de resíduos mais graves, seja em valéculas ou seios piriformes, contribuem para maiores chances de penetração e aspiração laringotraqueal nessa população, devido o déficit no gerenciamento de expulsão desse material na região laríngea(3030 Sabry A, Abou-Elsaad T. Pharyngeal residue severity and aspiration risk in stroke patient using fiber-optic endoscopic evaluation of swallowing. Folia Phoniatr Logop. 2023;75(3):158-63. http://doi.org/10.1159/000528204. PMid:36412739.
http://doi.org/10.1159/000528204...
).

A tosse sob comando foi um dos parâmetros subjetivos avaliados antes do exame instrumental nesta pesquisa, na qual, não houve diferença entre os grupos. Apesar de não encontrar associação, esse parâmetro torna-se importante de ser pesquisado, visto que em alguns casos de AVE, poderá ocorrer sobreposição de lesões associadas a tosse fraca e até mesmo a diminuição da sensibilidade faríngea, o que piora o prognóstico de disfagia orofaríngea(3131 Lee KB, Lim SH, Park GY, Im S. Effect of brain lesions on voluntary cough in patients with supratentorial stroke: an observational study. Brain Sci. 2020;10(9):627. http://doi.org/10.3390/brainsci10090627. PMid:32927900.
http://doi.org/10.3390/brainsci10090627...
). Embora os mecanismos de deglutição e tosse sejam independentes, ambas são ações motoras complexas e coordenadas que reconfiguram o padrão laríngeo do indivíduo(3131 Lee KB, Lim SH, Park GY, Im S. Effect of brain lesions on voluntary cough in patients with supratentorial stroke: an observational study. Brain Sci. 2020;10(9):627. http://doi.org/10.3390/brainsci10090627. PMid:32927900.
http://doi.org/10.3390/brainsci10090627...
).

O tempo máximo de fonação é uma medida confiável para avaliação vocal, relacionada às medidas multimodais perceptivas e objetivas da gravidade da disfonia e, consequentemente, da gravidade da disfagia(3232 Choi MK, Park EJ, Yoo SD. Quantitative measurement of dysphonia severity in patients with stroke with unilateral vocal cord palsy. Brain Neurorehabil. 2022;15(3):e29. http://doi.org/10.12786/bn.2022.15.e29. PMid: 36742090.
http://doi.org/10.12786/bn.2022.15.e29...
,3333 Lim JY, Yoo YH, Park CH, Joa KL, Jung HY. Use of the maximal phonation test for the screening of dysphagia in stroke patients: a preliminary study. Eur J Phys Rehabil Med. 2020;56(1):41-6. http://doi.org/10.23736/S1973-9087.19.05818-0. PMid:31797658.
http://doi.org/10.23736/S1973-9087.19.05...
). Em nosso estudo, houve diferença significativa entre os grupos, indicando que 59,1% dos indivíduos disfágicos pós-AVE em fase crônica tiveram o tempo máximo de fonação reduzido com referência ao seu gênero, o que sugere redução da coaptação das pregas vocais durante a fonação. Por ser um parâmetro rápido e fácil de ser coletado na prática clínica, confere ao fonoaudiólogo informações importantes quanto às possíveis alterações de fala e a proteção de vias aéreas inferiores durante a deglutição, além de ser um parâmetro pouco pesquisado nos pacientes disfágicos que aparentemente não possuem outras alterações na fala(3131 Lee KB, Lim SH, Park GY, Im S. Effect of brain lesions on voluntary cough in patients with supratentorial stroke: an observational study. Brain Sci. 2020;10(9):627. http://doi.org/10.3390/brainsci10090627. PMid:32927900.
http://doi.org/10.3390/brainsci10090627...
). Visto que os resíduos faríngeos são frequentes, a coaptação glótica e o reflexo de tosse são funções que devem ser reabilitadas para desencadear com eficiência a reação de proteção de vias aéreas inferiores e a limpeza faríngea, de modo que evitasse as aspirações silenciosas que são comuns nos pacientes pós-AVE(2626 Sun F, Qiao J, Huang X, He Z, Dou Z. Characteristics of post-stroke dysphagia: a retrospective study based on FEES. Brain Behav. 2023;13(8):e3161. http://doi.org/10.1002/brb3.3161. PMid:37475645.
http://doi.org/10.1002/brb3.3161...
).

Com relação às limitações do estudo, podemos citar o tipo do estudo não permitir causa e efeito, a causa idiopática de disfagia no grupo sem o AVE e que não foi possível diferenciar o mecanismo fisiológico da lesão, ou seja, a localização topográfica que prevaleceu no grupo com AVE. Sabe-se que a definição é importante para definir o prognóstico, reincidência e tratamento com medidas específicas, porém, é fato que todos os pacientes apresentavam diagnóstico de AVE do tipo isquêmico e em fase crônica da doença. Os resultados do presente estudo são capazes de fornecer uma caracterização objetiva e subjetiva das características da fisiopatologia envolvida na fase oral e faríngea nos pacientes disfágicos pós-AVE, em comparação aos pacientes disfágicos sem o comprometimento, de modo que seja possível levantar novas hipóteses com relação aos efeitos de novos programas terapêuticos na reabilitação fonoaudiológica.

CONCLUSÃO

Os indivíduos disfágicos com diagnóstico de acidente vascular encefálico apresentaram diferença nos sinais videoendoscópios de resíduos faríngeos, penetração laríngea e aspiração laringotraqueal independentemente da consistência alimentar avaliada, em comparação aos indivíduos disfágicos sem o diagnóstico. Assim como houve diferença no achado da deglutição múltipla apenas nas consistências de líquido ralo, líquido extremamente espessado e sólido.

  • Trabalho realizado no Departamento de Fonoaudiologia, Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN - Natal (RN), Brasil.
  • Fonte de financiamento: Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Brasil (CAPES) – Código de Financiamento 001.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    19 Ago 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    24 Set 2023
  • Aceito
    12 Mar 2024
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