Descrição anatômica da língua do mão-pelada (Procyon cancrivorus)

Anatomical description of the crab-eating raccoon tongue - (Procyon cancrivorus)

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NOTA

BIOLOGIA

Descrição anatômica da língua do mão-pelada (Procyon cancrivorus)

Anatomical description of the crab-eating raccoon tongue - (Procyon cancrivorus)

Aline Francielle Corrêa^I; Carlos Eduardo Oliveira Sestari^I; Gregório Corrêa Guimarães^II; Fabrício Singaretti de Oliveira^I,1

^IDepartamento de Medicina Veterinária, Universidade Estadual de Maringá (UEM), 87501-970, CP 65, Campus Umuarama, Umuarama, PR, Brasil. E-mail: [e-mail]

^IIDepartamento de Medicina Veterinária, Universidade Federal de Lavras (UFLA), Campus Universitário, Lavras, MG, Brasil

RESUMO

O mão-pelada é um mamífero da família Procyonidae com poucas descrições anatômicas detalhadas a seu respeito. O objetivo deste trabalho foi descrever, anatomicamente, a língua do mão-pelada, proporcionando base para futuros estudos clínico-cirúrgicos, além de contribuir com a anatomia comparada de carnívoros. Foram utilizadas as línguas de dois exemplares de mãos-pelada, fixados em formaldeído a 10%. A língua do mão-pelada possui, em média, 9,5cm de comprimento, é alongada e apresenta um sulco mediano pouco evidente. Possui lissa, quatro pares de papilas valadas na raiz lingual e um par no corpo, várias papilas fungiformes e cônicas no corpo e raiz e papilas filiformes pouco desenvolvidas e presentes principalmente no ápice. Outros três pares de papilas, sugestivas de serem papilas valadas, foram observadas na região lateral da base lingual. A língua do mão-pelada possui algumas características anatômicas similares às do cão, como a presença da lissa e a disposição das papilas, com exceção das folhadas, as quais não foram observadas.

Palavras-chave: lingual, animal selvagem, anatomia.

ABSTRACT

The crab-eating raccoon is a mammal of the Procyonidae family of rare anatomical descriptions about it. This paper aimed to anatomically describe the crab-eating raccoon's tongue, providing data on future clinical and surgical studies, besides contributing to the carnivores compared anatomy. Two tongues were used after formaldehyde fixation. Crab-eating raccoon's tongue is, in average, 9.5cm in length; it is elongated and with a less evident median sulcus. It presents lyssa, four pairs of vallate papillae in the root and one pair in the body, several fungiform and conical papillae in the body and root and less developed filiform papillae in the apex, mainly. Other three papillae pairs, taken as vallates, were observed in the lateral area of the tongue root. The crab-eating raccoon's tongue presents some anatomical aspects which are similar to the dog's, as the lyssa and the distribution of papilae, but foliates, which were not observed.

Key words: tongue, wild animal, anatomia.

O mão-pelada é um mamífero da família Procyonidae, de ampla distribuição geográfica, que habita todos os biomas nacionais, e um dos menos estudados carnívoros brasileiros (MORATO et al., 2004). O comprimento corporal varia entre 40 e 100cm e possui coloração em máscara ao redor dos olhos (REIS et al., 2006). As mãos são desprovidas de pêlos, característica que lhe conferiu o nome popular pelo qual é conhecido no Brasil como mão-pelada (ROCHA et al., 2004; CUBAS et al., 2006).

A língua dos mamíferos é um importante órgão tátil que contribui na apreensão do alimento. Pode variar quanto à forma e tamanho, apresentando uma diversidade morfológica fortemente influenciada por hábitos alimentares (DORAN, 1975; DYCE et al., 2010).

A superfície dorsal da língua é marcada pela presença de papilas (EVANS & DE LAHUNTA, 2001; DYCE et al., 2010). As filiformes e cônicas são papilas mecânicas e as fungiformes, folhadas e valadas são gustativas (DORAN, 1975; OJIMA, 2001; DYCE et al., 2010).

O objetivo deste trabalho foi descrever, anatomicamente, a língua do mão-pelada, proporcionando base para futuros estudos clínico-cirúrgicos. Pretendeu-se, também, contribuir com a anatomia comparada de carnívoros, principalmente com a dos domésticos, os quais apresentam descrições anatômicas muito mais completas, quando comparados às espécies selvagens.

Foram utilizadas as línguas de dois exemplares de mãos-pelada, adultos, machos, mortos em rodovias da região e trazidos pela Polícia Ambiental do Município de Umuarama, PR, para o laboratório de Anatomia Animal da Universidade Estadual de Maringá (UEM) - Campus Umuarama, PR.

Pelo longo período decorrido após o óbito, os animais foram fixados por meio de injeções intra-musculares e intra-viscerais com solução de formaldeído a 10%, e mantidos nesta solução por uma semana. Foram lavados em água corrente por 24h para posterior observação com auxílio de lupa esterioscópica, dissecação e fotodocumentação.

A língua do mão-pelada possui, em média, 9,5cm de comprimento. É alongada e apresenta um sulco mediano pouco evidente e melhor observado em lupa esterioscópica. Ocupa a maior parte da cavidade oral e também se estende na orofaringe, possuindo raiz e corpo fixos e ápice livre, como descrito nos carnívoros domésticos (EVANS & DE LAHUNTA, 2001; DYCE et al., 2010; KÖNIG et al., 2004). Possui a lissa ventralmente como um cordão mediano no ápice, como os cães (DYCE et al., 2010; BESOLUK & EKEN, 2006) e gatos (ELLENPORT, 1986; SCHALLER, 1999; KÖNIG et al., 2004; BESOLUK & EKEN, 2006); entretanto, o sulco mediano é pouco evidente, diferente do observado nos cães (DYCE et al., 2010; KÖNIG et al., 2004) ou outros carnívoros (ELLENPORT, 1986; SCHALLER, 1999). É unida rostralmente ao assoalho da cavidade oral por uma prega mediana ventral de mucosas, o frênulo lingual, como nos carnívoros domésticos (EVANS & DE LAHUNTA, 2001; DYCE et al., 2010; KÖNIG et al., 2004).

O mão-pelada possui quatro pares de papilas valadas na raiz e um par no corpo lingual, semelhantemente aos quatro a seis pares presentes no cão (BRUNI & ZIMMERL, 1950; SCHWARZE & SCHRÖDER, 1970; SISSON & GROSSMAN, 1979; EVANS & DE LAHUNTA, 2001), aos cinco pares na pantera (Panthera pardus), e diferentemente das sete ou oito unidades no urso negro asiático (Selenarctos thibetanus) (EMURA et al., 2001), das cinco a nove unidades no leão (Panthera leo) (EMURA et al., 2003) e dos dois a quatro pares da raposa-do-campo (Dusicyon vetulus) (MASUKO et al., 2004). Para gatos, a quantidade de papilas valadas é de quatro a seis, quatro a oito, ou 5,64±1,13 pares, como descrito, respectivamente, por CROUCH (1969) e KOBAYASHI et al. (1988), OJIMA et al. (1997) e OJIMA (2001), e GUIMARÃES et al., (2007), similarmente ao descrito no mão-pelada, e localizando-se próximo à junção do corpo com a raiz (ELLENPORT, 1986), igualmente ao observado no tigre (Panthera tigris altaica) (EMURA et al., 2004). As papilas valadas do mão-pelada são mais numerosas que as cinco papilas valadas descritas no cachorro-vinagre (Speothos venaticus) (EMURA et al., 2000).

As papilas valadas são dispostas na forma de "V", com a extremidade aguda direcionada à base lingual, sendo maiores que as demais papilas e com superfície circular rodeada por sulco, como descrito em cães e gatos (BRUNI & ZIMMERL, 1950; HUDSON & HAMILTON, 1993; EVANS & DE LAHUNTA, 2001; OJIMA, 2001). Outros três pares de papilas, ovaladas e envoltas por sulco, sugestivas de serem papilas valadas conforme descrição na literatura (KRAUSE & CUTTS, 1982; CHAMORRO et al. 1986) foram observadas na região lateral da base lingual, em região onde são encontradas as papilas folhadas dos carnívoros domésticos (EVANS & DE LAHUNTA, 2001; DYCE et al., 2010; KÖNIG et al., 2004) e as da raposa-do-campo (MASUKO et al., 2004).

As papilas fungiformes são arredondadas e com superfície central lisa, em menor quantidade e localizam-se entre as papilas filiformes, espalhadas caudalmente e entre as papilas cônicas, como no cão (EVANS & DE LAHUNTA, 2001). As filiformes são presentes no corpo e ápice, como no cão (BRUNI & ZIMMERL, 1950; EVANS & DE LAHUNTA, 2001) e na raposa-do-campo (MASUKO et al., 2004) (Figura 1); a língua possui moderada aspereza, conferida principalmente pelas papilas cônicas, similarmente ao descrito em carnívoros domésticos (KÖNIG et al., 2004).

As papilas cônicas, com extremidade pontiaguda apontando caudalmente, foram encontradas na raiz e corpo da língua, diferentemente do cão, que apresenta esse tipo de papila apenas na raiz (ELLENPORT, 1986; EVANS & DE LAHUNTA, 2001).

Não foram observadas papilas folhadas, diferentemente do observado no cão (ELLENPORT, 1986; EVANS & DE LAHUNTA, 2001) e na raposa-do-campo (MASUKO et al., 2004) e similarmente ao descrito no tigre (EMURA et al., 2004).

Concluiu-se que a língua do mão-pelada é similar à do cão em algumas características anatômicas, como a presença da lissa e a disposição das papilas, com exceção das folhadas, as quais não foram observadas.

Recebido para publicação 24.02.11

Aprovado em 12.05.12

Devolvido pelo autor 18.07.12

CR-4843

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1

Autor para correspondência.

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  04 Out 2012
• Data do Fascículo
  Out 2012

Histórico

• Recebido
  24 Fev 2011
• Aceito
  12 Maio 2012