Resumos
O desenvolvimento de um pensamento social em saúde, recente no Brasil, está relacionado com a constituição da Saúde Coletiva e da Associação Brasileira de Pós-graduação em Saúde Coletiva (ABRASCO). Com a criação da ABRASCO, constituiu-se também a área de Ciências Sociais. Este artigo apresenta os principais aspectos referentes à constituição e institucionalização das Ciências Sociais em Saúde na ABRASCO, com base nos depoimentos de seus presidentes e coordenadores das Comissões de Ciências Sociais no período de 1995 a 2011. Os depoimentos possibilitaram captar e analisar o contexto de constituição desse campo, sua relevância e trajetória no conjunto da Saúde Coletiva, tendo sido agrupados em cinco eixos de análise: (1) o desenvolvimento das Ciências Sociais e Humanas em Saúde; (2) a Saúde Coletiva e a interdisciplinaridade; (3) a contribuição das Ciências Sociais à Saúde Coletiva; (4) as Ciências Sociais em Saúde e as Ciências Sociais “tradicionais”; e (5) os desafios para as Ciências Sociais e Humanas em Saúde.
Ciências Sociais; Ciências da Saúde; Domínios Científicos
The development of recent social thinking in health in Brazil is associated with the establishment of the Public Health field and the Brazilian Association of Graduate Studies in Public Health (ABRASCO). The area of Social Sciences in Health was created together with the founding of ABRASCO. This article presents the main aspects related to the establishment and institutionalization of Social Sciences in Health in ABRASCO, based on interviews with its presidents and the coordinators of the Social Sciences Committees from 1995 to 2011. The interviews allowed capturing and analyzing the context in which this field was established and its relevance and history in Public Health as a whole, grouped in five analytical categories: (1) the development of Social Sciences and the Humanities in Health; (2) interdisciplinarity in Public Health; (3) the contribution of Social Sciences to Public Health; (4) Social Sciences in Health and the “traditional” Social Sciences; and (5) challenges for Social Sciences and the Humanities in Health.
Social Sciences; Health Sciences; Scientific Domains
El pensamiento social de la salud en Brasil está asociado a la creación de la Asociación Brasileña de Postgrado en Salud Pública (ABRASCO), al establecerse un área de especialización en el ámbito de las Ciencias Sociales. Este artículo destaca los principales aspectos relacionados con el establecimiento y la institucionalización de las Ciencias Sociales en salud dentro de ABRASCO, basándose en el testimonio de sus funcionarios y líderes durante el período 1994-2011, así como en los coordinadores de las comisiones de ciencias sociales ABRASCO durante el mismo período. Se recogieron testimonios autorizados y se analizó el contexto de la constitución de estos estudios, su pertinencia y evolución a lo largo de la trayectoria en salud de la comunidad. El contenido de las entrevistas fue agrupado en cinco grandes áreas de análisis: (1) desarrollo de las Ciencias Sociales y Humanidades dentro del ámbito de la salud; (2) salud pública y su interdisciplinariedad; 3) contribución de las Ciencias Sociales a la salud pública; (4) Ciencias Sociales en salud y las Ciencias Sociales “tradicionales”, y (5) desafíos de las Ciencias Sociales y Humanidades dentro del ámbito de la salud.
Ciencias Sociales; Ciencias de la Salud; Dominios Científicos
Introdução
O pensamento social em saúde estabeleceu-se de diferentes formas nos mais diversos países, sempre relacionado às problemáticas sociais, econômicas, políticas e culturais de cada época e contextos históricos específicos, com expoentes nos Estados Unidos e na Europa, principalmente 1,2. Nesse sentido, discutir a trajetória desse campo no Brasil expressa, em consonância com a situação internacional, as peculiaridades do contexto sócio-histórico brasileiro e latino-americano 3,4,5.
No Brasil, configura-se um pensamento social em saúde com a Primeira República, oligárquica, em torno da questão nacional, e que deu origem às políticas de proteção social da Era Vargas. Tais configurações desdobram-se, na história brasileira, perpassando os períodos desenvolvimentista e democrático, sendo reconvertidas no período ditatorial 6. Entretanto, no processo da redemocratização do país, há o recrudescimento do pensamento social em saúde que se estabelece como campo específico e institucionalizado 7. Ganha configuração no bojo da Saúde Coletiva, com suas origens nos movimentos da Medicina Social na América Latina entre os anos de 1950 e 1960 e da Reforma Sanitária no início dos anos de 1980 1,8. A formalização e a incorporação dos conteúdos de ciências sociais nos cursos de medicina 10 propulsionaram essa nova configuração, marcando o pensamento em saúde que se expressará no campo da Saúde Coletiva.
O campo da Saúde Coletiva caracteriza-se pela articulação de conhecimentos e práticas, ancoradas em três áreas disciplinares: Epidemiologia; Política, Planejamento e Gestão; e Ciências Sociais e Humanas em Saúde. O termo Saúde Coletiva é genuinamente brasileiro e toma o coletivo como produto das relações sociais em determinado contexto sócio-histórico; também identifica os movimentos de renovação da saúde pública institucionalizada como campo científico, de práticas e profissional, além de evocar as diferentes coletividades para o entendimento do que é saúde como estado e como objeto de estudo 11,12,13. Essas formulações expressam uma contribuição fundamental das ciências sociais 12,14.
Para Paim & Almeida Filho 13, os conceitos que a estruturam podem ser resumidos nas ideias de que a saúde está articulada à estrutura social em seus aspectos históricos, econômicos e políticos-ideológicos; as ações de saúde são prática social por excelência; o objeto da Saúde Coletiva se constrói nos limites da relação biológico-social, revelando seu caráter interdisciplinar; e o conhecimento está comprometido com a transformação da realidade. Nesse sentido, a opção pelo termo Saúde Coletiva expressa o movimento de elaboração teórico-prático que se institucionaliza por meio da Associação Brasileira de Pós-graduação em Saúde Coletiva (ABRASCO), criada em 1979.
Com a criação da ABRASCO, constituiu-se também a área de Ciências Sociais 3. Certamente, esse foi um espaço privilegiado de pensamento e reflexão sobre as práticas e os saberes da Reforma Sanitária brasileira, um movimento de caráter político-institucional e científico na história recente da saúde no Brasil 8,9. A Reforma Sanitária, expressão que se refere a um conjunto de ideias sobre as mudanças e transformações necessárias na área da saúde, foi um movimento social pautado na luta contra a ditadura militar no Brasil (1964-1985), direcionado à democracia, ao amplo acesso aos serviços de saúde e preocupada com a exclusão da participação dos trabalhadores e técnicos no processo decisório das políticas de saúde, que eram tomadas exclusivamente pelos governos autoritários 12. Naquele contexto, o diálogo interdisciplinar e a multiplicidade metodológica consistiram nos aspectos relevantes e estruturantes desse vasto campo de conhecimento que se tornou a Saúde Coletiva 12,16. Mas é somente no ano de 1994 que, institucionalmente, a ABRASCO estrutura a área de ciências sociais, por meio da Comissão de Ciências Sociais em Saúde e da iniciativa de organização do Congresso Brasileiro de Ciências Sociais em Saúde.
Nos dias de hoje, é evidente a importância das ciências sociais para a consolidação da Saúde Coletiva no Brasil. Reafirma-se, a partir dos conhecimentos trazidos por essas ciências, que o social é parte da produção fisiopatológica e epidemiológica dos processos saúde-doença, das práticas de atenção e cuidado e das estratégias políticas de atuação, além de incorporarem as questões de natureza subjetiva e os processos e relações sociais em nível microssociológico 17.
Reconhecido como subcampo estruturante do campo da Saúde Coletiva, as ciências sociais representam, hoje, no âmbito da ABRASCO, um campo científico, expressão de um pensamento social em saúde. De acordo com Bourdieu 18, campo científico é um espaço social de lutas competitivas que tem, como desafio específico, o monopólio da autoridade científica. Essa autoridade é definida pela capacidade técnica e poder social cujo monopólio da competência científica é socialmente reconhecido a um agente determinado 18.
Um campo científico é historicamente construído por poderes institucionalizados cujas lógicas de atuação são guiadas pelos agentes que o constituem. Os conflitos entre os agentes e suas disputas, como os que ocorrem na Saúde Coletiva no Brasil, são estruturantes desse campo científico. Esses conflitos, segundo Bourdieu 7, envolvem uma dupla dimensão, a política e a epistemológica. Como a produção de um campo científico não passa ao largo de seus praticantes 19, faz-se necessário compreender a conexão entre o campo científico e os seus atores, neste caso, o campo do pensamento social em saúde.
Com vistas a compreender a estruturação do pensamento social em saúde no Brasil nas últimas décadas, este artigo analisa os principais aspectos referentes à constituição e à institucionalização do subcampo das Ciências Sociais e Humanas em Saúde na ABRASCO, com base nos depoimentos de atores importantes, os presidentes da entidade e os coordenadores das Comissões de Ciências Sociais no período de 1995-2011.
Metodologia
De acordo com Giddens 20 (p. 12), “Todas as disciplinas têm seus fundadores porque eles são parte de seus mitos de origem” , os quais constituem comunidades imaginadas e imprimem recursos para cartografar seu próprio desenvolvimento, a fim de estabelecer limites em relação a outras disciplinas. Em se tratando de um subcampo 7 que se estrutura em consonância com a história dos atores envolvidos, decidiu-se realizar entrevistas com alguns desses atores, informantes-chave.
O material analisado provém da pesquisa Questões Contemporâneas nas Ciências Sociais em Saúde: O Estudo de Temas Emergentes nos Congressos Brasileiros de Ciências Sociais e Humanas em Saúde, ABRASCO 1995-2007 17, tendo seu período estendido a 2011, data de realização do V Congresso, durante a vigência da pesquisa.
Foi realizado um total de 13 entrevistas com presidentes da ABRASCO e coordenadores das Comissões de Ciências Sociais e Humanas em Saúde, em diferentes gestões (Tabela 1).
Procurou-se, com as entrevistas, captar, na ótica desses sujeitos-atores, os seguintes aspectos: o contexto de constituição do subcampo das ciências sociais na ABRASCO; sua institucionalização e evolução; a contribuição das ciências sociais para o campo da saúde coletiva em suas três dimensões: corrente de pensamento, movimento social e prática política; e os principais desafios das Ciências Sociais e Humanas em Saúde no campo da Saúde Coletiva.
As perguntas formuladas primaram pelo detalhamento das experiências vivenciadas pelos entrevistados, e os instrumentos elaborados para conduzir as entrevistas passaram por pré-testes a fim de assegurar a qualidade da coleta das informações. Todas as entrevistas foram gravadas e transcritas, e, no que se refere aos aspectos éticos, o projeto recebeu aprovação de Comitê de Ética em Pesquisa.
O material transcrito foi submetido à técnica de análise de conteúdo, compreendendo as fases de: exploração do material, pré-análise, análise e sistematização dos resultados 21.
Resultados
A riqueza do material de pesquisa permitiu agrupar os conteúdos das entrevistas em cinco eixos de análise: (1) o desenvolvimento das Ciências Sociais e Humanas em Saúde; (2) a Saúde Coletiva e a interdisciplinaridade; (3) a contribuição das Ciências Sociais à Saúde Coletiva; (4) as Ciências Sociais em Saúde e as Ciências Sociais “tradicionais”; e (5) os desafios para as Ciências Sociais e Humanas em Saúde.
Segue uma discussão detalhada de cada eixo de análise, permeada pelas falas dos informantes:
O desenvolvimento das Ciências Sociais e Humanas em Saúde
Ao se referir à constituição da área de ciências sociais na ABRASCO, os informantes destacaram o papel indutor desempenhado pela Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS).
É possível identificar três momentos da participação da OPAS na América Latina: primeiro, décadas de 1930 e 1940, quando foram introduzidos alguns antropólogos para desenvolver ações sanitárias junto às populações rurais e indígenas. Segundo momento, décadas de 1950 e 1960, contexto da Guerra Fria, marcado pelas intenções norte-americanas de consolidar o modelo capitalista de desenvolvimento na América Latina, quando a OPAS foi, dentre algumas fundações norte-americanas, estimuladora da reestruturação dos cursos de medicina. Nesse contexto, são introduzidas as Ciências Sociais em Saúde no ensino médico, com base nas ciências do comportamento. Em meados de 1960, sob liderança de Juan César García, há uma reconversão da OPAS na América Latina, que estimulará um movimento crítico à estratégia norte-americana, reconhecendo o potencial contra-hegemônico dos quadros profissionais da saúde nos países latino-americanos. O Seminário de Cuenca (Equador), em 1972, é um marco; e a Medicina Social, no Brasil, incorporará as Ciências Sociais por meio de uma abordagem extremamente crítica: o marco do materialismo histórico-dialético 22.
Desse processo, emergirão discussões que resultarão na conformação do campo da Saúde Coletiva e, em decorrência, na criação da ABRASCO; estreita-se o diálogo entre a saúde e as Ciências Sociais, campo de conhecimentos e de práticas. Esse processo se revela no depoimento que segue:
“ABRASCO nasce muito apoiada pelo movimento dos departamentos de medicina social e preventiva do país. Nesses departamentos, historicamente quando eles foram constituídos, havia um movimento na educação médica, principalmente na América Latina, capitaneado pela OPAS, de revisão de currículos” (Entrevistado/a no 5).
No período de constituição do campo, portanto, predominou o ensino das Ciências Sociais nos departamentos de Medicina Preventiva e Social, numa revisão do marco comportamentalista de matriz sociológica e antropológica anterior para uma perspectiva mais ampla, articulada à determinação sócio-histórica do processo saúde-doença. A vertente marxista surge como elemento fundamental de reconfiguração teórica, necessária à produção desse conhecimento, especialmente quanto à sociologia em saúde que era, até então, herdeira da teoria funcionalista sistêmica advinda dos escritos dos norte-americanos Talcott Parsons, Samuel Bloom e David Mechanic 1. Esse processo foi conduzido majoritariamente por profissionais médicos, segundo depoimento que segue:
“Na maioria, eram profissionais formados na área da saúde [medicina, principalmente] e ensinavam nos Departamentos, Escolas ou Institutos de Saúde, Medicina Social, Saúde Coletiva. O referencial teórico dominante era o marxista estruturalista – uma literatura que extrapolava a área das Ciências Sociais” (Entrevistado/a no 12).
Ressalte-se que o contexto histórico-social de constituição do campo da Saúde Coletiva congregou uma gama de interesses muito amplos, mobilizados pelo processo de redemocratização do país. Houve, naquele momento, uma grande articulação social e política dos atores da saúde em torno da Reforma Sanitária para formular um projeto que viria resultar na futura Lei Orgânica da Saúde (Lei no 8.080, de 19 de setembro de 1990) que fundou o Sistema Único de Saúde (SUS). Essa conjuntura aparece nos depoimentos que enfatizaram as funções política, social e acadêmica desempenhada pela ABRASCO no período.
A luta contra a ditadura aparece também como um elemento central na agregação e mobilização ativa dos sujeitos envolvidos com a formação da ABRASCO e a reformulação das políticas de saúde no país. Também aparece, fortemente, a contribuição das ciências sociais, especialmente aquelas que embasaram as análises teórico-metodológicas constitutivas do campo, representadas por correntes marxistas.
“Toda a luta contra a ditadura e aí tinha todo um alinhamento à esquerda dessas grandes lideranças, esse alinhamento mais do que à esquerda, inclusive na perspectiva do socialismo, da luta pelo socialismo e aí, então, a teoria marxista como uma teoria que estava estruturando e fundamentando esse campo, de modo que toda a teoria marxista não era apenas uma base teórica para a luta política, mas também para fundamentação da constituição dessa abordagem teórica e analítica” (Entrevistado/a no 2).
No que se refere ao desenvolvimento das ciências sociais e humanas em saúde, fica evidente a pluralidade e heterogeneidade de instituições e atores aglutinados em torno da ABRASCO, bem como a sua relevância para a constituição e o desenvolvimento do campo da Saúde Coletiva no país. A dupla inserção dos profissionais, nos serviços – órgãos da administração direta de gestão e gerência do sistema de saúde e nas universidades –, foi um dos diferenciais que conferiram legitimidade ao “novo” campo, inclusive com lideranças que enalteciam e valorizavam as Ciências Sociais, mesmo não sendo profissionais graduados na área.
“Houve um movimento todo articulado, dentro da ABRASCO, acho que esse é, digamos, o pulo do gato do sucesso que a Saúde Coletiva brasileira tem, que a ABRASCO teve a habilidade de colocar no mesmo campo, os epidemiologistas, os cientistas sociais, os planejadores, os administradores, com suas diferentes funções, vocações e tal, e estabelecer, então, esta linha do pensamento, que, no conjunto todo, permitiu o desenvolvimento da saúde coletiva brasileira” (Entrevistado/a no 3; grifo nosso).
Do ponto de vista de evolução do subcampo, inicialmente, os cientistas sociais aglutinaram-se em torno da área de conhecimento das ciências políticas, que se estabelece de forma contundente na década de 1980, em consonância aos movimentos sociais de saúde, pela Reforma Sanitária e institucionalização do SUS, caracterizando-se crescentemente por uma lógica mais instrumental e aplicada, em função do contexto de redemocratização do país. A coexistência, no campo das ciências sociais em saúde, de dois subcampos internos, um mais atinente às perspectivas sociológicas e antropológicas e outro mais atinente às políticas públicas e gestão em saúde, manteve-se até o final da década de 1990, quando cresce a discussão para a criação da área de Política, Planejamento e Gestão em Saúde 23.
“Ela [a Comissão de Ciências Sociais] tinha existido no final da década de 1980, mas, como era um momento de grandes discussões do SUS, de constituição do SUS, predominou muito mais uma Comissão de Política de Saúde do que propriamente de Ciências Sociais, então, ela ficou abafada...” (Entrevistado/a no 6).
“No começo, a área de política ficava muito ligada à área de planejamento e gestão, numa coisa mais instrumental, mas hoje eu diria que ela está muito mais forte no seu lado de ciências sociais, como ciência política” (Entrevistado/a no 5).
Os depoimentos dos entrevistados indicam dois aspectos que contribuíram para esse processo: o desenvolvimento do subcampo da Política, Planejamento e Gestão na ABRASCO, mais ou menos articulado ao processo de implementação do SUS na década de 1990, e muito especialmente nos anos 2000, e a inserção formal, ainda que gradual e restrita, de professores de ciências sociais nos cursos de pós-graduação dos Departamentos de Medicinas Preventivas e Socais e Faculdades de Saúde Pública no país. Esse último aspecto contribuiu também para uma maior circulação e diversificação de abordagens teóricas e metodológicas, bem como de objetos de estudo no campo da Saúde Coletiva.
No período das décadas de 1980 e 1990, momento em que se dá o processo de institucionalização das Ciências Sociais em Saúde, os encontros preparatórios e a realização do I Congresso Brasileiro de Ciências Sociais em Saúde, ocorrido em 1995, foram fortemente destacados pelos informantes como um dos momentos mais marcantes na trajetória da área, porque, do seu ponto de vista, impulsionaram e articularam os cientistas sociais no interior da associação.
“Fizemos o Primeiro Encontro Nacional de Ciências Sociais e Saúde, que foi em Belo Horizonte, em 1993 (...) Foi uma reunião pequena para que os cientistas sociais pensassem, refletissem sobre o campo em que estavam; quais as contribuições que estavam dando” (Entrevistado/a no 6).
As realizações posteriores dos congressos desse subcampo consistiram em espaços de aglutinação, visibilidade e promoção de discussões sobre os impasses e a identidade dos profissionais dedicados às ciências sociais no campo da Saúde Coletiva. Cabe enfatizar que, nesse processo, uma maior diversidade e complexidade de temas e objetos passaram a ser investigados pelos cientistas sociais, o que contribuiu para o desenvolvimento e institucionalização desse subcampo na ABRASCO.
No entanto, pode-se observar que as ciências sociais e humanas em saúde foram, e ainda são, marcadas por grandes impasses que traduzem peculiaridades e diferenças e se expressam na própria produção científica, bem como no seu reconhecimento nos espaços formais dedicados à ciência e à tecnologia no país.
A Saúde Coletiva e a interdisciplinaridade
É possível dizer que, no bojo da conformação e institucionalização da Saúde Coletiva, desenvolveu-se um pensamento social em saúde no Brasil 3,24, um pensamento notadamente marcado pelo diálogo interdisciplinar entre as ciências biológicas e as ciências sociais 17. Atualmente, segundo Luz 25, a Saúde Coletiva convive com três paradigmas: a multidisciplinaridade, a interdisciplinaridade e a transdisciplinaridade.
Neste trabalho, focaremos as questões referentes à interdisciplinaridade, sugeridas pelos informantes da pesquisa, ainda que não seja possível esquivar-se do intenso debate acerca da especificidade paradigmática interdisciplinar do campo da Saúde Coletiva. Cabe ressaltar dois aspectos que emergiram dos discursos dos entrevistados, um, o da relação interdisciplinar institucionalmente constituída na ABRASCO, e outro que diz respeito ao plano das ideias e das intenções de produção do conhecimento. Nos depoimentos, esses dois aspectos aparecem em separado ou, muitas vezes, articulados entre si.
Discutir a prática interdisciplinar no âmbito da Saúde Coletiva expressa tensões entre os diferentes subcampos, evidenciando tanto as diferenças da produção teórica quanto os diferentes objetos de investigação e as diferentes formas de cada subcampo situar-se nesse território de interface disciplinar.
Ficou perceptível, pela fala dos protagonistas, um empenho de coesão em torno da Reforma Sanitária e da luta contra a ditadura nos primórdios da constituição da ABRASCO. Naquele momento, a preocupação com a interdisciplinaridade não foi objeto central da agenda, dada a urgência social de se discutir o tema da Saúde no contexto do movimento de redemocratização do país e da construção de um sistema nacional de saúde.
“Houve um grande momento político na década de 1970 e 1980 em relação ao SUS, em que as forças todas se uniram, além do que tinha o contexto de combate à ditadura. Então, ali não estava em questão se era cientista social, se era epidemiólogo, se era planejador, se era profissional do serviço de saúde... Aquelas forças estavam unidas, e a gente se sentia compromissado com a política de saúde, com a constituição do SUS e tudo mais. Mas toda a discussão posterior [a constituição das comissões dentro da ABRASCO] foi para a criação da interdisciplinaridade nesse campo” (Entrevistado/a no 6).
Questões relativas às potencialidades e aos limites da perspectiva interdisciplinar na Saúde Coletiva foram relatadas por alguns/algumas dos/das entrevistados(as) ao analisarem o trânsito das Ciências Sociais nesse contexto multidisciplinar, destacando a relevância da disciplinaridade nesse processo, inclusive como um dos elementos que contribuem para a identidade do subcampo:
“Agora, interdisciplinaridade não significa perder as suas referências disciplinares, a gente sempre bateu nessa tecla, porque nós vamos beber nas ciências sociais mesmo, nos seus métodos, nas suas teorias e tudo mais. Então, a gente vê esse interdisciplinar como uma relação com o campo da saúde, que era necessária, você também precisa entender qual é a lógica do sistema de saúde, o que a epidemiologia faz, o que o planejamento faz, mas, ao mesmo tempo, para essa interlocução, se possível, criar objetos comuns, sobre os quais você trabalha interdisciplinarmente na pesquisa, mas reconhecemos, até hoje, eu pelo menos penso assim, que essa interdisciplinaridade não significa perder nossas raízes nas ciências sociais ou nas demais disciplinas do campo da saúde. É um interdisciplinar que não destitui a disciplinaridade, é preciso ter um jogo de cintura” (Entrevistado/a no 6; grifos nossos).
Em virtude desses desafios, os informantes apontam, ainda, alguns caminhos que devem ser trilhados com vistas a repensar as concepções, o desenho e a operacionalização dos processos de formação no campo da Saúde Coletiva, que precisa, necessariamente, contemplar a questão da interdisciplinaridade.
“No meu modo de ver, isso fragiliza aquilo que poderia ser a maior potência da Saúde Coletiva, de fazer com que os egressos dessa área tenham um domínio básico de excelência que articulasse essa três áreas, então, você teria um cientista social, egresso de um programa de Saúde Coletiva, mas que seria capaz de entender perfeitamente como ler uma tendência histórica a respeito de mortalidade ou utilização de serviços ou de implementação de políticas” (Entrevistado/a no 2).
O reconhecimento, a legitimidade e a visibilidade conquistados pelos diferentes subcampos da Saúde Coletiva também expressam algumas particularidades da trajetória da própria ABRASCO. No caso das Ciências Sociais, cabe enfatizar as tensões e as disputas internas quanto à própria capacidade de captação de recursos financeiros para a realização dos congressos da área e quanto às linhas de financiamento e ao volume de recursos destinados aos projetos de pesquisa, auxílios e bolsas.
“Há uma divisão de recursos e temos que brigar pela representação da nossa área, mas acho que isso tem mais chances de ser bem-sucedido se tivermos propondo coisas, tanto na ABRASCO quanto na Capes e no CNPq, porque, mesmo no âmbito da epidemiologia, eu vejo às vezes um certo desconforto com certos modelos de ciência que vigoram. Eu acho que a área de epidemiologia fez plano diretor, fez não sei o quê... Então eu acho que uma parte do congresso deveria ser dedicada a isso...” (Entrevistado/a no 10).
Como decorrência dessa discussão, as disputas institucionais internas foram lembradas e alguns dos entrevistados manifestaram preocupação com a Comissão de Ciências Sociais e a delimitação dos seus espaços no interior da ABRASCO, seus objetivos próprios e até mesmo a sua coordenação.
Outras questões problemáticas foram, ainda, levantadas pelos entrevistados, como a apropriação pouco adequada dos conceitos das Ciências Sociais por epidemiologistas e demais profissionais do campo; a potencialidade de múltiplas identidades do pesquisador na contemporaneidade; o subcampo da epidemiologia como o que mais avançou no processo de consolidação e institucionalização na ABRASCO, tanto em relação ao apoio político e à indução financeira das agências internacionais como da OPAS quanto ao apoio político e interesses do Ministério da Saúde no financiamento dos congressos de epidemiologia no Brasil; e a própria natureza dos objetos de investigação da epidemiologia na Saúde Coletiva e sua incorporação no âmbito das políticas e das práticas de saúde no SUS.
Evidentemente, os relatos mostram que há desafios teóricos e metodológicos para o avanço da interdisciplinaridade no campo da Saúde Coletiva. Operacionalmente, entretanto, os entrevistados apontam alguns elementos que poderiam fortalecer a atuação institucional da Comissão de Ciências Sociais e Humanas em Saúde na ABRASCO. São eles: a atuação mais proativa dos membros na organização dos congressos e na definição dos temas dos congressos; a necessidade de enfatizar temas que apresentem relevância para a sociedade na contemporaneidade, em detrimento de assuntos internos ou específicos das ciências sociais.
A contribuição das Ciências Sociais à Saúde Coletiva
Em quase todos os depoimentos, há demonstrações da importância da contribuição das Ciências Sociais para o campo da Saúde Coletiva. Porém, em apenas um depoimento, de um dos presidentes da ABRASCO, explicita-se isso:
“(...) das três áreas da Saúde Coletiva, as ciências sociais é aquela que tem a característica de ser a mais importante do ponto de vista do embasamento... Eu acho que a epidemiologia é muito aplicada, é claro que tem a teoria epidemiológica, mas ela é muito aplicada, muito empirista... A política, planejamento e gestão, da mesma forma, não poderia ser diferente (...) E as ciências sociais são a grande base, que tem autonomia para produzir o seu conhecimento de maneira independente das outras, mas, ao mesmo tempo, ela tem uma capacidade de contribuição importante para as outras duas áreas no sentido de sustentar as propostas teóricas e metodológicas, as abordagens e especialmente as interpretações...” (Entrevistado/a no 2).
Também dois/duas coordenadores(as) das Comissões de Ciências Sociais e Humanas em Saúde falaram sobre a contribuição das ciências sociais. Para um(a) deles(as), as Ciências Sociais foram fundamentais para a reflexão crítica do processo saúde-doença e das políticas de saúde vigentes, à época, no país. Para o(a) outro(a) coordenador(a), Ciências Sociais e Saúde Coletiva estão muito imbricadas, porque as Ciências Sociais ajudaram a construir a área.
“É difícil de responder essa pergunta, para mim está tão impregnado... Agora se a gente vê com uma perspectiva histórica, ela vem ajudando a construir a área e incorpora discussões, inclusive teóricas, muito importantes” (Entrevistado/a no 11).
Reconhece-se, portanto, que o arcabouço teórico, metodológico e analítico das ciências sociais contribuiu tanto para a Saúde Coletiva, como um todo, quanto para as outras áreas conformadoras do campo, como a Epidemiologia e a Política, Planejamento e Gestão. Essa perspectiva traz consigo uma potencialidade contraditória: por um lado, as ciências sociais consistem num conhecimento transversal que permeia todas as esferas da Saúde Coletiva, o que é bastante positivo; por outro lado, essa característica não lhe garante uma visibilidade empírica, ou “empirista”, nos dizeres de um(a) dos(as) informantes, tornando-a, muitas vezes, conhecimento abstrato e intangível para os outros subcampos da Saúde Coletiva.
As Ciências Sociais em Saúde e Ciências Sociais “tradicionais”
Sobre a relação entre as Ciências Sociais em Saúde e as Ciências Sociais “tradicionais”, foram relatadas dificuldades de legitimação da área de Ciências Sociais em Saúde na própria Saúde Coletiva, bem como nas Ciências Sociais tradicionais.
“Então, eu vejo que o cientista social que entra para a área de saúde, ele tem que fazer um esforço, porque ele não vai ser peixe, nem tatu, ele vai ser uma mistura dos dois... Ele vai ter que ter claro algumas categorias básicas da sua área, mas está voltado para as questões de saúde, analisar as questões de saúde” (Entrevistado/a no 4).
Também foi abordada a imagem que se tem das Ciências Sociais em Saúde como Ciências Sociais aplicadas, menos científicas, menos nobres dos que as Ciências Sociais tradicionalmente instituídas, e a dificuldade de consolidar a área nas instâncias legitimadoras da produção científica e gestoras de recursos financeiros para pesquisas em geral. Foram observadas, ainda, em algumas situações, as dificuldades de diálogo e cooperação entre elas e as disputas por espaços científicos.
“Primeiro, eu acho que essas relações [Ciências Sociais e Ciências Sociais em Saúde] nem sempre são harmônicas e tranquilas. Elas também têm um certo grau de estranhamento e de resistência de ambas as partes. Também uma certa alusão, de uma certa desconfiança de que seriam trabalhos mais superficiais, enfim. Do outro lado, também há má vontade, (...) porque uma coisa que marca o campo da Saúde Coletiva, difícil não se colocar, é a aplicação política, não é?” (Entrevistado/a no 8).
As interdependências, influências e afinidades, entretanto, também foram mencionadas:
“Na minha opinião, elas [as Ciências Sociais ‘tradicionais’ e as Ciências Sociais em Saúde] estão afinadas, pois, quando se começa a fazer a discussão da crise dos paradigmas lá nas Ciências Sociais ‘tradicionais’, nós também estávamos fazendo aqui, quer dizer, uma coisa reflete na outra (...) Então, eu acho que é o conjunto de coisas, não dá pra gente dizer que somos um monobloco e eu acho que o mesmo se dá dentro das Ciências Sociais” (Entrevistado/a no 6).
Fica evidente a latência de uma tensão entre as Ciências Sociais em Saúde e as Ciências Sociais tradicionais. A percepção sobre as dificuldades de diálogo e cooperação e as disputas por espaços científicos estiveram presentes desde sua origem. Hoje, essa tensão parece estar sendo diluída – provavelmente resultado do crescimento das Ciências Sociais na saúde e seu protagonismo na Saúde Coletiva. Nesse contexto, são reafirmadas as influências e afinidades entre ambas; reconhecendo-se diferença significativa entre estar numa instituição de saúde realizando trabalhos de Ciências Sociais e pertencer a uma Faculdade de Ciências Sociais.
Os desafios para as Ciências Sociais e Humanas em Saúde
Quanto aos principais desafios das Ciências Sociais em Saúde no campo da Saúde Coletiva, os(as) entrevistados(as) levantaram diversos aspectos que aparecem tanto nos relatos dos(as) presidentes da ABRASCO quanto no(as) dos(as) coordenadores(as) das Comissões das Ciências Sociais e Humanas em Saúde. Os pontos mais relevantes referidos pelos entrevistados espelham a reflexão que cada um deles fez sobre o campo, sobre sua constituição e trajetória, sinalizando novas possibilidades de desenvolvimento e articulação.
Sugerem a recuperação do vigor que as ciências sociais tiveram na origem do campo, contribuindo para o seu embasamento teórico, analítico e interpretativo. Indicam a importância da superação do distanciamento entre as áreas constitutivas do campo da Saúde Coletiva dentro da ABRASCO e a falta de legitimidade das Ciências Sociais na associação, bem como a dificuldade de falar para um público externo à comissão, no sentido de estabelecer um diálogo com a sociedade e com as demais áreas de conhecimento. Esperam que as Ciências Sociais contribuam, como na gênese do movimento da Saúde Coletiva, com novos referenciais teóricos, conceituais e categorias de análise, atendendo, assim, às demandas de questões emergentes na área da saúde. Alguns dos depoimentos mencionam a falta de interação com os novos problemas da sociologia.
Há grande insistência na questão da interdisciplinaridade, sugerindo a quebra de um conservadorismo disciplinar visto como intrínseco às Ciências Sociais “tradicionais”. E, com relação à precariedade da formação acadêmica dos atores que transitam no campo das Ciências Sociais em Saúde, denunciam a superficialidade no uso dos referenciais teóricos das Ciências Sociais e a vulgarização das análises ditas qualitativas. Também mencionam que um dos grandes desafios é o de não esvaziar ou empobrecer as análises do campo da Saúde Coletiva, mantendo o ensino das Ciências Sociais nas áreas da saúde.
Indicam a necessidade de legitimar e consolidar, no âmbito do sistema de Ciência & Tecnologia, a área das Ciências Sociais em Saúde, criando uma identidade própria, porém enfrentando o risco da fragmentação da área em outros subcampos da Saúde Coletiva. Nesse sentido, aparecem, nos depoimentos, sugestões de aumentar o grupo de estudiosos da área, a sua disseminação pelo país e maior articulação; a retomada da essência das ciências sociais e dos seus temas originais; e uma maior objetividade da Comissão de Ciências Sociais, estabelecendo um planejamento mais estruturado para a comissão sob a forma de um plano diretor.
Considerações finais
Em linhas gerais, constatou-se que a sustentabilidade das Ciências Sociais e Humanas em Saúde na ABRASCO depende da sua legitimidade científica, teórica e técnica. Pelos relatos, ficou clara uma capacidade deficitária nas dimensões técnica e política dessa área em ancorar processos que conduzam a patamares mais sustentáveis das Ciências Sociais no campo da Saúde Coletiva. As descontinuidades das ações da comissão e da agenda dos congressos refletem uma baixa institucionalização do processo de trabalho. Por outro lado, as disputas internas ao campo das Ciências Sociais em Saúde acirraram a delimitação de espaços e territórios, muitas vezes intradisciplinares, na defesa de determinados objetos e linhas de investigação, distanciando-os mutuamente e os tornando pouco permeáveis e até vulneráveis ao intercâmbio e interface com os outros atores e instituições. Tal situação restringe, ainda, a possibilidade de incorporar, na agenda de pesquisa, “novos” objetos e estudos que venham a contribuir para o avanço da Saúde Coletiva na contemporaneidade, em consonância com abordagens “complexas”, necessariamente ancoradas em concepções e práticas interdisciplinares.
É interessante notar, nas falas atores, uma certa “dança identitária” das Ciências Sociais em Saúde, que tem, como eixo balizador, a relação dicotômica entre teoria x prática. Quando postas no campo da Saúde Coletiva, as Ciências Sociais são tidas como extremamente teóricas e interpretativas, trazendo consigo um tom de abstração típico das reflexões puramente teóricas, embora seja evidente o reconhecimento da importância dessas “abstrações” para a constituição do campo da Saúde Coletiva no Brasil. Quando postas em relação às ciências sociais “tradicionais”, as Ciências Sociais em Saúde são acusadas de empíricas, aplicadas, e, por isso mesmo, menos científicas. Denota-se, assim, uma dificuldade de diálogo entre as ciências sociais que são produzidas no âmbito da saúde, mais especificamente, no interior da ABRASCO, e as ciências sociais que estão sendo produzidas nos centros tradicionais de ensino e pesquisa dessa área.
A necessidade de um plano diretor da comissão, destacado pelos informantes, é outro ponto que pode ser considerado vital para a sustentabilidade das Ciências Sociais em Saúde e Humanas na ABRASCO. Tal plano poderia, como apontado nos depoimentos, contribuir como um meio eficaz para aumentar a capacidade de negociação e captação de recursos regulares para as atividades da comissão, entre elas os congressos. Seria, ainda, um instrumento adequado para potencializar as dimensões técnica e política da sustentabilidade da subárea, bem como para a interlocução com as agências nacionais e internacionais de fomento e apoio à pesquisa no campo da Saúde Pública/Coletiva.
Resta ainda o desafio da incorporação dos resultados das pesquisas para o fortalecimento do SUS, enfrentando a contradição entre a intencionalidade e pragmatismo da gestão da política de saúde e as recomendações e subsídios dos estudos “sociais” na identificação de lacunas e melhoria das políticas e, consequentemente, das práticas de saúde.
São muitos os desafios e os caminhos que os resultados da pesquisa oferecem para as Ciências Sociais e Humanas em Saúde no Brasil. Mais uma vez, reafirma-se a força dos depoimentos que retomam a história das Ciências Sociais em Saúde na ABRASCO, seu desenvolvimento e os impasses atuais. E, sobretudo, revelam um fragmento da história social contemporânea do pensamento social em saúde no Brasil, permitindo recuperar as estratégias de construção de um campo tão potente na história recente do país como é o da Saúde Coletiva.
Agradecimentos
À Capes e ao CNPq (Edital MCT/CNPq 14/2009 – Universal) pelo financiamento.
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
Nov 2014
Histórico
-
Recebido
18 Dez 2013 -
Revisado
01 Abr 2014 -
Aceito
28 Abr 2014