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PRÁTICAS MULTILINGUES DE TRADUÇÃO NA PAISAGEM LINGUÍSTICA DE MACAU: REFLEXÕES ATRAVÉS DA ABORDAGEM DE PLACENESS E SUBJETIVIDADE DO LUGAR

MULTILINGUAL PRACTICES OF TRANSLATION IN THE LINGUISTIC LANDSCAPE OF MACAO: REFLECTIONS THROUGH THE LENS OF PLACENESS AND SUBJECTIVITY OF PLACE

Resumo

Sendo território chinês que esteve sob administração portuguesa durante mais de quatro séculos, Macau tem vindo a vivenciar um intercâmbio cultural e linguístico dinâmico, em que diferentes línguas (chinês e português, em particular) coexistem e formam, assim, uma paisagem linguística urbana com características próprias. Perante este contexto, e baseando-nos em dois conceitos ligados às relações entre lugares e sujeitos humanos (suas emoções, atividades linguísticas e culturais, etc.) – placeness (Augé, 2008; Chaveiro, 2012) e subjetividade do lugar (Brown & Knopp, 2008; Holzer, 2009), respetivamente –, o objetivo do presente artigo consiste em analisar e refletir sobre as manifestações linguísticas públicas na cidade de Macau, com incidência nas práticas multilingues e interculturais nela patentes e tornadas visíveis por meio da tradução. A partir da análise de casos específicos presentes na esfera pública de Macau, abordamos as práticas linguísticas, entre as quais a de tradução é central, que interagem nas três principais categorias de espaço que preenchem um território urbano: “espaço de estado e governo”, “espaço de entidade privada” e “espaço de interação de multi-atores” (Zhang & Sun, 2019Zhang, Ai-Heng & Sun, Jiu-Xia. “Progress of Linguistic Landscape from the Perspective of Space Practice and Place Subjectivity”. Human Geography, 34(4), p. 13-19, 2019. DOI: https://doi.org/10.13959/j.issn.1003-2398.2019.04.002
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). Seguindo esta categorização, o nosso corpus de trabalho inclui como objetos de estudo sinais em via pública, designadamente placas com nomes de ruas e estabelecimentos comerciais, cartazes publicitários e avisos institucionais e governamentais. Pretendemos, através desta análise, aprofundar a compreensão quanto à especificidade pública do multilinguismo e da interculturalidade de Macau, contribuindo, em simultâneo, para uma reflexão a respeito das relações de poder entre as línguas e comunidades coexistentes no território e, por conseguinte, a respeito da identidade (cultural) de Macau. Procuramos assim fornecer um modelo de referência para a investigação interdisciplinar no âmbito dos estudos de tradução, da paisagem linguística e da geografia cultural e humanista, em que as práticas tradutórias se entendem como uma linguagem do lugar.

Palavras-chave
tradução; paisagem linguística; placeness ; subjetividade do lugar; Região Administrativa Especial de Macau

Abstract

As a Chinese territory under Portuguese administration for over four centuries, Macao has experienced a dynamic cultural and linguistic exchange, where different languages (Chinese and Portuguese, in particular) coexist and thus form an urban linguistic landscape with its own characteristics. Against this background and drawing on two concepts connected to the relationship between place and human subject (their emotions, language and cultural activities, etc.) – namely placeness (Augé, 2008; Chaveiro, 2012) and subjectivity of place (Brown & Knopp, 2008; Holzer, 2009) – the aim of this article is to examine and reflect on public linguistic manifestations in the city of Macao, with a focus on the multilingual and intercultural practices that are made visible through translation. Based on the analysis of case studies present in Macao’s public sphere, this article addresses those language practices, among which translation is central, as they interact in three main categories of space that fill in an urban territory: “space of state and government”, “space of private sectors”, and “space of interaction of multi-actors” (Zhang & Sun, 2019Zhang, Ai-Heng & Sun, Jiu-Xia. “Progress of Linguistic Landscape from the Perspective of Space Practice and Place Subjectivity”. Human Geography, 34(4), p. 13-19, 2019. DOI: https://doi.org/10.13959/j.issn.1003-2398.2019.04.002
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). Following this categorization, our corpus encompasses signs on public roads, namely street and commercial establishment nameplates, advertising posters, and institutional and governmental notices. Through this analysis, the article seeks to deepen our understanding of multilingualism and interculturality in Macao, while contributing to a reflection on the power relations between the languages and communities coexisting in the territory, and thus on Macao’s (cultural) identity. Furthermore, this article also seeks to provide a reference model for interdisciplinary research at the crossroads of translation studies, linguistic landscape studies, and cultural and humanistic geography studies, in which translation practices are understood as a language of place.

Keywords
translation; linguistic landscape; placeness; subjectivity of place; Macao Special Administrative Region

Introdução

Enquanto território chinês que vivenciou a presença e administração portuguesa durante mais de quatro séculos, a Região Administrativa Especial de Macau (RAEM) constitui uma cidade metropolitana caracterizada pelo seu multilinguismo e interculturalidade. Nela converge uma grande variedade de línguas, das quais ressaltam não só o chinês e o português – línguas oficiais da região após a transferência de soberania (em 1999) – mas também o inglês, em virtude sobretudo da sua proximidade a Hong Kong e do seu posicionamento como um centro mundial de turismo e lazer. A convergência destas línguas na região de Macau pode ser resumida, neste caso, através da expressão popular de “três línguas escritas (chinês, português e inglês) e quatro idiomas falados (cantonês, mandarim, português e inglês)”1 1 Em chinês: 三文四語 (sān wén sì yǔ). . É justamente nesta necessidade de interação linguística e neste hibridismo cultural de longa data que se enquadra a prática de tradução no território (Song, 2022Song, Ge. “Cosmopolitan Translation in Multilingual Cities: A Macao Experience”. Language and Intercultural Communication, 22(1), p. 35-49, 2022. DOI: https://doi.org/10.1080/14708477.2021.1990309
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). Servindo de ponte de comunicação e intercâmbio entre pessoas oriundas de contextos linguísticos e socioculturais diferentes, as práticas tradutórias têm desempenhado um papel imprescindível na história e no desenvolvimento urbano de Macau.

Face a esta conjuntura, e recorrendo aos conceitos de placeness (Augé, 2008Augé, Marc. Non-places: Introduction to an Anthropology of Supermodernity. Traduzido por John Howe. Londres: Verso, 2008.; Chaveiro, 2012Chaveiro, Eguimar Felício. “Corporeidade e lugar: elos da produção da existência”. In: Marandola Jr., Eduardo; Holzer, Werther & Oliveira, Lívia de. (Orgs.). Qual o espaço do lugar? Geografia, epistemologia, fenomenologia. São Paulo: Perspectiva, 2012. p. 279-303.) e subjetividade do lugar (Brown & Knopp, 2008Brown, Michael & Knopp, Larry. “Queering the Map: The Productive Tensions of Colliding Epistemologies”. Annals of the Association of American Geographers, 98(1), p. 40-58, 2008. DOI: https://doi.org/10.1080/00045600701734042
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; Holzer, 2009Holzer, Werther. “O conceito de lugar na geografia cultural-humanista: uma contribuição para a geografia contemporânea”. GEOgraphia, 5(10), p. 113-123, 2009. DOI: http://dx.doi.org/10.22409/GEOgraphia2003.v5i10.a13458
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), o presente trabalho visa ilustrar, com base na análise de diversos casos de estudo, as interações entre as práticas multilingues, sobretudo as de tradução (intercultural), presentes nos ambientes públicos e urbanos de Macau. Para isso, começamos, primeiro, com uma breve reflexão sobre o contexto sociolinguístico da cidade2 2 A palavra “cidade” deve ser aqui entendida de forma mais lata, abrangendo não apenas a Península de Macau (cidade de Macau num sentido mais estrito), mas todo o território da RAEM. de Macau e, de seguida, discutimos a correlação entre placeness, lugar, subjetividade e paisagem linguística. Com essa contextualização e posterior análise de um conjunto selecionado de sinais em via pública, pretendemos oferecer um micro-retrato da realidade urbana de Macau, inferindo a respeito das dinâmicas interculturais e relações de poder entre as línguas e comunidades em copresença no território e, consequentemente, a respeito da sua identidade (cultural).

O contexto sociolinguístico de Macau

Por razões históricas, Macau tem sido, desde a instalação oficial dos portugueses nesta região em 1557, um espaço de intercâmbio caracterizado pela predominância da língua chinesa em coexistência com outras línguas estrangeiras, como o português, o inglês, o malaio, o japonês, o coreano, o catalão, etc. (Han & Yang, 2022Han, Lili & Yang, Nan. “Remapping the Translation Policies in China: Contributions from Macau”. Asian-Pacific Journal of Second and Foreign Language Education, 7(38), 2022. DOI: https://doi.org/10.1186/s40862-022-00163-4
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), constituindo assim “um núcleo explicitamente pluricultural em que ocidentes e orientes passaram a conviver (ou ao menos dividir) em um espaço na Ásia” (Teixeira-e-Silva & Lima-Hernandes, 2014Teixeira-e-Silva, Roberval & Lima-Hernandes, Maria Célia. “Políticas linguísticas e língua portuguesa em Macau, China: à guisa de introdução”. Signótica, 26(esp.), p. 61-76, 2014. DOI: https://doi.org/10.5216/sig.v26iesp..31400
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, p. 62). Segundo Lam Johnny F. I. & Ieong Wai In (2022)Lam, Johnny F. I. & Ieong, Wai In. “Translanguaging and Multilingual Society of Macau: Past, Present and Future”. Asian-Pacific Journal of Second and Foreign Language Education, 7(39), 2022. DOI: https://doi.org/10.1186/s40862-022-00169-y
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, sobressaem três fases na evolução histórica da sociedade multilingue de Macau: (1) o período em que o chinês era a língua predominante (e até única) em Macau (tempos antigos3 3 Mais pormenorizadamente, a partir da dinastia Qin (221 a.C. – 206 a.C.). – 15534 4 Ano em que se registou o desembarque dos primeiros portugueses em Macau. ); (2) a introdução de línguas estrangeiras e o estabelecimento do estatuto oficial da língua portuguesa em Macau (1553 –1987); e (3) o período em que o chinês, o português e o inglês têm sido as três línguas principais do território (1987 – atualidade). Note-se que foi exatamente no ano de viragem de 1987, aquando da assinatura da Declaração Conjunta do Governo da República Portuguesa e do Governo da República Popular da China sobre a Questão de Macau, que se iniciou o chamado período de transição, o qual culminou em 1999 e trouxe consigo uma inversão na representação das forças de poder no território e o fim de uma colonialidade escondida e “insignificante” (Almeida, 2020Almeida, Rosa Vieira de. “À margem das margens”. In: Laborinho, Ana Paula; Cordeiro, Gonçalo; Pinto, Marta Pacheco & Nunes, Ariadne. (Orgs.). Macau: Novas Leituras. Lisboa: Tinta-da-China, 2020. p. 99-107.). Nos últimos anos, graças ao desenvolvimento próspero do setor do jogo e à edificação de Macau como um centro mundial de turismo e lazer, a cidade também tem vindo a atrair trabalhadores provenientes de países asiáticos, como as Filipinas, o Vietname, a Indonésia ou a Tailândia, enriquecendo e dinamizando bastante o multilinguismo e a multiculturalidade da sociedade local (Lam & Ieong, 2022Lam, Johnny F. I. & Ieong, Wai In. “Translanguaging and Multilingual Society of Macau: Past, Present and Future”. Asian-Pacific Journal of Second and Foreign Language Education, 7(39), 2022. DOI: https://doi.org/10.1186/s40862-022-00169-y
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; Zhang X., 2022Zhang, Jingni & Wang, Jiahe. “Culture, Locality and Modernity: The Function and Planning of Multimodal Tourism in Language Landscape”. Social Scientist, (3), p. 56-63, 2022.).

Como sabemos, as línguas chinesa e portuguesa ganharam o status de línguas oficiais da RAEM em 1999, com a entrada em vigor da sua Lei Básica. Todavia, em contraste com o seu importante estatuto político, a língua portuguesa tem sido falada, na realidade, apenas por uma fatia muito restrita da população. De acordo com os resultados globais dos censos de 2021, divulgados pela Direção dos Serviços de Estatística e Censos da RAEM (2022)Direção dos Serviços de Estatística e Censos (DSEC) da Região Administrativa Especial de Macau. Resultados globais dos censos 2021. Macau: DSEC, 2022., entre toda a população com idade igual ou superior a três anos, somente 2,3% falava fluentemente português como meio de comunicação, um número muito mais reduzido em comparação com o do cantonês (86,2%), do mandarim (45,0%) e do inglês (22,7%), registando-se, a par disso, um decréscimo ligeiro de 0,1 pontos percentuais em relação ao ano de 2011. No que se refere à Administração Pública, dizem os dados estatísticos publicados pela Direção dos Serviços de Administração e Função Pública da RAEM (2022)Direção dos Serviços de Administração e Função Pública (SAFP) da Região Administrativa Especial de Macau. Recursos Humanos da Administração Pública da RAEM 2021. Macau: SAFP, 2022. que o português é também de peso mais leve: em 2021, a proporção de falantes de português entre os funcionários públicos era de cerca de 29,5%, enquanto a de inglês atingiu cerca de 62,6%; quase 96,7% dos trabalhadores dos serviços públicos falava cantonês, enquanto mais de 76,9% dominava o mandarim.

Não obstante, tal como afirmam Roberval Teixeira-e-Silva & Maria Célia Lima-Hernandes (2014, p. 68)Teixeira-e-Silva, Roberval & Lima-Hernandes, Maria Célia. “Políticas linguísticas e língua portuguesa em Macau, China: à guisa de introdução”. Signótica, 26(esp.), p. 61-76, 2014. DOI: https://doi.org/10.5216/sig.v26iesp..31400
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face à tendência descendente registada nos censos de 2011, “a diminuição numérica apontada no censo não significa menos importância e/ou menor interesse pela língua portuguesa”. Ressalta, pelo contrário, o reforço do ensino da língua portuguesa em Macau ao longo dos últimos dez anos. Segundo Carlos Ascenso André (2020)André, Carlos Ascenso. “O interesse pelo português, 20 anos depois”. In: Laborinho, Ana Paula; Cordeiro, Gonçalo; Pinto, Marta Pacheco & Nunes, Ariadne. (Orgs.). Macau: Novas Leituras. Lisboa: Tinta-da-China, 2020. p. 19-26., no ano letivo de 2019/2020, já existiam 51 escolas públicas e privadas de ensino não superior na região a oferecer aulas de português a cerca de 8 mil estudantes, e com tendência para crescer. No ensino superior, assinala-se, por sua vez, um total de cinco instituições que possuem nos seus curricula disciplinas relacionadas com a língua portuguesa, oferecendo cursos de licenciatura, mestrado e até doutoramento (Zhang X., 2022Zhang, Xiang. “Macau como um espaço de interculturalidade entre a língua chinesa e a portuguesa”. In: Defendi, Cristina Lopomo; Lima-Hernandes, Maria Célia & Vicente, Renata Barbosa. (Orgs.). Cultura e literatura: estudos de linguagem em perspetiva interdisciplinar. São Paulo: IFSP, 2022. p. 97-114.). Esta procura crescente do ensino português constitui uma “marca prestigiada e honrosa da presença da cultura portuguesa” (André, 2020André, Carlos Ascenso. “O interesse pelo português, 20 anos depois”. In: Laborinho, Ana Paula; Cordeiro, Gonçalo; Pinto, Marta Pacheco & Nunes, Ariadne. (Orgs.). Macau: Novas Leituras. Lisboa: Tinta-da-China, 2020. p. 19-26., p. 21), sobretudo numa Macau dita pós-colonial.

Hoje em dia, aproveitando as oportunidades inerentes à construção da Grande Baía Guangdong – Hong Kong – Macau e da iniciativa “Uma Faixa, Uma Rota”, Macau, com o seu novo posicionamento oficial de “Plataforma Sino-Lusófona”, tem vindo a atribuir à língua portuguesa uma importância sem precedentes (Han & Yang, 2022Han, Lili & Yang, Nan. “Remapping the Translation Policies in China: Contributions from Macau”. Asian-Pacific Journal of Second and Foreign Language Education, 7(38), 2022. DOI: https://doi.org/10.1186/s40862-022-00163-4
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). Assim sendo, a proteção do multilinguismo e a promoção da interculturalidade na sociedade de Macau, em geral, e a divulgação da língua portuguesa, em particular, contribuem tanto para a sua diversidade etnolinguística como para a sua identidade cultural única.

Enquadramento teórico

Tendo por base esta contextualização sociolinguística de Macau, necessária para melhor compreender as práticas multilingues e multiculturais que ocupam o seu espaço público, acentuam-se, nesta secção, as ligações multidirecionais que se estabelecem entre placeness, lugar, subjetividade e paisagem linguística.

Placeness e subjetividade do lugar

Placeness e subjetividade do lugar são noções importantes que caracterizam um lugar do ponto de vista geográfico, humanista e cultural. Ambos os conceitos se fundamentam no pressuposto de Tuan Yi-Fu, nos anos de 1970, que parte da linguagem para o entendimento epistemológico do espaço, e ambos foram posteriormente desenvolvidos por vários estudiosos, com ênfase nas relações intrínsecas entre linguagem e lugar.

O conceito de placeness reporta-se à ligação dos corpos humanos com as suas práticas discursivas num dado lugar. Tuan (1991)Tuan, Yi-Fu. “Language and the Making of Place: A Narrative-descriptive Approach”. Annals of the Association of American Geographers, 81(4), p. 684-696, 1991. sublinha que essas práticas não existem fora da linguagem. Para ele, a linguagem serve como um tipo de discurso, assente exclusivamente no uso e na troca de signos verbais, o que faz com que essas práticas sejam suscetíveis de mudança e possam contribuir para a manutenção do sentimento de lugar, através, por exemplo, das conversas interpessoais e narrações interativas (e.g. storytelling) que podem ocorrer num lugar. Por seu turno, Eguimar Felício Chaveiro (2012)Chaveiro, Eguimar Felício. “Corporeidade e lugar: elos da produção da existência”. In: Marandola Jr., Eduardo; Holzer, Werther & Oliveira, Lívia de. (Orgs.). Qual o espaço do lugar? Geografia, epistemologia, fenomenologia. São Paulo: Perspectiva, 2012. p. 279-303., Werther Holzer (2009)Holzer, Werther. “O conceito de lugar na geografia cultural-humanista: uma contribuição para a geografia contemporânea”. GEOgraphia, 5(10), p. 113-123, 2009. DOI: http://dx.doi.org/10.22409/GEOgraphia2003.v5i10.a13458
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e Peter Jordan (2014)Jordan, Peter. “Place Names as an Expression of Human Relations to Space”. In: Hough, Carole & Izdebska, Daria. (Eds.). ICOS (Names and their Environment. Proceedings of the 25th International Congress of Onomastic Sciences). Glasgow: University of Glasgow, 2014. p. 209-223. compreendem a linguagem como um construto mais abrangente de sistemas verbais e não-verbais. Nesse sentido, os recursos linguísticos e semióticos constituem os meios de comunicação privilegiados para a partilha de um entendimento individual do lugar, sendo também relevantes para a sua “espacialização”, que remete para processos através dos quais um espaço passa a ser representado, organizado e experienciado (Jaworski & Thurlow, 2010Jaworski, Adam & Thurlow, Crispin. (Eds.). Semiotic Landscapes: Language, Image, Space. Londres & Nova York: Continuum, 2010.).

Na perspetiva antropológica de Marc Augé (2008)Augé, Marc. Non-places: Introduction to an Anthropology of Supermodernity. Traduzido por John Howe. Londres: Verso, 2008., que se situa na esteira de Tuan, placeness5 5 Placelessness, termo proposto por Augé (2008), tem por base o conceito de placeness: trata-se da erradicação de lugares distintivos e da estandardização deliberada de paisagens, que homogeneíza os lugares, tornando-os todos iguais e sem características particulares – ou seja, non-places (não-lugares). define-se como o centro de valores e de memórias humanas concernentes à identidade e à cultura, e pode ser exposta pela transformação visual de uma dada paisagem urbana, quando essa transformação impacta a ligação afetiva e sensorial do indivíduo com ela. Materializados no espaço, os diferentes modos de linguagem podem espoletar o senso de lugar e moldar a nossa compreensão sobre ele, permitindo-nos, deste modo, estabelecer ligações mais ou menos fortes e afetivas com um lugar específico (Reed, 2020Reed, Paul. “Place and Language: Links between Speech, Region, and Connection to Place”. WIREs Cognitive Science, 11(3), e1524, 2020. DOI: https://doi.org/10.1002/wcs.1524
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). Sob esse ângulo, todos os recursos linguísticos, semióticos e comunicativos que caracterizam o lugar permitem distinguir um lugar do outro (Chaveiro, 2012Chaveiro, Eguimar Felício. “Corporeidade e lugar: elos da produção da existência”. In: Marandola Jr., Eduardo; Holzer, Werther & Oliveira, Lívia de. (Orgs.). Qual o espaço do lugar? Geografia, epistemologia, fenomenologia. São Paulo: Perspectiva, 2012. p. 279-303.) e placeness é o suporte para a criação de um sentimento de lugar.

Em paralelo, o lugar adquire uma outra propriedade importante, a subjetividade do lugar, uma vez que “o lugar é criado a partir das relações humanas de significação, fala e representação” (Carlos, 2007Carlos, Ana Fani Alessandri. O lugar no/do mundo. São Paulo: FFLCH, [1996]2007., p. 22) e é categorizado por memória, vivência e experiência(s) (Tuan, 1980Tuan, Yi-Fu. Topofilia: um estudo da perceção, atitudes e valores do meio ambiente. Tradução de Lívia de Oliveira. São Paulo: Difel, 1980.). À luz da ideia de “topofilia”6 6 Segundo Tuan (1980), “a topofilia é uma intimidade com o ambiente em que se vive, essa relação de intimidade é construída de maneiras diferentes e depende das vivências de cada indivíduo” (cf. Aguiar, 2018, p. 32). , termo cunhado por Tuan (1980Tuan, Yi-Fu. Topofilia: um estudo da perceção, atitudes e valores do meio ambiente. Tradução de Lívia de Oliveira. São Paulo: Difel, 1980., 1990)Tuan, Yi-Fu. Topophilia: A Study of Environmental Perception, Attitudes, and Values. Nova York: Columbia University Press, 1990., o lugar define-se como:

produto das relações humanas, entre homem e natureza, tecido por relações sociais que se realizam no plano do vivido[,] o que garante a construção de uma rede de significados e sentidos que são tecidos pela história e cultura civilizadora[,] produzindo a identidade, posto que é aí que o homem se reconhece porque é o lugar da vida

(Carlos, 2007Carlos, Ana Fani Alessandri. O lugar no/do mundo. São Paulo: FFLCH, [1996]2007., p. 22).

Nessa lógica, afirma-se que o lugar está intimamente ligado não só às modificações trazidas pela modernidade e às relações sociais que se desenvolvem no lugar, mas também à experiência de corpos humanos que se movimentam pelo lugar. Ora, segundo Michael Brown & Larry Knopp (2008)Brown, Michael & Knopp, Larry. “Queering the Map: The Productive Tensions of Colliding Epistemologies”. Annals of the Association of American Geographers, 98(1), p. 40-58, 2008. DOI: https://doi.org/10.1080/00045600701734042
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e Chaveiro (2012)Chaveiro, Eguimar Felício. “Corporeidade e lugar: elos da produção da existência”. In: Marandola Jr., Eduardo; Holzer, Werther & Oliveira, Lívia de. (Orgs.). Qual o espaço do lugar? Geografia, epistemologia, fenomenologia. São Paulo: Perspectiva, 2012. p. 279-303., a subjetividade do lugar é uma noção fenomenológica, que se refere a uma propriedade condicionada por ações humanas, através da qual se revela a empatia, ou pelo contrário a resistência, na consciência do lugar. É assim uma propriedade atribuída por quem interage com o lugar. Quando as experiências humanas de um mesmo lugar geram uma partilha de afeições, perceções e emoções entre indivíduos, essa partilha torna-se intangível (Holzer, 2009Holzer, Werther. “O conceito de lugar na geografia cultural-humanista: uma contribuição para a geografia contemporânea”. GEOgraphia, 5(10), p. 113-123, 2009. DOI: http://dx.doi.org/10.22409/GEOgraphia2003.v5i10.a13458
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) e potenciadora do desenvolvimento de uma identidade coletiva.

Apesar de placeness e subjetividade do lugar serem, de facto, dois conceitos interligados, há diferenças evidentes entre os mesmos. Mais especificamente, placeness entende o lugar como fruto da linguagem, ou seja, de sistemas linguísticos e semióticos culturais que permitem identificar a particularidade de um lugar. É nosso argumento que placeness pode ser representada por meio de uma série de práticas (multi)linguísticas e (multi)culturais num espaço/lugar, ao serem-lhe atribuídas significações específicas, processo em que a tradução, explícita ou dissimulada, emerge como uma possível linguagem do lugar. Já a subjetividade compreende o lugar como o conjunto de experiências, sobretudo corpóreas, e discursos individuais através do qual esse lugar pode ser interpretado e categorizado. É assim transmitida “a partir do corpo [humano] e das experiências que temos através dele”, possibilitando que “os [tais] atos humanos de atribuir significações ao lugar po[ssam] ocorrer” (Aguiar, 2018Aguiar, Felipe Costa. “A Geografia, o lugar e os sujeitos”. Revista Vértices, 20(1), p. 29-37, 2018. DOI: https://doi.org/10.19180/1809-2667.v20n12018p29-37
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, p. 36). Placeness relaciona-se com a fluidez social; é influenciada pelas políticas linguísticas adotadas em contexto e, por conseguinte, por alterações (materiais) na realidade decorrentes da utilização de diversas línguas, muitas vezes ligadas entre si por via de relações tradutórias. A subjetividade do lugar, por sua vez, decorre da agência dos sujeitos, que podem criar múltiplas formas discursivas para descrever e identificar o lugar onde vivem. Atualmente, em sintonia com os movimentos de migração global, a paisagem nos espaços urbanos tem experienciado uma mudança tanto visível como invisível (Villette, 2021Villette, Julia. Exploring Landscape through Place Names: An Interdisciplinary Approach. 2021. Thesis (Ph.D. in Natural Sciences) – Faculty of Science, Institute of Geography, University of Zurich, Zurich, 2021.). Esta mudança, intimamente relacionada com placeness e subjetividade do lugar, ambas inerentes às atividades culturais e discursivas, refletir-se-á na paisagem linguística destes espaços.

Paisagem linguística

A paisagem linguística, entendida aqui como um tipo de representação espacial, pode ser vista como uma intermediação entre as experiências humanas (subjetividade do lugar) e as práticas linguísticas (placeness) num espaço. No seguimento da proposta tradicional de Rodrigue Landry & Richard Bourhis (1997, p. 25)Landry, Rodrigue & Bourhis, Richard. “Linguistic Landscape and Ethnolinguistic Vitality: An Empirical Study”. Journal of Language & Social Psychology, 16(1), p. 23-49, 1997. DOI: https://doi.org/10.1177/0261927X970161002
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, este tipo de paisagem incide, mais concretamente, sobre a visibilidade e materialidade da língua através dos seguintes objetos em espaço público: “public road signs, advertising billboards, street names, place names, commercial shop signs, and public signs on government buildings”. Com a evolução do tempo, em virtude do contributo de um número cada vez maior de publicações que aborda este tema sob diferentes óticas, o cenário de estudo da paisagem linguística foi-se expandido (Shohamy & Gorter, 2009Shohamy, Elana & Gorter, Durk (ed.). Linguistic Landscape: Expanding the Scenery. Londres & Nova York: Routledge, 2009.), podendo abarcar, como objeto de investigação, não apenas textos escritos e materiais impressos que marcam presença na esfera urbana, tais como cartões-de-visita, rótulos e formulários públicos (Shohamy, 2006Shohamy, Elana. Language Policy: Hidden Agendas and New Approaches. Londres & Nova York: Routledge, 2006.), mas, no fundo, tudo o que existe num espaço público em mudança, isto é, desde textos verbais a textos visuais (e.g. imagens) ou até textos patentes em corpos humanos (e.g. textos escritos na indumentária) (Shohamy & Waksman, 2009Shohamy, Elana & Waksman, Shoshi. “Linguistic Landscape as an Ecological Arena: Modalities, Meanings, Negotiations, Education”. In: Shohamy, Elana & Gorter, Durk. (Eds.). Linguistic Landscape: Expanding the Scenery. Londres & Nova York: Routledge, 2009. p. 313-331.), entre outros itens públicos que resultam de dinâmicas de encontro intercultural. A superdiversidade étnica e social decorrente do contexto da globalização também possibilita uma investigação mais inovadora e aberta da paisagem linguística e das relações entre línguas e espaços físicos, que são, em simultâneo, espaços sociais, culturais e políticos (Blommaert, 2013Blommaert, Jan. Ethnography, Superdiversity and Linguistic Landscapes: Chronicles of Complexity. Bristol, Buffalo & Toronto: Multilingual Matters, 2013.). Adotando uma perspetiva interdisciplinar, Jordan (2014)Jordan, Peter. “Place Names as an Expression of Human Relations to Space”. In: Hough, Carole & Izdebska, Daria. (Eds.). ICOS (Names and their Environment. Proceedings of the 25th International Congress of Onomastic Sciences). Glasgow: University of Glasgow, 2014. p. 209-223. e Julia Villette (2021)Villette, Julia. Exploring Landscape through Place Names: An Interdisciplinary Approach. 2021. Thesis (Ph.D. in Natural Sciences) – Faculty of Science, Institute of Geography, University of Zurich, Zurich, 2021. argumentam que a paisagem linguística é um dos elementos definidores de placeness, por isso, pode ter um papel importante na construção da subjetividade do lugar.

A maioria dos estudos sobre paisagem linguística provém da área da sociolinguística (Melo-Pfeifer & Lima-Hernandes, 2020Melo-Pfeifer, Sílvia & Lima-Hernandes, Maria Célia. “Paisagens Linguísticas: ideologias, discursos e práticas multilingues nos espaços sociais”. Domínios De Lingu@gem, 14(4), p. 1024-1058, 2020. DOI: https://doi.org/10.14393/DL44-v14n4a2020-1
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); porém, tem recentemente suscitado também o interesse da geografia cultural. No primeiro caso, esses estudos tendem a explorar a dinâmica multilingue e a competição etnolinguística que caracterizam uma dada região, incindindo sobre políticas linguísticas e sua ligação com a identidade étnica ou cultural (Landry & Bourhis, 1997Landry, Rodrigue & Bourhis, Richard. “Linguistic Landscape and Ethnolinguistic Vitality: An Empirical Study”. Journal of Language & Social Psychology, 16(1), p. 23-49, 1997. DOI: https://doi.org/10.1177/0261927X970161002
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; Zhang & Zhang, 2016Zhang, Yuanyuan. “A Study on Several Theoretical and Methodological Issues of Linguistic Landscape: A Case of Cunha Street of Macau”. China Language Strategies, 4(1), p. 74-81, 2016.). No segundo caso, os poucos estudos que existem abordam a paisagem linguística como um tipo de enunciado representativo de práticas sociais e de atividades culturais, em que a língua é o fator de significação central (e.g. Zhang & Wang, 2022Zhang, Jingni & Wang, Jiahe. “Culture, Locality and Modernity: The Function and Planning of Multimodal Tourism in Language Landscape”. Social Scientist, (3), p. 56-63, 2022.). De facto, enquanto tipo de linguagem verbal que tanto permite o ato comunicativo como pode ser entendida como um produto cultural, a língua é fulcral na criação de significações e na produção dos próprios lugares. Já do ponto de vista da geografia humanista e cultural, o papel essencial de línguas/linguagens reside no processo de construção do lugar, dado que são fundamentais para produzir sentidos, constatar identidades culturais e refletir sentimentos de pertença (Tuan, 2001Tuan, Yi-Fu. Space and Place: The Perspective of Experience. Minneapolis: University of Minnesota Press, [1977]2001.). Assim, com base no enquadramento analítico de placeness e subjetividade do lugar, Zhang Ai-Heng & Sun Jiu-Xia (2019)Zhang, Ai-Heng & Sun, Jiu-Xia. “Progress of Linguistic Landscape from the Perspective of Space Practice and Place Subjectivity”. Human Geography, 34(4), p. 13-19, 2019. DOI: https://doi.org/10.13959/j.issn.1003-2398.2019.04.002
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distinguem três categorias principais quanto aos espaços que constituem essa paisagem linguística:

  1. Espaço de estado e governo;

  2. Espaço de entidade privada;

  3. Espaço de interação de multi-atores.

Os primeiros dois tipos de espaço, em conformidade com Zhang & Sun (2019)Zhang, Ai-Heng & Sun, Jiu-Xia. “Progress of Linguistic Landscape from the Perspective of Space Practice and Place Subjectivity”. Human Geography, 34(4), p. 13-19, 2019. DOI: https://doi.org/10.13959/j.issn.1003-2398.2019.04.002
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, referem-se respetivamente às instituições oficiais/governamentais e às entidades representativas de comunidades étnicas/grupos minoritários. O terceiro tipo de espaço é, por seu turno, onde se cruzam sujeitos provenientes de contextos linguísticos e socioculturais distintos, consistindo tipicamente em sítios comerciais e turísticos, em que sobressaem o poder de fala e a representação cultural, em busca da criação de empatia entre o criador da paisagem linguística (comerciante ou prestador de serviços) e o seu público ou recetor (cliente/turista). No espaço de interação de multi-atores, a compartilha de experiências entre diversos sujeitos é concretizada por manifestações culturais em diferentes esferas urbanas, tais como sinais verbais (e.g. anúncios verbais) e visuais (e.g. imagens). Estas categorias, que seguimos adiante, podem relevar um alto grau de placeness, de subjetividade do lugar e de diversidade cultural (Relph, 2012Relph, Edward. “Reflexões sobre a emergência, aspetos e essência de lugar”. In: Marandola Jr., Eduardo; Holzer, Werther & Oliveira, Lívia de. (Orgs.). Qual o espaço do lugar? Geografia, epistemologia, fenomenologia. São Paulo: Perspetiva, 2012. p. 17-32.; Zhang & Sun, 2019Zhang, Ai-Heng & Sun, Jiu-Xia. “Progress of Linguistic Landscape from the Perspective of Space Practice and Place Subjectivity”. Human Geography, 34(4), p. 13-19, 2019. DOI: https://doi.org/10.13959/j.issn.1003-2398.2019.04.002
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).

Estudos sobre a paisagem linguística de Macau

No caso particular de Macau, apesar do seu ambiente linguístico e cultural único que reúne condições favoráveis para a investigação em torno da sua paisagem linguística, os estudos relevantes são ainda residuais e pouco sistemáticos. A maioria adota uma abordagem quantitativa e focada no multilinguismo da região, destacando a predominância da língua chinesa e a representação menor, mas não desprezível, do português e do inglês (cf. Neves, 2016Neves, Ana Cristina. “The Linguistic Landscape of Macau: A Quantitative Analysis”. In: Sciriha, Lydia (Ed.). International Perspectives on Bilingualism. Newcastle upon Tyne: Cambridge Scholars Publishing, 2016. p. 43-62.; Zhai & Zheng, 2020Zhai, Chenhui & Zheng, Ruilin. “Study on Linguistic Landscape of Macao in the Perspective of CIS”. International Journal of Linguistics, Literature and Translation, 3(8), p. 64-81, 2020. DOI: https://doi.org/10.32996/ijllt.2020.3.8.7
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; Zhang Y., 2016Zhang, Yuanyuan. “A Study on Several Theoretical and Methodological Issues of Linguistic Landscape: A Case of Cunha Street of Macau”. China Language Strategies, 4(1), p. 74-81, 2016., 2017Zhang, Hong & Chan, Brian Hok-Shing. “Translanguaging in Multimodal Macao Posters: Flexible versus Separate Multilingualism”. International Journal of Bilingualism, 21(1), p. 34-56, 2017. DOI: http://dx.doi.org/10.1177/1367006915594691
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; Zhang & Zhang, 2016Zhang, Yuanyuan & Zhang, Binhua. “Multilingualism in the Linguistic Landscape of Macau”. Applied Linguistics, (1), p. 45-54, 2016. DOI: https://doi.org/10.16499/j.cnki.1003-5397.2016.01.007
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). São apenas três os trabalhos académicos em língua portuguesa sobre a paisagem linguística de Macau. Rui Rocha & Ana Paula Dias (2020)Rocha, Rui & Dias, Ana Paula. “Para uma pedagogia da paisagem linguística: Breve análise empírica na cidade de Macau”. In: Sá, Rubens Lacerda de. (Coord.). Português para falantes de outras línguas: língua e cultura em tempos de perplexidade. Lisboa: LIDEL, 2020. p. 23-38., ao analisarem a vitalidade etnolinguística da região, enfatizam a utilização da paisagem multicultural e multilinguística da cidade como recurso pedagógico em contexto educativo. Também Zhang Xiang (2022)Zhang, Jingni & Wang, Jiahe. “Culture, Locality and Modernity: The Function and Planning of Multimodal Tourism in Language Landscape”. Social Scientist, (3), p. 56-63, 2022. salienta a interculturalidade envolvendo as línguas chinesa e portuguesa em Macau, a partir da visibilidade destas duas línguas tanto em sinais públicos como no próprio sistema de ensino no território. Por sua vez, Zhu Linke (2021)Zhu, Linke. Não fique susto pelo mau tempo: usos particulares da língua portuguese na paisagem linguística de Macau. 2021. Dissertação (Mestrado) – Faculdade de Letras, Departamento de Português, Universidade de Macau, Macau, 2021. categoriza os usos particulares da língua portuguesa nessa paisagem linguística, sem, no entanto, aprofundar as razões socioculturais por detrás deste fenómeno.

Ora, em virtude dos laços indestrinçáveis entre multilinguismo e tradução (Meylaerts, 2010Meylaerts, Reine. “Multilingualism and Translation”. In: Gambier, Yves & Van Doorslaer, Luc. (Eds.). Handbook of Translation Studies. Amsterdã: John Benjamins Publishing Company, 2010. p. 227-230.), a paisagem linguística de Macau constitui também um cenário ideal para se interrogar o fenómeno da tradução enquanto linguagem do lugar. Ela existe em espaços ditos de tradução – isto é, “places that are shaped by language traffic, places where languages and histories meet” (Simon, 2019Simon, Sherry. “The Hotel as a Translation Site: Place and Non-place, Difference and Indifference”. Dibur Literary Journal, 7, p. 45-53, 2019., p. 45) –, como é o caso dos espaços públicos de Macau. Porém, em comparação com outras cidades multilingues (e.g. Hong Kong), Macau é raramente mencionada nos trabalhos sobre paisagem linguística que consideram a tradução ou o seu papel no processo de formação de significados e na construção de identidades culturais (cf. Song, 2022Song, Ge. “Cosmopolitan Translation in Multilingual Cities: A Macao Experience”. Language and Intercultural Communication, 22(1), p. 35-49, 2022. DOI: https://doi.org/10.1080/14708477.2021.1990309
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). Assim sendo, com o intuito de preencher esta lacuna através de uma nova perspetiva de investigação, o nosso trabalho assenta no cruzamento interdisciplinar entre os estudos de tradução, da paisagem linguística e da geografia cultural e humanista, cujo foco é aqui direcionado para a constituição de placeness e subjetividade do lugar, através das práticas multilingues (as de tradução intercultural) e das relações de poder linguístico e cultural que lhes subjazem.

Tomando por base os materiais escritos espalhados pelas ruas de Macau, que designamos como sinais públicos, procedemos, de seguida, à análise dessas práticas multilingues e interculturais de tradução a partir de casos concretos. Privilegiamos materiais de visionamento diário e que estão intimamente relacionados com a vida quotidiana da população local.

Metodologia

Dado que a moldura teórica da nossa investigação decorre do cruzamento interdisciplinar supra-identificado, também a nossa abordagem metodológica é multidisciplinar.

Na nossa investigação, em continuidade com as opções metodológicas seguidas noutros estudos relevantes, tanto sobre a paisagem linguística como sobre geografia humanista (e.g., Hu & Bai, 2015Hu, Xianyang & Bai, Kai. “The Construction of Tourists’ Placeness Identity of Barkhor Street in Lhasa”. Acta Geographica Sinica, 70(10), p. 1632-1663, 2015. DOI: https://doi.org/10.11821/dlxb201510008
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; Huang & Yuan, 2015Huang, Wen-Wei & Yuan, Zhen-Jie. “Place, Placeness and the Sociocultural Investigation on Urban Village Redevelopment: A Case Study of Liede Village”. Human Geography, 30(3), p. 42-49, 2015. DOI: https://doi.org/10.13959/j.issn.1003-2398.2015.03.007
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; Neves, 2016Neves, Ana Cristina. “The Linguistic Landscape of Macau: A Quantitative Analysis”. In: Sciriha, Lydia (Ed.). International Perspectives on Bilingualism. Newcastle upon Tyne: Cambridge Scholars Publishing, 2016. p. 43-62.; Song, 2022Song, Ge. “Cosmopolitan Translation in Multilingual Cities: A Macao Experience”. Language and Intercultural Communication, 22(1), p. 35-49, 2022. DOI: https://doi.org/10.1080/14708477.2021.1990309
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), aplicámos uma metodologia de trabalho de campo, nomeadamente a abordagem etnográfica walk the city, no sentido de – enquanto investigadoras residentes em Macau – experimentar e explorar os diferentes lugares da cidade através do meio de walking (deambulação) e da mobilização, em simultâneo, de aspetos sensoriais do nosso corpo, em particular a perceção visual (Cheng, 2013Cheng, Yi’En. “Telling Stories of the City: Walking Ethnography, Affective Materialities, and Mobile Encounters”. Space and Culture, 20(10), p. 1-13, 2013. DOI: https://doi.org/10.1177/1206331213499468
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; Wunderlich, 2008Wunderlich, Filipa Matos. “Walking and Rhythmicity: Sensing Urban Space”. Journal of Urban Design, 13(1), p. 125-139, 2008. DOI: https://doi.org/10.1080/13574800701803472
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). Por outras palavras, registámos fotograficamente o que mais estimulou os nossos sentidos, com vista à recolha de dados linguísticos e, depois, à construção do corpus.

Corpus de análise

Dos objetos recolhidos ao longo do processo de observação etnográfica, assumimos, para o presente trabalho, a abordagem tradicional de Landry & Bourhis (1997)Landry, Rodrigue & Bourhis, Richard. “Linguistic Landscape and Ethnolinguistic Vitality: An Empirical Study”. Journal of Language & Social Psychology, 16(1), p. 23-49, 1997. DOI: https://doi.org/10.1177/0261927X970161002
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e focámo-nos meramente naqueles itens mais visíveis ao olhar do público e que nos suscitaram uma experiência sensorial mais intensa, a saber: placas com nomes de ruas e estabelecimentos comerciais, cartazes publicitários e anúncios emitidos por instituições e pelo governo. Todos estes são dirigidos diretamente à população local e encontram-se com relativa facilidade, retratando a realidade abrangente das práticas linguísticas e de relacionamento intercultural na cidade de Macau.

As amostras linguísticas dispersas na esfera pública, que, no nosso caso, e como se verá adiante, são sobretudo produtos de tradução, podem ser, seguindo os parâmetros apresentados por Eliezer Ben-Rafael et al. (2006)Ben-Rafael, Eliezer; Shohamy, Elana; Amara, Muhammad Hasan & Trumper-Hecht, Nira. “Linguistic Landscape as Symbolic Construction of the Public Space: The Case of Israel”. International Journal of Multilingualism, 3(1), p. 7-30, 2006. DOI: https://doi.org/10.1080/14790710608668383
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e Peter Backhaus (2007)Backhaus, Peter. Linguistic Landscapes: A Comparative Study of Urban Multilingualism in Tokyo. Clevedon, Buffalo & Toronto: Multilingual Matters, 2007., agrupadas como descendente ou oficial (top-down) e ascendente ou não oficial (bottom-up). O primeiro grupo representa os itens emitidos e distribuídos pelo governo ou autoridades públicas, como, por exemplo, sinais de trânsito e avisos públicos. São um reflexo concreto das políticas linguísticas de uma dada cidade e encontram-se com maior frequência nos chamados “espaços de estado e governo”. Por sua vez, o segundo grupo engloba aqueles itens que são de responsabilidade de indivíduos ou empresas da comunidade local, tais como placas com nomes de espaços comerciais e anúncios publicitários privados, os quais refletem basicamente as preferências individuais relativas à seleção das línguas a figurarem nos sinais públicos e podem ser observados tanto nos “espaços de entidade privada” como nos de “interação de multi-agência”.

Em síntese, a nossa recolha de dados, que decorreu entre maio e dezembro de 2022 e esteve, portanto, alicerçada na observação etnográfica e no levantamento imagético da paisagem linguística de diferentes espaços públicos da região de Macau, resultou na constituição de um corpus de amostras linguísticas com um total de 5 030 fotos7 7 Como o presente artigo decorre de um projeto de investigação mais amplo, que visa o estudo sistemático da paisagem linguística de toda a região de Macau, o corpus de trabalho tem uma dimensão alargada. Para este artigo, consideramos apenas as fotos relativas aos géneros de sinais supracitados e dessas selecionámos as mais exemplificativas das três categorias espaciais identificadas. . Desse total, foram selecionados para análise nove registos fotográficos, por os considerarmos mais representativos das categorias espaciais atrás identificadas.

Abordagem ao corpus de análise

Para a análise do corpus, e tal como Sílvia Melo-Pfeifer & Maria Célia Lima-Hernandes (2020, p. 1029)Melo-Pfeifer, Sílvia & Lima-Hernandes, Maria Célia. “Paisagens Linguísticas: ideologias, discursos e práticas multilingues nos espaços sociais”. Domínios De Lingu@gem, 14(4), p. 1024-1058, 2020. DOI: https://doi.org/10.14393/DL44-v14n4a2020-1
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assinalam, no campo dos estudos da paisagem linguística, “à contagem de línguas, que diagnostica a presença de línguas e a (des)valorização da diversidade linguística no tempo e no espaço, deverá associar-se uma abordagem interpretativa e qualitativa”. Nesse sentido, levámos a cabo uma análise textual descritiva e explicativa dos nove registos fotográficos tomados como exemplos mais ilustrativos, por forma a apurar como as práticas multilingues, entre as quais se realça a de tradução, desempenham funções de mediação e conciliação, ao mesmo tempo que alimentam a placeness e a subjetividade do lugar, moldam a vida dos cidadãos e até a paisagem e a identidade da cidade. Não menos importante, é de salientar que, combinando textos visuais e escritos, a paisagem linguística é sempre multimodal (Cenoz & Gorter, 2008Cenoz, Jasone & Gorter, Durk. “The Linguistic Landscape as an Additional Source of Input in Second Language Acquisition”. International Review of Applied Linguistics in Language Teaching, 46(3), p. 267-287, 2008. DOI: https://doi.org/10.1515/IRAL.2008.012
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). Por isso, as interações entre as línguas, imagens visuais e o espaço onde estas se inscrevem são também relevantes para a nossa interpretação desta paisagem e das suas características.

Análise e discussão do corpus

A paisagem linguística de uma determinada cidade, enquanto elemento essencial da construção simbólica do espaço público (Ben-Rafael et al., 2006Ben-Rafael, Eliezer; Shohamy, Elana; Amara, Muhammad Hasan & Trumper-Hecht, Nira. “Linguistic Landscape as Symbolic Construction of the Public Space: The Case of Israel”. International Journal of Multilingualism, 3(1), p. 7-30, 2006. DOI: https://doi.org/10.1080/14790710608668383
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), pode não apenas revelar informações sobre as políticas e dinâmicas linguísticas locais, mas também configurar um discurso em transição, no qual se materializam os resultados de negociações culturais entre diversos sujeitos (i.e. estado e governo, entidade privada e multi-atores) (Zhang & Sun, 2019Zhang, Ai-Heng & Sun, Jiu-Xia. “Progress of Linguistic Landscape from the Perspective of Space Practice and Place Subjectivity”. Human Geography, 34(4), p. 13-19, 2019. DOI: https://doi.org/10.13959/j.issn.1003-2398.2019.04.002
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). À luz desta premissa, todas as unidades de texto selecionadas e analisadas foram, primeiro, categorizadas em três grupos – “espaço de estado e governo” (Figuras 1 a 3), “espaço de entidade privada” (Figuras 4 a 6) e “espaço de interação de multi-atores” (Figuras 7 a 9) –, representando cada um diferentes características das práticas linguísticas (e tradutórias) potenciadoras da construção de placeness e subjetividade do lugar.

Espaço de estado e governo

As autoridades competentes e instituições oficiais, no papel de forças motoras, podem proteger e consolidar o estatuto e o domínio das suas línguas oficiais através da legislação vigente, por forma a assegurar a visibilidade e uniformidade destas línguas na paisagem pública, a par de imprimirem a sua ideologia na representação de placeness para influenciar e orientar a população em geral e particularizar a identidade cultural urbana (Zhang & Sun, 2019Zhang, Ai-Heng & Sun, Jiu-Xia. “Progress of Linguistic Landscape from the Perspective of Space Practice and Place Subjectivity”. Human Geography, 34(4), p. 13-19, 2019. DOI: https://doi.org/10.13959/j.issn.1003-2398.2019.04.002
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). Em Macau, os sinais públicos de flow de cima para baixo caraterizam-se, como será evidenciado, pela copresença das línguas oficiais – o chinês e o português –, e têm como público-alvo toda a população residente. Em simultâneo, dada a convivência de diversos grupos etnolinguísticos neste território, pode observar-se ainda a existência de outras línguas em utilização, embora por apenas uma pequena parte dos residentes, para dar resposta a situações específicas.

Tomando como exemplo a Figura 1, neste aviso governamental afixado na Rotunda de Carlos da Maia (Três Candeeiros), à volta da qual se concentram sobretudo as comunidades filipina e indonésia de Macau, entre outros grupos culturais minoritários, a mesma informação é apresentada, em paralelo, em chinês, português, inglês, indonésio e vietnamita. Trata-se de um multilinguismo visibilizado por via da tradução, onde as diferentes línguas estão claramente demarcadas e, ao visarem grupos distintos de leitores monolingues (Zhang & Chan, 2017Zhang, Hong & Chan, Brian Hok-Shing. “Translanguaging in Multimodal Macao Posters: Flexible versus Separate Multilingualism”. International Journal of Bilingualism, 21(1), p. 34-56, 2017. DOI: http://dx.doi.org/10.1177/1367006915594691
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), criam uma relação de proximidade entre o estado e as populações locais. É a partir desta prática multilingue e tradutória que se cria a placeness no espaço em causa, traduzida na multiculturalidade decorrente da coexistência de comunidades oriundas de contextos etnolinguísticos diferentes.

Figura 1
Aviso governamental

Quanto às placas com nomes de ruas, sinais públicos mais tradicionais e comuns da paisagem linguística da cidade de Macau, estas constituem um legado português, com toponímia bilingue traduzida da língua portuguesa para a chinesa. Geralmente, estes sinais são divididos em duas partes de dimensão idêntica e a versão chinesa é sempre posicionada acima da portuguesa8 8 Antes da transferência de soberania, a versão portuguesa ocupava três quartos da área e estava à esquerda dos sinais enquanto a versão chinesa contava com apenas um quarto e ficava à direita (Gu & Xu, 2019). . A disposição visual do texto não pode assim ser tomada como indicadora da direção de tradução e, apesar de pôr em destaque o facto de Macau ser, antes de mais, uma cidade chinesa (Song, 2022Song, Ge. “Cosmopolitan Translation in Multilingual Cities: A Macao Experience”. Language and Intercultural Communication, 22(1), p. 35-49, 2022. DOI: https://doi.org/10.1080/14708477.2021.1990309
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), também não deixa de assinalar o estatuto oficial destas duas línguas. De facto, os topónimos, cujo processo de denominação não é nada estático, não apenas fazem parte da paisagem linguística em que se inserem, mas também remetem para a memória sociocultural de uma comunidade diversa, ao prestar homenagem aos seus contextos históricos, étnicos e geográficos, profundamente ligados à constituição e desenvolvimento do próprio espaço (Teis, Seide & Lucas, 2018Teis, Denize Terezinha; Seide, Márcia Sipavicius & Lucas, Patricia. “Os topônimos na paisagem linguística da Av. Zelina em São Paulo: um encontro na interdisciplinaridade”. Revista do GELNE, 20(2), p. 16-29, 2018. DOI: https://doi.org/10.21680/1517-7874.2018v20n2ID14089
https://doi.org/10.21680/1517-7874.2018v...
).

Tendo um total de 1 030 metros de comprimento, a Avenida do Conselheiro Ferreira de Almeida (Figura 2) é a artéria vital do tráfego de Macau, localizada numa das zonas comerciais mais movimentadas. O seu nome português homenageia o conselheiro Ferreira de Almeida, membro do parlamento português que, em 1895, exerceu o cargo de Ministro da Marinha. Porém, esta homenagem não se expressa no nome chinês da rua. Ao combinar a tradução fonética e a tradução literal – “肥利喇亞美打” corresponde à transliteração cantonesa de “Ferreira de Almeida” e “大馬路” ao significado de “Avenida” –, a omissão do título “conselheiro” faz com que a versão chinesa seja uma reprodução parcial do texto original, sem qualquer significação particular. Este nome longo e exótico, com pronúncia estranha, dificulta a sua utilização pelo povo chinês local, razão pela qual a rua é mais conhecida pelos seus nomes convencionais “荷蘭園大馬路” (avenida do campo dos holandeses) e “荷蘭園正街” (rua principal do campo dos holandeses), que se colocam com ideogramas menores entre parênteses na placa. Esta referência aos “holandeses” está relacionada com a vitória histórica dos portugueses face à invasão holandesa em 1622. Quando as tropas portuguesas repeliram os inimigos, os prisioneiros de guerra foram mantidos nesta zona, daí o seu nome popular “campo dos holandeses”. Esta continuidade semântica refletida na toponímia de Macau (Zhang X., 2022Zhang, Jingni & Wang, Jiahe. “Culture, Locality and Modernity: The Function and Planning of Multimodal Tourism in Language Landscape”. Social Scientist, (3), p. 56-63, 2022.) pode não apenas afetar as perceções culturais dos residentes sobre este lugar, como também atribuir significações específicas ao mesmo contexto sociocultural e histórico. O falante de chinês que não esteja familiarizado com a história de Macau não reconhecerá as referências; para esse público sobressai a presença holandesa – e não portuguesa – no território, ou tão-só uma presença estrangeira cuja identidade cultural será porventura irrelevante.

Figura 2
Placa com nome de rua

Se, por um lado, consideramos o bilinguismo ou até o multilinguismo, que acaba de se exemplificar, como uma das singularidades inerentes à paisagem linguística deste tipo de espaços, por outro, é inegável que as línguas envolvidas raramente têm estatutos igualitários. Na maioria dos casos, como na Figura 3, em consequência do respeito pelas políticas linguísticas oficiais da RAEM, as informações publicitárias são transmitidas tanto em chinês como em português. Destaca-se, ainda assim, a maior valorização da versão chinesa (texto de partida) em detrimento da portuguesa (texto de chegada), o que se espelha não apenas na estruturação dos textos e na respetiva disposição gráfica, mas também nos problemas linguísticos manifestados. Mais especificamente, os carateres chineses ocupam sempre uma posição de prestígio em cartazes, com tamanho de letra maior e em cor mais saliente. Pelo contrário, os textos portugueses, aparentemente resultantes de um processo de tradução do chinês, manifestam-se de forma mais discreta e, às vezes, de difícil compreensão.

Figura 3
Anúncio governamental

Atentemos nos slogans patentes na Figura 3. A frase completa chinesa foi dividida em duas orações, colocadas respetivamente em dois banners que estão dispostos lado a lado – “適時接種加強劑” (inoculação oportuna da dose de reforço da vacina contra a COVID-19) e “疫苗效力更長久” (aumento da eficácia da vacina) –, garantindo a compreensibilidade e a clareza da mensagem. Contudo, a mesma estratégia de disposição do texto pode ser equívoca na versão traduzida em português: para se adaptar o texto de chegada à partição do texto de partida, a frase portuguesa foi também dividida em duas partes, cada uma colocada num banner diferente: “Administrar o reforço da vacina de forma oportuna”, uma oração infinitiva que funciona como sujeito, e “aumenta a eficácia da vacina”, que funciona como predicado. Esta separação entre sujeito e predicado, provocada pela quebra visual, que serve quase como uma vírgula, faz com que se trate de duas orações independentes, perturbando de certa forma a leitura do texto e a sua posterior compreensão. Além disso, também se observam alguns estranhamentos linguísticos – ou tradutorês [translationese] –, que dificultam o entendimento desta mensagem de apelo à participação dos residentes na campanha de vacinação contra a COVID-19: “Administrar o reforço” e a expressão adverbial “de forma oportuna”, tradução literal do chinês, em vez de expressões mais aceitáveis como “reforço da vacina” e “em tempo útil”. Obviamente, a população em geral não consegue administrar a si própria a vacina, como parece estar implícito no texto português, porque esse papel cabe antes aos funcionários dos serviços médicos. Dito de outro modo, os residentes podem somente receber a administração da vacina, e o que se expressa na tradução viola os princípios lógicos elementares.

A existência deste exemplo na paisagem linguística dos espaços de estado e governo denota, no fundo, as relações de poder assimétricas em favor do chinês e em detrimento do português em Macau, apesar de serem ambas línguas oficiais. Essa assimetria, correspondente à própria dinâmica demográfica da região, é porventura representativa da insensibilidade oficial das autoridades competentes perante a utilização da língua portuguesa e a sua tradução. Tal insensibilidade será, em paralelo, sintomática de uma tentativa de construção de uma Macau pós-colonial, de identidade marcadamente chinesa, mas aberta a outras comunidades linguísticas. Assim, dado o número reduzido de falantes de português em Macau, acreditamos que a tradução portuguesa neste tipo de espaços públicos, ao invés de ser necessariamente um instrumento de intercâmbio, tem uma função mais simbólica e estratégica de reforço da identidade multicultural de Macau e sobretudo da sua afirmação como plataforma de mediação entre a China e os espaços de língua portuguesa. Tal como argumenta Song Ge (2022, p. 43)Song, Ge. “Cosmopolitan Translation in Multilingual Cities: A Macao Experience”. Language and Intercultural Communication, 22(1), p. 35-49, 2022. DOI: https://doi.org/10.1080/14708477.2021.1990309
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, “the greatest motivation to have text translated into Portuguese is to keep this specific sociolinguistic feature, which now facilitates Macao’s role as a bridge between China and Portuguese-speaking countries”. Resumidamente, ao injetar, por meio de práticas multilingues de tradução, a sua ideologia multicultural na representação de placeness em espaços públicos deste género, o governo proporciona um exemplo de paisagem linguística utilitária que serve as comunidades locais.

Espaço de entidade privada

Em oposição aos espaços de estado e governo, nos de entidade privada sobressaem os sinais públicos de flow de baixo para cima, os quais são da autoria de indivíduos ou instituições não governamentais e destinados às comunidades étnicas locais. Uma vez que a paisagem linguística deste tipo é normalmente criada por vontade ou necessidade individual, com menos interferência de forças administrativas superiores, pode assumir formas e conteúdos mais variados, dando assim visibilidade à subjetividade particular do criador da paisagem (de quem expõe e também de quem traduz) e à diversidade cultural de placeness (Zhang & Sun, 2019Zhang, Ai-Heng & Sun, Jiu-Xia. “Progress of Linguistic Landscape from the Perspective of Space Practice and Place Subjectivity”. Human Geography, 34(4), p. 13-19, 2019. DOI: https://doi.org/10.13959/j.issn.1003-2398.2019.04.002
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). Nesse sentido, escolhemos como casos exemplificativos avisos privados afixados em área pública ao redor de edifícios habitacionais. Todos estes, ao cumprirem funções pragmáticas, visam os moradores das respetivas áreas residenciais e, por isso, informam sobre assuntos de interesse comum.

Figura 4
Aviso privado (a)

Por exemplo, a Figura 4 apresenta um aviso bilingue sobre a proibição de estacionamento de motociclos e de colocação de lixo em área pública. O ponto digno de ênfase neste aviso é a utilização do chinês a par do inglês, ao invés do português. A despeito de não ser uma língua nativa nem oficial, o inglês, enquanto segunda língua mais falada na cidade, ocupa também uma posição privilegiada na paisagem linguística urbana, especialmente em sinais bottom-up, como é o caso, ultrapassando até a proporção de uso do português9 9 Esta realidade reflete, de uma outra perspetiva, a divergência entre as escolhas linguísticas na prática quotidiana da população e as políticas linguísticas implementadas pelo governo. (Zhang Y., 2017Zhang, Yuanyuan. “澳門語言景觀調查 [Pesquisa de paisagem linguística em Macau]”. Zhongguo Yuyan Shenghuo Zhuangtai Baogao/中國語言生活狀況報告, (1), p. 237-243, 2017.; Zhang & Zhang, 2016Zhang, Yuanyuan. “A Study on Several Theoretical and Methodological Issues of Linguistic Landscape: A Case of Cunha Street of Macau”. China Language Strategies, 4(1), p. 74-81, 2016.). Essencialmente, o que está em causa nesta circunstância é a inexistência de orientações jurídicas ou diretrizes específicas relativas ao comportamento linguístico em espaços públicos. Por isso, a língua inglesa, que “detém um estatuto de facto como língua de trabalho adicional do Governo de Macau, sendo igualmente usada como língua de intercomunicação entre as diferentes etnias e nacionalidades presentes em Macau” (Rocha & Dias, 2020Rocha, Rui & Dias, Ana Paula. “Para uma pedagogia da paisagem linguística: Breve análise empírica na cidade de Macau”. In: Sá, Rubens Lacerda de. (Coord.). Português para falantes de outras línguas: língua e cultura em tempos de perplexidade. Lisboa: LIDEL, 2020. p. 23-38., p: 31), torna-se uma escolha preferencial de comunicação pela população local na constituição de avisos e outros sinais públicos, o que também contribui para consolidar o caráter cosmopolita da cidade e conferir aos espaços uma placeness de modernidade e inclusividade. A elevação do inglês como língua de intermediação privilegiada entre as diversas comunidades pode, em contrapartida, dispensar a prática de tradução para as línguas destas comunidades, a par de promover uma comunicação global em Macau.

Embora mais escassas e de acesso mais limitado, encontramos ainda algumas amostras representativas em espaços de entidade privada de tradução para a língua portuguesa (Figuras 5 e 6).

Figura 5
Aviso privado (b)
Figura 6
Aviso privado (c)

As Figuras 5 e 6 correspondem a dois avisos emitidos por diferentes empresas administradoras de condomínio, mas com informações idênticas em língua chinesa: “公共區域, 禁泊車輛; 違者報警, 拖車處理” (É proibido o estacionamento de veículos em área pública. No caso de infração, avisaremos [a segurança] a polícia para rebocar os veículos mal-estacionados). Ambos os avisos apresentam a mesma informação em português, a qual resulta de estratégias de tradução divergentes.

O aviso bilingue chinês-português na Figura 5 adota, na tradução, uma estratégia de economia verbal que pode descrever-se como domesticação (Venuti, 2008Venuti, Lawrence. The Translator’s Invisibility: A History of Translation. Londres & Nova York: Routledge, 2008.), por seguir em maior proximidade o tipo de texto (mais breve) que se encontraria num espaço público em Portugal. Ou seja, omitindo as informações de pormenor, a tradução transmite apenas a mensagem nuclear do aviso: “proibido estacionar”, o que deixa as sanções implícitas. Esta mensagem é mais simples, direta e imediata do que a que consta do aviso trilingue chinês-inglês-português na Figura 6, e talvez por isso seja mais eficaz. O referido aviso trilingue valoriza, por seu turno, uma estratégia de estrangeirização (Venuti, 2008Venuti, Lawrence. The Translator’s Invisibility: A History of Translation. Londres & Nova York: Routledge, 2008.), ao apresentar um texto mais descritivo e próximo da língua de partida (chinês): a tradução portuguesa, a par da tradução inglesa, reproduz basicamente toda a informação original, palavra por palavra, e explicita claramente as sanções, que parecem ter um importante papel regulador da vida social em Macau, pelo menos em língua chinesa. Em todo o caso, o emprego de estratégias de tradução distintas evidencia a diversidade cultural patente nestas práticas multilingues flexíveis, o que pode enriquecer as conotações de placeness e impactar a subjetividade do lugar.

Importa ainda mencionar as informações adicionais comunicadas pelos elementos semióticos destes avisos privados. Como vimos, no texto original em chinês, somente se indica que é proibido o estacionamento de veículos em área pública, sem esclarecer que “veículos” são estes. No entanto, essa lacuna é suprida pela inclusão gráfica de símbolos relevantes: para o aviso na Figura 5, os “veículos” reportam-se a carros e motociclos, enquanto, no caso da Figura 6, o estacionamento de bicicletas também está impedido. Outrossim, os símbolos de proibição de estacionamento de carros e de motociclos são idênticos nos dois avisos, o que comprova, em certa medida, a universalidade destes signos.

Não obstante as tentativas das autoridades competentes para influenciar e orientar os comportamentos da população, esta última, enquanto interveniente na paisagem linguística, goza, na prática, de grande liberdade e flexibilidade no que toca à seleção linguística e ao estilo de comunicação, expressando assim a sua própria subjetividade através da paisagem linguística, além de moldar a placeness dos espaços que a rodeiam.

Espaço de interação de multi-atores

À parte os espaços de estado e governo e de entidade privada, existem ainda os espaços de interação de multi-atores, ligados inextricavelmente às zonas comerciais e turísticas, e com incidência em sinais públicos de flow de baixo para cima, da autoria de indivíduos ou empresas locais, como, por exemplo, placas com nomes de lojas, cartazes e folhetos publicitários comerciais, entre outros. Na paisagem linguística deste género, cuja subjetividade é construída com base em interações e compartilha de experiências entre comerciantes/prestadores de serviços e clientes/visitantes, as línguas são vistas como um símbolo cultural com mais-valias a nível económico; a função simbólica das línguas sobrepõe-se assim à sua função comunicativa (Zhang & Sun, 2019Zhang, Ai-Heng & Sun, Jiu-Xia. “Progress of Linguistic Landscape from the Perspective of Space Practice and Place Subjectivity”. Human Geography, 34(4), p. 13-19, 2019. DOI: https://doi.org/10.13959/j.issn.1003-2398.2019.04.002
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). Os nomes de lojas, por exemplo, enquanto elementos potencialmente constituídos por nomes próprios (Seide, 2021Seide, Márcia Sipavicius. “Proposta de definição interdisciplinar de nome próprio”. Onomástica desde América Latina, 2(4), p. 70-94, 2021. DOI: https://doi.org/10.48075/odal.v0i0.27562
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), podem tornar-se, através deste tipo de nome, uma imagem de marca de um produtor de bens e serviços, cuja designação desperta uma teia de associações sociais, linguísticas, culturais e históricas (Reyes-Contreras, 2020Reyes-Contreras, Miguel. “Acercamiento onomástico al nombre de las bandas de Heavy Metal”. Onomástica desde América Latina, 2(3), p. 59-81, 2020. DOI: https://doi.org/10.48075/odal.v0i0.26062
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). No caso especial de Macau, existem regulamentos específicos sobre a utilização de línguas neste contexto. Nos termos dos n.os 1 e 2 do artigo 17.º doCódigo Comercial da RAEMCódigo Comercial da Região Administrativa Especial de Macau. Disponível em: https://bo.io.gov.mo/bo/i/99/31/codcompt/. Acesso em: 15 dez. 2022.
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10 10 Disponível em: https://bo.io.gov.mo/bo/i/99/31/codcompt/. :

  1. A firma deve obrigatoriamente ser redigida numa ou em ambas as línguas oficiais, podendo ainda, no segundo caso, conter uma versão em inglês.

  2. Quando a firma seja redigida em mais do que uma língua e seja composta por expressões alusivas à atividade comercial desenvolvida deve existir um mínimo de correspondência entre as várias versões na parte relativa a tal atividade.

Os exemplos das Figuras 7 a 9 cumprem este Código.

Figura 7
Placa de estabelecimento comercial (a)

Na Figura 7, observa-se uma placa quadrilingue, de que consta o nome de um estabelecimento de massagens. Ao chinês, português e inglês, as três línguas mais importantes em Macau, junta-se ainda o japonês, o que, por um lado, insinua que o público-alvo deste estabelecimento abrange também os falantes dessa língua e, por outro, é espelho da diversidade étnica da cidade. Como sempre, a língua chinesa permanece na posição central e sobressai pelas letras maiores, enquanto a informação em inglês é mais pequena, seguida, em tamanho, pelos textos em japonês e em português. Note-se que há um erro ortográfico no texto em português – “MAEEAGENS” em vez de “MASSAGENS”. Esta gralha, a que acresce o facto de o nome da loja “知心” (sinceridade) não estar traduzido, antes mantendo a palavra inglesa “SINCERE”, faz-nos pressupor que talvez o responsável de loja não esteja familiarizado com a língua portuguesa, utilizando-a apenas para cumprir as orientações governamentais. Também a não tradução da informação adicional “24小时营业11 11 Esta informação foi redigida em chinês simplificado, forma de escrita vulgarmente popular no Interior da China. Porém, é o chinês tradicional que se usa como padrão oficial de escrita de língua chinesa em Macau. ” (aberto 24 horas) para as outras línguas subscreve a centralidade da língua ou antes dos clientes-alvo chineses, porque se mantêm os demais falantes (não chineses) na ignorância quanto ao horário de funcionamento do estabelecimento.

A Figura 8 está relacionada, por seu turno, com um restaurante de comida tradicional portuguesa, cujo proprietário, Adriano Neves, é um nativo macaense. De acordo com as informações divulgadas no website oficial deste restaurante12 12 Disponível em: https://alorcha.com/pt/home/. , a sua denominação “A Lorcha” designa um tipo de barco com origem em Macau, construído com velas provenientes do junco chinês, mas com casco da caravela portuguesa, sendo esta ideia de hibridismo espelho da identidade híbrida do próprio proprietário e refletindo-se na gastronomia que o restaurante serve e na sua decoração singular, que relembra o interior de uma lorcha.

Figura 8
Placa de estabelecimento comercial (b)

Logo a partir da placa trilingue e multimodal deste estabelecimento comercial podemos apreciar a figura da embarcação que lhe dá o nome. A explicação adicional proporcionada por este elemento semiótico é vital para os leitores chineses que não dominem o português, pois o nome chinês traduzido do restaurante “船屋” (Casa do barco), sendo um hiperónimo (“船”) em vez do hipónimo (“老閘船”, termo chinês equivalente que, de facto, existe), coloca em foco meramente as características da sua decoração interior, sem especificar o tipo de embarcação nem a história por detrás dessa nomeação. Aliás, diferentemente de todos os casos de estudo analisados nesta secção, é a língua portuguesa que ganha uma posição de destaque nesta placa, o que não é de estranhar, pois o proprietário tem ligação íntima com a comunidade macaense, tradicionalmente de língua identitária portuguesa (Duque, 2018Duque, Eurico António da Rosa. Práticas e atitudes linguísticas da comunidade macaense em Macau: construção identitária. 2018. Disertação (Mestrado) – Departamento de Português, Faculdade de Letras, Universidade de Macau, Macau, 2018.; Li, 2003Li, Changsen. “關於澳門土生葡人的語言屬性問題 [On the question of Macanese’s Linguistic Identity]”. Journal of Sino-Western Cultural Studies/, (2), p. 89-97, 2003.). Os carateres chineses, por sua vez, situam-se no canto inferior direito, em forma de uma moeda tradicional chinesa. Assim sendo, ao combinar os elementos simbólicos da herança cultural portuguesa (lorcha) e chinesa (moeda), esta placa representa exemplarmente a diversidade cultural que distingue tanto no restaurante como na cidade de Macau, atribuindo, em simultâneo, a este lugar uma subjetividade de hibridismo cultural.

A Figura 9 demonstra uma placa de um café localizado na zona turística da Vila de Coloane (perto da Avenida de Cinco de Outubro).

Figura 9
Placa de estabelecimento comercial (c)

Especializado na preparação de bebidas com café, o restaurante Seu Cafe também fornece aos clientes gastronomia japonesa e italiana, como arroz com caril, udon, esparguete, pãezinhos, entre outros, mas não comida portuguesa. Este facto faz com que a utilização de um nome inteiramente português13 13 O café utiliza apenas o nome em língua portuguesa, sem qualquer informação sobre o seu nome em chinês. O que os caracteres chineses na placa identificam é o seu proprietário e a natureza do estabelecimento: “宏圖餐飲管理有限公司” (Wang Tou Administração de Géneros Alimentícios Limitada). por parte do estabelecimento seja digna do nosso interesse. Levando em conta a sua localização numa área turística popular, estimamos que esta designação, provavelmente produzida a partir de um processo de tradução oculto, tenha como objetivo (re)criar uma atmosfera exótica a fim de atrair os visitantes. Para os admiradores de música brasileira, este nome pode soar a um trocadilho com o nome do artista Seu Jorge. Ainda que os chineses locais ou os turistas fora dos Países de Língua Portuguesa não consigam perscrutar o significado do nome do restaurante, o uso do português pode não apenas suscitar a sua curiosidade, mas também imprimir uma identidade multicultural e cosmopolita a Macau, elementos definidores, além do mais, de uma subjetividade do lugar.

Em síntese, na formação da paisagem linguística dos espaços de interação de multi-atores, sujeita a menos constrangimentos do que os outros tipos de espaços, releva-se, devido à forte fluidez social, um intercâmbio empático entre os proprietários de lojas e os clientes/turistas, processo em que são decisivos a função simbólica (ao invés da informativa) das línguas, a expressão de identidade e subjetividade e os benefícios comerciais (Zhang & Sun, 2019Zhang, Ai-Heng & Sun, Jiu-Xia. “Progress of Linguistic Landscape from the Perspective of Space Practice and Place Subjectivity”. Human Geography, 34(4), p. 13-19, 2019. DOI: https://doi.org/10.13959/j.issn.1003-2398.2019.04.002
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). Sendo promotores do diálogo intercultural, estes espaços acentuam a construção interativa da sua placeness, assente numa subjetividade marcada por grande diversidade cultural, conforme destacada pelas práticas linguísticas mais livres.

Considerações finais

Situada num ambiente multilingue e cosmopolita, a cidade de Macau evidencia, como se viu através dos exemplos, uma paisagem linguística repleta de práticas diárias de tradução: “Macao people’s daily translation practices, as well as their perceptions of translation, are rich. Frequent and complicated traffic between different languages (or language variants) and cultures acculturate Macao people, most of whom have been accustomed to the presence of other written languages other than TC [chinês tradicional]” (Song, 2022Song, Ge. “Cosmopolitan Translation in Multilingual Cities: A Macao Experience”. Language and Intercultural Communication, 22(1), p. 35-49, 2022. DOI: https://doi.org/10.1080/14708477.2021.1990309
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, p. 46). Por terem experiências e objetivos distintos, os construtores desta paisagem podem conduzir, através das suas práticas linguísticas e interações com os espaços, a diferenças significativas no que toca à (re)configuração e interpretação de placeness e subjetividade do lugar. Trata-se de um processo de construção interativa e contínua, em que diferentes línguas e culturas dialogam, negociam, competem entre si e se misturam. Ora, o chinês, o português e o inglês são as três línguas principais dessa paisagem linguística, mas com relações de poder assimétricas, coexistindo a par de outras línguas estrangeiras asiáticas com menor presença, tais como o japonês, o indonésio e o vietnamita, o que revela a dinâmica multilingue e intercultural do território e a sua heterogeneidade sociocultural. O chinês predomina sempre como a língua mais falada e, portanto, com maior visibilidade e potencialidade de gerar placeness. Por sua vez, o inglês, uma língua internacional que dinamiza a aproximação a uma economia cada vez mais globalizada, tem vindo a ganhar importância, constituindo uma outra escolha de preferência da população local. Quanto ao português, apesar de aparentar estar fora do alcance de uso diário de muitos que vivem no território, a sua representação na paisagem linguística da cidade também não pode ser negligenciada ou menosprezada, tendo, aliás, em conta os esforços do governo. Sem dúvida, a região de Macau, no papel de “Base de Intercâmbio e Cooperação para a Promoção da Coexistência Multicultural, com Predominância da Cultura Chinesa”, representa “uma arena de muitas cenas de interações” (Zhang X., 2022Zhang, Jingni & Wang, Jiahe. “Culture, Locality and Modernity: The Function and Planning of Multimodal Tourism in Language Landscape”. Social Scientist, (3), p. 56-63, 2022., p. 112): foi, é e sempre será uma ponte de conexão entre a China e o universo lusófono ou, através de Portugal, com o mundo europeu.

Esse multilinguismo e a própria tradução, explícita ou oculta, na paisagem linguística de Macau constituem uma linguagem do território que, por um lado, pode influenciar a placeness e a subjetividade do lugar e, por outro, permite inferir as diferenciais de poder entre línguas, mantendo assim a sua ligação com Portugal, que é também herança colonial e representação do “sincretismo cultural único da cidade” (Almeida, 2020Almeida, Rosa Vieira de. “À margem das margens”. In: Laborinho, Ana Paula; Cordeiro, Gonçalo; Pinto, Marta Pacheco & Nunes, Ariadne. (Orgs.). Macau: Novas Leituras. Lisboa: Tinta-da-China, 2020. p. 99-107., p. 101). As práticas tradutórias multilingues e multimodais não somente consolidam os valores positivos de uma nova “sensação de lugar” (Stokowski, 2017Stokowski, Patricia A. “Languages of Place and Discourses of Power: Constructing New Senses of Place”. Journal of Leisure Research, 32(4), p. 368-382, 2017. DOI: https://doi.org/10.1080/00222216.2002.11949977
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), como também refletem as memórias humanas e as interações sociais em contextos dinâmicos, mutáveis e fluídos num determinado local geográfico. Essas práticas linguísticas podem assim ocultar discursos de poder, construindo, ao mesmo tempo, uma ponte de ligação entre representações espaciais e vozes sociais, enraizada no processo de recriação e reprodução de sentidos a partir das linguagens do lugar.

Por fim, partindo de uma investigação interdisciplinar no âmbito dos estudos de tradução, da paisagem linguística e da geografia cultural e humanista, o presente trabalho procura trazer novas perspetivas em prol da promoção da viragem espacial (spatial turn) nos Estudos (Descritivos) de Tradução, na qual se destaca a intersecção entre tradução, língua, história, cultura, memória e espaço público urbano, de modo a acrescentar as dimensões analíticas multimodais ao conceito tradicional de paisagem linguística e de tradução.

  • 1
    Em chinês: 三文四語 (sān wén sì yǔ).
  • 2
    A palavra “cidade” deve ser aqui entendida de forma mais lata, abrangendo não apenas a Península de Macau (cidade de Macau num sentido mais estrito), mas todo o território da RAEM.
  • 3
    Mais pormenorizadamente, a partir da dinastia Qin (221 a.C. – 206 a.C.).
  • 4
    Ano em que se registou o desembarque dos primeiros portugueses em Macau.
  • 5
    Placelessness, termo proposto por Augé (2008)Augé, Marc. Non-places: Introduction to an Anthropology of Supermodernity. Traduzido por John Howe. Londres: Verso, 2008., tem por base o conceito de placeness: trata-se da erradicação de lugares distintivos e da estandardização deliberada de paisagens, que homogeneíza os lugares, tornando-os todos iguais e sem características particulares – ou seja, non-places (não-lugares).
  • 6
    Segundo Tuan (1980)Tuan, Yi-Fu. Topofilia: um estudo da perceção, atitudes e valores do meio ambiente. Tradução de Lívia de Oliveira. São Paulo: Difel, 1980., “a topofilia é uma intimidade com o ambiente em que se vive, essa relação de intimidade é construída de maneiras diferentes e depende das vivências de cada indivíduo” (cf. Aguiar, 2018Aguiar, Felipe Costa. “A Geografia, o lugar e os sujeitos”. Revista Vértices, 20(1), p. 29-37, 2018. DOI: https://doi.org/10.19180/1809-2667.v20n12018p29-37
    https://doi.org/10.19180/1809-2667.v20n1...
    , p. 32).
  • 7
    Como o presente artigo decorre de um projeto de investigação mais amplo, que visa o estudo sistemático da paisagem linguística de toda a região de Macau, o corpus de trabalho tem uma dimensão alargada. Para este artigo, consideramos apenas as fotos relativas aos géneros de sinais supracitados e dessas selecionámos as mais exemplificativas das três categorias espaciais identificadas.
  • 8
    Antes da transferência de soberania, a versão portuguesa ocupava três quartos da área e estava à esquerda dos sinais enquanto a versão chinesa contava com apenas um quarto e ficava à direita (Gu & Xu, 2019Gu, Yao & Xu, Yan. “‘三文四語’: 澳門街牌字母符號的情感化設計 [‘Três línguas escritas e quatro idiomas falados’: o design emocional dos símbolos alfabéticos das placas com nomes de ruas de Macau]”. Revista de Cultura, (104), p. 35-46, 2019.).
  • 9
    Esta realidade reflete, de uma outra perspetiva, a divergência entre as escolhas linguísticas na prática quotidiana da população e as políticas linguísticas implementadas pelo governo.
  • 10
  • 11
    Esta informação foi redigida em chinês simplificado, forma de escrita vulgarmente popular no Interior da China. Porém, é o chinês tradicional que se usa como padrão oficial de escrita de língua chinesa em Macau.
  • 12
  • 13
    O café utiliza apenas o nome em língua portuguesa, sem qualquer informação sobre o seu nome em chinês. O que os caracteres chineses na placa identificam é o seu proprietário e a natureza do estabelecimento: “宏圖餐飲管理有限公司” (Wang Tou Administração de Géneros Alimentícios Limitada).

Agradecimentos

Gostaríamos de manifestar o nosso profundo agradecimento à Professora Doutora Marta Pacheco Pinto pelo seu apoio inestimável, paciência incansável e sugestões valiosas ao longo de todo o processo de desenvolvimento deste trabalho.

Referências

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    17 Maio 2024
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    16 Jan 2023
  • Aceito
    09 Nov 2023
  • Publicado
    Dez 2023
Universidade Federal de Santa Catarina Campus da Universidade Federal de Santa Catarina/Centro de Comunicação e Expressão/Prédio B/Sala 301 - Florianópolis - SC - Brazil
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