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OS PREFÁCIOS DAS MIL E UMA NOITES

THE PREFACES TO THE ONE THOUSAND AND ONE NIGHTS

Resumo

Partindo de uma concepção responsiva da linguagem e de seus enunciados, nossa pesquisa examina alguns dos prefácios escritos por tradutores europeus das Mil e uma noites para descobrir, por meio deles, não só as distintas relações entre a Europa e o Oriente ao longo do tempo, mas principalmente a formação de uma tradição combativa de traduções daquela obra, na qual os diferentes tradutores buscam contestar e suplantar os anteriores – ao mesmo tempo em que traduzem para alguém, também traduzem contra alguém. Tomamos como base dois ensaios de Jorge Luis Borges (“Las mil y una noches” e “Los traductores de Las mil y una noches”), aos quais se adicionam as considerações de Edward Said sobre o Orientalismo e os prefácios de Mamede M. Jarouche, Antoine Galland, Edward W. Lane e Sir Richard F. Burton para suas traduções das Mil e uma noites.

Palavras-chave
Mil e uma noites ; Orientalismo; Jorge Luis Borges

Abstract

Starting from a responsive comprehension of language and its enunciations, our research examines a few prefaces written by European translators of the One Thousand and One Nights, discovering through them not just the historically distinct relations between Europe and Orient, but most importantly the formation of a combative tradition of translations, in which different translators try to contest and supersede their precursors – at the same time they translate for someone, they are also translating against someone. Our reasoning for this study comes from two essays by Jorge Luis Borges (“Las mil y una noches” e “Los traductores de Las mil y una noches”), to which we add Edward Said’s thoughts about Orientalism and the prefaces written by Mamede M. Jarouche, Antoine Galland, Edward W. Lane and Sir Richard F. Burton for their translations of the One Thousand and One Nights.

Keywords
One Thousand and One Nights ; Orientalism; Jorge Luis Borges

Noventa e nove anos separam dois momentos que poderíamos identificar como originadores parciais da ficção literária moderna no Ocidente. O primeiro momento, em 1605, trata-se da publicação do volume I de El ingenioso hidalgo Don Quijote de la Mancha, de Miguel de Cervantes (2015)Cervantes, Miguel de. El ingenioso hidalgo don Quijote de la Mancha. Edición conmemorativa IV Centenario Cervantes. Madrid: Alfaguara; Real Academia Española; Asociación de Academias de la Lengua Española, 2015.. A obra espanhola, precursora do romance em prosa moderno e realista, foi responsável por alçar o gênero à categoria de “grande literatura”, trazendo consigo uma nova imagem humana: a do indivíduo terreno, conduzido por suas paixões e obsessões individuais, sem qualquer reflexo nos mundos transcendentais ou missão divina que lhe servisse de amparo; trouxe, mais ainda, uma nova imagem de mundo, transformado em um divertido jogo que pode ser iluminado pela loucura, e em que uma sociedade extraordinariamente variada expressa seus múltiplos modos de vida por meio de linguagens que se confrontam, se esclarecem e se traduzem mutuamente. De fato, o capítulo IX de Dom Quixote é especialmente conhecido por colocar o problema da tradução como uma questão que ultrapassa a barreira linguística e diz respeito a conflitos étnicos e culturais: o narrador que se vê obrigado a continuar a história de Dom Quixote a partir do texto traduzido de um historiador árabe revela como o processo de tradução pode envolver preconceitos arraigados, desconfianças e questionamentos em relação à cultura do outro e às suas formas de expressão. Aquela passagem, embora breve, revela como a tradução de um único texto tinha como pano de fundo os séculos de guerra entre europeus e árabes, dos quais a narrativa não poderia se desvencilhar – e, em todos os capítulos posteriores, as desconfianças em relação à fidedignidade da tradução estão calcadas simultaneamente em questões linguísticas e culturais.

O segundo momento também traz um contato entre Ocidente e Oriente por meio da tradução, e diz respeito à publicação, em 1704, do volume I de Les mille et une nuits (originalmente publicado como Les mille et une nuit. Contes arabes), a tradução francesa de Antoine Galland para a coletânea de narrativas árabes. Se Dom Quixote foi o marco da literatura realista e sério-cômica, além de uma representação dos novos modos de vida e pensamento que se encontravam em ascensão na Europa após o fim do feudalismo, as Mil e uma noites corresponderam a uma nova vertente do maravilhoso e do romântico, e a uma representação do estrangeiro e distante, suprindo a carência de um novo exotismo que correspondesse adequadamente às já renovadas expressões locais. A distância temporal em relação às comunidades cultural e linguisticamente fechadas do feudalismo, tal como aponta Bakhtin (2019)Bakhtin, Mikhail. “O romance como gênero literário”. In: Bakhtin, Mikhail. Teoria do romance III: o romance como gênero literário. Tradução, posfácio e notas de Paulo Bezerra. São Paulo: Editora 34, 2019. p. 65-111. em O romance como gênero literário, e às cruzadas medievais alimentou um novo interesse na direção do Oriente, dos árabes e do islã1 1 Conforme discutido por Said (2007). : a representação de estilo grotesco encontrada na Divina comédia, de Dante Alighieri2 2 Que, a despeito da inclusão elogiosa de Avicena e Averróis no Limbo, apresenta no Canto XXVIII de Inferno um Maomé que, junto com seu genro Ali, é fendido ao meio por uma espada, colhendo eternamente suas tripas, “’l tristo sacco que merda fa di quel che si trangugia” (Alighieri, 1998, p. 188). , e a pejorativa e conflituosa encontrada no Dom Quixote, de Cervantes3 3 Cujo narrador considera que as objeções levantadas sobre a história devem se dar pela origem arábe do autor, um “galgo” (“cachorro”, insulto que se costumava aplicar aos muçulmanos), “siendo muy propio de los de aquella nación ser mentirosos” (Cervantes, 2015, p. 88). , abrem espaço para o mágico e o amoroso, especialmente o sensual – pois um dos elementos próprios do exotismo seria justamente uma suspensão aceitável, porque estrangeira, da moral cristã. A importância que tais elementos ocuparam na imaginação literária europeia não deve ser subestimada, de modo que a afirmação de Jorge Luis Borges, para quem o romantismo começara com a leitura das Mil e uma noites, não precisa ser vista como uma extrapolação:

Galland, pues, publica el primer volumen en 1704. Se produce una suerte de escándalo, pero al mismo tiempo de encanto para la razonable Francia de Luis XIV. Cuando se habla del movimiento romántico se piensa en fechas muy posteriores. Podríamos decir que el movimiento romántico empieza en aquel instante en que alguien, en Normandía o en París, lee Las mil y una noches. Está saliendo del mundo legislado por Boileau, está entrando en el mundo de la libertad romántica

(Borges, 1997Borges, Jorge Luis. “Las mil y una noches”. In: Borges, Jorge Luis. Siete noches. Buenos Aires: Emecé, 1997. p. 79-104., p. 100)4 4 “Galland, pois, publica o primeiro volume em 1704. Produz-se um tipo de escândalo, mas ao mesmo tempo de encanto para a racional França de Luís XIV. Quando se fala do movimento romântico se pensa em datas muito posteriores. Poderíamos dizer que o movimento romântico começa naquele instante em que alguém, na Normandia ou em Paris, lê As mil e uma noites. Está saindo do mundo legislado por Boileau, está entrando no mundo da liberdade romântica” (tradução nossa). .

Borges identifica o romantismo à superação das poéticas normativas do século XVII e às querelas literárias que lhes deram origem (notavelmente a questão em torno de Le Cid, de Corneille), baseadas em reinterpretações de Aristóteles e da tradição grega clássica, e que tinham como centro o decoro e questões ligadas à verossimilhança – conceito cuja interpretação moveu a crítica artística não só de Boileau, mas também de Scudéry, Richeleu, Chapelain e, de modo geral, de toda a Academia Francesa daquele período (sobre isso, cf. a discussão de Jean-Jacques Roubine (2003)Roubine, Jean-Jacques. “Aristóteles revisado”. In: Roubine, Jean-Jacques. Introdução às grandes teorias do teatro. Tradução de André Telles. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2003. p. 14-56. em Introdução às grandes teorias do teatro). A criação de uma nova consciência de Oriente resultou em uma revisão do decoro literário, da idealização da arte grega como princípio universal a ser almejado e, mais ainda, das poéticas baseadas em concepções estritas de verossimilhança, abrindo espaço para o movimento romântico.

Assim, desconsiderando parcialmente a distância de quase um século entre o romance de Cervantes e a tradução de Galland, as duas obras são complementares em seus potenciais reformuladores da tradição literária, permitindo-nos entender tanto a visão da nova Europa para si mesma quanto para o mundo exterior, considerado estrangeiro e exótico, sensual e mágico, espaço construído em oposição ao realismo terreno pós-medieval, à moral religiosa cristã e ao decoro literário classicista – como escreveu Edward Said em seu conhecido estudo sobre o Orientalismo, “a cultura europeia ganhou força e identidade ao se contrastar com o Oriente, visto como uma espécie de eu substituto e até subterrâneo” (Said, 2007Said, Edward W. Orientalismo: o Oriente como invenção do Ocidente. Tradução de Rosaura Eichenberg. São Paulo: Companhia das Letras, 2007., p. 30). Podemos adicionar a isso, ainda, o modo como a materialidade das Mil e uma noites foi apagada em suas primeiras traduções e críticas, criando a imagem de algo construído por uma sábia, anônima e infinita tradição oral que as punha em contraposição à própria ascensão do livro como objeto dentro da cultura europeia e do consequente aspecto escriptocêntrico que a literatura assumiu no Ocidente (Bakhtin, 2019Bakhtin, Mikhail. “O romance como gênero literário”. In: Bakhtin, Mikhail. Teoria do romance III: o romance como gênero literário. Tradução, posfácio e notas de Paulo Bezerra. São Paulo: Editora 34, 2019. p. 65-111.). Era um feito admirável que tal continuidade espontânea da criação oral, montada supostamente através de gerações, pudesse gerar uma obra tão encantadora e disputar espaço canônico com a literatura legislada do século anterior, e isso possivelmente pode ser apontado como o marco precursor de concepções românticas como a de Volksgeist e do interesse pelo imaginário e pela linguagem da cultura popular, elementos que se refletiram, por exemplo, na produção de Jacob e Wilhelm Grimm já no início do século XIX.

Foi isso o que moveu a imaginação dos primeiros orientalistas, e ainda no século XX era comum que mesmo escritores de profunda erudição, como Borges, atribuíssem a esse conjunto misterioso de confabulatores nocturni, narradores orais e populares que compartilhavam histórias à noite, as origens das Mil e uma noites: “Son obra de miles de autores y ninguno pensó que estaba edificando un libro ilustre, uno de los libros más ilustres de todas las literaturas, más apreciados en el Occidente que en el Oriente, según me dicen” (Borges, 1997Borges, Jorge Luis. “Las mil y una noches”. In: Borges, Jorge Luis. Siete noches. Buenos Aires: Emecé, 1997. p. 79-104., p. 90)5 5 “São obra de milhares de autores, e nenhum pensou que estava edificando um livro ilustre, um dos livros mais ilustres de todas as literaturas, mais apreciados no Ocidente do que no Oriente, segundo me dizem” (tradução nossa). . Recentemente, Mamede Mustafa Jarouche, no prefácio crítico de sua tradução das Mil e uma noites (que se inicia fazendo justamente uma referência àquela mesma conferência de Borges), esclareceu melhor a questão, apresentando uma hipótese formulada a partir das observações do pesquisador arabista Muhsin Mahdi6 6 Muhsin Mahdi (1926-2007) foi uma das maiores autoridades em filologia e filosofia árabes no século XX, sendo responsável, em 1984, por uma importante edição crítica em língua inglesa das Mil e uma noites. :

O que deve ficar claro, desde já, é que o Livro das mil e uma noites não é literatura “oral”, ao menos não na medida em que oralidade é vulgarmente pensada como atributo de espontaneidade ou alegre caos impensado, mas em todo caso profundo porque proveniente de uma seiva popular etc. etc. Trata-se de um trabalho letrado cujo percurso foi da elaboração escrita à apropriação pela esfera da oralidade, e não o contrário. Ou seja: não são lendas ou fábulas orais que alguém um dia resolveu compilar, mas sim histórias elaboradas por alguém, por escrito, a partir de fontes diversas (das quais por acaso poderiam ser orais, embora não exista nenhuma evidência disso) que foram sofrendo, de maneira crescente, a apropriação dos narradores de rua, os quais encontraram nelas um excelente material de trabalho

(Jarouche, 2006Jarouche, Mamede Mustafa. “Uma poética em ruínas”. In: Jarouche, Mamede Mustafa. Livro das mil e uma noites, v. 1: ramo sírio. 3. ed. São Paulo: Globo, 2006. p. 11-35., p. 27).

Ou seja: sem descartar a influência de comunidades orais, que se apropriaram das narrativas e as foram adaptando às suas performances, que por sua vez devem ter influído novamente sobre as várias reescritas do livro, Jarouche enfatiza a sua profunda ligação com os gêneros escritos e com a erudição letrada árabe, inclusive rechaçando o tópico da comunicação da experiência, que Walter Benjamin (1994)Benjamin, Walter. “O narrador. Considerações sobre a obra de Nikolai Leskov”. In: Benjamin, Walter. Magia e técnica, arte e política: ensaios sobre literatura e história da cultura. Tradução de Sérgio Paulo Rouanet; prefácio de Jeanne Marie Gagnebin. 7. ed. São Paulo: Brasiliense, 1994. Obras escolhidas. v. 1, p. 197-221. tão intimamente ligou ao narrador oral, e operando uma mistura de gêneros que não só modifica o funcionamento das fábulas e narrativas noturnas a que o livro faz referência e as desloca na hierarquia dos gêneros, mas também subverte gêneros escritos e elevados, como a narrativa histórica, a de libertação depois da dificuldade e a história-exemplar, que são subordinadas à fábula e despojadas de valor moralizante7 7 A concepção de gênero discutida neste parágrafo, assim como em todo o restante do texto, provém das discussões de Mikhail Bakhtin, especialmente aquelas encontradas em “Os gêneros do discurso” (Bakhtin, 2011) e “O romance como gênero literário” (Bakhtin, 2019). .

Mas a questão é que, para além da complexa origem material dos manuscritos das Mil e uma noites, a sua divulgação no Ocidente foi moldada pelo nascente Orientalismo e suas pré-concepções em relação ao mundo árabe – e este tipo de “conhecimento do Oriente”, como escreveu Said (2007, p. 73)Said, Edward W. Orientalismo: o Oriente como invenção do Ocidente. Tradução de Rosaura Eichenberg. São Paulo: Companhia das Letras, 2007., “porque gerado pela força, cria num certo sentido o Oriente, o oriental e seu mundo”. A história da formação dessa consciência de Oriente pelo Ocidente não seguiu um caminho direto, e seu desenvolvimento pode ser experimentado através das próprias traduções das Mil e uma noites: pois, além de estabelecerem um diálogo entre a Europa e as culturas orientais, as várias traduções também oferecem respostas umas às outras, de modo que os grandes tradutores posteriores a Galland (Lane, Burton, Mardrus, Littman, Cansinos Assens, Jarouche e outros) tiveram que lidar não só com os manuscritos que traduziriam e com o público alvo, mas também com os problemas trazidos pelas próprias traduções anteriores. Mais do que uma história do Oriente, as mudanças percebidas entre as várias traduções contam a história de como essa consciência ocidental se transformou por meio de um processo dialógico, em que os orientalistas e tradutores posteriores buscaram contestar, revisar ou reafirmar as concepções anteriores. O que significa que o Capitão Sir Richard Burton, por exemplo, não traduziu o livro em um vácuo: sua tradução nasceu de uma insatisfação em relação ao decoro literário de Galland e o pudor puritano de Lane, de modo que muitas de suas escolhas devem ser vistas não só como uma aderência aos manuscritos originais (afinal, oferecia sua tradução como plain and literal), mas principalmente como uma tentativa consciente de se distanciar e contradizer ou corrigir aqueles outros tradutores; ao mesmo tempo, também não escapou a Burton o fato de que seu público, os assinantes do Burton Club, era formado por senhores eruditos de West End cujos interesses certamente seriam muito diferentes do que se imaginava serem os dos públicos antigos das noites: os estrangeirismos e hibridismos linguísticos na tradução e as várias notas que se multiplicam enciclopedicamente e comparam motivos das narrativas às literaturas clássicas (como a identificação de momentos das jornadas de Sinbad à Odisseia), ou descrevem anedoticamente descobertas do próprio Burton em território árabe, satisfazendo a curiosidade de seu público pelas aventuras de um orientalista, certamente criam impressões que estão de todo ausentes nos manuscritos árabes. “Plain and literal translation” significa, nesse caso, menos uma fidelidade incólume aos manuscritos e mais uma provocação às censuras de Galland e, principalmente, Lane, sem descartar os gostos literários de um público da alta sociedade inglesa de fins do século XIX.

Também sobre isso escreveu Borges um importante comentário, publicado em 1936 na obra Historia de la eternidad. No ensaio “Los traductores de Las mil y una noches”, Borges explorou as várias traduções a partir de seus conflitos; sobre Burton, ele escreve:

Uno de los secretos fines de su trabajo era la aniquilación de otro caballero (también de barba tenebrosa de moro, también curtido) que estaba compilando en Inglaterra un vasto diccionario y que murió mucho antes de ser aniquilado por Burton. Ése era Eduardo Lane, el orientalista, autor de una versión harto escrupulosa de Las mil y una noches, que había suplantado a otra de Galland. Lane tradujo contra Galland, Burton tradujo contra Lane; para entender a Burton hay que entender esa dinastía enemiga

(Borges, 2005Borges, Jorge Luis. “Los traductores de Las mil y una noches”. In: Borges, Jorge Luis. Historia de la eternidad. Buenos Aires: Emecé, 2005. p. 107-143., p. 109-110)8 8 “Um dos objetivos secretos de seu trabalho era a aniquilação de outro cavalheiro (também de barba tenebrosa de mouro, também tostado de sol) que estava compilando na Inglaterra um vasto dicionário e que morreu muito antes de ser aniquilado por Burton. Esse era Edward Lane, o orientalista, autor de uma versão fartamente escrupulosa de As mil e uma noites, que havia suplantado a outra de Galland. Lane traduziu contra Galland, Burton traduziu contra Lane; para entender Burton deve-se entender essa dinastia inimiga” (tradução nossa). .

A inventiva leitura que Borges propõe dessa longa linhagem de tradutores sugere que subjaz às Mil e uma noites um extenso embate entre eruditos orientalistas, o qual se expressa em termos combativos – trata-se de aniquilar ou suplantar os adversários, de traduzir contra alguém, de uma dinastia inimiga. O apreço que Borges demonstra por algumas das traduções reside em sua forte resposta dentro dessa tradição, como identifica em Burton e Mardrus; por outro lado, sua decepção com a tradução de Littman (que é, sobretudo, muito correta) advém do modo como esta desperdiça a chance de oferecer uma resposta literária alemã, a mesma Alemanha de Kafka e Goethe, aos outros tradutores.

Se só um exame detalhado e um cotejamento das várias traduções nos permitiria identificar perfeitamente as diferentes posturas de cada tradutor em relação ao Oriente, à sua própria cultura e idioma e aos outros tradutores, em compensação podemos encontrar tudo isso de forma condensada por meio dos prefácios, momento esclarecedor em que as pré-concepções e objetivos iniciais que motivaram cada tradução costumam ser expostos muito claramente. Nesse sentido, é exemplar o primeiro prefácio de todos: aquele escrito por Antoine Galland para a primeira edição de sua tradução. Composto de alguns poucos parágrafos, ele apresenta muitos dos elementos que se tornaram constantes nas interpretações e traduções posteriores, entre eles o de uma autoria difusa, que aqui é atribuída ao próprio excesso de imaginação encontrado no livro: “On ignore le nom de l’auteur d’un si grand ouvrage ; mais vraisemblablement il n’est pas tout d’une main : car, comment pourra-t-on croire qu’un seul homme ait eu l’imagination assez fertile pour suffire à tant de fictions ?” (Galland, 1846Galland, Antoine. “Advertissement de la première édition (1704)”. In: Galland, Antoine (Trad.). Les mille et une nuits : contes arabes, v. 1. Paris: Victor Lecou, 1846. p. 1-2., p. 1)9 9 “Não sabemos o nome do autor de tão grande obra; mas provavelmente não está tudo em uma mão: pois como podemos acreditar que um único homem teve a imaginação fértil o suficiente para tantas ficções?” (tradução nossa). . Note-se que não há ainda ligação com a oralidade destacada, posteriormente, por Lane e Burton; há, no entanto, perplexidade diante da grande variedade de narrativas ter a aparência de um conjunto planejado: “En effet, qu’y a-t-il de plus ingénieux que d’avoir fait un corps d’une quantité prodigieuse de contes dont la variété est surprenante, et l’enchainement si admirable, qu’ils semblent avoir été faits pour composer l’ample recueil dont ceux-ci ont été tirés ?” (Galland, 1846Galland, Antoine. “Advertissement de la première édition (1704)”. In: Galland, Antoine (Trad.). Les mille et une nuits : contes arabes, v. 1. Paris: Victor Lecou, 1846. p. 1-2., p. 1)10 10 “De fato, o que é mais engenhoso do que dar corpo a uma quantidade prodigiosa de contos cuja variedade é surpreendente, e a sequência tão admirável, que parecem ter sido feitos para compor a grande coleção de que foram tirados?” (tradução nossa). .

Nesse contato inicial, o interesse sobre as noites está em seu caráter agradável e divertido, e este deve se assentar sobre três aspectos atribuídos a elas: a beleza, a maravilha e a expressão de costumes e modos orientais. Embora os dois primeiros não sejam caracterizados, sugere-se uma superioridade das nações árabes e de seu idioma em relação a eles. Sobre a beleza, escreve Galland (1846, p. 1)Galland, Antoine. “Advertissement de la première édition (1704)”. In: Galland, Antoine (Trad.). Les mille et une nuits : contes arabes, v. 1. Paris: Victor Lecou, 1846. p. 1-2. que “il ne faut que les lire pour demeurer d’accord qu’en ce genre on n’a rien vu de si beau jusqu’à présent dans un aucune langue”11 11 “basta lê-los para ficarmos de acordo que até agora nada se viu de tão belo neste gênero, em nenhuma língua” (tradução nossa). ; já a maravilha se agrega aos adjetivos de agradável, divertida e surpreendente, e também seria superior nos árabes:

Si les contes de cette espèce sont agréables et divertissants par le merveilleux qui y règne d’ordinaire, ceux ci doivent l’emporter en cela sur tous ceux qui ont paru, puisqu’ils sont remplis d’événements qui surprennent et attachent l’esprit, et qui font voir combien les Arabes surpassent les autres nations en cette sorte de composition

(Galland, 1846Galland, Antoine. “Advertissement de la première édition (1704)”. In: Galland, Antoine (Trad.). Les mille et une nuits : contes arabes, v. 1. Paris: Victor Lecou, 1846. p. 1-2., p. 1-2)12 12 “Se os contos deste tipo são agradáveis e divertidos pelo maravilhoso que costuma reinar ali, devem prevalecer nisto sobre todos os que já apareceram, pois estão repletos de acontecimentos que surpreendem e prendem o espírito, e mostram o quanto os árabes ultrapassam outras nações neste tipo de composição” (tradução nossa). .

No que diz respeito aos costumes e modos, dos quais são enfatizadas as cerimônias religiosas, “tant païenne que mahométane” (Galland, 1846Galland, Antoine. “Advertissement de la première édition (1704)”. In: Galland, Antoine (Trad.). Les mille et une nuits : contes arabes, v. 1. Paris: Victor Lecou, 1846. p. 1-2., p. 2), Galland considera que as noites trazem duas vantagens: a de serem superiores aos relatos de viajantes, e a de que “Tous les Orientaux, Persans, Tartares et Indiens, s’y font distinguer, et paraissent tels qu’ils sont, depuis les souverains jusqu’aux personnes de la plus basse condition” (Galland, 1846Galland, Antoine. “Advertissement de la première édition (1704)”. In: Galland, Antoine (Trad.). Les mille et une nuits : contes arabes, v. 1. Paris: Victor Lecou, 1846. p. 1-2., p. 2)13 13 “tanto pagã quanto maometana”; “Todos os orientais, persas, tártaros e indianos se distinguem ali e aparecem como são, desde soberanos até pessoas da condição mais baixa” (tradução nossa). . A escolha da expressão religião maometana não é incidental: seu uso provém da Bibliothèque orientale de Barthélemy d’Herbelot, publicada postumamente, poucos anos antes, em 1697, e com um prefácio do próprio Galland. Aquela obra enciclopédica descreve Maomé, em seu verbete, com termos pejorativos como “famoso impostor” e “Fundador de uma heresia que chamamos de [...] maometana” (apud Said, 2007Said, Edward W. Orientalismo: o Oriente como invenção do Ocidente. Tradução de Rosaura Eichenberg. São Paulo: Companhia das Letras, 2007., p. 106); como explica Said (2007, p. 106)Said, Edward W. Orientalismo: o Oriente como invenção do Ocidente. Tradução de Rosaura Eichenberg. São Paulo: Companhia das Letras, 2007., “‘Maometana’ é a designação europeia relevante (e insultuosa); ‘islã’, que é por acaso o nome muçulmano correto, é relegado a outro verbete. A ‘heresia [...] que chamamos de maometana’ é ‘compreendida’ como a imitação de uma imitação cristã da verdadeira religião”.

A ideia de que os orientais de diferentes condições sociais aparecem como são, ao contrário de sua presença em registros ocidentais, é dada como uma das preocupações centrais da tradução: “On a pris soin de conserver leurs caractères, et de ne pas s’éloigner de leurs expressions et de leurs sentiments, et l’on ne s’est écarté du texte que quand la bienséance n’a pas permis de s’y attacher” (Galland, 1846Galland, Antoine. “Advertissement de la première édition (1704)”. In: Galland, Antoine (Trad.). Les mille et une nuits : contes arabes, v. 1. Paris: Victor Lecou, 1846. p. 1-2., p. 2)14 14 “Tomou-se o cuidado de preservar seu caráter e não nos desviar de suas expressões e sentimentos, e só nos afastamos do texto quando o decoro não nos permitiu segui-lo” (tradução nossa). . Observe-se, no entanto, que há um conflito entre conservar as expressões e sentimentos, por um lado, e corresponder ao decoro linguístico-literário francês, por outro: além de ter se afastado do texto quando o decoro (bienséance) não permitiu segui-lo, Galland condiciona ainda sua tradução a uma pressuposta delicadeza linguística e cultural do povo francês: “Le traducteur se flatte que les personnes qui entendent l’arabe [...] conviendront qu’il a fait voir les Arabes aux Français avec toute la circonspection que demandait la délicatesse de notre langue et de notre temps” (Galland, 1846Galland, Antoine. “Advertissement de la première édition (1704)”. In: Galland, Antoine (Trad.). Les mille et une nuits : contes arabes, v. 1. Paris: Victor Lecou, 1846. p. 1-2., p. 2)15 15 “O tradutor se vangloria de que quem entende árabe, e que se dará ao trabalho de comparar o original com a cópia, concordará que esta mostrou os árabes aos franceses com toda a circunspecção que demanda a delicadeza de nossa língua e de nosso tempo” (tradução nossa). . Isso nos leva ao problema central que Borges apontou na tradução de Galland:

Las reservas de Galland son mundanas; las inspira el decoro, no la moral. Copio unas líneas de la tercer página de sus Noches: Il alla droit à l’appartement de cette princesse, qui, ne s’attendant pas à le revoir, avait reçu dans son lit un des derniers officiers de sa maison. Burton concreta a ese nebuloso officier: “un negro cocinero, rancio de grasa de cocina y de hollín”. Ambos, diversamente, deforman: el original es menos ceremonioso que Galland y menos grasiento que Burton. (Efectos del decoro: en la mesurada prosa de aquél, la circunstancia recevoir dans son lit resulta brutal.)

(Borges, 2005Borges, Jorge Luis. “Los traductores de Las mil y una noches”. In: Borges, Jorge Luis. Historia de la eternidad. Buenos Aires: Emecé, 2005. p. 107-143., p. 112)16 16 “As reservas de Galland são mundanas; são inspiradas pelo decoro, não pela moral. Copio umas linhas da terceira página de suas Noites: Foi direto ao aposento dessa princesa, que, não esperando vê-lo novamente, recebera em seu leito um dos últimos funcionários de sua casa. Burton concretiza esse nebuloso funcionário: “um cozinheiro negro, sujo de gordura da cozinha e de cinzas”. Ambos, diversamente, deformam: o original é menos cerimonioso que Galland e menos engordurado que Burton. (Efeitos do decoro: na mesurada prosa daquele, a circunstância recebeu em seu leito soa brutal.)” (tradução nossa). .

O segundo prefácio importante é aquele encontrado na primeira edição da tradução de Edward William Lane para o inglês, em 1839. Muito mais extenso que o anterior, ele já admite desde o segundo parágrafo que a nova tradução “implies an unfavourable opinion on the version which has so long amused us” (Lane, 1839Lane, Edward William. “The translator’s preface”. In: Lane, Edward William (Trad.). The Arabian Nights’ Entertainments. London: Charles Knight and Co., 1839. p. vii-xxiii., p. vii)17 17 “implica uma opinião desfavorável acerca da versão que por tanto tempo nos entreteve” (tradução nossa). , procedendo a uma crítica da versão de Galland – da qual derivava e somente de onde vinham, segundo Lane, os defeitos principais da única versão inglesa anterior, de Jonathan Scott. Forma-se, assim, a tradição combativa a que Borges aludia: Lane concorda com os arabistas que afirmam que a versão de Galland pode ter melhorado o original (certamente pela sua ênfase nos aspectos de beleza e maravilha e por satisfazer o senso de exotismo europeu), mas nisso o teria pervertido demasiadamente.

Tal perversão se originaria em duas questões: a insuficiente familiaridade de Galland com os costumes e modos orientais e o próprio estilo de sua versão. Por um lado, vimos que Galland afirmava que as noites distinguiam claramente os persas, tártaros e indianos, e se vangloriava de que sua tradução conservava o seu caráter, de modo que o leitor os veria agir e os ouviria falar sem precisar “procurar esses povos em seu país” (“sans avoir essuyé la fatigue d’aller chercher ces peuples dans leur pays”) (Galland, 1846Galland, Antoine. “Advertissement de la première édition (1704)”. In: Galland, Antoine (Trad.). Les mille et une nuits : contes arabes, v. 1. Paris: Victor Lecou, 1846. p. 1-2., p. 2); Lane, por outro lado, aponta que há uma precisão minuciosa no original em distinguir os países árabes, principalmente o Egito, de todas as outras nações, do Ocidente e do Oriente, de modo que as Mil e uma noites descrevem costumes, roupas e arquiteturas árabes mesmo em cenas na Pérsia, Turquia, Índia ou China:

Deceived by the vague nature of Galland’s version, travellers in Persia, Turkey, and India, have often fancied that the Arabian Tales describe the particular manners of the natives of those countries; but no one who has read them in the original language, having an intimate acquaintance with the Arabs, can be of this opinion: it is in Arabian countries, and especially in Egypt, that we see the people, the dresses, and the buildings, which it describes in almost every case, even when the scene is laid in Persia, in India, or in China

(Lane, 1839Lane, Edward William. “The translator’s preface”. In: Lane, Edward William (Trad.). The Arabian Nights’ Entertainments. London: Charles Knight and Co., 1839. p. vii-xxiii., p. viii)18 18 “Enganados pela natureza vaga da versão de Galland, viajantes na Pérsia, Turquia e Índia têm imaginado que os Contos Árabes descrevem modos particulares dos nativos daqueles países; mas ninguém que os tenha lido na língua original e que tenha convivido intimamente com os árabes pode ter essa opinião: é nos países árabes, e especialmente no Egito, que vemos o povo, as vestimentas e a arquitetura, aos quais a descrição se refere em quase todos os casos, mesmo quando a cena se passa na Pérsia, na Índia ou na China” (tradução nossa). .

Ou seja: para Lane, a distinção estilística utilizada por Galland para expressar os habitantes daqueles diferentes países “tais como são” em suas falas e sentimentos seria um artifício, enquanto o original expressava, na verdade, uma unidade maior da cultura árabe em relação às outras.

O outro elemento importante que Lane introduz em seu texto diz respeito às qualificações do tradutor. Se a comparação entre original e tradução era suficiente, segundo Galland, para demonstrar a qualidade de sua versão, Lane inaugura a necessidade (repetida pelos seus sucessores, principalmente Burton) de que o tradutor seja também um aventureiro, de que seu conhecimento linguístico e cultural seja justificado por uma convivência entre os árabes. Se Galland teria pervertido a obra porque “His acquaintance with Arab manners and customs was insufficient to preserve him always from errors of the grossest description” (Lane, 1839Lane, Edward William. “The translator’s preface”. In: Lane, Edward William (Trad.). The Arabian Nights’ Entertainments. London: Charles Knight and Co., 1839. p. vii-xxiii., p. viii)19 19 “Seu convívio com modos e costumes árabes era insuficiente para lhe salvar de erros dos mais grosseiros” (tradução nossa). , Lane poderia utilizar como prova de sua erudição o tempo vivido no Cairo, “the city in which Arabian manners now exist in the most refined state” (Lane, 1839Lane, Edward William. “The translator’s preface”. In: Lane, Edward William (Trad.). The Arabian Nights’ Entertainments. London: Charles Knight and Co., 1839. p. vii-xxiii., p. ix):

Convinced of the truth of this assertion, I consider myself possessed of the chief qualifications for the proper accomplishment of my present undertaking, from my having lived several years in Cairo, associating almost exclusively with Arabs, speaking their language, conforming to their general habits with the most scrupulous exactitude, and received into their society on terms of perfect equality

(Lane, 1839Lane, Edward William. “The translator’s preface”. In: Lane, Edward William (Trad.). The Arabian Nights’ Entertainments. London: Charles Knight and Co., 1839. p. vii-xxiii., p. ix)20 20 “a cidade em que os modos árabes existem agora em seu estado mais refinado”; “Convencido da verdade de tal afirmação, eu me considero detentor das qualificações mais importantes para a apropriada conclusão de minha presente tarefa, após ter vivido vários anos no Cairo, associando-me quase exclusivamente com árabes, falando sua língua, conformando-me aos seus hábitos cotidianos com a mais escrupulosa exatidão e sendo recebido em sua sociedade nos termos de uma perfeita igualdade” (tradução nossa). .

A tradução será recebida pelos europeus, mas antes o próprio tradutor deve ter sido recebido pelos árabes como um igual. Isso não significa, no entanto, que sua consciência durante a peregrinação tenha deixado de ser europeia: Said (2007, p. 221)Said, Edward W. Orientalismo: o Oriente como invenção do Ocidente. Tradução de Rosaura Eichenberg. São Paulo: Companhia das Letras, 2007. nota que “Ser um europeu no Oriente sempre implica ser uma consciência separada de seu ambiente e desigual em relação a esse meio”, e a razão para estar no Oriente normalmente é explicada por um conjunto pequeno de categorias de intenções; no caso de Lane, a categoria seria a do “escritor que pretende usar sua residência para a tarefa específica de fornecer material científico ao Orientalismo profissional, aquele que considera a residência uma forma de observação científica” (Said, 2007Said, Edward W. Orientalismo: o Oriente como invenção do Ocidente. Tradução de Rosaura Eichenberg. São Paulo: Companhia das Letras, 2007., p. 221). Se isso resultou em sua obra central, Manners and Customs of the Modern Egyptians, também é algo que se reflete em seu tratamento das Mil e uma noites: os elogios de Galland são substituídos por uma investigação histórico-filológica acerca das possíveis origens da obra, acompanhada de comentários sobre a cultura dos recitadores e copistas árabes, explicações sobre produção de livros no Egito, questões estilísticas e de gêneros literários, contestações de hipóteses orientalistas etc. Mais do que um livro de maravilha e beleza, Lane o considera como um objeto de pesquisa que ilustra sentimentos e modos árabes para os europeus, daí sua dedicação em definir mais precisamente o período dos costumes descritos pelas narrativas (Lane, 1839Lane, Edward William. “The translator’s preface”. In: Lane, Edward William (Trad.). The Arabian Nights’ Entertainments. London: Charles Knight and Co., 1839. p. vii-xxiii., p. xv), supostamente derivadas de algum original que poderia ser situado historicamente.

Como sua preocupação não é literária, omite narrativas que considera desinteressantes ou moralmente questionáveis, ou as modifica, mas com o cuidado de “to render them so as to be perfectly agreeable with Arab manners and customs” (Lane, 1839Lane, Edward William. “The translator’s preface”. In: Lane, Edward William (Trad.). The Arabian Nights’ Entertainments. London: Charles Knight and Co., 1839. p. vii-xxiii., p. xvii)21 21 “representá-los de modo que estejam em perfeito acordo com os modos e costumes árabes” (tradução nossa). ; de fato, explicita que sua intenção original era omitir todos os poemas, que só permaneceram porque senão seria diminuído o valor do livro “as illustrating Arab manners and feelings” (Lane, 1839Lane, Edward William. “The translator’s preface”. In: Lane, Edward William (Trad.). The Arabian Nights’ Entertainments. London: Charles Knight and Co., 1839. p. vii-xxiii., p. xviii)22 22 “como ilustração de modos e sentimentos árabes” (tradução nossa). . Se Galland viu a necessidade de, pelo decoro, corrigir as qualidades literárias do livro, Lane se descobriu confrontado com seu próprio pudor britânico: os costumes árabes, centro de sua investigação, são ao mesmo tempo objetos de curiosidade e de reprovação. Isso explica aquele traço que Borges apontou em sua tradução: em relação às “torpezas” ocasionais, Lane “las rebusca y las persigue como un inquisidor. Su probidad no pacta con el silencio [...]” (Borges, 2005Borges, Jorge Luis. “Los traductores de Las mil y una noches”. In: Borges, Jorge Luis. Historia de la eternidad. Buenos Aires: Emecé, 2005. p. 107-143., p. 113)23 23 “as rebusca e as persegue como um inquisidor. Sua integridade não pactua com o silêncio [...]” (tradução nossa). . Omite e suprime, mas não se esquece de comentar, em copiosas notas, as razões da supressão: um episódio que era repreensível, uma explicação repugnante, uma linha grosseira etc. “De ahí que su versión eruditísima de las Noches sea una mera enciclopedia de la evasión”, conclui Borges (2005, p. 113)Borges, Jorge Luis. “Los traductores de Las mil y una noches”. In: Borges, Jorge Luis. Historia de la eternidad. Buenos Aires: Emecé, 2005. p. 107-143.24 24 “Daí que sua versão eruditíssima das Noites seja uma mera enciclopédia da evasão” (tradução nossa). .

O que nos leva, finalmente, a Burton. Edward Said comenta a relação entre Burton e a erudição europeia nos mesmos termos combativos que havíamos apontado anteriormente:

Como viajante, Burton foi um verdadeiro aventureiro; como erudito, podia enfrentar qualquer orientalista acadêmico da Europa; como caráter, tinha plena consciência da necessidade do combate entre ele próprio e os professores uniformizados que controlavam a Europa e o conhecimento europeu com um anonimato tão preciso e tanta firmeza científica. Tudo o que Burton escreveu atesta essa combatividade, raramente com um desprezo mais franco pelos seus oponentes do que no prefácio à sua tradução das Mil e uma noites. Ele parece ter experimentado um tipo especial de prazer infantil em demonstrar que conhecia mais que qualquer erudito profissional, que havia assimilado mais detalhes, que podia tratar o material com mais inteligência, tato e frescor

(Said, 2007Said, Edward W. Orientalismo: o Oriente como invenção do Ocidente. Tradução de Rosaura Eichenberg. São Paulo: Companhia das Letras, 2007., p. 268).

Tudo isso se manifesta imediatamente em seu prefácio: como Lane, justifica-se apresentando suas qualificações, mas, ao contrário daquele, abandona o caráter de observador científico e investe na qualidade de aventureiro em terras exóticas: apresenta-se como exilado em “the luxuriant and deadly deserts of Western Africa” e em “the dull and dreary half clearings of South America” (Burton, 2016Burton, Richard Francis. “The Translator’s Foreword”. In: Burton, Richard Francis (Trad.). A plain and literal translation of the Arabian nights entertainments, now entituled The Book of the Thousand Nights and a Night, v. 1. E-book (Project Gutenberg). Disponível em: https://www.gutenberg.org/ebooks/51252. Acesso em 07 nov. 2022.
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)25 25 “os luxuriosos e mortais desertos da África Ocidental”; “as opacas e áridas clareiras da América do Sul” (tradução nossa). , ou como peregrino em Medina e Meca, enquanto discorre sobre encantos e talismãs; os epítetos que usa para se referir à Arábia evocam a maravilha, confundindo intencionalmente a região real e a ficcional: “diaphanous skies”, “air glorious as aether”, “the after glow transfiguring and transforming, as by magic, the homely and rugged features of the scene into a fairy land lit with a light which never shines on other soils or seas” (Burton, 2016Burton, Richard Francis. “The Translator’s Foreword”. In: Burton, Richard Francis (Trad.). A plain and literal translation of the Arabian nights entertainments, now entituled The Book of the Thousand Nights and a Night, v. 1. E-book (Project Gutenberg). Disponível em: https://www.gutenberg.org/ebooks/51252. Acesso em 07 nov. 2022.
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)26 26 “Céus diáfanos”, “ar glorioso como éter”, “a incandescência transfigurando e transformando, como por mágica, os traços caseiros e rústicos da cena em uma terra feérica, iluminada por uma luz que jamais brilhou sobre outros solos ou mares” (tradução nossa). etc.

Seu desdém pelas traduções anteriores é claro. “Our century of translations, popular and vernacular, from (Professor Antoine) Galland’s delightful abbreviation and adaptation (A.D. 1704), in no wise represent the eastern original”, diz Burton; também dedica, logo depois, um parágrafo inteiro a Lane, “That amiable and devoted Arabist” (Burton, 2016Burton, Richard Francis. “The Translator’s Foreword”. In: Burton, Richard Francis (Trad.). A plain and literal translation of the Arabian nights entertainments, now entituled The Book of the Thousand Nights and a Night, v. 1. E-book (Project Gutenberg). Disponível em: https://www.gutenberg.org/ebooks/51252. Acesso em 07 nov. 2022.
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)27 27 “Nosso século de traduções, populares e vernáculas, desde a deliciosa abreviação e adaptação do Professor Antoine Galland (1704), de nenhum modo representa o original do Oriente”; “Aquele amigável e devoto arabista” (tradução nossa). . A expressão é sarcástica: Lane é caracterizado como o bom moço cuja moral impedia de traduzir qualquer conteúdo questionável, e sua versão foi feita para a mesinha da sala: Burton critica suas omissões de qualquer conteúdo que se aproximasse do licencioso, as alterações formais, incluindo a divisão de capítulos e conversão de versos em prosa, o latim anglicizado e erros infantis que teriam desfigurado o original. Acima de tudo, Lane seria, ao mesmo tempo, “too Oriental and not Oriental enough” (Burton, 2016Burton, Richard Francis. “The Translator’s Foreword”. In: Burton, Richard Francis (Trad.). A plain and literal translation of the Arabian nights entertainments, now entituled The Book of the Thousand Nights and a Night, v. 1. E-book (Project Gutenberg). Disponível em: https://www.gutenberg.org/ebooks/51252. Acesso em 07 nov. 2022.
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)28 28 “oriental demais e não oriental o bastante” (tradução nossa). .

A proposta de Burton é apresentar as noites tais como realmente são, e escrever “as the Arab would have written in English” (Burton, 2016Burton, Richard Francis. “The Translator’s Foreword”. In: Burton, Richard Francis (Trad.). A plain and literal translation of the Arabian nights entertainments, now entituled The Book of the Thousand Nights and a Night, v. 1. E-book (Project Gutenberg). Disponível em: https://www.gutenberg.org/ebooks/51252. Acesso em 07 nov. 2022.
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); reivindica sua superioridade sobre Galland e Lane “by preserving intact, not only the spirit, but even the mécanique, the manner and the matter” (Burton, 2016Burton, Richard Francis. “The Translator’s Foreword”. In: Burton, Richard Francis (Trad.). A plain and literal translation of the Arabian nights entertainments, now entituled The Book of the Thousand Nights and a Night, v. 1. E-book (Project Gutenberg). Disponível em: https://www.gutenberg.org/ebooks/51252. Acesso em 07 nov. 2022.
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)29 29 “tal como um árabe teria escrito em inglês”; “preservando intacto não só o espírito, mas até mesmo o mecanismo; o modo e a matéria” (tradução nossa). . Ou seja: retoma de Galland a maravilha, a beleza, o exótico e o aventuresco (o que as noites ofereciam de novidade para a linguagem e a literatura); de Lane, os costumes, modos e sentimentos precisos, historicizados; adiciona a estes uma nova preocupação com a expressão formal: não pretende converter o árabe à delicadeza do francês, nem omiti-lo pelo critério moral britânico. Claro que, como discutimos antes, isso não torna sua tradução “plain and literal”, tal como queria, e de todo modo é afetado pela necessidade de suplantar aqueles outros tradutores, oferecendo um Oriente que parece mais maravilhoso e menos regido pelo decoro literário que o de Galland, e simultaneamente mais explícito em suas práticas culturais e mais licencioso que o de Lane, reforçando na tradução o Oriente da fantasia sexual do século XIX. Sobre isto, escreve Said:

O que eles frequentemente procuravam era um tipo diferente de sexualidade, talvez mais libertina e menos assolada pela culpa; porém, mesmo essa busca, se repetida por um número suficiente de pessoas, podia tornar-se (e tornou-se) tão regulada e uniforme quanto a própria erudição

(Said, 2007Said, Edward W. Orientalismo: o Oriente como invenção do Ocidente. Tradução de Rosaura Eichenberg. São Paulo: Companhia das Letras, 2007., p. 263).

Há muito que se dizer ainda sobre esses três prefácios e muitos outros; afinal, mesmo em uma tradução recente, como a de Jarouche, ainda encontramos reflexos do combate contra os precursores – ao falar sobre o manuscrito mais antigo do ramo sírio, atualmente preservado na Biblioteca de Paris, o tradutor brasileiro lembra que este “Pertenceu a Jean-Antoine Galland, primeiro tradutor – e na opinião de alguns o pior – do Livro das mil e uma noites” (Jarouche, 2006Jarouche, Mamede Mustafa. “Uma poética em ruínas”. In: Jarouche, Mamede Mustafa. Livro das mil e uma noites, v. 1: ramo sírio. 3. ed. São Paulo: Globo, 2006. p. 11-35., p. 28). Mas encerramos nossa discussão, saídos dela com uma consideração central: aqueles quase dois séculos de traduções, de Galland a Burton, transformaram as Mil e uma noites não só em uma visão (na verdade, várias visões) do Oriente, mas também em um erudito campo de batalha orientalista, formando uma curiosa tradição que, continuada até a contemporaneidade, lança uma mágica luz sobre a tarefa de traduzir outros mundos – que podem ser, afinal, reflexos subterrâneos de nossa própria identidade cultural, sexual e literária.

  • 1
    Conforme discutido por Said (2007)Said, Edward W. Orientalismo: o Oriente como invenção do Ocidente. Tradução de Rosaura Eichenberg. São Paulo: Companhia das Letras, 2007..
  • 2
    Que, a despeito da inclusão elogiosa de Avicena e Averróis no Limbo, apresenta no Canto XXVIII de Inferno um Maomé que, junto com seu genro Ali, é fendido ao meio por uma espada, colhendo eternamente suas tripas, “’l tristo sacco que merda fa di quel che si trangugia” (Alighieri, 1998Alighieri, Dante. “Canto XXVIII”. In: Alighieri, Dante. A divina comédia: Inferno. Tradução e notas de Italo Eugenio Mauro. São Paulo: Editora 34, 1998. p. 187-192., p. 188).
  • 3
    Cujo narrador considera que as objeções levantadas sobre a história devem se dar pela origem arábe do autor, um “galgo” (“cachorro”, insulto que se costumava aplicar aos muçulmanos), “siendo muy propio de los de aquella nación ser mentirosos” (Cervantes, 2015Cervantes, Miguel de. El ingenioso hidalgo don Quijote de la Mancha. Edición conmemorativa IV Centenario Cervantes. Madrid: Alfaguara; Real Academia Española; Asociación de Academias de la Lengua Española, 2015., p. 88).
  • 4
    “Galland, pois, publica o primeiro volume em 1704. Produz-se um tipo de escândalo, mas ao mesmo tempo de encanto para a racional França de Luís XIV. Quando se fala do movimento romântico se pensa em datas muito posteriores. Poderíamos dizer que o movimento romântico começa naquele instante em que alguém, na Normandia ou em Paris, lê As mil e uma noites. Está saindo do mundo legislado por Boileau, está entrando no mundo da liberdade romântica” (tradução nossa).
  • 5
    “São obra de milhares de autores, e nenhum pensou que estava edificando um livro ilustre, um dos livros mais ilustres de todas as literaturas, mais apreciados no Ocidente do que no Oriente, segundo me dizem” (tradução nossa).
  • 6
    Muhsin Mahdi (1926-2007) foi uma das maiores autoridades em filologia e filosofia árabes no século XX, sendo responsável, em 1984, por uma importante edição crítica em língua inglesa das Mil e uma noites.
  • 7
    A concepção de gênero discutida neste parágrafo, assim como em todo o restante do texto, provém das discussões de Mikhail Bakhtin, especialmente aquelas encontradas em “Os gêneros do discurso” (Bakhtin, 2011Bakhtin, Mikhail. “Os gêneros do discurso”. In: Bakhtin, Mikhail. Estética da criação verbal. Prefácio à edição francesa de Tzvetan Todorov; introdução e tradução do russo de Paulo Bezerra. 6. ed. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2011. p. 261-306.) e “O romance como gênero literário” (Bakhtin, 2019Bakhtin, Mikhail. “O romance como gênero literário”. In: Bakhtin, Mikhail. Teoria do romance III: o romance como gênero literário. Tradução, posfácio e notas de Paulo Bezerra. São Paulo: Editora 34, 2019. p. 65-111.).
  • 8
    “Um dos objetivos secretos de seu trabalho era a aniquilação de outro cavalheiro (também de barba tenebrosa de mouro, também tostado de sol) que estava compilando na Inglaterra um vasto dicionário e que morreu muito antes de ser aniquilado por Burton. Esse era Edward Lane, o orientalista, autor de uma versão fartamente escrupulosa de As mil e uma noites, que havia suplantado a outra de Galland. Lane traduziu contra Galland, Burton traduziu contra Lane; para entender Burton deve-se entender essa dinastia inimiga” (tradução nossa).
  • 9
    “Não sabemos o nome do autor de tão grande obra; mas provavelmente não está tudo em uma mão: pois como podemos acreditar que um único homem teve a imaginação fértil o suficiente para tantas ficções?” (tradução nossa).
  • 10
    “De fato, o que é mais engenhoso do que dar corpo a uma quantidade prodigiosa de contos cuja variedade é surpreendente, e a sequência tão admirável, que parecem ter sido feitos para compor a grande coleção de que foram tirados?” (tradução nossa).
  • 11
    “basta lê-los para ficarmos de acordo que até agora nada se viu de tão belo neste gênero, em nenhuma língua” (tradução nossa).
  • 12
    “Se os contos deste tipo são agradáveis e divertidos pelo maravilhoso que costuma reinar ali, devem prevalecer nisto sobre todos os que já apareceram, pois estão repletos de acontecimentos que surpreendem e prendem o espírito, e mostram o quanto os árabes ultrapassam outras nações neste tipo de composição” (tradução nossa).
  • 13
    “tanto pagã quanto maometana”; “Todos os orientais, persas, tártaros e indianos se distinguem ali e aparecem como são, desde soberanos até pessoas da condição mais baixa” (tradução nossa).
  • 14
    “Tomou-se o cuidado de preservar seu caráter e não nos desviar de suas expressões e sentimentos, e só nos afastamos do texto quando o decoro não nos permitiu segui-lo” (tradução nossa).
  • 15
    “O tradutor se vangloria de que quem entende árabe, e que se dará ao trabalho de comparar o original com a cópia, concordará que esta mostrou os árabes aos franceses com toda a circunspecção que demanda a delicadeza de nossa língua e de nosso tempo” (tradução nossa).
  • 16
    “As reservas de Galland são mundanas; são inspiradas pelo decoro, não pela moral. Copio umas linhas da terceira página de suas Noites: Foi direto ao aposento dessa princesa, que, não esperando vê-lo novamente, recebera em seu leito um dos últimos funcionários de sua casa. Burton concretiza esse nebuloso funcionário: “um cozinheiro negro, sujo de gordura da cozinha e de cinzas”. Ambos, diversamente, deformam: o original é menos cerimonioso que Galland e menos engordurado que Burton. (Efeitos do decoro: na mesurada prosa daquele, a circunstância recebeu em seu leito soa brutal.)” (tradução nossa).
  • 17
    “implica uma opinião desfavorável acerca da versão que por tanto tempo nos entreteve” (tradução nossa).
  • 18
    “Enganados pela natureza vaga da versão de Galland, viajantes na Pérsia, Turquia e Índia têm imaginado que os Contos Árabes descrevem modos particulares dos nativos daqueles países; mas ninguém que os tenha lido na língua original e que tenha convivido intimamente com os árabes pode ter essa opinião: é nos países árabes, e especialmente no Egito, que vemos o povo, as vestimentas e a arquitetura, aos quais a descrição se refere em quase todos os casos, mesmo quando a cena se passa na Pérsia, na Índia ou na China” (tradução nossa).
  • 19
    “Seu convívio com modos e costumes árabes era insuficiente para lhe salvar de erros dos mais grosseiros” (tradução nossa).
  • 20
    “a cidade em que os modos árabes existem agora em seu estado mais refinado”; “Convencido da verdade de tal afirmação, eu me considero detentor das qualificações mais importantes para a apropriada conclusão de minha presente tarefa, após ter vivido vários anos no Cairo, associando-me quase exclusivamente com árabes, falando sua língua, conformando-me aos seus hábitos cotidianos com a mais escrupulosa exatidão e sendo recebido em sua sociedade nos termos de uma perfeita igualdade” (tradução nossa).
  • 21
    “representá-los de modo que estejam em perfeito acordo com os modos e costumes árabes” (tradução nossa).
  • 22
    “como ilustração de modos e sentimentos árabes” (tradução nossa).
  • 23
    “as rebusca e as persegue como um inquisidor. Sua integridade não pactua com o silêncio [...]” (tradução nossa).
  • 24
    “Daí que sua versão eruditíssima das Noites seja uma mera enciclopédia da evasão” (tradução nossa).
  • 25
    “os luxuriosos e mortais desertos da África Ocidental”; “as opacas e áridas clareiras da América do Sul” (tradução nossa).
  • 26
    “Céus diáfanos”, “ar glorioso como éter”, “a incandescência transfigurando e transformando, como por mágica, os traços caseiros e rústicos da cena em uma terra feérica, iluminada por uma luz que jamais brilhou sobre outros solos ou mares” (tradução nossa).
  • 27
    “Nosso século de traduções, populares e vernáculas, desde a deliciosa abreviação e adaptação do Professor Antoine Galland (1704), de nenhum modo representa o original do Oriente”; “Aquele amigável e devoto arabista” (tradução nossa).
  • 28
    “oriental demais e não oriental o bastante” (tradução nossa).
  • 29
    “tal como um árabe teria escrito em inglês”; “preservando intacto não só o espírito, mas até mesmo o mecanismo; o modo e a matéria” (tradução nossa).

Referências

  • Alighieri, Dante. “Canto XXVIII”. In: Alighieri, Dante. A divina comédia: Inferno Tradução e notas de Italo Eugenio Mauro. São Paulo: Editora 34, 1998. p. 187-192.
  • Bakhtin, Mikhail. “O romance como gênero literário”. In: Bakhtin, Mikhail. Teoria do romance III: o romance como gênero literário Tradução, posfácio e notas de Paulo Bezerra. São Paulo: Editora 34, 2019. p. 65-111.
  • Bakhtin, Mikhail. “Os gêneros do discurso”. In: Bakhtin, Mikhail. Estética da criação verbal Prefácio à edição francesa de Tzvetan Todorov; introdução e tradução do russo de Paulo Bezerra. 6. ed. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2011. p. 261-306.
  • Benjamin, Walter. “O narrador. Considerações sobre a obra de Nikolai Leskov”. In: Benjamin, Walter. Magia e técnica, arte e política: ensaios sobre literatura e história da cultura Tradução de Sérgio Paulo Rouanet; prefácio de Jeanne Marie Gagnebin. 7. ed. São Paulo: Brasiliense, 1994. Obras escolhidas. v. 1, p. 197-221.
  • Borges, Jorge Luis. “Las mil y una noches”. In: Borges, Jorge Luis. Siete noches Buenos Aires: Emecé, 1997. p. 79-104.
  • Borges, Jorge Luis. “Los traductores de Las mil y una noches”. In: Borges, Jorge Luis. Historia de la eternidad Buenos Aires: Emecé, 2005. p. 107-143.
  • Burton, Richard Francis. “The Translator’s Foreword”. In: Burton, Richard Francis (Trad.). A plain and literal translation of the Arabian nights entertainments, now entituled The Book of the Thousand Nights and a Night, v. 1. E-book (Project Gutenberg). Disponível em: https://www.gutenberg.org/ebooks/51252 Acesso em 07 nov. 2022.
    » https://www.gutenberg.org/ebooks/51252
  • Cervantes, Miguel de. El ingenioso hidalgo don Quijote de la Mancha Edición conmemorativa IV Centenario Cervantes. Madrid: Alfaguara; Real Academia Española; Asociación de Academias de la Lengua Española, 2015.
  • Galland, Antoine. “Advertissement de la première édition (1704)”. In: Galland, Antoine (Trad.). Les mille et une nuits : contes arabes, v. 1. Paris: Victor Lecou, 1846. p. 1-2.
  • Jarouche, Mamede Mustafa. “Uma poética em ruínas”. In: Jarouche, Mamede Mustafa. Livro das mil e uma noites, v. 1: ramo sírio 3. ed. São Paulo: Globo, 2006. p. 11-35.
  • Lane, Edward William. “The translator’s preface”. In: Lane, Edward William (Trad.). The Arabian Nights’ Entertainments London: Charles Knight and Co., 1839. p. vii-xxiii.
  • Roubine, Jean-Jacques. “Aristóteles revisado”. In: Roubine, Jean-Jacques. Introdução às grandes teorias do teatro Tradução de André Telles. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2003. p. 14-56.
  • Said, Edward W. Orientalismo: o Oriente como invenção do Ocidente Tradução de Rosaura Eichenberg. São Paulo: Companhia das Letras, 2007.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    19 Jun 2023
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    08 Abr 2022
  • Aceito
    31 Out 2022
  • Publicado
    Nov 2022
Universidade Federal de Santa Catarina Campus da Universidade Federal de Santa Catarina/Centro de Comunicação e Expressão/Prédio B/Sala 301 - Florianópolis - SC - Brazil
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