Resumos
O objetivo deste artigo é discutir a forma como a ideia e a práxis de autonomia na política externa brasileira se relacionam com as posições do país nos processos de integração regional no Cone Sul e, de forma mais ampla, na América do Sul, no período de 1991 a 2012. Discutimos o significado de autonomia em termos de políticas brasileiras para a região, bem como suas consequências para os próprios processos e as organizações subcontinentais. Identificamos mudanças e continuidades na ideia de autonomia e de que modo incidem ou não na consolidação das organizações, particularmente, o Mercosul e a Unasul. A partir da análise da literatura pertinente e de parte da documentação primária, concluímos que há ambiguidades, mas a tendência que prevalece é a do interesse pelo fortalecimento da cooperação e mesmo da integração. O interesse no fortalecimento da democracia e da paz surgem como centrais no período analisado.
política externa brasileira; Mercosul; Unasul; autonomia; integração regional
The goal of this article is to discuss how autonomy as an idea and practice inBrazilian foreign policy relates to the country's stance inregional integration process inthe Southern Cone region and, more broadly, in South America, from 1991 to 2012. It discusses the meaning of autonomy interms of Brazilian policies for the region, as well as its consequences inthe process of integration itself and regional organizations. The article identifies shifts and continuities in the idea of autonomy and evaluates how they affect the consolidation of organizations, particularly, Mercosul and Unasul. Building upon the relevant literature and primary sources, it concludes that ambiguities exist; yet there is a prevailing trend towards the strengthening of cooperation and integration. The strengthening of democracy and peace are key interests during the investigated timeframe.
Brazilian foreign policy; Mercosul; Unasul; autonomy; regional integration
El objetivo de este artículo es discutir cómo la idea y la praxis de autonomía en la política exterior brasileña se relacionan con las posiciones del país en los procesos de integración regional en el Cono Sur y, de forma más amplia, en Sudamérica, en el período de 1991 a 2012. Discutimos el significado de autonomía en términos de políticas brasileñas para la región, bien como las consecuencias que tiene para sus propios procesos y para las organizaciones subcontinentales. Identificamos los cambios y las continuidades en la idea de autonomía y de qué modo incide o no en la consolidación de las organizaciones, particular-mente, el Mercosur y la Unasur. A partir del análisis de la literatura pertinente y de documentación primaria, concluimos que hay ambigüedades, pero que la tendencia que prevalece es la del interés por el fortalecimiento de la cooperación e incluso de la integración. El interés por el fortalecimiento de la democracia y de la paz surgen como centrales en el período analizado.
política exterior brasileña; Mercosur; Unasur; autonomía; integración regional
Dans cet article, on examine comment l'idée et la praxis de l'autonomie dans la politique extérieure brésilienne sont liées aux positions du pays dans les processus d'intégration régionale au Cône Sud et, de façon plus large, en Amérique du Sud, dans la période 1991-2012. On recherche la signification de l'autonomie selon les politiques brésiliennes pour la zone, ainsi que leurs conséquences pour les processus mêmes et les organisations sous-continentales. On identifie des changements et des continuités dans l'idée d'autonomie et la façon dont elle incide ou non dans la consolidation des organisations, en particulier du Mercosul et de l'Unasul. À partir de la littérature et d'une partie des documents initiaux, on en conclut que, malgré des ambiguïtés, la tendance principale va vers le renforcement de la coopération et même de l'intégration. L'intérêt pour le renforcement de la démocratie et de la paix est dominant dans la période étudiée.
politique extérieure brésilienne; Mercosul; Unasul; autonomie; intégration régionale
Autonomia, integração regional e política externa brasileira: Mercosul e Unasul
Autonomy, regional integration and Brazilian foreign policy: Mercosul and Unasul
Autonomie, intégration régionale et politique extérieure brésilienne: Mercosul et Unasul
Autonomía, integración regional y política exterior brasileña: Mercosur y Unasur
Tullo VigevaniI; Haroldo Ramanzini JúniorII
IProfessor da Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho" (UNESP), São Paulo, SP, Brasil. E-mail: vigevanit@uol.com.br
IIProfessor-adjunto da Universidade Federal de Uberlândia (UFU), Uberlândia, MG, Brasil. E-mail: hramanzinijunior@gmail.com
RESUMO
O objetivo deste artigo é discutir a forma como a ideia e a práxis de autonomia na política externa brasileira se relacionam com as posições do país nos processos de integração regional no Cone Sul e, de forma mais ampla, na América do Sul, no período de 1991 a 2012. Discutimos o significado de autonomia em termos de políticas brasileiras para a região, bem como suas consequências para os próprios processos e as organizações subcontinentais. Identificamos mudanças e continuidades na ideia de autonomia e de que modo incidem ou não na consolidação das organizações, particularmente, o Mercosul e a Unasul. A partir da análise da literatura pertinente e de parte da documentação primária, concluímos que há ambiguidades, mas a tendência que prevalece é a do interesse pelo fortalecimento da cooperação e mesmo da integração. O interesse no fortalecimento da democracia e da paz surgem como centrais no período analisado.
Palavras-chave: política externa brasileira; Mercosul; Unasul; autonomia; integração regional
ABSTRACT
The goal of this article is to discuss how autonomy as an idea and practice inBrazilian foreign policy relates to the country's stance inregional integration process inthe Southern Cone region and, more broadly, in South America, from 1991 to 2012. It discusses the meaning of autonomy interms of Brazilian policies for the region, as well as its consequences inthe process of integration itself and regional organizations. The article identifies shifts and continuities in the idea of autonomy and evaluates how they affect the consolidation of organizations, particularly, Mercosul and Unasul. Building upon the relevant literature and primary sources, it concludes that ambiguities exist; yet there is a prevailing trend towards the strengthening of cooperation and integration. The strengthening of democracy and peace are key interests during the investigated timeframe.
Keywords: Brazilian foreign policy; Mercosul; Unasul; autonomy; regional integration
RÉSUMÉ
Dans cet article, on examine comment l'idée et la praxis de l'autonomie dans la politique extérieure brésilienne sont liées aux positions du pays dans les processus d'intégration régionale au Cône Sud et, de façon plus large, en Amérique du Sud, dans la période 1991-2012. On recherche la signification de l'autonomie selon les politiques brésiliennes pour la zone, ainsi que leurs conséquences pour les processus mêmes et les organisations sous-continentales. On identifie des changements et des continuités dans l'idée d'autonomie et la façon dont elle incide ou non dans la consolidation des organisations, en particulier du Mercosul et de l'Unasul. À partir de la littérature et d'une partie des documents initiaux, on en conclut que, malgré des ambiguïtés, la tendance principale va vers le renforcement de la coopération et même de l'intégration. L'intérêt pour le renforcement de la démocratie et de la paix est dominant dans la période étudiée.
Mots-clés: politique extérieure brésilienne; Mercosul; Unasul: autonomie; intégration régionale
RESUMEN
El objetivo de este artículo es discutir cómo la idea y la praxis de autonomía en la política exterior brasileña se relacionan con las posiciones del país en los procesos de integración regional en el Cono Sur y, de forma más amplia, en Sudamérica, en el período de 1991 a 2012. Discutimos el significado de autonomía en términos de políticas brasileñas para la región, bien como las consecuencias que tiene para sus propios procesos y para las organizaciones subcontinentales. Identificamos los cambios y las continuidades en la idea de autonomía y de qué modo incide o no en la consolidación de las organizaciones, particular-mente, el Mercosur y la Unasur. A partir del análisis de la literatura pertinente y de documentación primaria, concluimos que hay ambigüedades, pero que la tendencia que prevalece es la del interés por el fortalecimiento de la cooperación e incluso de la integración. El interés por el fortalecimiento de la democracia y de la paz surgen como centrales en el período analizado.
Palabras clave: política exterior brasileña; Mercosur; Unasur; autonomía; integración regional
INTRODUÇÃO
Este artigo tem o objetivo de analisar como a ideia de autonomia na política externa brasileira se relaciona com as posições do Brasil nos processos de integração regional no Cone Sul e na América do Sul, no período de 1991 a 2012. Procuraremos entender o significado do conceito de autonomia em termos de políticas brasileiras para a região e suas consequências para o Mercado Comum do Sul (Mercosul) e para a União de Nações Sul-Americanas (Unasul). Consideramos que as posições do Brasil têm papel relevante para a dinâmica desses processos. Para isso, identificamos mudanças e continuidades. O que queremos é entender em que medida a posição do Brasil fortalece ou não os processos de cooperação e de integração.
Numa perspectiva histórica, a autonomia é um objetivo primordial de qualquer Estado-nação, mesmo tendo características que se adaptam ao longo do tempo. Segundo Fonseca Jr., "as expressões do que é autonomia variam histórica e espacialmente, variam segundo interesses e posições de poder" (1998:361). O conceito admite diferentes abordagens em função da configuração do sistema internacional em um determinado período histórico, bem como das visões de mundo da população e das elites. Historicamente, para o Estado brasileiro, a ideia de autonomia significou, frente ao mundo exterior, capacidade de decisão diante dos centros de poder internacional, viabilizando a possibilidade de o país realizar reais escolhas. Isso valeu em diferentes momentos com maior ou menor intensidade, mas é um fio condutor constante, válido até os dias de hoje, na segunda década do século XXI. Até certo ponto, o Mercosul e a Unasul não seriam vistos como limitadores de autonomia de ação, ao contrário, o compartilhamento de interesses aumentaria as capacidades externas. Esta política manteve-se em diferentes governos, desde 1985, com o início do governo José Sarney. Entretanto, há posições, com ressonância em setores do empresariado e em correntes políticas, inclusive em parte dos intelectuais, no sentido de estabelecer ou de restabelecer o significado de autonomia, de modo a desenhar uma política exterior pela qual se reduz o significado do Mercosul, sobretudo das relações com a Argentina. O Estado brasileiro manteve e mantém forte interesse regional nos governos Fernando Henrique Cardoso, Luiz inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, mas seu aprofundamento, em particular no caso do Mercosul, vincula-se ao cenário global, sendo este um importante fator condicionante da sua dinâmica.
Desde a aproximação entre o Brasil e a Argentina, em meados dos anos 1980, com a volta dos governos civis, passando pela formação do Mercosul, em 1991, até a criação da Unasul, em maio de 2008, é possível verificar mudanças significativas com respeito ao papel exercido pela integração regional em relação aos objetivos da política externa do Brasil. A busca pela expansão geográfica da integração e/ou da cooperação do Cone Sul para a América do Sul tem sido uma característica central da política brasileira, e está relacionada com o peso do tema da autonomia na ação externa do país e com a constante preocupação pela manutenção do formato intergovernamental do Mercosul. Nos anos 2000, fortalece-se o objetivo dos governos brasileiros de ampliar a integração mediante a incorporação de um maior número de Estados membros. Ao mesmo tempo, há uma ação que visa ampliar o escopo das iniciativas integracionistas, criando novas estruturas de concertação política e de articulação física sul-americana (Gardini e Lambert, 2010). Decisões sobre diferenças substantivas no Mercosul no tocante ao comércio e à integração produtiva são adiadas. Provavelmente, não existindo documentos oficiais neste sentido, pode ter havido uma conexão entre o objetivo de autonomia e uma política de menor pressão por uma integração profunda, que também implicaria custos para o Brasil. Do ponto de vista da estratégia brasileira de integração sul-americana, a Unasul desempenha papel importante, já que alguns países consideram o status de associado, por meio de uma área de livre comércio, adequado para suas relações com o Mercosul. São os casos de Chile, Colômbia e Peru, que têm tarifas muito baixas ou acordos de livre comércio com os Estados Unidos.
A Unasul é uma iniciativa de integração regional que associa os países sul-americanos, segundo os termos de seu Tratado Constitutivo, buscando fortalecer a soberania e a autonomia nacional dos países-membros1 1 O artigo 2º do Tratado Constitutivo da Unasul afirma: "a Unasul tem como objetivo construir, de maneira participativa e consensual, um espaço de integração e união no âmbito cultural, social, econômico e político entre seus povos, priorizando o diálogo político, as políticas sociais, a educação, a energia, a infraestrutura, o financiamento e o meio ambiente, entre outros, com vistas a eliminar a desigualdade socioeconômica, alcançar a inclusão social e a participação cidadã, fortalecer a democracia e reduzir as assimetrias no contexto do fortalecimento da soberania e independência dos Estados" (Tratado Constitutivo da Unasul, 2008). . O Brasil havia dado início a um movimento nesse sentido em 1993, desembocando, em 2008, na Unasul. O ex-presidente Itamar Franco, com apoio do Mercosul, da Colômbia e da Venezuela, em 1993 convoca reunião dos países sul-americanos para a criação, em dez anos, da Área de Livre Comércio Sul-Americana, a ALCSA. Cardoso e Lula deram continuidade a este movimento, formalizado como instituição regional em 2008. Entre seus objetivos está o fortalecimento de mecanismos de cooperação regional, buscando articular um espaço econômico e político sul-americano, preservando os espaços nacionais de formulação de política. Neste texto, estudaremos se a Unasul, na perspectiva da política externa brasileira, constitui um fato singular ou uma repetição dos padrões de integração presentes em outros processos, principalmente no Mercosul. Ou seja, em que medida, além de novo fórum institucional, há o início de um novo padrão de integração ou de cooperação.
É relevante observar que o conceito de integração regional, diferentemente da cooperação, segundo parte da literatura, remete a um processo de transferência de lealdades das elites do Estado nacional para o âmbito regional. Em outras palavras, trata-se de uma dinâmica de transferência de parte das funções que eram desempenhadas pelo Estado para o âmbito regional (Haas, 2004; Matlary, 1994; Mariano, 2007), com consequente diminuição da margem de ação nacional autônoma. Argumentaremos que o que se observa na América do Sul e, em particular, na política brasileira é diferente. O fortalecimento do Estado continua a dar-se do ponto de vista de seu fortalecimento nacional e a autonomia é um elemento definidor da ação externa, sendo objeto de intensa discussão o seu grau de relativização. Em outros termos, na sociedade e nas elites não há consenso no que tange à transferência de funções para o âmbito regional, o que não é diferente do que acontece nos outros países da região.
A partir de 2003, em particular na percepção de funcionários mais diretamente vinculados à Presidência da República, a atuação do país na América do Sul exige algum tipo de perda de autonomia, de modo a viabilizar a integração num contexto de crescente assimetria com os países do entorno, e, ao mesmo tempo, permitir o aumento da autonomia do Brasil nas outras esferas internacionais. Possivelmente, Guimarães (2012) seja quem melhor expressou esta posição. Assim deve ser compreendido o conceito de autonomia pela diversificação (Vigevani e Cepaluni, 2007), quando outros parceiros se tornam prioritários. Pode-se então entender por que movimentos aparentemente não convergentes puderam ser realizados: 1) não aprofundamento do Mercosul; 2) ampliação do Mercosul, sem novos avanços no projeto de mercado comum; 3) investimento político e institucional para a criação e o funcionamento da Unasul; 4) ênfase nas parcerias estratégicas com China, Rússia, Índia e África do Sul.
Partindo dessas considerações iniciais, o artigo está organizado da seguinte forma: na primeira seção, discutimos o conceito de autonomia na política externa brasileira e a forma como interpretá-lo na relação sub-regional. Na seção seguinte analisamos as posições do país no Mercosul e suas consequências para o formato que a integração assume. Na terceira, discutimos a possibilidade de a Unasul representar uma nova dimensão de autonomia na política externa brasileira. Por fim, nas considerações finais, retomamos os principais argumentos apresentados.
O CONCEITO DE AUTONOMIA E A POLÍTICA EXTERNA BRASILEIRA
Nas produções acadêmicas latino-americana e brasileira sobre Relações internacionais, a autonomia é uma noção que se refere a uma política externa livre dos constrangimentos impostos pelos países poderosos, tanto como um objetivo a ser perseguido na ação externa, quanto como um conceito explicativo das opções internacionais. Nesse sentido, Tickner considera
que el objeto de estudio de los académicos de relaciones internacionales puede variar dependiendo de los retos que enfrentan los países donde residen y realizan sus labores profesionales. Esto se debe principalmente al interés de muchas comunidades académicas, en América Latina y otras partes del mundo, de construir un tipo de conocimiento sobre la política mundial que es susceptible de ser convertido en fórmulas políticas aplicables por los tomadores de decisiones (2012:26).
Para o Estado brasileiro, e também para outros países latino-americanos, a autonomia na ação internacional é algo a ser reafirmado constantemente. Isso difere da situação em que se encontram alguns países desenvolvidos, onde o peso econômico, político ou militar já garante, em si, um grau elevado de autonomia. Giacalone (2012) contribui para esse debate, explicando por que o tema da autonomia se situa no centro do debate acadêmico e político de relações internacionais na América Latina, com foco nos casos de Brasil, Argentina, México, Venezuela, Colômbia e Chile. De acordo com a autora (ibidem:12), a maior parte dos debates de relações internacionais na América Latina "referem-se à possibilidade de exercer uma política externa autônoma de modo a diminuir as consequências da dependência econômica". Essa concentração temática resultaria na existência de um conjunto de preocupações próprias à região. Neste artigo buscamos contribuir para a compreensão de como a noção de autonomia se verifica e evolui no caso brasileiro, influindo sobre as possibilidades de cooperação e integração em âmbito regional. Isto é, não destacamos a autonomia como caráter valorativo e como instrumento efetivo e ideológico frente aos mais poderosos, mas concentramos a atenção em seu significado vis-à-vis os parceiros regionais.
Pinheiro (2004:7) argumenta que "no plano das ideias, valores e doutrinas que orientam a ação externa do Brasil ao longo do último século destaca-se a busca pela autonomia". Do ponto de vista acadêmico e político, é uma condição diferente do entendimento da maior parte dos autores do mainstream clássico das Relações internacionais, que definem autonomia como o reconhecimento jurídico de Estados soberanos considerados como "unidades iguais" em uma ordem internacional anárquica.
Em vez de estar enraizada na noção jurídica de soberania, no Brasil a autonomia é um conceito político, um instrumento para salvaguardar-se dos efeitos mais nocivos do sistema internacional. Do ponto de vista dos países poderosos, a autonomia externa não é uma preocupação de maior relevância. Mello (2000) considera que a noção de autonomia fundamenta a articulação entre os conceitos de independência, diversificação e universalismo da política externa brasileira. A independência constituiria condição prévia da autonomia, enquanto a diversificação e o universalismo remeteriam aos meios que deveriam ser promovidos para alcançá-la. O termo autonomia, no caso brasileiro, remete à ideia de ampliação das margens de atuação ou de escolha do Estado, tendo em conta a percepção das condições do sistema doméstico e internacional em um determinado período. Portanto, é uma noção relativa, depende do contexto doméstico e/ou internacional em que a política externa é implementada (Mariano, 2007). Além disso, a autonomia é sempre uma questão de grau, sendo esse aspecto particularmente importante para as discussões sobre integração regional, que, por definição, irão implicar algum grau de relativização da autonomia. Como veremos nas seções seguintes, na perspectiva do Brasil, nos anos 2000, há propensão em aceitar maiores graus de cooperação. Por exemplo, na área de segurança regional, com limitações setoriais de autonomia em prol de objetivos de integração sul-americana distintos dos estabelecidos para o Mercosul.
A noção de autonomia é caracterizada pela capacidade do Estado para implementar decisões baseadas em seus próprios objetivos, sem interferência ou restrição exterior, e pela habilidade em controlar as consequências internas de processos ou eventos produzidos além de suas fronteiras. Como dissemos, a autonomia é sempre uma questão de grau, dependendo dos atributos de poder dos Estados e das condições externas que eles enfrentam. Na América Latina, a partir da década de 1970, a ideia de autonomia tem sido pensada como um meio de "libertar" os países da região de sua dependência externa. De fato, a origem da utilização do conceito é remota, e para alguns países da periferia ela aparece no século XIX. No Brasil, fases como a do nacionalismo, da Política Externa independente (governos Jânio Quadros e João Goulart) e do Pragmatismo Responsável (governo Ernesto Geisel) refletem o grau de enraizamento do conceito. Jaguaribe (1979:91-93) descreve o sistema internacional como uma ordem hierárquica. Embora os países com capacidade para exercício pleno da autonomia não possam garantir total inviolabilidade de seus territórios nacionais, eles oferecem consideráveis obstáculos para as ações de seus inimigos e desfrutam de margem de manobra suficiente para conduzir suas políticas externas. As nações dependentes, por outro lado, embora formalmente independentes e soberanas, historicamente são constrangidas pelas grandes potências.
A autonomia é uma função das condições estruturais que Jaguaribe (ibidem:96-97) descreve como "viabilidade nacional" e "permissibilidade internacional". O primeiro termo refere-se à existência de recursos humanos e sociais adequados à capacidade de inserção internacional e ao grau de coesão sociocultural dentro das fronteiras nacionais. O segundo conceito relaciona-se com a capacidade de neutralizar as ameaças externas, e depende de recursos econômicos e militares e alianças com outros países. Jaguaribe também identifica dois fatores fundamentais para a existência da autonomia na periferia: autonomia tecnológica e empresarial e relações favoráveis com o centro.
Em suas reflexões sobre a autonomia, Puig (1980, 1984), diferentemente de autores realistas como Morgenthau e Waltz, argumenta que o sistema internacional não é caracterizado pela anarquia, mas por uma hierarquia internacional. Conforme Puig (1980:149-155), a obtenção da autonomia passa por quatro estágios: 1) o status formal de Estado soberano; 2) os benefícios materiais suficientes para elaborar e pôr em prática um projeto nacional; 3) a aceitação das políticas da potência em suas áreas de interesse estratégico em troca do exercício de autonomia em setores de igual importância para os países latino-americanos, como por exemplo, na escolha de seus modelos de desenvolvimento; e 4) a ruptura da dependência com o centro e ações de não obediência. Para Puig assim como para Jaguaribe a autonomia requer graus adequados de "viabilidade nacional", uma considerável quantidade de recursos domésticos e um compromisso explícito das elites com um projeto nacional. Os dois autores também compartilham a noção de que a autonomia requer a mobilização de recursos de poder na periferia. Recolhendo parte destes argumentos, neste artigo defendemos a ideia de que o conceito de autonomia na perspectiva do Estado brasileiro, na década de 1990 e nos anos 2000, parte do pressuposto de que alianças regionais potencializam a capacidade de resolução de problemas, fortalecem a integração e/ou a cooperação política e econômica e melhoram a estratégia negociadora internacional. Nessa perspectiva, a integração e a cooperação regional constituem um objetivo estratégico.
Avançando o entendimento do conceito, Fonseca Jr. (1998) argumenta que a diplomacia brasileira no período da Guerra Fria se caracteriza pela autonomia pela distância. Já na década de 1980, esta mesma diplomacia ganharia uma nova roupagem em virtude da democratização brasileira, ao final da Guerra Fria, da aceleração do processo chamado de globalização e da entrada de "novos temas" na agenda internacional (questões ambientais, direitos humanos, reforma do sistema internacional de comércio). Em suma, a própria ideia de autonomia ganharia nova conotação. Segundo o autor, a primeira expressão de autonomia seria a de manter distância em relação às ações e aos valores do Bloco Ocidental; significaria uma atitude crítica em relação às superpotências. Por outro lado, a autonomia, no mundo contemporâneo, não significaria mais "distância" dos temas polêmicos para resguardar o país de alinhamentos indesejáveis. Ao contrário, segundo Fonseca Jr. (1998), a autonomia se traduziria por "participação", por um desejo de influenciar a agenda participando dos processos decisórios.
Na mesma linha de raciocínio, Russell e Tokatlian (2003) argumentam que a aceleração da globalização nas últimas décadas teria modificado sensivelmente o espaço de ação dos países latino-americanos. Esse novo contexto global demandaria que a autonomia fosse definida de uma forma diferente, havendo a necessidade de transição da autonomia antagônica (que é similar à autonomia pela distância) para a autonomia relacional (que é parecida com a autonomia pela participação).
A autonomia relacional traduz-se em uma crescente interação, negociação e participação na elaboração das normas e regras internacionais. A autonomia não é mais definida "pelo poder de um país para isolar-se e controlar o processo externo e eventos, mas sim pelo seu poder de participar e efetivamente influenciar em questões globais, particularmente em todos os tipos de organizações internacionais e regimes políticos" (Russell e Tokatlian, 2003:16). Para Russell e Tokatlian (2003:19), a autonomia relacional deve ser alcançada por meio de compromissos e negociações com grande participação da opinião pública, fortalecendo o aspecto democrático deste tipo de desenvolvimento de política externa. O abandono parcial de elementos de soberania (marca da autonomia antagônica) é feito no sentido de desenvolver instituições e normas para a promoção do bem comum. Percebemos nessa perspectiva a ideia da inserção propositiva na lógica dos regimes internacionais prevalecentes. Briceño Ruiz entende que "las recientes reflexiones sobre densidad nacional y autonomia relacional confirman que el desarrollo económico y la autonomia política continúan siendo ideas centrales en la reflexión integracionista latinoamericana" (2012:54).
Cada um dos conceitos discutidos (autonomia pela distância, pela participação, pela diversificação), está enraizado na tradição diplomática brasileira. Contudo, não necessariamente estas estratégias são bem sucedidas a ponto de trazerem benefícios para, por exemplo, o intercâmbio comercial, a atração de investimentos diretos, a influência nos organismos internacionais, a consolidação dos esforços de integração regional ou o prestígio político e a influência nos temas da paz e da guerra. Por conta da forma como a questão da autonomia se insere nos objetivos de ação externa dos Estados latino-americanos, particularmente no caso do Brasil, a experiência da integração tem particularidades importantes, inclusive consequências teóricas a serem consideradas.
A integração no Cone Sul e na América do Sul, portanto no Mercosul e na Unasul, de certa forma destoa das teorias desenvolvidas por neofuncionalistas (Matlary, 1994; Haas, 2004) e por liberal-intergovernamentalistas (Moravcsik, 1994, 2005). Para os primeiros, integração significa um fenômeno de spill over voltado à atenuação do poder nacional, tendencialmente direcionado ao favorecimento da supranacionalidade. Para os segundos, a interação combinada dos interesses nacionais garante a integração. Para os liberal-intergovernamentalistas, a autonomia nacional subsiste, mas a permanência e o avanço da integração resulta da combinação de interesses nacionais. Defendemos a ideia de que para o Estado brasileiro, para suas instâncias formuladoras de política externa, os diferentes blocos regionais do qual participa devem contribuir para o fortalecimento da autonomia dos estados-membros. Para funcionalistas e liberal-intergovernamentalistas a integração surge da demanda dos atores domésticos e grupos de interesse dos Estados. Tem como pressuposto um grau razoável de interdependência econômica dos membros (Choi e Caporaso, 2002). Essas características, decorridos 23 anos do Tratado de Assunção de 1991, não tiveram um crescimento qualitativo importante. Não há no Brasil forte demanda pela integração, nem houve crescimento vigoroso da interdependência, sem desconhecer que há avanços históricos em pontos importantes: por exemplo, o quase desaparecimento de hipóteses de guerra em todo o subcontinente e uma maior presença de investimentos intrarregionais. Ao mesmo tempo, o país manteve, de forma consequente, durante 30 anos, desde 1985, forte presença em favor da integração e da cooperação regional, o que se explica pela capacidade de conectá-las com a perspectiva da autonomia. Na seção seguinte trataremos do impacto da dimensão da busca de autonomia para a política brasileira no Mercosul para a integração no Cone Sul.
A QUESTÃO DA AUTONOMIA E A POLÍTICA DO BRASIL PARA O MERCOSUL
O início da integração entre o Brasil e a Argentina2 2 Declaração de Iguaçu, novembro 1985; Programa de integração e Cooperação Econômica (Pice), julho 1986; os 24 Protocolos decorrentes; Tratado de integração, Cooperação e Desenvolvimento, novembro 1988. em meados dos anos 1980 correspondeu a uma lógica desenvolvimentista, que visava estimular a competição empresarial para a modernização e a inserção competitiva no sistema econômico internacional (Peña, 1991). Essa fase fortaleceu, em parte das elites brasileiras, incluindo grupos empresariais e funcionários do Estado, a percepção de que o compartilhamento de interesses melhoraria a inserção internacional. Mesmo no momento do Tratado de integração, Cooperação e Desenvolvimento, de 1988, que desenhou o Mercosul e deu caráter estável e forte à aliança Argentina-Brasil, prevaleceu a perspectiva intergovernamentalista.
No processo de revisão da política internacional e das relações econômicas externas, investimentos, relações financeiras, comércio, em órgãos como Ministério da Fazenda, Bancos do Brasil e Central, e de forma gradual pela diplomacia brasileira, a aproximação Brasil-Argentina era vista como fundamental em termos de política internacional. Conquistava adeptos em parte da diplomacia e, ao mesmo tempo, estava ligada à estratégia do paradigma universalista (Flecha de Lima, 1989:30-31). Ela fortalecia a ideia de uma melhor presença no mundo, política e econômica, assim como dava maior poder de agenda aos seus membros na formulação de regimes e de instituições internacionais. Para alguns, avançar no processo de integração regional aumentaria a capacidade nas relações com os maiores centros de poder, particularmente com os Estados Unidos (Amorim e Pimentel, 1996). Essas perspectivas permitiram que a aliança pela integração viabilizasse acordos intraburocráticos e sustentação de parte de segmentos da sociedade. A aliança era composta por setores ligados à tradição nacionalista e também por aqueles que desejavam maior inserção do Brasil na ordem internacional liberal.
Dessa forma, é estabelecido o nexo entre a integração regional, o Mercosul e a aliança com a Argentina, com a preservação dos valores da autonomia e da diversificação de parcerias. O regionalismo não diminuiria, mas reforçaria o paradigma universalista de inserção internacional brasileiro. A ideia da "modernização via internacionalização" (Przeworski, 1993), que traria reflexos diretos ao paradigma de inserção internacional ao longo dos anos 1990, não se chocou com o regionalismo. O conceito de regionalismo aberto foi utilizado na perspectiva da plena inserção internacional, aproveitando as vantagens de uma área de livre comércio e, a partir de 1995, de uma união alfandegária. Não foram criados os instrumentos necessários para dar sustentabilidade à integração, isto é, instrumentos que permitissem ações públicas de desenvolvimento social e econômico, assim como a atenuação das grandes desigualdades entre os Estados e internamente a cada Estado. A ideia de autonomia permaneceu enraizada na administração e entre empresários nos anos 1990, sob a égide do conceito da autonomia pela participação (Fonseca Jr., 1998). O impulso empresarial inicial, em particular nas empresas do setor automotivo, voltadas para o mercado global, não continuou forte com o decorrer dos anos. Já nos anos 2000, a tendência tem se alternado. Novos investimentos, empreiteiras brasileiras investindo na região, mas também retrocessos em investimentos, como os que identificamos nesta década de 2010 de parte do Brasil na Argentina. Empresas como Vale, Petrobras, e outras, como Deca, JBS e ALL, tendem a retirar-se. Não há uma tendência totalmente definida depois de um período de fortalecimento de investimentos transfronteiriços e cruzados.
Nos anos 1990, portanto, a noção de autonomia não foi anulada com o Mercosul. Ela se apresentava de outras maneiras. Manifestava-se semelhantemente em relação aos países ricos, com os quais se buscavam maiores vínculos, por serem considerados fundamentais nos aspectos econômicos e políticos, sem abdicar dos interesses nacionais considerados fundamentais (Cardoso, 2001). Paradoxalmente, nas relações do Brasil com o Mercosul, a ideia de autonomia se manifesta sob a forma de insistente revalorização da potencialidade de ação nacional, não sujeita às amarras que uma integração institucionalizada poderia acarretar. Assim, a lógica instrumental vai se afirmando e prevalece. Segundo afirma o ex-ministro das Relações Exteriores, Luiz Felipe Lampreia (1995-2001):
O Mercosul é um processo essencialmente aberto ao exterior. No caso do Brasil, o desenvolvimento do Mercosul é parte de um amplo esforço de abertura econômica, liberalização comercial e melhor inserção na economia mundial. O processo de integração não é concebido como um fim em si mesmo, mas como instrumento para uma participação mais ampla no mercado global (Lampreia, 1999:135).
A partir de 2003, o Mercosul muda relativamente a sua ênfase comercial e passa a considerar de modo mais direto as questões sociais e institucionais. As discussões em torno do Parlamento do Mercosul, do Mercosul Social, do Protocolo de Olivos e do Fundo de Convergência Estrutural do Mercosul (Focem) representam a potencialidade de novas dimensões na integração (Mariano, 2011). O Brasil passa a reconhecer de forma explícita a existência de assimetrias estruturais no Mercosul. Mesmo assim, as tentativas de oferecer contrapartidas aos outros sócios não tiveram a densidade necessária. Segundo o ex-presidente do Brasil:
O Mercosul tem diante de si o desafio de reinventar-se e atender às expectativas de todos os seus membros. Temos de desenhar mecanismos que equacionem em definitivo as assimetrias, inclusive com o aporte de novos recursos. Precisamos encarar de frente as questões relativas ao fortalecimento institucional e à implementação, em cada um de nossos países, das decisões e acordos que tomamos no bloco. Esta nova etapa do Mercosul que estamos iniciando exigirá que suas instituições estejam à altura de nossas ambições [...] Mais Mercosul significa, necessariamente, mais institucionalidade. (Lula, 2006)
Entretanto, na sociedade brasileira, essa perspectiva não apenas não é consensual como também enfrenta resistências, o que explica os parâmetros reais da ação do Estado. Em encontro realizado em novembro de 2004, que reuniu empresários de diversos segmentos e entidades como a Federação das indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Associação Brasileira dos Fabricantes de Calçados (Abicalçados), Associação Nacional dos Fabricantes de Produtos Eletroeletrônicos (Eletros) e Associação Brasileira de Comércio Exterior (AEB), foram feitas diversas ressalvas quanto à importância do aprofundamento do Mercosul para o Brasil. Há entre empresários uma intensa discussão sobre a necessidade de retroceder de uma união alfandegária, ainda imperfeita, para uma área de livre comércio. Segundo os representantes daquelas entidades, o Mercosul seria uma âncora que segura o Brasil nas negociações internacionais, dificultando acordos bilaterais com os Estados Unidos e a União Europeia (Valor Econômico, 16/11/2004). De acordo com Fonseca e Marconini (2006:87) "seria recomendável que as autoridades brasileiras tivessem a ousadia realista de converter o Mercosul, extinguindo o cada vez mais problemático regime de união aduaneira, para tornar-se uma área de livre-comércio".
O desenvolvimento do Mercosul não se apresenta uniforme e as suas variações têm relação com as diferentes dimensões da autonomia na política externa brasileira. Pode-se apontar três fases distintas: a primeira, que antecede o primeiro mandato de Cardoso, vai de 1991 a 1994 (do Tratado de Assunção ao Protocolo de Ouro Preto). É durante esse período que se consolida o desenho institucional. Em seguida, de 1995 a 1998, observa-se a continuidade da expansão comercial intrabloco, que alcança o seu ponto máximo. Nesses dois primeiros momentos prevalecia uma leitura de autonomia que se acomodava com a integração regional, até porque a integração estava nos seus estágios iniciais. A partir de 1999, com a crise do Real e sua desvalorização, e a posterior recessão argentina, de 2001, o Mercosul entra em crise. Nesse momento, fortalece-se no Brasil uma dimensão da autonomia que começa cada vez mais a relativizar a importância da integração, ao mesmo tempo que lidar com as crises exigiria um maior comprometimento com a integração, inclusive do ponto de vista institucional, o que teria implicações para a autonomia do país. Assim, além dos elementos conjunturais, que se expressam por seguidos contenciosos comerciais e políticos, devem ser considerados na busca de explicações consistentes para os problemas do bloco: questões estruturais, relativas às economias dos países envolvidos e valores enraizados nos Estados e nas sociedades, como democracia, percepção da própria posição no mundo, afinidades culturais e outros, inclusive o desafio de compatibilizar as lógicas da autonomia e as necessidades da integração regional.
Nos primeiros anos da integração, como se verifica nas atas do Grupo Mercado Comum, surgem sinais de razoável interesse por uma maior institucionalização do Mercosul. Em 1992, o Grupo aprovava agenda de ministros da Economia e presidentes de Bancos Centrais em que deveria ser tratada "a situação econômica e a análise da convergência das políticas econômicas nacionais" (Grupo Mercado Comum, 1992:18). No entanto, a partir de 1996 e 1997, combinaram-se problemas comerciais específicos com desencontros relativos à inserção internacional que fortaleceram uma leitura do objetivo da autonomia que relativiza a importância da integração. Ganha peso no Brasil o argumento de que o Mercosul é um limitador da capacidade de diversificação das parcerias do país, principalmente na Fiesp, na Confederação Nacional da indústria (CNI), nas entidades representativas do agribusiness, entre altos funcionários e na imprensa. Contribuíram para essa inflexão razões objetivas: o avanço das negociações para a criação da Área de Livre Comércio das Américas (Alca), as negociações para o início de uma nova rodada na Organização Mundial do Comércio (OMC), o começo da discussão sobre o papel dos BRICs (Brasil, Rússia, Índia e China). Essas negociações ou orientações não necessariamente deveriam enfraquecer o Mercosul, mas isso acabou acontecendo, pois a ideia da integração nunca chegou a ser assimilada pelo conjunto das elites brasileiras e por uma parte da população de maneira geral. O movimento contrário à integração tampouco tem base popular. Simplesmente: o tema não mobiliza.
Tanto na perspectiva liberal quanto na nacional-desenvolvimentista, o Mercosul continua importante como base da política brasileira, mas o foco de interesses vem sendo reorientado e a ação empresarial e governamental passa a concentrar-se em outras direções. Em relação à região, o foco privilegiado passa a ser a América do Sul, não o Cone Sul. Como veremos na próxima seção, a formação da Unasul pode sinalizar essa nova tendência: Lima (1994, 2005) afirma que o padrão brasileiro de política externa é contrário ao aprofundamento da institucionalização do Mercosul, prevalecendo a aspiração em converter o país em um ator internacional relevante, somado à crença (também presente na Argentina) da especificidade do país na região.
É interessante mostrar a racionalidade, segundo um ponto de vista, da posição do Brasil de defesa do princípio da autonomia no Mercosul, que tem relação com a defesa da intergovernamentalidade enquanto princípio institucional da integração, contrária ao adensamento da institucionalidade do bloco. Pierson (1998) considera que os governos nacionais, quando delegam determinadas funções às instituições ou a órgãos comunitários regionais, com o tempo tendem a perder o controle do processo de integração para essas instituições. As instituições ou órgãos regionais abririam espaço para novos atores domésticos participarem do processo decisório, sem a intermediação dos governos, fato que tenderia a fortalecê-las e a fornecer-lhes novas fontes de legitimidade. Uma vez alcançada por essa instituição ou órgão certa autoridade no processo de integração, torna-se difícil para os governos fazê-lo recuar, viabilizando a recuperação do poder original dos estados-membros. O custo dessa ação de recuperação, de certa forma, inviabilizaria a sua concretização. Gradualmente, a dinâmica decisória da integração tende a adquirir mais autonomia em relação aos Estados nacionais. Assim, pode-se entender a baixa disposição brasileira quanto ao fortalecimento institucional do bloco, já que o Estado não deseja perder o controle do processo de integração. As posições brasileiras são fundamentadas na lógica da intergovernamentalidade e são mais adaptadas à expansão do bloco do que propriamente ao seu aprofundamento. A intergovernamentalidade, na medida em que resguarda um alto nível de autonomia para o Estado nacional, faz com que este tenha uma forte capacidade de intervenção em relação à política de integração regional. Desta forma, compatibiliza-se adequadamente com o elemento de autonomia da política exterior do Brasil.
Como apontamos, os conceitos de autonomia e de diversificação das parcerias, defendidos por parte das elites e presentes na memória institucional do Ministério das Relações Exteriores (Mariano, 2007), colocam questionamentos ao Mercosul. A percepção de que haverá perda da soberania e da autonomia brasileira na medida em que houver um maior aprofundamento da integração do bloco continua norteando parte da ação da burocracia estatal. Consequentemente, rejeita-se uma opção que parece limitar o espaço de manobra internacional do Brasil no mundo, dificultando a diversificação das parcerias. A estrutura do bloco, definida pelo Tratado de Assunção de 1991, concentra o poder decisório e a governabilidade no Conselho do Mercado Comum (CMC). Este conselho conta com os presidentes e os ministros das Relações Exteriores e da Economia dos países-membros, enquanto o Grupo Mercado Comum (GMC), composto pelos vice-ministros das relações exteriores ou subsecretários, encarrega-se da direção executiva da integração. Essa engenharia institucional, compatível com uma leitura de autonomia nacional, tem se mostrado inadequada para permitir o desenvolvimento de uma identidade integracionista entre os países-membros.
Um Mercosul mais institucionalizado parece não atender aos interesses de parte considerável das elites, de grupos sociais, econômicos e regionais, de setores políticos, que parecem ter suas necessidades atendidas na atual estrutura. Redimensionados os objetivos, permanece, com as indeterminações sinalizadas acima, o interesse em aumentar o comércio e, em alguns casos, aumentar o investimento transfronteiriço. Foi o caso da Petrobras, com as dúvidas que surgem nestes anos 2010. Seriam, ainda, os casos do Banco Itaú, Bunge, Gerdau, AmBev, Techint e de outras empresas. O bloco permanece tendo significado em algumas circunstâncias importantes. É útil para uma parte das relações com os Estados Unidos, tem importância nas relações com a União Europeia, parcialmente no caso da OMC e em algumas negociações com países emergentes, particularmente nos casos de diálogo bloco a bloco.
O que queremos dizer é que mesmo nos casos em que o padrão de relacionamento interno ao bloco e a lógica das negociações sugeriria o fortalecimento da integração, pois uma união alfandegária tem legalmente que negociar como tal as relações econômicas e comerciais com outros países ou com outras Uniões, isto não tem acontecido com intensidade. A União Europeia valorizou a relação bloco a bloco. Ao mesmo tempo, a parceria estratégica entre a União Europeia e o Brasil, estabelecida em 2007, demonstra que parceiros importantes aumentam o nível de reconhecimento dos Estados nacionais.
Dando sequência a esta interpretação, compreende-se melhor por que se evitam posições que, para alguns, limitariam as possibilidades abertas pela maior autonomia e pelo maior número de parcerias comerciais fortalecidas no quadro de relações bilaterais. Consequentemente, "O grande obstáculo, no Brasil e na Argentina, para um efetivo 'investimento' no projeto Mercosul é a ambiguidade com que, para além da retórica do discurso pró-integração, diversos setores das duas sociedades e dos dois governos avaliam o bloco" (Gonçalves e Lyra, 2003:14).
Fica claro que a manutenção das margens de manobra vale não somente para as relações brasileiras com outras partes do mundo, mas, também, para a política em relação ao Mercosul. Contudo, a manutenção de margens de ação amplas para os estados-membros dificulta o aprofundamento do próprio processo de integração. Uma união alfandegária, em tese, pode ser viabilizada por uma arquitetura institucional intergovernamental, assim como pode também ser gerenciada mantendo-se um alto grau de autonomia nacional com relação à política regional (Mariano, 2007). No entanto, consolidar plenamente esse estágio e até mesmo ultrapassá-lo torna-se menos provável uma vez que a manutenção da autonomia é um eixo estruturador das posições brasileiras diante da integração. Assim, também se explica a defesa de uma perspectiva de gerenciamento contínuo da união alfandegária com um nível importante de assimetria (Mariano, 2007). Mas, na medida em que essas assimetrias se mantêm altas em virtude da ausência de instrumentos regionais adequados, a tendência é que a União Alfandegária não se complete e acabe sendo debilitada por uma lógica na qual os conflitos são sobrevalorizados, já que os meios para sua superação têm também relação com a mudança de postura do Estado mais importante do bloco mesmo que esta postura não seja o único fator. Seria o papel de paymaster, de acordo com a formulação de Mattli (1999). No caso do Mercosul, instabilidades e crenças na possibilidade de resolução autônoma de problemas as encontramos insistentemente em todos os países.
O BRASIL E A UNASUL: POSSIBILIDADE DE UMA NOVA DIMENSÃO DE AUTONOMIA
A constituição e a posterior institucionalização da Unasul, nos anos 2000, aponta para a necessidade de pesquisar em que medida representaria uma nova dimensão da integração e, ao mesmo tempo, da política brasileira em relação à América do Sul. Sendo objetivo deste artigo discutir as formas como a ideia e a práxis de autonomia na política externa brasileira se relacionam com as posições do país nos processos de integração regional no Cone Sul e na América do Sul, no período de 1991 a 2012, a compreensão da relação do Brasil com a Unasul contribui para entender se o bloco representa uma forma de arranjo institucional que repetiria o padrão de política externa brasileira, isto é, a política que coloca determinados limites para a integração regional. Em outros termos, trata-se de entender se nos encontramos diante de uma lógica em que, prevalecendo o conceito de autonomia, ao mesmo tempo este consegue conectar-se positivamente com o objetivo da cooperação e de aspectos setoriais de integração. O Brasil certamente contribuiu significativamente para a constituição da Unasul: fazem parte os 12 países sul-americanos: Argentina, Brasil, Uruguai, Paraguai, Bolívia, Colômbia, Equador, Peru, Chile, Guiana, Suriname e Venezuela.
As primeiras iniciativas brasileiras contemporâneas que remontam ao tema deram-se no governo Itamar Franco. A primeira manifestação foi o anúncio da ideia de Associação de Livre Comércio Sul-Americana (Alcsa), em 1993, durante a VII Cúpula do Grupo do Rio. Tiveram continuidade anos depois, no segundo governo Cardoso, com a realização de cúpulas presidenciais sul-americanas em Brasília, em 2000, e em Guayaquil, em 2002. Em dezembro de 2004, na cidade de Cuzco foi realizada a Terceira Reunião de Presidentes da América do Sul, quando foi redigido um documento, conhecido como Declaração de Cuzco, que criou as bases para a Unasul. O projeto criado naquela reunião foi denominado Casa (Comunidade Sul-Americana de Nações). Em 2007, durante a Primeira Reunião Energética da América do Sul, realizada na Venezuela, o nome foi modificado para Unasul. Em maio de 2008, em Brasília, representantes dos 12 países assinaram um tratado para a criação da Unasul, que com este tratado, passa a ser um organismo internacional.
Por se tratar de um processo recente, é difícil encontrar resposta definitiva a respeito do padrão da política brasileira. Neste caso parece haver certa tensão entre elementos de continuidade e de mudança, principalmente por se tratar de uma instituição de índole intergovernamental, que encerra elementos de uma nova força não necessariamente articulada com a diplomacia, ainda que em alguns casos convergente com ela. Trata-se de verificar se uma marca dos governos, seja dos governos Lula e Rousseff, seja dos governos dos outros países da região, de forte ativismo presidencial, especificamente regionalistas portanto, com peculiaridades no que tange à mais clássica diplomacia presidencial têm implicações que viabilizariam um novo padrão de política de cooperação e integração. As diferenças do contexto social e político internacional dos anos 1990, surgimento do Mercosul, e dos anos 2000, surgimento da Unasul, são um elemento importante para entender diferenças entre os dois processos e para a própria política brasileira. Para evidenciar o contraponto, diga-se que o Mercosul continha em sua matriz alguns sinais que poderiam evoluir para a supranacionalidade: isso desde 1986, 1988, e pelos conteúdos do Protocolo de Outro Preto de 1994. Esta tendência em alguns momentos aflorava como consequência dos acordos das cúpulas presidenciais semestrais, tendo em vista a dinâmica de maior institucionalidade. Exemplos seriam o Tribunal Arbitral Permanente de Revisão, o Fundo para a Convergência Estrutural do Mercosul (Focem), o Parlamento etc.
Nos anos 2000, novos temas ganham centralidade na agenda sul-americana do Brasil: 1) integração física e da infraestrutura; 2) segurança e defesa; 3) migrações; 4) integração produtiva; 5) tratamento das assimetrias, entre outros (Lima, Hirst e Pinheiro, 2010). Esses temas envolvem dilemas importantes de cooperação; ao mesmo tempo, lidar com essas questões torna-se fundamental, pois influem decisivamente no objetivo de promover maior cooperação e interconexão dos países. Para alguns, são temas próprios das novas dimensões que a integração assume nos anos 2000, num contexto que alguns autores chamam de regionalismo pós-liberal (Veiga e Rios, 2007). Dois movimentos processam-se contemporaneamente: por um lado, observam-se modificações importantes em algumas características dos processos de integração na América do Sul, adensando-se formas cooperativas em alguns temas, como democracia e segurança. Por outro, nota-se que parte dos modelos de integração econômica e comercial dos países da região apresentam diferenças que não podem ser desconsideradas. A recente criação da Aliança do Pacífico (seu tratado constitutivo foi assinado em junho de 2012 e é composta por Chile, Colômbia, Peru e México), assim como a multiplicação de acordos de livre comércio com os Estados Unidos (Chile, Peru, Colômbia), seriam elementos que sinalizam heterogeneidade em termos de opções de inserção comercial externa, com efeitos não necessariamente positivos para a cooperação e a integração regional. Acrescente-se a isso a ação da China na região (Vadell, 2011), cujas consequências de longo prazo não são claras, tampouco sua influência sobre os processos de integração e cooperação. O que estamos discutindo é a existência de um cenário multifacetado, no qual a política brasileira se insere com importante peso.
Diferentemente do Mercosul, a Unasul surge num contexto de diversidades na região. Diversidades aceitas, mas que não trazem como objetivo a integração econômica, descartando-se qualquer proposta de mercado comum. A Unasul não visa a política externa comum; busca superar diferenças, sem desconhecê-las, mantendo um espaço de interlocução. Do ponto de vista do Brasil, segundo Guimarães (2006:275) é indispensável trabalhar de forma "consistente e persistente em favor da emergência de um sistema mundial multipolar no qual a América do Sul venha a constituir um dos polos e não ser apenas uma sub-região de qualquer outro polo econômico ou político". Na perspectiva brasileira, de diplomatas e funcionários formuladores de políticas, é importante a Unasul configurar-se como um espaço em que se atenua ou mesmo deixa de existir polarização focada fora da região, nos Estados Unidos particularmente. Não se trata de contraposições, mas de adensar capacidades propositivas próprias, isto é, os governos no Brasil acreditam na possibilidade da focalização de poder em termos regionais, focalização própria, não determinada pela antítese adesão/contraposição.
Esta parece ser a forma como o Estado no Brasil percebe a atual situação política sul-americana. Movimentos com lógicas distintas, como a Aliança do Pacífico, que alguns analistas consideram ter potencial de clivagens e fragmentação na região (Menezes, 2013) e que tem o Paraguai e o Uruguai como países observadores, geram respostas brasileiras no sentido de fortalecer os mecanismos de diálogo sul-americano e promover uma infraestrutura regional mais eficiente de modo a incentivar um comércio intrarregional que contribua para o desenvolvimento dos países (Padula, 2013).
Podemos nos apropriar da ideia de Bull (2002) de Sociedade internacional para entender melhor a questão. Segundo ele, para a Sociedade existir é necessário algum nível de "consenso que precisa incluir uma percepção de interesses comuns" (Bull, 2002:353). Na perspectiva de Lula (2006), em discurso na cerimônia de abertura da II Reunião de Chefes de Estado e de Governo da Comunidade Sul-Americana de Nações, antecessora da Unasul: "Um projeto tão amplo quanto o da nossa Comunidade tem que contar com instituições que permitam realizar nossos projetos. Se queremos uma Comunidade forte é necessário dotar-lhe dos instrumentos necessários". O objetivo é a existência de um instrumento sul-americano, portanto não latino-americano, e ainda menos hemisférico. Esse objetivo explica-se porque nesse espaço, na formulação do Estado brasileiro, de seus políticos e de seus altos funcionários, podem-se criar consensos a respeito de alguns temas. Consensos que, ainda seguindo Bull (2002), são possíveis na medida em que se busca a ordem e, como discute no Capítulo I (O conceito de ordem na política mundial), permitem "manter a independência ou a soberania externa dos Estados individuais". Mais relevante, consensos que podem ser obtidos como resultado de uma composição de poder marcadamente regional. Desse modo, compatibiliza-se preservação da autonomia, cooperação, integração seletiva e um espaço comum em que as relações correspondem a outra geografia, atenuando (não eliminando) o peso de fatores extrarregionais. Isso seria possível na América do Sul, mas não na América Latina e menos ainda na esfera continental, onde alguns países ganham maior capacidade decisória.
Verificamos que determinadas políticas podem sinalizar mudança em relação a posições anteriores do Brasil na América do Sul. Há tentativas mais ou menos articuladas de conectar a autonomia nacional com os objetivos de cooperação e integração sul-americana. A questão do financiamento da integração, tema em relação ao qual o Brasil havia resistido, parece passar por modificação (Carvalho, 2009). A crítica brasileira, sobretudo do Ministério da Fazenda e do Banco Central, referia-se ao risco da utilização de critérios não rigorosos na administração de instituições regionais de financiamento, por isto insistiu em regras precisas para a criação do Banco do Sul. Em setembro de 2009, com apoio do Brasil3 3 Disponível em < http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaImprimir. cfm?materia_id=14021>. Acesso em 10/5/2013. , foi assinado o Convênio Constitutivo do Banco do Sul, com sede em Caracas; contou com a adesão da Argentina, Bolívia, Equador, Paraguai, Uruguai e Venezuela. De acordo com declarações de Garcia, em dezembro de 2011, sinalizava-se a vontade de consolidar o projeto: "vamos mandar imediatamente o acordo de criação do Banco do Sul ao Congresso e fazer com que se possa votar o mais rápido possível o assunto"4 4 Governo quer criar base de exportação de autopeças no Mercosul. Valor Econômico, 14/12/2011. Disponível em http://www.portogente.com.br/texto.php? cod=59866. Acesso em 10/5/2013. . Uma das motivações da posição do Brasil de apoio ao Banco do Sul está relacionada à impossibilidade de utilizar recursos do BNDES para financiar investimentos de empresas estrangeiras fora do Brasil. Trata-se de uma mudança que sinaliza posições cooperativas num tema em que a questão de maiores níveis de integração não se apresenta, nem há relação com o tema da autonomia.
Nos anos 1990 e início dos anos 2000, segundo Mariano (2007), a posição do Brasil era a de que o BNDES poderia cumprir o papel de financiador de projetos comuns na região, diminuindo pressões dos países do Mercosul e ao mesmo tempo detendo importante papel decisório. Botafogo Gonçalves expressava essa posição:
eu sustento a ideia de que o BNDES, além de suas funções atuais, tenha uma função de órgão de fomento regional. Sou favorável à extensão da atuação do BNDES para além das fronteiras e que a busca de mecanismos de integração financeira do BNDES seja para investimentos em infraestrutura, financiamento do comércio ou investimentos produtivos de longo prazo, de tal maneira que esses investimentos integrem as economias da região5 5 "Embaixador pede mudanças no BNDES". Folha de S. Paulo, 6/5/2004. .
Na perspectiva em que estamos analisando a questão da autonomia na política brasileira para a Unasul, entender o papel da integração da infraestrutura contribui para avançar mais na interpretação. Nos últimos anos, o tema da infraestrutura passa a ser visto como central para a política brasileira de integração, na medida em que se considera que parte das dificuldades para o adensamento das relações localiza-se na precária conexão física entre os países (Saraiva, 2010), que seria pré-requisito para uma maior circulação de pessoas e de mercadorias. A iniciativa para a integração da infraestrutura Regional Sul-Americana (IIRSA), lançada no ano 2000, por ocasião da Cúpula de Brasília, no governo Cardoso, foi um marco importante nesse tema. A operacionalização da IIRSA foi estruturada sob a égide do Banco interamericano de Desenvolvimento (BID), da Corporação Andina de Fomento (CAF) e do Fundo Financeiro para o Desenvolvimento da Bacia do Prata (Fonplata). Em junho de 2010, a IIRSA tornou-se o órgão técnico do Conselho de infraestrutura e Planejamento (Cosiplan) da Unasul, passando a receber diretrizes políticas dos governos dos países da Unasul.Opapel do BID, da CAF e do Fonplata passaria a ser técnico e de financiamento dos projetos (Padula, 2010). Segundo o estatuto de criação do Cosiplan, buscou-se "fomentar la cooperación regional en planificación e infraestructura, mediante alianzas estratégicas entre los estados miembros de la UNASUR"6 6 Disponível em < http://www.unasursg.org/index.php?option=com_content& view=article&catid=95:consejo-suramericano-de-infraestructura-y-planeami& id=335:estatutos-del-consejo-de-infraestructura-y-planeamiento>. Acesso em 14/5/2013. .
Nas reuniões do Cosiplan está presente a ideia da importância da integração da infraestrutura em razão da consideração de seu sentido estratégico, conectado às demandas econômicas, sociais e culturais dos países, com destaque para a necessidade de superação das assimetrias7 7 Disponível em < http://www.unasursg.org/index.php?option=com_content& view=article&catid=95:consejo-suramericano-de-infraestructura-y-planeami& id=335:estatutos-del-consejo-de-infraestructura-y-planeamiento>. Acesso em 14/5/2013. . Uma decisão relevante, presente em documento do Cosiplan, de março de 2012, refere-se à criação de uma rede de conectividade sul-americana, cujo objetivo é criar a infraestrutura de comunicação na região composta de uma rede de fibras ópticas terrestres e submarinas a fim de melhorar a qualidade das comunicações, diminuir custos, garantir que uma parte maior de transferência de dados se dê na própria região e promover o intercâmbio de conteúdos gerados no subcontinente.
Nessa mesma perspectiva, em reunião de novembro de 2011, os ministros das Comunicações da Unasul discutiram o projeto de construção de um anel óptico sul-americano. Além do objetivo de diminuir custos e melhorar a qualidade do tráfego de dados na região, essa iniciativa se articularia com os princípios da Unasul de aumentar a autonomia da região em relação ao sistema internacional, já que uma das intenções seria fazer com que os dados trafeguem mais internamente à região, diminuindo a dependência de conexões internacionais. Tudo isso com a importante consequência de criação de centros de distribuição de conteúdos e fabricação de equipamentos na América do Sul8 8 Disponível em < http://www.unasursg.org/index.php?option=com_content& view=article&id=462:declaracion-ministros-de-comunicaciones-de-unasur-brasilia-noviembre-2011&catid=95:consejo-suramericano-de-infraestructura-y-planeamiento>. Acesso em 20/5/2013. .
Na formulação política da presidente Dilma, expressa em discurso na reunião extraordinária da Unasul em Lima, em julho de 2011, "devemos estabelecer modalidades consistentes de financiamento a exportações, devemos desenvolver convênios de crédito recíprocos, aperfeiçoar meios para superar barreiras pontuais. Enfim, avançando na integração física, energética, logística e na cooperação na área de ciência e tecnologia"9 9 Disponível em < http://www2.planalto.gov.br/imprensa/discursos/discursoda-presidenta-da-republica-dilma-rousseff-na-reuniao-extraordinaria-da-unasul>. Acesso em 22/5/2013. . A questão da cooperação vai se tornando clara: ao discutir o tema da autonomia, é importante formular conceitualmente como vêm se processando as relações entre os Estados na região. A Unasul, como estamos examinando, parece alinhar-se àquilo que Bull (2002:269), referindo-se à totalidade do sistema internacional, chama de "alguma organização comparável [às Nações Unidas], fundamentada na cooperação de Estados soberanos em base mundial [nós falamos, neste caso, 'em base subcontinental']". Na literatura sobre relações internacionais, essa perspectiva tem sido intensamente discutida. Se usarmos os termos de Nardin(1987), trata-se da ideia de "associação prática", que ele contrapõe à de "associação de objetivos".
Do ponto de vista do Brasil, a criação do Conselho de Defesa Sul-Americano, em dezembro de 2008, vincula-se ao objetivo de fortalecer a cooperação em temas de defesa e segurança e remete também à intenção de estabelecer um contraponto à penetração dos Estados Unidos na América do Sul, mais precisamente, na região andina. De acordo com Villa e Viana (2010), diferentemente dos quatro órgãos básicos da estrutura da Unasul10 10 O bloco sul-americano é constituído pelo Conselho de Chefes de Estado e Governo (principal órgão decisório da Unasul); o Conselho dos Ministros das Relações Exteriores; o Conselho de Delegados; e a Secretaria-Geral. , delineados por todos os membros em conjunto, a criação do Conselho de Defesa foi proposta exclusivamente pelo Brasil. Os países da região não tinham um histórico de cooperação no tema da segurança e defesa, muito por conta das diferentes leituras sobre os mesmos, e subordinavam a discussão dessas questões à relação com os Estados Unidos ou com os regimes e instituições criados à sombra da hegemonia desse país, como a Organização dos Estados Americanos (OEA). Com a formação do Conselho de Defesa Sul-Americana a ideia é utilizar a institucionalidade própria da Unasul para solucionar controvérsias e tensões na região, como ocorreu nos casos da crise institucional da Bolívia, em 2008, da reação à utilização de bases militares dos Estados Unidos na Colômbia, da tensão entre Colômbia e Venezuela, em julho de 2010, e da deposição do presidente do Paraguai, Fernando Lugo, em junho de 2011. O Conselho de Defesa da Unasul tem tido um papel estabilizador e busca ser um garante para a paz, buscando antecipar-se na resolução de potenciais conflitos, isto de forma convergente com a ação visando o respeito à democracia e à autonomia. A presença na observação dos processos eleitorais, inclusive os de abril de 2013 na Venezuela e no Paraguai, tem servido como facilitadora, propiciando à organização seu reconhecimento e base de legitimidade.
Há um esforço no sentido de associar os objetivos de redução da pobreza e das desigualdades sociais, presentes no Tratado Constitutivo da Unasul, com a de-securitização11 11 Para compreender o conceito de de-securitização, é preciso esclarecer o significado de securitização, termo que parte da premissa de que a noção de segurança não é objetiva, mas socialmente construída: trata-se de "uma prática auto-referencial [...] não necessariamente porque uma ameaça existencial realmente existe, mas porque o assunto é apresentado como tal" (Buzan, Waever e Wilde, 1998:24). Securitização, nesse sentido, é "o uso da retórica da ameaça existencial com o objetivo de levar um assunto para fora das condições da 'política normal'", de modo a justificar a adoção de procedimentos de emergência. Cabe destacar que não é necessário que uma medida emergencial seja tomada para que se identifique um processo de securitização: é preciso, entretanto, que a ideia dessa ameaça seja aceita, de modo a legitimar eventuais ações com esse caráter. Ade-securitização, em contrapartida, corresponde aos esforços retóricos com vistas a remover determinado objeto da lógica emergencial, de modo a tratá-lo por meio da política normal. de alguns desafios enfrentados pelos países. Há a busca de construção de instrumentos que permitam maior confiança nas relações entre os próprios países, fortalecendo a ideia de segurança regional combinada com a preservação da autonomia nacional dos Estados12 12 Disponível em < http://www.unasursg.org/index.php?option=com_content& view=article&id=667: declaracion-de-ministros-de-defensa-y-altos-representantes-de-relaciones-exteriores-a-los-efectos-de-evaluar-la-situacion-y-el-ritmo-de-reduccion-de-los-contingentes-de-los-paises-miembros-de-la-unasur-en-la-minustah&catid=82:consejo-de-defensa-suramericano>. Acesso em 25/5/2013. . Nesse sentido, é notável o avanço representado pela discussão em torno do Registro de Gastos em Defesa entre os países da Unasul, acordado na reunião de junho de 2012 da instância executiva do Conselho de Defesa Sul-Americano13 13 Disponível em < http://www.unasursg.org/index.php?option=com_content& view=article&id=670:acta-de-la-vi-reunion-de-la-instancia-ejecutiva-del-consejode-defensa-suramericano&catid=82:consejo-de-defensa-suramericano>. Acesso em 25/5/2013. Disponível em < http://www.unasursg.org/>. Acesso em 26/5/2013. . Trata-se de aspecto relevante na construção de instrumentos que permitam uma maior confiança nas relações entre os países da América do Sul. As discussões em torno de um projeto industrial e de defesa regional, de produção de um avião militar sul-americano, entre outras, inserem-se na mesma perspectiva, projetos em relação aos quais o maior desenvolvimento relativo do Brasil na tecnologia e na indústria aeroespacial poderia lhe assegurar papel destacado.
Saint-Pierre, em análise a respeito do Conselho de Defesa Sul-Americano da Unasul, explicita algumas razões do interesse pela cooperação, partindo do documento "Estratégia Nacional de Defesa", de 2009. De acordo com o autor:
La preocupación brasileña con el contexto internacional y especialmente el subregional se manifiesta prácticamente en todos los aspectos estratégicos de la "Estrategia Nacional de Defesa". En relación a la subregión, propone estimular la integración de América del Sur como forma de contribuir para la defensa de Brasil, además de fomentar la cooperación militar regional y la integración de las bases industriales de la defensa (END, p. 11). Admite que la cooperación es fundamental para disminuir las posibilidades de conflictos tradicionales en la región y preparar el ambiente para el funcionamiento del Consejo Suramericano de Defensa (CSAD). Algo más adelante reconoce la importancia de la CSAD a fin aumentar la escala del mercado regional para compensar la inversión que permitiría la autonomía estratégica "posibilitando el desarrollo de la producción de defensa en conjunto con otros países de la región" (END, p. 13) (2009:28).
Além da busca por autonomia frente a reais ou potenciais interferências externas à região que, em certa medida, impulsionam os esforços de cooperação no tema da segurança e defesa, há também desafios regionais. Estes têm tido papel relevante no fortalecimento da coesão e no estabelecimento da legitimidade da Unasul, particularmente do Conselho de Defesa Sul-Americano. Os fatores endógenos que mobilizam o bloco referem-se a: 1) gestão das zonas de fronteira face às migrações, aos ilícitos transnacionais; 2) os contenciosos envolvendo interesses de cidadãos e empresas nacionais em países vizinhos; 3) situações de instabilidade política; 4) segurança energética, entre outros. Na institucionalidade da Unasul criam-se órgãos específicos para lidar com algumas dessas questões, como o Conselho de Saúde Sul-Americano, o Conselho Sul-Americano sobre o Problema Mundial das Drogas, o Conselho Eleitoral, entre outros14.
A absorção da iniciativa da IIRSA pela formação do Cosiplan, assim como a formação do Conselho de Defesa Sul-Americano e o apoio à formação do Banco do Sul representam novidades importantes na forma como o Brasil atua em temas que exigem coordenação. Do ponto de vista que interessa ao objetivo central deste artigo, a ideia e a práxis de autonomia na política externa brasileira e sua relação com as posições do país nos processos de integração regional no Cone Sul e na América do Sul, é relevante observar que o elemento que articula as questões de segurança e defesa, integração da infraestrutura e financiamento da integração é a ideia de autonomia nacional, neste caso, articulada com a ideia de cooperação e integração setorial. Ou seja, os esforços de cooperação e integração relacionados com essas três dimensões fundamentam-se no objetivo de fortalecimento da autonomia dos Estados, seja do ponto de vista de aumento das margens de manobra no sistema internacional, seja do ponto de vista de exercer efetivamente a soberania sobre o território nacional (Borba, 2012).
Comparativamente à política brasileira para o Mercosul, no caso da Unasul a autonomia parece se conectar mais diretamente com alguns dos objetivos da cooperação, ao menos nas três dimensões discutidas. Deixando mais claro: o Mercosul é desenhado como união alfandegária visando um mercado comum (do Sul); portanto, por definição, há um horizonte de abdicação de segmentos de autonomia e de soberania. Parte dos problemas do Mercosul referem-se, como discutimos, a esta questão, não apenas no que toca ao Brasil, mas repetem-se para Argentina, Paraguai e Uruguai. Os Estados, assim como as respectivas sociedades, tanto as elites quanto a população em geral, consideram que o foco de seu desenvolvimento depende da própria capacidade nacional. No caso da Unasul, exatamente por se privilegiar a ideia de autonomia nacional e de soberania sobre o território nacional, convergem interesses muito diferentes e ideologias extremamente distantes, como a de governos conservadores; o Chile na administração Piñera; e de governos populares-distribucionistas, como o de Chávez, na Venezuela. O elemento unificador é o respeito à autonomia e à estabilidade. Isto interessa ao Brasil.
Concluindo esta discussão da aplicação do princípio de autonomia na política externa brasileira ao caso da Unasul, particularmente formulada no Ministério das Relações Exteriores, retomamos a ideia de autonomia relacional de Russell e Toklatian (2003:19). É parcialmente útil para pensarmos como o princípio de autonomia se relaciona com as posições do país na Unasul. Consideramos parcialmente útil pois, ao contrário do significado original do conceito, como desenvolvido por seus autores, não se observa grande participação da opinião pública, dos grupos de interesses e de atores domésticos diversos na definição das posições do Brasil. A política brasileira para a América do Sul, embora não desconsidere as preferências domésticas, é muito mais determinada pelas instituições do Estado, pela ação da Presidência e do Ministério das Relações Exteriores. Neste caso é importante a participação do Ministério da Defesa. O apoio doméstico necessário para a implementação dos acordos, em geral, é buscado ex post facto, sendo esta, inclusive, uma das próprias particularidades da integração regional na América do Sul que dificulta a utilização de teorias de matriz neofuncionalista ou liberal-intergovernamentalista para o seu entendimento. A ideia de autonomia relacional deve ser compreendida e utilizada considerando-se também a análise de Pinheiro (2004) sobre o duplo padrão da política externa do Brasil, definido como de institucionalismo pragmático, isto é, há esferas distintas de análise. Busca-se manter autonomia pela distância ou pela diversificação (Vigevani e Cepaluni, 2007), por um lado, e autonomia pela participação, por outro, estabelecendo uma relação entre as duas visando garantir benefícios, afastando riscos. Nos governos Lula e Dilma intensificou-se em parte, sobretudo na visão da Presidência, a ideia da importância da construção institucional, sem deixar de existirem padrões duplos.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Discutimos como a ideia de autonomia na política externa brasileira se relaciona com as posições do país nos processos de integração e de cooperação na América do Sul, particularmente a partir de 1991, data de criação do Mercosul, até hoje. Identificamos tensões entre as instâncias decisórias do Estado, mas que não produziram conflitos abertos, com consequências para os próprios processos e para as organizações subcontinentais. Concluímos que há ambiguidades, mas a tendência que prevalece é a do interesse pelo fortalecimento da cooperação e, na medida do possível, da integração. O conceito de autonomia pela diversificação, que utilizamos de forma não totalmente contraposta aos de autonomia pela distância e pela participação, sugere uma explicação: interessa a cooperação, também a integração, sempre que não inviabilizem as possibilidades de projeção global e contribuam para o enfraquecimento do unilateralismo. O interesse no fortalecimento da democracia e da paz surge como central no período analisado, sobretudo a estabilidade regional e interna em cada país.
Falamos de ambiguidades, determinadas por interesses distintos. Alguns autores (Burges, 2008) consideram a política regional do Brasil como centrada na busca de hegemonia e na defesa de interesses visando sua segurança sob diferentes ângulos, entre outros, o energético. Outros, como Malamud (2005), falam em busca de hegemonia não aceita, ainda que com impacto favorável ao Brasil nas relações internacionais extrarregionais. Diferentemente da análise de Burges (2008), consideramos que não se trata do interesse, até certo ponto, egoísta do Brasil, que visaria uma liderança sem contrapartida para os países envolvidos, mas de dificuldades estruturais, de fundo, econômicas e políticas. O país não temos recursos de um país rico. Há no Brasil os que defendem uma política mais decidida, pagando custos, a favor da integração; há forças importantes que trabalham de forma contrária.
O Mercosul tem sido considerado, há duas décadas, como a base da estratégia de cooperação sul-americana, como componente importante para as posições regionais do Brasil. Daí a necessidade de manutenção de um aparato institucional, intergovernamental, que permita, garanta e não limite a autonomia do Estado, sem, ao mesmo tempo, enfraquecer os laços do mercado comum. Trata-se de uma opção de grande dificuldade operacional: isso explica boa parte dos problemas existentes. Vimos que os esforços paralelos em favor da integração e da cooperação na América do Sul têm se consolidado como política de Estado há quase três décadas, desde o governo Sarney, em 1985. Como afirma Gardini (2010) no caso, serve para consolidar ad absurdum a ideia de política de Estado , o início da perspectiva colaborativa e integracionista com a Argentina começou neste período histórico, nos governos militares de Rafael Videla e João Baptista Figueiredo, reconstruída em outros termos por Raúl Alfonsín e depois por José Sarney. Consolidou-se no Brasil nas administrações Itamar Franco (1992-1994) e Cardoso (1995-2002), expandindo-se nas gestões Lula (2003-2010) e Dilma (2011-atual).
Acreditamos ter demonstrado haver uma dimensão sul-americana do Estado brasileiro que se manifesta no objetivo de alargamento do Mercosul e na prioridade atribuída à cooperação e integração subcontinental nos anos 2000. Também mostramos haver um movimento, não explícito e documentado, provavelmente não elaborado, de busca de soluções alternativas, ainda que apresentadas como complementares, a uma integração em profundidade a um mercado comum no Cone Sul, com as consequências e os compromissos que ela implicaria. A posição dos diferentes governos brasileiros, buscando continuidade de baixa intensidade da integração, parece atender à média das expectativas das elites, dentro e fora do aparelho estatal. Como analisado, encontramos essa posição em simetria especular nos outros países do bloco.Colocando limites ao Mercosul, rejeitam-se articulações que possam dificultar a movimentação internacional do Brasil, a vocação universalista.
A rationale das posições do Brasil explica por que o argumento da autonomia não deveria evoluir para o retrocesso do Mercosul, por exemplo, ao nível de área de livre comércio. Como vimos, há um balanço entre o peso da integração e da cooperação com a lógica da autonomia. Este balanço é muitas vezes interpretado como maximizador dos interesses nacionais. O forte interesse brasileiro na formação da Unasul indica uma nova forma de compreender o que seja autonomia na política externa. No período 1986-1999 prevalecia a ideia de que a integração alavancaria a projeção conjunta, no mundo, da Argentina e do Brasil. Hoje, anos 2010, alguns objetivos estratégicos do país conectam-se com a cooperação na América do Sul, entre eles o de uma polaridade sul-americana, não subalterna, autônoma mas não antagônica aos países centrais, particularmente aos Estados Unidos, tese defendida por forças políticas que se encontram no governo desde 2003.
NOTAS
Recebido para publicação em julho de 2013
Reapresentado em março de 2014
Aprovado para publicação em abril de 2014
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
21 Jul 2014 -
Data do Fascículo
Jun 2014
Histórico
-
Aceito
Abr 2014 -
Revisado
Mar 2014 -
Recebido
Jun 2013