Open-access Danos causados pelas radiações ionizantes sobre órgãos e sistemas vitais de fetos e crianças pequenas

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Danos causados pelas radiações ionizantes sobre órgãos e sistemas vitais de fetos e crianças pequenas

Yuri Bandazhevsky

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O professor Yuri Bandazhevsky, do Instituto de Medicina Nuclear de Gomel, na Bielorrússia, trabalhou com as vítimas do acidente de Chernobyl e acabou proibido de divulgar dados sobre as suas pesquisas epidemiológicas, chegando a ser "semiconfinado" por cinco anos pelas autoridades soviéticas que governavam seu país na época.

Na entrevista que segue, concedida a jornalistas irlandeses, Yuri Bandazhevsky traçou um quadro da influência da radioatividade sobre sistemas e órgãos vitais no período de formação dos embriões, revelou as suas descobertas mais recentes e defendeu o uso dos produtos à base de pectinas de origem vegetal para mobilizar ou eliminar parcialmente o césio radioativo do organismo por via natural.

Sua brilhante carreira começou em Grodno. Por que veio a Gomel após a catástrofe da central atômica de Chernobyl? Que idade tinha então?

Yuri Bandazhevsky - Vivi minha infância na província de Grodno [Bielorrússia]. Tendo terminado ali meus estudos de medicina em 1980, fiz especialização em anatomia patológica e comecei a trabalhar no Laboratório central de pesquisa científica do mesmo instituto. Quando ainda era estudante, comecei a me ocupar ativamente com pesquisas científicas e a realizar numerosos experimentos com animais de laboratório, que eu mesmo criava em casa. O tema principal de minhas pesquisas era então o estudo da influência de diferentes fatores (físicos, químicos e biológicos) do meio ambiente sobre a gestação, o desenvolvimento embrionário e a formação dos diferentes órgãos e sistemas. Esse trabalho culminou na preparação da dissertação de mestrado que defendi com sucesso em 1983. Defendi o doutorado em 1987. No mesmo ano fui nomeado diretor do Laboratório central de pesquisa científica.

A catástrofe de Chernobyl produziu em mim, como num grande número de pessoas, um tremendo choque psicológico. Considerei que meu dever de médico era ajudar na solução dos problemas ligados a essa catástrofe. Assim, a partir de 19881989, dirigi-me oficialmente à Academia das Ciências e ao Ministério da Saúde com propostas de pesquisas científicas globais a respeito da influência da radioatividade sobre os sistemas e os órgãos vitais no período de formação. Parecia-me que tudo que era empreendido então se mostrava insuficiente para resolver os problemas existentes. Tratava-se, antes de mais nada, da ausência de uma visão clara dos mecanismos de ação dos radionuclídeos incorporados no organismos sobre a estrutura e a função das células e dos tecidos sobre o metabolismo. Minha experiência em trabalhos científicos precedentes, que fora reconhecida pelas principais escolas da então União Soviética (Moscou, Leningrado), me reforçava a ideia de que os temas propostos eram válidos. Em 1990, o destino quis que eu ficasse conhecendo diretamente a vida das populações de Gomel [também na Bielorrússia] e da província circundante. Tomei a decisão de prosseguir minhas pesquisas no próprio local. Acrescento que eu planejava dedicar-me exclusivamente ao trabalho científico no Instituto de Medicina Radiológica então recém-inaugurado. Contudo, no outono do mesmo ano, fui convidado a assumir a direção do Instituto de Medicina que estava em fase de estruturação em Gomel. Eu tinha então 33 anos.

Quais foram as novas doenças que descobriu a partir de suas pesquisas?

YB - As inúmeras pesquisas científicas, tanto clínicas quanto experimentais, mostraram a ação desfavorável de quantidades mesmo pequenas de radionuclídeos incorporados no organismo, em primeiro lugar o césio radioativo (césio-137), sobre os sistemas e os órgãos vitais. Eu gostaria de assinalar, primeiramente, os danos ao sistema cardiovascular, que se observam mesmo em crianças pequenas. Uma dependência linear proporcional foi constatada entre a quantidade de césio radioativo incorporado no organismo e no músculo cardíaco, e a frequência, assim como a gravidade, das alterações morfológicas e funcionais. Examinando as lesões no conjunto dos diferentes órgãos e sistemas, foi possível determinar os processos patológicos interdependentes tanto no coração, no fígado, nos rins, nos órgãos endócrinos quanto no sistema imunológico. Consequentemente, tendo me dedicado durante tantos anos à patologia, penso que, sob a ação de radionuclídeos incorporados no organismo, sobretudo o césio-137, as lesões morfológicas e funcionais interdependentes provocam distúrbios metabólicos em todos os sistemas e órgãos vitais. Além disso, as lesões de certos órgãos podem ter suas próprias características, observando-se nos rins, por exemplo, a destruição dos glomérulos com o aparecimento de cavidades. No entanto, todas essas lesões decorrem de um processo patológico semelhante, que chamamos síndrome dos radionuclídeos de longo período incorporados. Com base nos dados obtidos, verificou-se que a menor quantidade de césio radioativo incorporado no organismo humano ou de animais pode provocar a alteração da estrutura e da função de órgãos e de sistemas, e ocasionar novas doenças (doença do coração, dos vasos sanguíneos, tumores malignos, doenças do fígado, dos rins, da glândula tireoide e outros órgãos endócrinos) ou agravar doenças preexistentes. A alteração do sistema imunitário é uma das causas principais do aumento das doenças infecciosas, como a tuberculose e a hepatite viral.

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Que perigo existe hoje para os habitantes das regiões sinistradas?

YB - As pesquisas que efetuamos mostraram que o maior perigo é representado pela ação dos radionuclídeos incorporados no organismo, especialmente o césio radioativo. Se não pusermos fim a esse processo, as consequências podem ser trágicas. Eis por que um controle rigoroso da presença do césio radioativo nos produtos alimentares é indispensável. Isso interessa sobretudo às crianças, que são mais sensíveis ao césio radioativo. Aliás, a situação demográfica me preocupa muito, pois a mortalidade da população na província de Gomel ultrapassa em 1,6 a natalidade. Sublinho que o fato tem a ver não apenas, nem antes de tudo, com tumores malignos, mas também com alterações dos sistemas de metabolismo intenso, como os sistemas cardiovascular, nervoso, imunitário, endócrino, urinário, digestivo e de reprodução.

O césio-137 exerce sua ação desfavorável antes de tudo sobre o sistema energético das células fortemente diferenciadas, o que provoca sua necrose, assim como, finalmente, em muitos casos, a morte de todo o organismo.

Qual é o perigo para as futuras gerações?

YB - Levando em conta a ação direta do césio radioativo sobre os jovens, sobre a formação de seu sistema reprodutivo e sobre os outros sistemas essenciais, bem como modificações genéticas nas células sexuais, temos que ficar atentos em relação à saúde das futuras gerações.

A ajuda fornecida à república da Bielorrússia para a liquidação das consequências da catástrofe da central atômica de Chernobyl é suficiente?

YB - Para poder apreciar o valor dessa ajuda, é necessário determinar a gravidade do prejuízo causado à saúde das populações em consequência da catástrofe de Chernobyl. Penso que a ajuda mais importante deve ser orientada para a prevenção das doenças que podem surgir, que evoquei antes. O problema de Chernobyl é do mundo inteiro. Penso que a ajuda da comunidade mundial é necessária para a liquidação de suas consequências.

O senhor acaba de começar a trabalhar no instituto Belrad. de que aparelhagem terá necessidade para seu trabalho?

YB - Nesse Instituto tenho a intenção de estudar os problemas ligados à ação do césio radioativo sobre a fisiologia dos sistemas e dos órgãos vitais. Pretendo desenvolver métodos de prevenção radiológica. Para isso é necessário criar um laboratório de histopatologia, colaborar com grupos científicos para melhor compreender as mudanças estruturais-metabólicas dos tecidos e das células do corpo humano provocadas pela incorporação do césio radioativo. Paralelamente, é preciso estudar os sintomas clínicos no nível do sistema cardiovascular em crianças que vivem nos territórios contaminados por radionuclídeos. Desejo para isso ter o apoio e receber a ajuda necessária que possa levar a uma estreita colaboração com cientistas do mundo inteiro. A ajuda poderia vir de fundações científicas e de organizações sociais ou de beneficência, que não sejam indiferentes ao destino das vítimas da radioatividade. Espero que o resultado dessa colaboração permita a criação de um Centro científico internacional da patologia das radiações, para que numerosos pesquisadores, trabalhando no problema da proteção das pessoas contra a ação das radiações, possam unir seus esforços e fazer progredir nossos conhecimentos.

Que meios de proteção o senhor considera hoje contra a ação dos elementos radioativos incorporados no organismo humano?

YB - Com base em minhas pesquisas, bem como naquelas efetuadas pelos colaboradores do Instituto Belrad, pode-se atestar a eficácia dos produtos à base de pectinas de origem vegetal para mobilizar ou eliminar parcialmente o césio radioativo do organismo por via natural. Esses produtos conseguem corrigir os distúrbios metabólicos devidos à presença do referido radionuclídeo.

Entrevista feita por jornalistas irlandeses, por ocasião da conferência de imprensa de Ady Roche (Chernobyl Children's Project (http://www.chernobyl-international.com), Minsk, abril de 2000.

Tradução de Paulo Neves e revisão de Emico Okuno e Joaquim Francisco de Carvalho. O original em francês encontra-se à disposição do leitor para eventual consulta.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    11 Abr 2013
  • Data do Fascículo
    2013
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