Open-access Tecnologia socioeducacional de videodebate para o cultivo do envelhecimento ativo

Resumo

Objetivo:  Avaliar a pertinência e eficácia da tecnologia socioeducacional de videodebate como estratégia no cultivo do envelhecimento ativo.

Método:  Pesquisa Convergente Assistencial realizada com dezesseis usuários idosos de uma Unidade Básica de Saúde de Belém, para implementar a tecnologia, selecionando-se vídeos encontrados no YouTube os quais foram apreciados e debatidos, buscando-se articular o enredo de cada vídeo com fatores determinantes do envelhecimento ativo, com princípios da educação permanente e com experiência de vida dos idosos participantes.

Resultados:  Dos debates, emergiram categorias: "aprender a conhecer a si mesmo", "aprender a fazer diferente", "aprender a conviver com o outro", "aprender a ser melhor". O videodebate permitiu mudanças, entre outras, as comportamentais nos domínios nutrição e relacionamento, avaliadas pela escala de estilo de vida, pré/pós videodebate.

Conclusão:  Essa tecnologia mostrou-se eficaz e pertinente porque permitiu aos idosos refletirem em grupo, compartilhando idéias, aprendendo juntos e construindo novas estratégias para o envelhecer ativo.

Palavras-chave: Educação em Saúde; Tecnologia Socioeducacional; Videodebate; Idosos; Enfermagem

Abstract

Objective:  Evaluate the relevance and efficiency of socio-educational video debate technology as a strategy to promote active aging.

Methodology:  Convergent care research was conducted with 16 elderly users of a basic health unit in Belém, to implement the technology by selecting YouTube videos, which were analyzed and discussed, seeking to coordinate the video plot of each video with determining factors of active aging, principles of continuing education, and life experience of the elderly participants.

Results:  The following categories emerged from debates: "Learning how to know oneself," "Learning how to do things differently," "Learning how to live with others," and "Learning to how to be a better person." The video debate allowed behavioral changes in nutrition and relationship, as evaluated using the lifestyle scale, before and after the video debate.

Conclusion:  Video debate technology proved to be efficient and relevant as it allowed the elderly to reflect in groups by sharing ideas, learning together and building new strategies for active aging.

Keywords: Health education; Socio-educational technology; Video debate; Elderly; Nursing

Resumen

Objetivo:  Evaluar la pertinencia y eficacia de la tecnología socioeducativa de videodebate como estrategia para la cultura del envejecimiento activo.

Método:  Investigación Convergente Asistencial, con dieciséis pacientes ancianos de una Unidad Básica de Salud de Belém. Para implementar la tecnología, fueron seleccionados vídeos en YouTube, que fueron apreciados y debatidos, buscando articular la relación de cada vídeo con factores determinantes del envejecimiento activo, principios de la educación continuada y con experiencias de vida de los participantes.

Resultados:  De los debates, surgieron las categorías: "aprender a conocerse a sí mismo", "aprender a hacerlo diferente", aprender a convivir con el otro", "aprender a ser mejor". El videodebate permitió cambios; entre otros, los conductuales en los dominios nutrición y relación, evaluados por escala de estilo de vida, pre y post videodebate.

Conclusión:  La tecnología resultó eficaz y pertinente, permitiendo la reflexión grupal: compartiendo ideas, aprendiendo juntos y construyendo nuevas estrategias para el envejecimiento activo.

Palabras clave: Educación en Salud; Tecnología Socioeducativa; Videodebate; Anciano; Enfermería

INTRODUÇÃO

O envelhecimento é um processo natural, dinâmico e progressivo no qual modificações morfológicas, funcionais, bioquímicas e psicológicas podem reduzir a capacidade de adaptação do indivíduo ao meio ambiente, tornando-o mais vulnerável às condições de cronicidade, tão comuns na velhice.1

No Brasil, os idosos correspondiam a 10,6% da população total em 2010, percentual este que dobrou nos últimos 50 anos. Estima-se que, em 2020, chegue a cerca de15% e que, em 2050, suba para 18%, totalizando aproximadamente 47 milhões de idosos brasileiros. Entre as regiões do Brasil, a Região Sudeste lidera as demais, com 12,7% do total, enquanto a Região Norte apresenta o menor número de idosos, com 7,1% da população total. Na Região Norte, residem 1.081.469 pessoas idosas com 60 anos ou mais. O Pará ocupa o primeiro lugar em números absolutos, com 535.135 pessoas idosas, com domicílios distribuídos em todos os municípios, principalmente em bairros periféricos de grandes cidades, incluindo a zona rural, ilhas fluviais e zonas ribeirinhas.2,3

Dessa forma, a população brasileira está envelhecendo cada vez mais, o que reflete no perfil de morbimortalidade populacional, visto que, com essa transição demográfica e epidemiológica, as condições de cronicidade ocupam lugar de destaque. O incremento das doenças crônicas exige adequações das políticas sociais, particularmente aquelas voltadas para atender às crescentes demandas nas áreas da saúde, previdência e assistência social.4

É fundamental assegurar à população idosa acesso aos serviços sociais e de saúde, que, além dos serviços tradicionais, ofereçam outros mais atraentes, criativos e transformadores, como o emprego de tecnologias socioeducacionais, com vistas a discutir aspectos relacionados ao envelhecimento ativo, buscando equidade, integralidade e universalidade do cuidado em saúde.

No município de Belém e em outros mais populosos, tanto nas Unidades Básicas de Saúde (UBS) como nas Unidades de Saúde da Família (ESF), em geral a atenção prestada ao usuário idoso ainda ocorre de modo fragmentado, com falta de efetividade das ações nos programas em funcionamento, distante dos preceitos do SUS.

Considerando a recente inclusão da atenção à população idosa no SUS e a complexidade dessa atenção em relação às múltiplas especificidades dos contextos cultural e sociogeográfico, a realidade do cotidiano da atenção básica de saúde com foco no usuário idoso e respectiva família ainda é precária. Assim, torna-se necessário buscar prestação de cuidados de qualidade, como: promover o envelhecer ativo e saudável; compensar incapacidades e limitações comuns da velhice; prover apoio e controle do curso da vida durante o envelhecimento e facilitar o processo de cuidar contínuo e prolongado ao longo da vida.5

Do exposto, evidencia-se quão complexa é a questão em pauta, exigindo que se enfatize a necessidade de esforço conjunto dos profissionais em caráter intersetorial, para abranger diversas condições de vida e saúde da população idosa em seu processo de envelhecimento, considerando a história cultural das famílias, incluindo as especificidades do contexto sociogeográfico e cultural.

Com base em tal concepção, torna-se necessário cultivar o envelhecimento ativo por meio da educação em saúde. A humanidade nunca envelheceu tanto quanto hoje, sendo, portanto, imprescindível que a população envelheça saudavelmente e torne-se protagonista de seu próprio envelhecimento.

O Videodebate em Gerontologia é estratégia que serve para estimular mudanças na vida das pessoas idosas, intervindo de forma educativa na percepção de seu viver envelhecendo no contexto familiar e social. É um meio mobilizador, porquanto desencadeia discussões de aspectos relevantes do processo de envelhecimento, pois o que é visto na tela poderá relacionar-se com a experiência de vida que cada um traz consigo, auxiliando na reflexão sobre a essência de vida e evidenciando que, sob as aparências, há o desconhecido a ser descoberto e repensado.6

Os filmes têm a capacidade de mobilizar o ser humano pela imagem, música e temática do enredo. Essa mobilização promove, facilita e reforça reflexões posteriores em reuniões grupais, para discutir eventos da vida que o filme sugere, contribuindo para desenvolver compreensão, tolerância, respeito mútuo, solidariedade e cooperação na busca por soluções de problemas cotidianos. Permite ainda que os idosos adquiram conhecimentos para o seu próprio benefício, de modo sistematizado e dirigido, valendo-se de recursos tecnológicos cinematográficos, o que pode representar uma escola de vida ao integrar tecnologias com novas linguagens e novos paradigmas para a educação, ampliando a visão do ato educativo.6

O referido estudo teve como objetivo avaliar a pertinência e a eficácia da tecnologia socioeducacional de videodebate como estratégia no cultivo do envelhecimento ativo.

MÉTODO

Trata-se de uma pesquisa qualitativa utilizando o método da Pesquisa Convergente Assistencial (PCA)7 com propósito de desenvolver a tecnologia do videodebate, com vistas ao cultivo do envelhecimento ativo,8 dentro dos princípios da educação ao longo da vida,9,10 realizada nas dependências de uma UBS, em Belém-PA.

A PCA é uma abordagem metodológica na qual o pesquisador assume o compromisso de estudar e operar na prática assistencial ou educacional em saúde, a partir da perspectiva do profissional e do usuário envolvido na pesquisa. Ela propõe o desenvolvimento de conhecimento técnico ou tecnológico para minimizar problemas, introduzir inovações e mudanças na prática educativo-assistencial, o que exige do pesquisador imersão na prática, no decorrer do processo de investigação.7

A população-alvo constituía-se de idosos, com idade de 60 anos ou mais, usuários da UBS onde ocorre o Programa do Idoso. Esse programa desenvolve atividades gerontológicas multiprofissionais com propósito de promover crescimento pessoal e integração social dos idosos, por meio de teatro, dança, coral, exercício físico e participação cultural em celebrações festivas locais. Formou-se uma amostra intencional de dezesseis idosos obedecendo aos critérios de inclusão: ter idade de 60 anos e acima, obter resultado livre de transtorno cognitivo pela aplicação do Mini Exame do Estado Mental (MEEM)11 e se comprometer a ser assíduo nos encontros programados do videodebate. O critério de exclusão foi: idosos que não estavam cadastrados no programa do idoso da UBS em questão.

A implementação da tecnologia do videodebate ocorreu entre os meses de agosto e setembro de 2014, após a aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Pará e os selecionados serem informados acerca do estudo a participar, assinando o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). As sessões de videodebate se sucederam semanalmente, num total de oito, com duração aproximada de 3 horas cada sessão.

Considerando a adoção do método da PCA e a tecnologia do videodebate, ainda incipientes e incomuns no contexto dos serviços de saúde,7 a equipe de pesquisa foi previamente capacitada e treinada por uma enfermeira pesquisadora e uma educadora gerontóloga para o estudo do videodebate como estratégia educacional para a promoção do envelhecimento ativo.

Os procedimentos para essa implementação constituíram-se de vários passos sequenciados, cujos procedimentos foram todos documentados, pois representaram o corpus de dados para análise, como seguem: a) A primeira reunião preparatória com os idosos participantes destinou-se a prestar orientações detalhadas sobre sua participação na realização do videodebate, explicitando as atividades a serem desenvolvidas e metas a atingir. b) A coordenadora da pesquisa, em comum acordo com os idosos, selecionou oito vídeos de curta-metragem no acervo do YouTube, cada um com temática definida que orientava a pesquisadora na seleção prévia de texto teórico de apoio que fazia alusão a algum determinante do envelhecimento ativo.12 c) O plano de atividades nos encontros grupais para sessões de videodebate incluía em cada uma: projeção do vídeo para os idosos participantes e audiência convidada, pausa com lanche educativo (frutas e alimentos de elevado valor nutricional e baixo teor calórico), discussão sobre o vídeo em pequenos grupos (máximo quatro idosos participantes) guiada pela questão norteadora: "Como você relaciona o vídeo assistido com a sua vida?". Durante a discussão, um idoso fazia anotações que ao final eram apresentadas a todos. Em seguida, havia a leitura conjunta do texto teórico de apoio, relacionando-o com o enredo do vídeo projetado, fomentando interpretações acerca de vivências relacionadas ao envelhecimento. Por fim, todos os idosos reuniam-se em grande grupo, para debater as reflexões de cada subgrupo em conjunto com a equipe de pesquisa. d) Ao final de cada sessão, a equipe de pesquisa (em sua função de educadora) levantava as temáticas mais enfatizadas pelos idosos e discutiam-se aspectos relacionados aos diferentes determinantes do envelhecer ativo e saudável, valorizando saberes compartilhados e incentivando a ajuda mútua na vivência do envelhecimento, de acordo com os princípios da educação ao longo da vida.9 e)Visando ainda ao objetivo de avaliar quantitativamente a efetividade do videodebate como tecnologia socioeducacional na gerontologia, aplicou-se aos dezesseis idosos da amostra a escala de Estilo de Vida de Nahas13 imediatamente antes do início das sessões de videodebate. A mesma escala foi reaplicada após o término dessas sessões, a fim de proceder-se à análise do desempenho dos idosos no pré e no pós videodebate, como dado complementar de avaliação de eficácia da tecnologia em questão. A escala de Estilo de Vida também denominada "pentáculo do bem-estar", conforme o título, avalia o estilo de vida das pessoas segundo o aspecto saúde, é composta das dimensões: Atividade física, Nutrição, Controle do Estresse, Relacionamento Social e Comportamento Preventivo. A avaliação se faz pela pontuação que varia de 0 a 45, sendo que, quanto mais alta a pontuação, mais adequado é o estilo de vida.13 Para o último encontro em campo, relativo ao encerramento da pesquisa de videodebate, os idosos participantes e outros usuários, além da equipe profissional da UBS, foram convidados pela equipe de pesquisa a assistir à sustentação da dissertação (resultado do presente estudo) na Universidade Federal do Pará (UFPA), um dos momentos de validação dos resultados de estudo acadêmico pelos profissionais e usuários dos serviços de saúde.

A obtenção de dados para a pesquisa deu-se pelo registro completo do processo do videodebate ocorrido entre os idosos participantes. Os debates foram audiogravados e transcritos posteriormente, respeitando-se a privacidade e o anonimato das informações. A análise dos dados e interpretação dos resultados ocorreram segundo as orientações do método da PCA e dos Princípios da educação ao longo da vida.9

A análise dos dados na PCA qualitativa segue quatro procedimentos: apreensão, síntese, teorização e transferência. A fase da apreensão inicia-se com a coleta de dados, quando o investigador entra no campo como um estranho e, a partir daí, procura conhecer e imergir no cenário da investigação e realizar simultaneamente a assistência e a pesquisa. O pesquisador registra todos os dados para compreender o significado das informações coletadas para se aprofundar no objeto do estudo. O pesquisador converte as informações em unidades menores, a codificação dos dados, e daí organiza-as em categorias. A fase da síntese consiste em reunir informações e descrever os padrões de comportamento e respostas típicas obtidas. A teorização é um processo de identificação, definição e construção de relações entre construtos de modo a possibilitar a produção de previsões do fenômeno investigado. A teoria na pesquisa qualitativa se desenvolve a partir da apreensão das informações, resultando em síntese dos resultados. A transferência de resultados consiste na possibilidade de contextualizá-los em situações similares, com a intenção de transferi-los e socializá-los, ou seja, implementar os resultados de pesquisa na realidade prática.7

O estudo observou todos os cuidados éticos segundo a Resolução 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde. Foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Pará, parecer 543.685, 26/02/2014, CAAE 26532214.2.0000.0018.

RESULTADOS

Caracterização dos idosos participantes

A caracterização dos idosos, obtida de questões baseadas nas informações contidas na Caderneta de Saúde da Pessoa Idosa14 contemplou as seguintes informações: identificação sociodemográfica, suporte familiar e social, e problema de saúde atual. A adoção dessa Caderneta para obter os dados ateve-se ao seu uso corrente nas unidades básicas e ao fato de constituir um instrumento auxiliar estratégico no manejo de saúde de usuários idosos. Dos 16 idosos, 13 eram mulheres e 3, homens, com idade oscilando entre 60 e 89 anos; doze solteiros e quatro casados; todos residiam na área adstrita à UBS, onde as condições de saneamento e moradia são precárias. Em relação à escolaridade, a maioria tinha oito ou mais anos de estudo. Eram aposentados e pensionistas. Apenas um idoso declarou residir sozinho, os demais convivem com seus familiares. Quando interrogados acerca de quem seria seu possível cuidador caso necessitasse, quinze responderam que contariam com e um recorreria a um vizinho. Todos procuravam serviços de saúde na UBS para controlar suas morbidades, principalmente hipertensão, diabetes e dislipidemias, com consequente uso da polifarmácia. Também participavam de eventos de campanha de promoção de saúde e vacinação e atividades de natureza gerontológica. Embora suas condições sociais e ambientais não fossem boas e apresentassem multipatologias, os idosos avaliaram positivamente seu estado de saúde.

Videodebate: Educação para um envelhecer ativo

Os oito vídeos de curta-metragem selecionados do acervo do You Tube e exibidos foram: 1) Tolerância, 2) A casa em pequenos cubinhos, 3) Apenas uma volta, 4) Quinze dicas para a felicidade, 5) A lenda da águia, 6) Day and night, 7) O que é isso? um pássaro? e 8) O bolo. Dos debates travados entre os idosos, emergiram temáticas que foram categorizadas segundo os princípios da educação permanente para a vida9: 1. Aprender a conhecer a si mesmo, 2. Aprender a fazer diferente, 3. Aprender a conviver com o outro e 4. Aprender a ser melhor.

Categoria 1 - Aprender a conhecer a si mesmo

A atribuição de tal categoria se deve às reações e debates dos idosos quando assistiram ao vídeo A casa em pequenos cubinhos, no qual identificaram a importância de se autoconhecer, retomar os fatos, relembrar os acontecimentos de suas histórias passadas que causam impactos positivos ou negativos e influenciam direta ou indiretamente sua vida atual enquanto envelhecem. Ainda, quanto aos aspectos negativos relembrados, o vídeo possibilitou a tentativa de reconstrução, enfatizando e centralizando a atenção nos aspectos positivos que as experiências podem trazer. No debate, foi enfatizado que conhecer a si mesmo é um grande passo para o repensar de lições para um melhor envelhecer, como observado nessas falas:

[...] ele tinha uma família, mas como ele vivia só, ele nunca desistiu de levantar e se reencontrar e assim foi passando a velhice dele. Eu to contando também a minha história, a história dele é a minha. (Laranja);

[...] a gente não pode desistir, tem que continuar, felizes. Fazendo as coisas. Eu tenho 67 anos, tenho um filho doente que me entristece muito, mas nunca vou ficar ali no canto chorando. Eu vou sair da minha casa pra buscar alegria. Porque na minha casa eu não tenho alegria, é só tristeza. (Acerola);

Com esse vídeo a gente aprende a tirar lições de vida [...] (Abacaxi);

A gente passa a entender melhor o sentido das coisas. (Uva);

Hoje sinto que estou dentro desse contexto que foi apresentado no vídeo. Estou sendo muito feliz porque estou tendo a oportunidade de crescer e subir mais um degrau, em conhecimento, em sabedoria, em tudo que escutei, vi e vivenciei. (Melão).

Categoria 2 - Aprender a fazer diferente

A categoria "Aprender a fazer diferente" emergiu dos debates dos idosos na análise dos vídeos: Apenas uma volta, Tolerância e A lenda da águia, quando comentaram e articularam seus enredos com as vivências práticas de seu cotidiano:

Sempre devemos sentar e conversar com as pessoas, ter mais diálogo. Vou treinar mais isso. (Laranja);

A saudade faz parte do ser humano. Então, nós temos memória. Vamos preservar? Eu vou passar a ficar mais atento quando começar a esquecer as coisas.(Melão);

Eu gostei do voar da águia, gostei que ela conseguiu se renovar. Pra ela foi um recomeço de vida. Eu quero ser assim, disposta pra recomeçar sempre. (Morango);

A águia ficou velha e depois se renovou e ficou nova. Quando a gente se cuida, a gente se renova. Eu preciso renovar as unhas, melhorar meu cabelo e preciso renovar meus pensamentos. Porque se ficarmos com os mesmos pensamentos, antigos, a gente tende ir pra trás. É muito importante pra gente renovar os pensamentos. (Pêssego).

No envelhecimento, o aprender a fazer diferente também está muito associado à forma como os idosos encaram as adversidades desse processo. Um exemplo disso é o enfrentamento da solidão. Os idosos manifestaram-se aqui, trazendo reflexões sobre a forma como encaram a solidão que experimentam:

Eu penso que o vídeo trata de uma solidão. A família o abandonou e deixou ele só. Eu moro só, mas não fico sozinha, esse negócio de solidão não dá. (Açaí).

Categoria 3 - Aprender a viver juntos

Manifestações demonstraram a importância do viver juntos. Para vivenciar o envelhecimento ativo é importante que idosos estejam envolvidos numa rede de suporte social fortalecida e harmoniosa e participe ativamente de sua família e da comunidade.

O vídeo O bolo relata o convívio de um casal que vivia sempre discutindo. Entretanto, apesar das adversidades detectadas no vídeo, os idosos observaram que havia, no fundo, união e respeito na família, ajuda mútua, tolerância, paciência.

Temos que viver sem reclamações e atritos e isso faz mais bem. Foi uma lição de vida.(Pêssego);

Eu gostei da prova de amor. Sem o amor não temos nada, compreensão e harmonia. Onde existe amor existe tudo. Na vida do casal é importante ter concórdia. (Bacuri);

Desde o início, eles tiveram tolerância, paciência um com o outro. Eu acredito que isso fez completar 50 anos de casados; deve ser maravilhoso. (Acerola);

Posso dizer sobre esse relacionamento que deveríamos unir mais uns com os outros, ser mais fraternos, dar apoio àqueles que mais necessitam, ajudando o próximo, o fundamental é o amor ao próximo. (Laranja).

Outra exibição, o vídeo Tolerância, instigou idosos a manifestarem sentimentos relacionados a um pleno convívio social, como se nota nas falas:

Se tivesse um diálogo entre os dois poderia ter um novo fim. (Caju);

As pessoas têm que ter comunicação, amizade, união. Isso é muito importante, porque se a pessoa não se comunica, vai se destruir. Falta união, porque não adianta viver perto e não se unir, isso só destrói. (Banana);

Eles deviam sentar e conversar, mas partiram logo pra briga. O certo é as pessoas sentarem, conversarem e se entenderem e não partir pra grosseria. (Ameixa).

O convívio interpessoal tolerante e harmonioso foi destacado pelos idosos como principal aspecto na velhice, por gerar bem-estar, satisfação com a vida, bom-humor e visão positiva da vida. Durante os debates, abordou-se a importância de relacionamento interpessoal tolerante, saudável, solidário, ativo e atento às necessidades do outro. Isso foi evidenciado na dimensão "relacionamentos" (Tabela 1), no tocante à avaliação do Estilo de Vida dos idosos antes e após as sessões de videodebate, quando se evidenciou diferença estatística significativa para melhor nos relacionamentos.

Tabela 1
Média e desvio-padrão dos escores parciais e do total de avaliação do Estilo de Vida obtidos na pré e na pós-prática de vídeodebate dos 16 idosos da UBS, Belém-PA, 2014

Categoria 4 - Aprender a ser melhor

Algumas falas dos idosos demonstraram como eles se veem enquanto sujeitos, a sua autoestima e motivação para enfrentar os desafios relacionados ao envelhecimento:

Estamos vivendo mais tempo e melhor. Então a velhice não é coisa pra se lamentar. É coisa pra se gabar. A pessoa tem que cultivar a psicologia positiva que nada mais é que a alegria, é tentar entender o outro e não ter tempo de pensar coisa errada, coisa negativa. Eu digo que sou feliz.(Abacaxi);

Sou muito feliz com a minha velhice. Tenho saúde e tenho qualidade de vida.(Amora);

Pra mim o envelhecimento é uma coisa natural e a gente tem que aceitar de maneira feliz. Tem que ser numa boa. Ele [personagem do vídeo] só tem boas recordações e você viu que ele não tem uma lembrança ruim, da família e dos filhos pequenos;são lembranças boas, a saudade. Isso foi um envelhecimento bom e saudável. (Uva);

É [...] nunca devemos desanimar. Sempre devemos estar alegres, mesmo havendo tristezas. Porque se a gente se entregar para a tristeza, a gente fica cheia de depressão e lembranças ruins. Ele permaneceu alegre, tanto que até brindava a vida. (Laranja);

Eu encaro a velhice dessa maneira. Eu tenho os meus limites, eu reconheço, mas eu aceito com muita alegria e felicidade. (Açaí);

Todo dia a gente tem que agradecer a Deus pelo dia de hoje. O que a gente pode viver. Pra gente, viver é lucro. Tem tanta gente que teria um futuro, mas Deus chamou. (Cajá).

Dessas manifestações, se infere que idosos apresentam boa autoaceitação, motivação, otimismo e bem-estar subjetivo. Tais respostas comprovam que eles valorizam o enfrentamento das vicissitudes do envelhecimento e aceitam a velhice.

Avaliação do Estilo de Vida

A Tabela 1 apresenta médias dos escores de avaliação de Estilo de Vida,12 onde se destacam diferenças estatisticamente significantes nas dimensões Nutrição (p=0,014), Relacionamentos (p=0,011), considerando-se os valores obtidos antes e após a intervenção da prática de videodebate. As médias dos escores de avaliação, pela escala de Estilo de Vida, aumentaram 1,1 vez, ou seja, mesmo pouco, o estilo de vida dos idosos melhorou no tocante às dimensões nutrição e relacionamentos.

Convém salientar que, nos intervalos das sessões de videodebate, o lanche servido constituía-se de frutas variadas, quando se salientava a importância de consumi-las diariamente como prática alimentar saudável na velhice, o que pode ter contribuído para a mudança verificada na dimensão Nutrição.

A mudança significante na dimensão Relacionamentos pode ser atribuída aos debates travados entre os idosos ao abordarem-se vídeos que destacaram a importância de relacionamento interpessoal tolerante, saudável, solidário, ativo e atento às necessidades alheias.

DISCUSSÃO

Há uma preocupação atual em estimular a criação e o uso de estratégias e tecnologias de educação em saúde para pôr em prática os preceitos da política do Envelhecimento Ativo.8 Tecnologias têm-se destacado como importantes ferramentas na busca de meios que estimulem pessoas a adotar estilos de vida saudáveis13 para um envelhecer com mais qualidade.16

Para estimular e promover o envelhecimento ativo, há que se buscar apoio em tecnologias de cuidado integral que visem ao desenvolvimento da autonomia e independência, bem como à melhoria das condições de vida dos idosos, provendo-os de recursos capazes de assegurar qualidade de atenção à saúde e estímulo à participação e fortalecimento do controle social. Quando se cria um espaço favorável e acolhedor16 aliado a uma tecnologia inovadora, diferenciada e atrativa, aumenta-se a possibilidade de adesão das pessoas às atividades propostas. Observou-se que a prática do videodebate teve elevada adesão e participação, evidenciadas nos relatos dos idosos participantes, muitos até desmarcavam outros compromissos pessoais para não perder as atividades do videodebate.

Ao desenvolver-se, em caráter de testagem, essa estratégia educativa para idosos, o videodebate mostrou-se pertinente e eficaz porque proporcionou mudanças em alguns aspectos da vida dos idosos relativos a alguns determinantes do envelhecimento ativo.8 No determinante comportamental, observou-se mudança no componente nutrição; no determinante relativo aos aspectos pessoais, houve mudança não só nos fatores psicológicos, com melhorias no item relacionamento, como também na percepção do próprio envelhecimento. Os idosos perceberam a necessidade de melhorar a qualidade dos seus relacionamentos interpessoais, evitando o isolamento social e aderindo às atividades que proporcionassem e estimulassem a satisfação pessoal. Esses resultados são corroborados por estudos que consideram as atividades educacionais grupais como estratégia promotora de mudanças comportamentais nos idosos17-19 assim como de melhoria da qualidade de vida, sendo, portanto, um recurso educacional adequado e eficaz para idosos.17,19

Dos relatos oriundos de debates entre os idosos, infere-se que eles apresentam boa autoaceitação, motivação, otimismo e bem-estar subjetivo, características essenciais de um envelhecer saudável; valorizando o enfrentamento da velhice e sua aceitação. Estudos16,20-22 apontam forte relação encontrada entre o sentimento de felicidade ou satisfação e a autoavaliação de saúde na mudança em relação à imagem da velhice ao diminuir as opiniões negativas e aumentar as positivas. Dessa forma, ações socioeducativas pelo videodebate podem contemplar estratégias que valorizem o bem-estar subjetivo dos idosos, pois quanto mais elevadas forem as dimensões do bem-estar subjetivo, maior será a chance de envelhecer com qualidade.

Infelizmente o contexto dos idosos, nesse estudo, não privilegiava os determinantes importantes do envelhecer ativo (de pouca governabilidade por parte dos idosos) como, por exemplo, situação ambiental e social de moradias pouco acolhedoras e serviços sociais e de saúde aquém de suas necessidades.

Contudo, a prática dirigida do assistir a vídeo/filme estimulou participantes a momentos de empatia, quando se projetavam no papel do personagem e assumiam o seu próprio destino, o que é demonstrado em alguns estudos.23,24 O homem é dotado de razão, mas também necessita da sua dimensão afetivo-emocional e estética para sua evolução psíquica e intelectiva, porque, na vida, aprende-se não só pelas ciências formais, mas também por meio das artes, como a literatura e a cinematografia,25 caso do presente estudo, que se valeu do recurso de vídeos de curta metragem disponíveis no YouTube. Isso foi observado entre os idosos que estavam abertos a novos aprendizados e dispostos a compartilhar suas experiências com seus pares e familiares.

Ao debater o conceito "reminiscência"26 articulado no enredo do vídeo A casa de pequenos cubinhos, os idosos recordaram situações vividas, de modo individual ou interacional, o que lhes permitiu analisar o passado, compreender as mudanças, adaptar-se às transições e adquirir novos conhecimentos. Recordar é inerente ao ser humano e, ainda que não seja exclusivo de uma etapa específica de vida, torna-se progressivamente mais presente à proporção que o sujeito envelhece.25,27,28 Notou-se que a exibição de vídeo/filme é importante estratégia de educação porque instiga modificar determinadas visões de mundo, pois histórias de personagens fictícios podem fazer com que pessoas se identifiquem com eles ou associem cenas a determinados contextos que já vivenciaram. Também a exibição de vídeo/filmes pode ser utilizada como estratégia de aprendizagem sobre o envelhecer, o empoderar-se, o desafiar-se para mudanças, pois os propósitos de estimular crescimento pessoal e promover integração social de que idosos tanto carecem podem ser desenvolvidos de acordo com o ponto de vista de cada um e seu modo particular de perceber o mundo.

O respeito ao próximo, outra temática abordada, também pode ser trabalhado nos mais variados espaços, em todas as fases da vida, incentivado no contexto familiar, nas instituições de ensino e em grupos dialógicos intergeracionais, entre idosos e destes com a comunidade.21 Constatou-se que o convívio interpessoal tolerante e harmonioso foi destacado como principal aspecto para o envelhecimento ativo, pois gera bem-estar, satisfação com a vida, bom-humor e atitude positiva diante da vida.

Considerando o videodebate uma tecnologia leve5 de ação educacional que se mostrou adequada e eficaz no presente estudo, torna-se de alta relevância para uso dos enfermeiros e demais profissionais da saúde. É aconselhável que essa adoção ultrapasse a estrutura de educação em saúde restrita a consultórios de forma individualizada e se considere a pertinência de estratégias grupais de tecnologias que valorizem a cultura do grupo, assim como o aprendizado construído em coletividade, com debates, compartilhamento de experiências e vivências dos próprios educandos.16,26 É necessário também que os profissionais de saúde valorizem histórias de vida, dificuldades e anseios dos idosos educandos a fim de que se consolidem diferentes formas do aprender a ser e do saber, de acordo com os preceitos da educação permanente para a vida.9,26

Essas constatações impõem que o profissional enfermeiro transcenda o enfoque saúde-doença em suas funções com os usuários idosos de UBS, para um esforço interdisciplinar e intersetorial, repensando e inovando métodos, técnicas e tecnologias que ensejem conscientizar os usuários da importância do processo do envelhecimento ativo e que aprendam a praticar, juntos, o protagonismo do próprio envelhecer e se emancipem na condução de suas vidas com qualidade, saúde e dignidade cidadã. Considerando a especificidade profissional de atender aos idosos, torna-se necessário formar e ou atualizar continuamente gerontólogos multiprofissionais para melhor atender a tal demanda com qualidade, além de mais investimentos em pesquisas para construir tecnologias cuidativo-educacionais5 pertinentes e eficazes.

As limitações desse estudo residem na amostra restrita e na exiguidade do tempo do processo educacional. Contudo, forneceu subsídios importantes para sua replicação em diferentes contextos de atendimento de pessoas idosas e suas famílias.

Sugere-se ao enfermeiro transcender o enfoque saúde-doença em suas funções com os usuários idosos de UBS, para um esforço interdisciplinar e intersetorial repensando e inovando métodos, técnicas e tecnologias que possibilitem contemplar nos usuários, o processo do envelhecimento ativo e saudável e praticar juntos o protagonismo do próprio envelhecer e a emancipar-se na condução de próprias vidas com qualidade, saúde e dignidade cidadã. Apesar dessa tecnologia ser recente e limitada, espera-se que o presente estudo tenha continuidade, visando a resultados mais consistentes, que seja reaplicada em outros contextos similares para conferir transferibilidade7 do valor dessa tecnologia socioeducacional de videodebate.

CONCLUSÃO

O objetivo de avaliar a pertinência e a eficácia da tecnologia socioeducativa do videodebate foi alcançado, pois trata-se de tecnologia inovadora, aplicável em vários contextos de serviços de saúde e um recurso educacional instigador de debates entre os seus usuários, no caso, os idosos. Propiciou o aprender ou reaprender comportamentos saudáveis, como enfrentar diferentes condições de vida e saúde no processo de envelhecimento, assumindo-se o protagonismo do próprio estilo de vida enquanto se envelhece. Portanto, a tecnologia apresentou-se como uma adequada proposta de promoção da saúde do idoso para apropriação pela enfermagem gerontológica e no contexto da atenção primária à saúde.

O referencial norteador - pilares da educação permanente - e a pesquisa convergente assistencial adotados na condução das sessões de videodebate confirmaram sua pertinência na educação de idosos. Os preceitos do "aprender a ser", "aprender a conhecer", "aprender a fazer", 'aprender a viver junto' e "aprender a viver com os outros" facilitaram o acompanhamento do processo de aprendizagem do educando idoso, observando-se o espiral de aprofundamento do aprender para o envelhecer ativo e saudável.

Em relação ao aspecto da pertinência, foram obtidas mudanças significativas no estilo de vida dos idosos participantes da tecnologia de videodebate, evidenciadas nos domínios "nutrição" e "relacionamentos", apesar de não serem privilegiados nos determinantes importantes do envelhecer ativo, como situação ambiental e social de moradias pouco acolhedoras e serviços sociais e de saúde aquém de suas necessidades. Os idosos valeram-se de seus predicados pessoais de força, determinação e auto-suficiência para adaptar-se às mudanças e adversidades, resignificando suas vidas e valorizando fatos que lhes conferiam alegria, satisfação e bem-estar psicossocial.

  • FINANCIAMENTO
    Pesquisa financiada pelo CNPq - Edital Universal, Proc. 480422/2013-3, sob a Coordenação da Profa. Dra. Sandra Helena Isse Polaro do Programa de Pós-graduação em Enfermagem da Universidade Federal do Pará.

Referências bibliográficas

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Ago 2018
  • Data do Fascículo
    2018

Histórico

  • Recebido
    28 Dez 2017
  • Aceito
    23 Jun 2018
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