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A CONQUISTA DA UNIVERSIDADE: OCUPAÇÃO INDÍGENA EM TORNO DE UM TERRITÓRIO EM DISPUTA

LA CONQUISTA DE LA UNIVERSIDAD: OCUPACIÓN INDÍGENA EN TORNO A UN TERRITORIO EN DISPUTA

RESUMO:

Os povos indígenas têm reivindicado acesso e permanência no ambiente universitário. O presente artigo se propõe fazer uma análise sobre a presença de pessoas indígenas na academia, bem como compreender a forma que esses estudantes vêm conquistando esse território. Para a coleta de dados, utilizamos os números oficiais disponibilizados na Sinopse Estatística da Educação Superior do INEP, além de pesquisa in loco nos Departamentos de Controle Acadêmico das IES do estado do Amapá. Portanto, trabalhamos com os dados nacionais e procuramos contrastá-los com a realidade de indígenas que frequentam o ensino superior no Amapá-Brasil. Além disso, também recorremos à pesquisa bibliográfica para demarcar o embasamento teórico já construído a respeito do tema. No decorrer do artigo é revelado que nos últimos 12 anos, a presença de estudantes indígenas nas universidades brasileiras tem se intensificado. Os números oficiais mostram que os indígenas cada vez mais estão acessando o ensino superior, e isso tem trazido alguns desdobramentos criativos para a universidade. Um desses desdobramentos é a reflexão necessária de recriar o espaço acadêmico à luz das perspectivas e saberes indígenas. Ou seja, além da presença física na universidade (que tem sido revolucionário), também é necessário que a academia se abra para os saberes ancestrais do mundo indígena. Compreendemos nesse estudo que é essa conquista de concepção que os indígenas também reivindicam do espaço acadêmico.

Palavras-chave:
Povos Indígenas; Universidade; Indígenas universitários

RESUMEN:

Los pueblos indígenas han exigido acceso y permanencia en el ámbito universitario. Este artículo tiene como objetivo analizar la presencia de los pueblos indígenas en la academia, así de comprender la forma en como estos estudiantes han ido conquistando este territorio. Para la recolección de datos, utilizamos las cifras oficiales disponibles en la Sinopsis Estadística de Educación Superior del INEP, además de investigaciones in-situ en los Departamentos de Control Académico de las IES del estado de Amapá. Por eso, trabajamos con datos nacionales y buscamos contrastarlos con la realidad de los indígenas que cursan la educación superior en Amapá, Brasil. Asimismo, utilizamos la investigación bibliográfica para demarcar las bases teóricas construidas sobre el tema. A lo largo del artículo se revela que en los últimos 12 años la presencia de estudiantes indígenas en las universidades brasileñas se ha intensificado. Las cifras oficiales muestran que los pueblos indígenas acceden cada vez más a la educación superior, y esto ha traído algunos avances creativos a la universidad. Uno de estos avances fue la reflexión sobre la recreación del espacio académico a la luz de las perspectivas y conocimientos indígenas. Es decir, además de la presencia física en la universidad (que ha sido revolucionario), también fue necesario que la academia se abra a los saberes ancestrales del mundo indígena. Entendemos en este estudio que este logro conceptual es lo que los indígenas también demandan desde el espacio académico.

Palabras clave:
Pueblos Indígenas; Universidad; Estudiantes Universitarios Indígenas

ABSTRACT:

Indigenous people have claimed access and permanence to the university environment. This article aims to analyze the presence of indigenous people in the academy, as well as to understand how these students have been conquering this territory. To collect the data, we used the official figures available in INEP's Statistical Synopsis of Higher Education, as well as on-site research at the Academic Control Departments of the HEIs in the state of Amapá (Brazil). We therefore worked with national data and tried to contrast it with the reality of indigenous people attending higher education in Amapá state. In addition, bibliographical research was also used to establish the theoretical basis already built up on the subject. The article reveals that in the last 12 years, the presence of indigenous students in Brazilian universities has intensified. Official records show that Indigenous people are increasingly accessing higher education, and this has led to some creative unfolding for the university. One of these unfoldings is the necessary reflection on recreating the academic space in the light of Indigenous perspectives and knowledge. In other words, in addition to the physical presence in universities (which has been revolutionary), it is also necessary for the Academy to open up to the ancestral knowledge of the indigenous world/culture. It is understood in this study that it is this achievement of conception that Indigenous people are also demanding from the academic space.

Keywords:
Indigenous people; University; Indigenous university students

INTRODUÇÃO

Esse artigo se propõe problematizar os aspectos que rondam a concepção de acesso e permanência de indígenas nas universidades e entender este fato como uma conquista. O título deste trabalho nos leva a uma ambiguidade proposital, pois, por um lado, nos instiga a compreender a universidade como espaço e lócus de conquista do outro a partir de suas perspectivas construídas sob as cercanias dos saberes, práticas e conhecimentos fundamentados em uma lógica adversa dos povos indígenas. Por outro lado, procuramos destacar ao longo do texto o caráter de uma universidade reivindicada, um lugar disputado, e, portanto, que busca ser conquistado pelos povos indígenas, como espaço para a pluralidade de saberes e conhecimentos, que ultrapassam os muros de um ambiente monopolizado pelas estruturas políticas, sociais, econômicas, culturais, linguísticas, históricas alheias ao ambiente em que está edificado.

Tomamos de empréstimo a ideia do título desse trabalho de Bartomeu Melià (1989MELIÀ, Bartomeu. A conquista da escrita: desafios e tendências na alfabetização em língua indígena. S.L., 1989.), que se propôs refletir tal ambiguidade a partir da “conquista da escrita”. Neste trabalho, o autor problematiza os desafios da alfabetização indígena na língua materna, pois a escrita, segundo sua compreensão, assim como a língua, foram estratégias para facilitar que aspectos exógenos pudessem ser apreendidos com maior facilidade pelos povos originários, e assim pudessem ser domesticados. Porém, segundo ainda Melià (1989), a escrita foi conquistada pelos indígenas, e esses a transformaram em ferramenta política de reforço de suas tendências étnicas e de luta por emancipação.

Também emprestamos o termo de Marcio Ferreira da Silva (1994SILVA, Marcio Ferreira da. A conquista da escola: educação escolar e movimento de professores indígenas no Brasil. Revista Em Aberto, Ano 14, n. 63, 1994. DOI: <https://doi.org/10.24109/2176-6673.emaberto.14i63.%25p>
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), o qual propõe uma análise da “conquista da escola” à luz do movimento de professores indígenas no Brasil, que, pelo enfrentamento, manifestaram o desejo de romper com uma estrutura escolar que subestimava e inferiorizava os saberes, anseios e conhecimentos dos povos indígenas. Quanto à universidade, entendemos que há no Brasil uma tendência crescente de reivindicação pela conquista desse espaço pelos povos indígenas, e é importante que esse aspecto seja frisado como um movimento de disputa pela conquista de concepções acerca desse tema. É a partir desse entendimento que pretendemos tecer os argumentos colocados no presente trabalho.

O percurso metodológico utilizado para a construção do presente estudo se deu, inicialmente, a partir de uma análise bibliográfica criteriosa, onde buscamos sustentação teórica para compreendermos os significados que representam a presença indígena na universidade. Dentre os/as autores/as que tivemos acesso à leitura, destacam-se nesse artigo: Assis (1981ASSIS, Eneida Corrêa de. Escola indígena, uma “frente ideológica?”. Dissertação (Mestrado em Antropologia) Brasília: Universidade de Brasília, 1981.), Tassinari (2001TASSINARI, Antonella Maria Imperatriz. Escola indígena: novos horizontes teóricos, novas fronteiras de educação. In: LOPES DA SILVA, Aracy; FERREIRA, Mariana Kawall Leal (Orgs.). Antropologia, história e educação: a questão indígena e a escola. São Paulo: Global, 2001. p. 44-70.), Paladino e Almeida (2012PALADINO, Mariana; ALMEIDA, Nina Paiva. Entre a diversidade e a desigualdade: uma análise das políticas públicas para a educação escolar indígena no Brasil dos governos Lula. Rio de Janeiro: Contra Capa, 2012.), Luciano (2013LUCIANO, Gersem José dos Santos. Educação para manejo do mundo: entre a escola ideal e a escola real no Alto Rio Negro. Rio de Janeiro: Contra Capa; LACED, 2013.), Paladino (2016), Souza Lima (2016 SOUZA LIMA, Antonio Carlos de. A educação superior de indígenas no Brasil: notas para balanços e possíveis perspectivas, à guisa de uma introdução. In: SOUZA LIMA, Antonio Carlos de. (Org.). A educação superior de indígenas no Brasil: balanços e perspectivas. Rio de Janeiro: E-papers, 2016. p. 11-28.), Dal Bó (2018DAL BÓ, Talita Lazarin. A presença de estudantes indígenas nas universidades: entre ações afirmativas e composições de modos de conhecer. Tese (Doutorado em Antropologia Social). São Paulo: Universidade de São Paulo: 2018. Disponível em < https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8134/tde-25102018-105344/pt-br.php>
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), Bergamaschi e Leite (2022BERGAMASCHI, Maria Aparecida; LEITE, Angela Maria Araújo. Formação de professores indígenas: a universidade como território de resistência? Revista Runa / n. 43.1, p. 57-75, 2022. DOI: <https://doi.org/10.34096/runa.v43i1.9990>
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).

Para a obtenção dos dados oficiais de matrículas de indígenas no ensino superior no Brasil e no estado do Amapá, recorremos aos dados abertos da Sinopse Estatística da Educação Superior - Graduação, do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP). Utilizamos os seguintes filtros nos arquivos baixados: Matrículas/Número de matrículas nos cursos de Graduação e Sequenciais de Formação Específica - Presenciais e à Distância, por Organização Acadêmica, Dependência Administrativa, Cor, Raça e sexo, segundo a Região Geográfica, a Unidade da Federação e o Município/Instituições de Ensino Superior/Público/Privada/Indígena/Total Brasil/Total Amapá.

Os dados que foram analisados começam em 2011, ano em que se inicia a sequência de dados com a categoria “cor/raça” no INEP. Ou seja, é só a partir daquele ano que a categoria “indígena” aparece oficialmente na estatística do ensino superior no Brasil. Os dados de indígenas matriculados no ensino superior se estendem até 2022 no portal do INEP. Eis a razão para delimitarmos o período de 2011 a 2022 nas tabelas 01 e 02 e nas reflexões que compõem este artigo.

Também fizemos busca nos sites institucionais das IES públicas do Amapá, bem como diretamente nos Departamentos de Controle Acadêmico dessas instituições e nas coordenações dos cursos de graduação do campus Binacional da Universidade Federal do Amapá, sediadas no município de Oiapoque-AP, a fim de cruzarmos os dados com as informações coletadas na plataforma do INEP. Porém, conforme veremos, pouco êxito tivemos nessa tarefa.

A partir do acesso aos relatórios estatísticos que demonstram um visível crescimento no número de matrículas de indígenas no ensino superior, e ainda projetando o olhar para nossas experiências pessoais de trabalho com estudantes indígenas no estado do Amapá, passamos a nos questionar: Quais as motivações para que os indígenas reivindiquem a entrada e permanência nas universidades, ambiente historicamente excludente e desafiador? O que a formação no ensino superior tem contribuído para os planos de vida desses povos originários?

É em torno desses questionamentos que construímos a presente reflexão, tendo como horizonte compreender a forma com que os povos indígenas vêm conquistando a universidade.

A conquista da universidade pelos próprios indígenas garante a possibilidade de romper com uma estrutura institucional que se solidificou em nossos ambientes acadêmicos. Essa estrutura entende que os indígenas, assim como as demais populações que historicamente foram segregadas do espaço universitário, são apenas fontes de nossas pesquisas, são os objetos de nossas investigações, e que, portanto, o “saber científico” deve alcançar essas populações, entendê-las, pensá-las, subordiná-las ao conhecimento acadêmico e, assim, conquistá-las. Esse é o movimento que pautou o posicionamento colonial e que ainda é muito presente em nosso ambiente.

Desse modo, existe uma mobilização indígena para construir um movimento reverso, para, ao invés de serem conquistados pela universidade, passarem a se firmar como conquistadores de concepção, de território, de políticas afirmativas e, assim, se consumarem na academia como intelectuais, levando em consideração os conhecimentos construídos dentro da universidade, mas trazendo seus saberes ancestrais, suas formas de entendimento, suas concepções de mundo. Entendemos que é dessa forma que reconstruiremos o ambiente acadêmico a partir da diversidade não apenas étnica, mas principalmente da diversidade teórica e analítica, que também contemple os saberes e fazeres dos povos originários.

Como já anunciado, uma parte desse estudo será pautada pela realidade dos povos indígenas de Oiapoque, município do extremo norte do estado do Amapá. São povos com os quais estamos construindo nossas reflexões investigativas nos últimos seis anos acerca da emergência da temática educacional ofertada pelas escolas nas aldeias, como também pela universidade.

Em outro momento já mencionamos a reivindicação dos indígenas daquele município por uma proposta de universidade que atenda suas demandas de acesso e permanência (MACHADO, 2019MACHADO, Tadeu Lopes. “Não somos objetos de pesquisa”: em busca de uma antropologia em colaboração. Revista FAEEBA - Educação e Contemporaneidade, Salvador, v. 28, n. 56, p. 44-55, 2019. DOI: <http://dx.doi.org/10.21879/faeeba2358-0194.2019.v28.n56.p44-55>
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), e queremos aprofundar aqui essa reflexão a partir de dados concretos oficiais que obtivemos dos últimos 12 anos sobre o número de matrículas de estudantes indígenas nos espaços acadêmicos, bem como, queremos iniciar uma análise do que esses dados representam na prática para suas comunidades de origem, como também para a própria universidade.

Compreendemos que essa reflexão carece de cuidado e extensiva observação, pois há nuances que não são evidenciáveis a partir de um olhar apressado. Portanto, entendendo os limites deste artigo, estamos propondo-o com o objetivo de contribuir para o debate e perceber que há muito a ser desnudado e compreendido à luz das motivações indígenas para reivindicar a universidade como espaço autenticamente seu.

Procuramos subdividir o texto em três partes. Na primeira buscaremos aprofundar o entendimento, os sentidos e os horizontes que a presença de estudantes indígena nas universidades vem propiciando, tanto para seus povos, quanto para a reinvenção da própria universidade. Ao abordar a importância da implantação dos Cursos de Licenciaturas Indígenas nas IES como uma das principais portas de acesso de estudantes indígenas ao ensino superior, demonstramos que a academia pode ser um local da pluralidade étnica, consumando assim a necessidade de reafirmá-la como um espaço reivindicado também pelos povos indígenas. Também frisamos que é inegável o avanço nos mais diversos aspectos (cultural, simbólico, estrutural, social), e o que a entrada e permanência de pessoas indígenas nesses ambientes representa.

A segunda parte do texto nos mostrará o panorama do ingresso de estudantes indígenas no ensino superior em níveis nacional e local (no estado do Amapá). Pautaremos nossa análise a partir dos dados oficiais da Sinopse Estatística da Educação Superior, disponibilizada publicamente pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), no período de 2011 a 2022. Perceberemos que, no período mencionado, há um aumento significativo de entrada de estudantes indígenas nas universidades, e isso já demonstra uma alteração de perspectiva da academia em função do que representa a presença indígena nesse espaço. Por outro lado, levando em consideração esses dados oficiais, também identificamos alguns desafios a serem superados.

Por fim, em nossas considerações finais, acentuamos alguns pontos importantes levantados ao longo do artigo, além de reafirmar a necessidade de pensar o ambiente acadêmico também com a colaboração da ótica indígena. A ocupação desses espaços não virá por acaso e nem de graça, por isso destacamos a importância da mobilização, dos enfrentamentos pessoais e coletivos para as pessoas indígenas se manterem nos bancos das salas de aula, nos laboratórios, nos espaços de convivências e nos demais ambientes da academia onde desejarem ocupar.

A CONQUISTA DA UNIVERSIDADE COMO COMPROMISSO ÉTNICO

A partir da Constituição Federal de 1988, que modificou a relação do Estado brasileiro para com os povos indígenas, deixando de tutelá-los e garantindo na lei que haja respeito e reconhecimento para com os seus saberes e modos de vida, os indígenas passam a disputar o espaço acadêmico, entendendo-o como também seu por direito.

Embora haja o sentimento de que as políticas de inclusão de indígenas no ambiente acadêmico ainda incluem somente indivíduos e não suas “tradições e conhecimentos dos povos dos quais fazem parte” (PALADINO, 2016PALADINO, Mariana. Uma análise da produção acadêmica de autoria indígenas no Brasil. In: SOUZA LIMA, Antonio Carlos de. (Org.). A educação superior de indígenas no Brasil: balanços e perspectivas. Rio de Janeiro: E-papers, 2016. p. 95-121., p. 120), a ocupação de um espaço significativo na academia tem representado um grande avanço na direção da reconstrução da concepção de uma universidade mais aberta, dialógica e plural de fato.

Contudo, desde a redemocratização do Brasil demarcada na nova Constituição, o país demora cerca de 15 anos para implementar uma política de educação superior que comece a contemplar as especificidades dos povos indígenas. De acordo com Mariana Paladino e Nina Paiva Almeida (2012PALADINO, Mariana; ALMEIDA, Nina Paiva. Entre a diversidade e a desigualdade: uma análise das políticas públicas para a educação escolar indígena no Brasil dos governos Lula. Rio de Janeiro: Contra Capa, 2012., p. 108), com relação ao ensino superior, o Movimento Indígena vem reivindicando duas pautas prioritárias:

A primeira delas se refere à formação de professores em nível superior, o que reflete a preocupação em aperfeiçoar suas práticas docentes, adquirindo instrumentos para conduzir com autonomia as escolas indígenas e ajustando-se às normativas legais que lhes exigem titulação em nível superior. A outra, decorrente das relações entre povos indígena e Estado na atualidade, vincula-se à necessidade de formar quadros dentro do movimento indígena que possam assumir, de forma qualificada, os processos de interlocução e intervenção nas políticas públicas em favor dos direitos e dos interesses indígenas (PALADINO e ALMEIDA, 2012PALADINO, Mariana; ALMEIDA, Nina Paiva. Entre a diversidade e a desigualdade: uma análise das políticas públicas para a educação escolar indígena no Brasil dos governos Lula. Rio de Janeiro: Contra Capa, 2012., p. 108).

Essas autoras entendem que só houve avanço significativo na primeira demanda apenas a partir de 2012, com a abertura de possibilidades legais de indígenas ocuparem espaços em cursos de graduação. Mas também consideramos que a abertura de cursos de Licenciaturas Interculturais Indígenas, a partir de 2006, em algumas universidades públicas do país, foram fundamentais para que esse quadro pudesse se transformar.

As Licenciaturas Interculturais Indígenas que passaram a se estruturar no Brasil a partir do primeiro edital lançado pelo Programa de Formação Superior e Licenciaturas Indígenas (PROLIND/SESU/SECAD/MEC), em 2005, teve como parâmetro para reconhecimento da importância desses cursos duas experiências autônomas e embrionárias, uma na Universidade Estadual de Mato Grosso (UNEMAT) e outra na Universidade Federal de Roraima (UFRR). A primeira iniciou um curso para formação de professores indígenas ainda em 2001, enquanto a segunda universidade iniciou em 2003 (PALADINO; ALMEIDA, 2012PALADINO, Mariana; ALMEIDA, Nina Paiva. Entre a diversidade e a desigualdade: uma análise das políticas públicas para a educação escolar indígena no Brasil dos governos Lula. Rio de Janeiro: Contra Capa, 2012., p. 110-111).

A partir do lançamento do PROLIND outras universidades passaram a criar projetos para iniciar a formação de professores indígenas em cursos específicos e diferenciados. Contudo, é importante mencionar a necessidade de se fazer um balanço crítico da realidade desses cursos para formação de professores indígenas, principalmente porque essa iniciativa estava pautada como um programa e não como uma política permanente do Governo Federal (PALADINO; ALMEIDA, 2012PALADINO, Mariana; ALMEIDA, Nina Paiva. Entre a diversidade e a desigualdade: uma análise das políticas públicas para a educação escolar indígena no Brasil dos governos Lula. Rio de Janeiro: Contra Capa, 2012., p. 201). Desse modo, assim que os recursos dos editais foram se esvaindo e os programas ficaram sob exclusiva responsabilidade das próprias universidades em que estavam inseridos, os problemas passaram a ser mais evidentes.

Fundamentado no estudo de Bergamaschi e Leite (2022BERGAMASCHI, Maria Aparecida; LEITE, Angela Maria Araújo. Formação de professores indígenas: a universidade como território de resistência? Revista Runa / n. 43.1, p. 57-75, 2022. DOI: <https://doi.org/10.34096/runa.v43i1.9990>
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), também compreendemos que as Licenciaturas Indígenas foram responsáveis em provocar a acentuação de entrada e permanência de estudantes indígenas nas universidades públicas brasileiras, demarcando o caráter de disputa de território à academia. O papel que esses cursos de formação para professores indígenas teve (e ainda tem) foi/é fundamental para construir o espaço acadêmico indígena, e ainda hoje esses cursos representam a principal porta de acesso de pessoas indígenas nas IES públicas de nosso país.

Entretanto, agora já na segunda década de suas implantações, é importante também mencionar suas fragilidades que ainda persistem, e que demonstram a imprescindibilidade de fazer avaliações recorrentes quanto aos métodos adotados para mantê-los.

Paladino e Almeida (2012PALADINO, Mariana; ALMEIDA, Nina Paiva. Entre a diversidade e a desigualdade: uma análise das políticas públicas para a educação escolar indígena no Brasil dos governos Lula. Rio de Janeiro: Contra Capa, 2012., p. 16-17) destacam algumas questões problemáticas desses cursos nos anos iniciais de sua implantação, tais como: 1. Mesmo com o aumento do número de cursos interculturais indígenas, ainda era uma realidade a dificuldade em atingir a meta de formação de professores em nível superior, como previa o Plano Nacional de Educação (PNE 2001-2011). É importante destacar que ainda na atualidade essa meta não foi conquistada, e a realidade das escolas indígenas demonstra que a vasta maioria dos professores indígenas que atuam nas escolas de suas aldeias ainda não tem o diploma de ensino superior; 2. Em alguns casos os cursos funcionavam em período intermitente, ou baseados em um esquema modular de ensino, o que provocava desgaste e precariedade no aprendizado dos alunos e do corpo docente. Essa é uma realidade ainda sentida por muitos cursos de Licenciatura Intercultural Indígena, que concentram as aulas presenciais em apenas três meses do ano, não tendo tempo suficiente para leitura, aulas dinamizadas, aula de campo, vivências, participação em eventos acadêmicos, descanso; 3. Em muitos locais esses cursos funcionavam no período de férias para os demais cursos nas universidades, não propiciando o contato dos estudantes indígenas com os demais alunos não-indígenas, bem como com os serviços diversos da universidade; 4. Por falta de recursos, no período em que os alunos voltavam para a aldeia, não havia acompanhamento contínuo e efetivo dos professores.

Há que se contar também com um risco iminente: ao concentrar os alunos em turmas exclusivamente para indígenas, em períodos intervalares dos demais cursos da universidade, corre-se o risco de os estereótipos e os preconceitos contra os alunos indígenas serem reforçados dentro do espaço acadêmico. Entendemos que a universidade, que teoricamente reivindica um caráter multiverso, polifônico e plural nos mais diversos aspectos, não pode conformar em sua estrutura a ideia de uma educação que possa ter o risco de se constituir segregadora.

Com isso não queremos dizer de modo algum que o caráter de educação diferenciada para os alunos indígenas nas universidades é um erro. Mas os riscos que ameaçam sua efetividade devem ser considerados, já que o caráter de “interculturalidade”, que esses cursos reivindicam para si, deve ser levado a sério, compreendido como uma via cultural de mão dupla, paritária, que requer o entendimento de que,

Mesmo considerando conflitos e contradições entre os conhecimentos tradicionais dos povos originários e o conhecimento da ciência moderna que predomina na academia, é necessário reconhecer uma ambivalência, ou seja, em que as partes não sejam irredutíveis, mas possíveis de negociação (BERGAMSCHI; LEITE, 2022, p. 61).

E é nesse sentido que os povos indígenas reivindicam todos os espaços da vida acadêmica (da graduação à pós-graduação), para além de seus cursos específicos e diferenciados, para além dos espaços destinados “exclusivamente” para eles.

Entretanto, mesmo considerando todas essas dificuldades elencadas, reforçamos o entendimento de que a introdução de cursos interculturais específicos nas universidades foi um primeiro passo importante para outras ações. Percebemos que os cursos de formação para professores indígenas trouxeram para os povos indígenas as primeiras experiências de mínimas condições efetivas para formação específica de professores para atuarem nas escolas de suas aldeias, buscando a implementação de uma educação diferenciada e bilíngue.

De certa forma, os cursos ofertados nas universidades especificamente para os povos indígenas significaram efetivamente a porta de entrada para que os estudantes indígenas pudessem alargar seu espaço na academia. Percebemos esse fato ao verificar o caso de estudantes indígenas com matrículas ativas no estado do Amapá. O número de estudantes vinculados ao Curso de Licenciatura Intercultural Indígena da UNIFAP (único curso do estado voltado especificamente para pessoas indígenas) representa 64% da totalidade dos estudantes indígenas matriculados em IES públicas no estado do Amapá no ano de 2022, conforme os números representados na Tabela 01.

Tabela 1:
Número de estudantes indígenas matriculados em IES públicas no estado do Amapá e no Curso de Licenciatura Intercultural Indígena, ano 2022

Com a Lei 12.711/2012, que cria vagas específicas para pretos, pardos, indígenas e pessoas com deficiência nos cursos regulares das universidades, além de ocupar vagas nos cursos específicos e diferenciados, os indígenas também passaram a adentrar em outros cursos, que antes tinham muita dificuldade em acessar. Mas a entrada nesses cursos advinda das cotas apresenta limitações e, em função disso, atualmente há instituições que utilizam as vagas das cotas destinadas a indígenas para promover entrada diferenciada1 1 Um exemplo é como ocorre na Universidade Federal do Pará (UFPA), que oferta quatro vagas em todos os cursos de graduação da instituição, através de um vestibular específico para indígenas e quilombolas. Na UNIFAP, embora tenha havido a reivindicação e conquista dos movimentos indígenas e quilombolas em 2018 para que fossem alargadas as possibilidades de acesso e permanência, conforme descrevemos em momento anterior (MACHADO, 2019), o vestibular específico e diferenciado se mantém somente para o Campus de Oiapoque. , para fugir do modelo padrão/tradicional dos vestibulares, assim como do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM), que não contemplam as especificidades dos povos indígenas, uma vez que os exames não dialogam com a realidade cultural e de formação escolar dessa parcela da população.

Muito ainda temos que avançar para construir um diálogo mais concreto e edificante entre as universidades e os povos indígenas, para chegarmos à elaboração que Boaventura de Sousa Santos (2019SANTOS, Boaventura de Sousa. O fim do império cognitivo: a afirmação das epistemologias do Sul. Belo Horizonte: Autêntica, 2019.) chama de uma “universidade polifônica”, que se coloca como pluralista, garantindo espaço para as vozes convencionais e não convencionais, uma “pluriversidade”, que seria a construção de uma universidade como resposta ao que o autor chama de “capitalismo universitário” e “colonialismo universitário”.

Guardados os devidos cuidados para não estabelecer uma universidade unívoca, levando em consideração os parâmetros para a efetivação do caráter intercultural, a ideia de uma instituição com caráter polifônico e “pluriverso” seria contemplada, talvez, a partir da criação de uma instituição de educação superior intercultural indígena, que, segundo Antonio Carlos de Souza Lima (2016 SOUZA LIMA, Antonio Carlos de. A educação superior de indígenas no Brasil: notas para balanços e possíveis perspectivas, à guisa de uma introdução. In: SOUZA LIMA, Antonio Carlos de. (Org.). A educação superior de indígenas no Brasil: balanços e perspectivas. Rio de Janeiro: E-papers, 2016. p. 11-28., p. 23), foi iniciada sua formatação no Brasil no ano de 2014, pela Portaria nº 52/2014, que instituiu o Grupo de Trabalho para a realização de estudos sobre as possibilidades de sua criação. Contudo, o Governo Federal não deu respostas aos estudos realizados pelo referido GT, e, mais uma vez, o plano ficou apenas no papel.

Desse modo, podemos perceber que a presença dos indígenas nas instituições de ensino superior, ocupando o espaço acadêmico e científico que lhes foi negado desde a criação das universidades em nosso país, é uma possibilidade de avançar na transformação desses espaços. Entendemos que o crescimento e a solidificação da ocupação de estudantes indígenas nas universidades se dão em decorrência da luta dos povos ameríndios do Brasil que se utilizam do capital cultural, político e cosmológico que têm e exigem que se estabeleçam e ampliem democraticamente, cada vez mais, esses espaços estratégicos.

Compreendemos que a formação de quadros de intelectuais indígenas na academia significa uma grande revolução dos últimos tempos no pensamento acadêmico brasileiro. Mas é importante também destacar que os saberes acumulados milenarmente pelos povos indígenas devem ser reconhecidos como conhecimento capaz de fortalecer a identidade e a cultura desses povos.

Nesses termos, é necessário demarcar os critérios que produzem o conceito de intelectualidade que estamos utilizando aqui, pois, conforme acentua Jack Goody (2012GOODY, Jack. A domesticação da mente selvagem. Petrópolis-RJ: Vozes, 2012.), a intelectualidade tem presença inquestionável nas sociedades que ele chama “pré-letradas”. Mas é importante entender que a intelectualidade que há, por exemplo, no seio dos povos indígenas, está fundada a partir de outras perspectivas, que não pode ser definida somente como indivíduos que atuam como membros de uma profissão em qualquer sentido estrito, mas sim “indivíduos que estão envolvidos na exploração criativa da cultura” (GOODY, 2012GOODY, Jack. A domesticação da mente selvagem. Petrópolis-RJ: Vozes, 2012., p. 32).

Por esse motivo, compreendemos que a presença da universidade na vida dos indígenas exerce o papel de agente auxiliar na formação intelectual desses indivíduos, que atuam para aproximar os saberes e não exercer e/ou obedecer a um comando epistêmico único.

Portanto, a “intelectualidade” que aqui destacamos compreende um olhar macro, não reduzindo o termo ao sentido que historicamente fora construído a partir dos modelos ocidentais, que se firma apenas nos saberes científicos, acadêmicos e epistêmicos classicamente aceitos no espaço universitário. Compreendemos, portanto, que a intelectualidade dos indígenas universitários é uma construção de encontro de saberes postulados na academia com os seus próprios saberes acumulados pela tradição, que contempla seu modo de ser, de estar, de sentir e de viver o mundo que os rodeia.

É nesse sentido que a presença dos indígenas na academia representa um avanço sem precedentes, pois, a partir de seus posicionamentos firmados em seus saberes culturais, atuam para desconstruir conhecimentos enviesados sobre seus povos e produzir novos rumos para o entendimento e o fortalecimento de sua cultura, de acordo com suas próprias convicções e suas formas de conhecimento e saberes (VASCO, 2012VASCO, Luis Guilhermo. Hacia una Ciencia Social al servicio del Pueblo. CHARLA INAUGURAL del seminario de postgrado “Textos y contextos de las Teorías Antropológicas Contemporáneas” del profesor Carlos Salamanca, Maestría en Antropología Social, FLACSO - Buenos Aires: 2012. Disponível em: <http://www.luguiva.net/%5C/articulos/detalle.aspx?id=95>
http://www.luguiva.net/%5C/articulos/det...
).

O reconhecimento que os indígenas têm sobre a importância do trabalho acadêmico é um movimento que contesta a posição subalterna e marginalizada que esses povos ocuparam na história oficial do Brasil e na trajetória das universidades de nosso país. E esse posicionamento podemos sentir a partir de alguns critérios que o movimento indígena vem adotando com relação à universidade.

Como exemplo disso, percebemos que se tornou comum a construção de um movimento político dos indígenas de embargo sobre algumas pesquisas acadêmicas em variados campos de estudo. Na nossa visão, enquanto pesquisadores brancos, essa postura dos povos indígenas frente às pesquisas acadêmicas pode trazer desconforto ou decepções. Entretanto, é uma atitude que merece atenção, dado o modo como as pesquisas foram conduzidas por não indígenas, ao longo dos anos, a partir de modos eurocêntricos e colononiais de considerar a produção de conhecimento.

Esse movimento de negação a algumas pesquisas científicas em seus territórios manifesta muitas questões particulares deles próprios. Entre essas manifestações, percebo que os indígenas entendem que os desdobramentos de uma pesquisa acadêmica têm forte repercussão e que impactam muitos setores da sociedade e que, além disso, de acordo com o olhar de quem está escrevendo, é reforçada a perspectiva de quem está à frente da pesquisa, uma vez que eles têm clareza que é impossível o pesquisador se desfazer de sua subjetividade para escrever sobre os outros (MACHADO, 2023MACHADO, Tadeu Lopes. Entre embargos e boicotes: bastidores de uma negociação de pesquisa com povo indígena. In: TONIOL, Rodrigo; FLEISCHER, Soraya (Orgs.). E quando a limonada antropológica azeda? Porto Alegre: Zouk, 2023, p. 79-96.).

Portanto, muitas descrições que surgem sobre os indígenas não contemplam o que os próprios indígenas pensam e/ou entendem. Daí surge a necessidade deles mesmos conquistarem seus espaços de pesquisadores, de estudiosos de suas culturas, para que surjam estudos que atentem mais para o que os povos indígenas designam como importante para si.

Mariana Paladino (2016PALADINO, Mariana. Uma análise da produção acadêmica de autoria indígenas no Brasil. In: SOUZA LIMA, Antonio Carlos de. (Org.). A educação superior de indígenas no Brasil: balanços e perspectivas. Rio de Janeiro: E-papers, 2016. p. 95-121., p. 97), ao fazer uma abordagem sobre as produções acadêmicas de autoria indígena no Brasil, aponta que é importante “romper com as barreiras corporativas dos grupos de pesquisadores indigenistas, que ainda continuam dominando o cenário”, e defende que os pesquisadores indígenas não podem permanecer somente na sombra dos renomados pesquisadores da questão indígena.

A autora assinala, ainda, que não defende a substituição dos grupos de pesquisadores não indígenas pelos grupos indígenas, mas que é fundamental garantir o espaço para todos, com políticas públicas e investimentos que cheguem também nas pesquisas acadêmicas promovidas por intelectuais indígenas. Essa é uma “condição indispensável para a construção de uma atividade intelectual crítica e descolonizadora” (PALADINO, 2016PALADINO, Mariana. Uma análise da produção acadêmica de autoria indígenas no Brasil. In: SOUZA LIMA, Antonio Carlos de. (Org.). A educação superior de indígenas no Brasil: balanços e perspectivas. Rio de Janeiro: E-papers, 2016. p. 95-121., p. 97).

É importante acentuar uma vez mais que a agenda da educação superior para os povos indígenas é muito importante, tanto que, por exemplo, essa pauta sempre está na mesa de discussão anual das assembleias gerais e de avaliação do Movimento Indígena de Oiapoque. Em suas falas sempre pontuam que é imprescindível a formação de quadros de pesquisadores indígenas para que tenham autonomia e garantam sua autoformação intelectual.

Nesse sentido, há um investimento e incentivo político do Movimento Indígena para garantir todos os anos um número considerável de pessoas para concorrer às vagas destinadas para os indígenas de Oiapoque nos cursos de graduação da UNIFAP.

Compreendemos mais ainda a importância dos cursos de educação superior na vida desses povos indígenas quando percebemos que as novas lideranças indígenas de Oiapoque são pessoas que já receberam certo grau de instrução escolar e/ou universitária. O capital intelectual que detêm, fruto de seus saberes culturais, somados aos saberes adquiridos nos espaços acadêmicos, é fundamental para que sejam vistos como representantes desejáveis para seus povos, porque conseguem encaminhar as demandas e corresponder às expectativas de suas comunidades.

Mas não para por aí. Além de reivindicar acesso nos cursos de graduação, o Movimento Indígena do estado do Amapá também ressalta a importância de continuar a carreira acadêmica nos cursos de pós-graduação.

Nos últimos anos, vemos crescer o número de pessoas indígenas no Amapá em busca de qualificação em nível de mestrado e doutorado. Há indígenas adentrando em alguns programas de pós-graduação que ofertam vagas específicas com processo seletivo diferenciado, como o Programa de Pós-Graduação em Letras (PPGLET) e o Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGED), ambos da UNIFAP, assim como em outros programas em universidades fora do estado do Amapá.

É importante mencionar que, segundo minhas observações pessoais, a maioria desse grupo de pesquisadores indígenas do Amapá que estão acessando a pós-graduação stricto sensu é oriundo da Licenciatura Intercultural Indígena, o que demonstra a importância da formação específica e a necessidade de acesso diferenciado para os alunos dos diversos povos indígenas da região, e ainda reforça, uma vez mais, a importância desse curso para os povos indígenas do Amapá.

Também consideramos necessário enfatizar que a busca por qualificação pelos indígenas tem também outra conotação muito importante. Trata-se, como defende Gersem Baniwa (2013), de considerar que o exemplo desses estudantes indígenas é muito importante para a autoestima e o orgulho étnicos desses povos:

Os acadêmicos indígenas bem-sucedidos servem de exemplo e ajudam a despertar o orgulho étnico, a autoestima e o autorreconhecimento, entendendo-se bem-sucedidos aqui em sentido amplo: de indígenas formados que conseguem bons empregos e salário na cidade, e assim podem ajudar materialmente os familiares que ficam nas aldeias, a indígenas que saíram para estudar e retornaram para suas comunidades, exercendo cargos e funções importantes na vida das mesmas. O bom exemplo de indígenas bem-sucedidos, portanto, vai além dos interesses materiais, servindo também para aumentar a autoestima e superar as constantes situações de preconceito de que são vítimas (LUCIANO, 2013LUCIANO, Gersem José dos Santos. Educação para manejo do mundo: entre a escola ideal e a escola real no Alto Rio Negro. Rio de Janeiro: Contra Capa; LACED, 2013., p. 94).

Conseguimos perceber esse sentimento traduzido nas palavras de Baniwa também entre alguns jovens indígenas do estado do Amapá. Alguns apontam com orgulho a trajetória que alguns parentes estão conseguindo acessar, e que percebem que há a possibilidade de conquistar a universidade, que, mesmo sabedores dos desafios e dificuldades que passam no cotidiano da vida estudantil (que são redobrados em função de suas origens étnicas), esses estudantes são exemplos de autoestima étnica e cultural para muitos jovens.

Percebi concretamente esse sentimento em um pronunciamento público de um jovem da aldeia Kumenê, do povo Palikur, que, inspirado pela trajetória acadêmica de um parente de seu povo que já está na fase conclusiva do doutorado em antropologia, revelou:

Adonias está se tornando doutor. Eu sinto muito orgulho dele, por ser Palikur e saber que mesmo que ele esteja passando por muitas dificuldades para estudar, ele está conseguindo seu objetivo. E se ele pode, eu também posso. Eu vou conseguir terminar meu mestrado e depois estudar para ser doutor também (Aldiere Orlando, janeiro de 2020, pronunciamento em uma roda de conversa em Macapá-AP).

Há que se destacar que a busca por qualificação por parte dos estudantes indígenas indica o caminho que reivindicam para o campo da educação. Além disso, também demonstra a importância que a universidade tem para a formação de seus quadros intelectuais, para a construção de um futuro que aponte um diálogo mais próximo, profundo e colaborativo entre os saberes tradicionais e as produções acadêmicas. Assim, reivindicam ocupar o território acadêmico para que a análise de suas estruturas sociais, econômicas, variações linguísticas, culturais, seja também definida a partir de suas percepções e entendimento.

Portanto, percebemos que a conquista da universidade pelos povos indígenas está diretamente ligada a um compromisso étnico com seus povos, que na contemporaneidade entendem a necessidade de envidar esforços para ocupar o espaço acadêmico e transformá-lo em aliado de sua causa, pois esse aspecto representa uma posição política que os povos indígenas estão construindo para si, e que auxilia diretamente nas tomadas de decisões que lhes são exigidas e nas diversas relações que estabelecem com os não indígenas.

INDÍGENAS NA UNIVERSIDADE: O PANORAMA NO BRASIL E NO ESTADO DO AMAPÁ

Os povos indígenas do Brasil reconhecem a importância de adentrar à universidade como uma necessidade para a formação de quadros profissionais e intelectuais para atuarem em suas aldeias nas mais diversas áreas de serviços e da causa indígena. Entendem que é uma estratégia política para conseguirem assumir as responsabilidades de se colocar como uma ponte que favoreça o diálogo entre seu povo e o mundo dos brancos.

Esse entendimento mais geral dos povos indígenas sobre a importância e os sentidos da formação escolar e acadêmica na atualidade não anula as concepções ideológicas que marcaram (e ainda marcam) a função da instrução formal no ambiente indígena. Essas marcas são amplamente registradas na historiografia da educação escolar indígena de nosso país, caracterizando a escola como instituições ideológicas, agindo como braço do Estado para nacionalizar os povos indígenas (ASSIS, 1981ASSIS, Eneida Corrêa de. Escola indígena, uma “frente ideológica?”. Dissertação (Mestrado em Antropologia) Brasília: Universidade de Brasília, 1981.), por outros percebida como um espaço para aprendizagem das concepções religiosas, sociais e econômicas do colonizador (LUCIANO, 2013LUCIANO, Gersem José dos Santos. Educação para manejo do mundo: entre a escola ideal e a escola real no Alto Rio Negro. Rio de Janeiro: Contra Capa; LACED, 2013.), e por outros como espaço de disputa, de diálogo, de fronteira (TASSINARI, 2001TASSINARI, Antonella Maria Imperatriz. Escola indígena: novos horizontes teóricos, novas fronteiras de educação. In: LOPES DA SILVA, Aracy; FERREIRA, Mariana Kawall Leal (Orgs.). Antropologia, história e educação: a questão indígena e a escola. São Paulo: Global, 2001. p. 44-70.).

Entretanto, percebemos que há um movimento dos povos indígenas que reivindica a escola e a universidade. Mas essa reivindicação parte do entendimento de que esses espaços devem ser refundados, à luz das compreensões e das demandas dos próprios povos originários. É a partir dessa concepção que entendem o quão importante significa contar com professores indígenas, advogados indígenas, médicos e enfermeiros indígenas, pois, ao especializar as pessoas que fazem parte de seus grupos étnicos de origem, compreendem que não ficarão totalmente reféns dos brancos, já que algumas atuações de agentes públicos não-indígenas em suas aldeias têm provocado uma série de reclamações de maus tratos, má vontade, preconceitos, indisposição para permanecer continuamente em suas aldeias.

Para além disso, a formação acadêmica representa também a possibilidade de autonomia e autodeterminação, demarcando no seu cotidiano aquilo que realmente faz sentido para seu projeto de vida. Portanto, a formação em nível superior demonstra a disposição dos povos indígenas em estender e afirmar seus conhecimentos para resguardar e assegurar a perpetuação de seus procedimentos ancestrais, conforme suas próprias compreensões de presente e de futuro.

Nesse sentido, fica evidenciada a importância que os cursos de formação superior ofertados no espaço acadêmico têm para os indígenas, haja vista seu caráter socialmente referenciado. Contudo, a universidade pública brasileira é marcada em sua história para atender ao apelo da classe dominante, inicialmente constituída para a formação dos filhos dessa classe dirigente. E nesse sentido, a universidade está marcada pelo perfil excludente e meritocrático, pois essencialmente foi instituída no Brasil “não para atender as necessidades fundamentais da qual era e é parte, mas pensada e aceita como um bem cultural oferecido a minorias” (FÁVERO, 2006FÁVERO, Maria de Lourdes de Albuquerque. A universidade no Brasil: das origens à Reforma Universitária de 1968. Educar em Revista. n. 28, p. 17-36. 2006. DOI: <https://doi.org/10.1590/S0104-40602006000200003>
https://doi.org/10.1590/S0104-4060200600...
, p. 19)2 2 O termo “minorias” indicado por Fávero (2006) refere-se às minorias abastadas, economicamente poderosas e ricas no Brasil no início do século XX, quando as universidades passaram a ser institucionalizadas em nosso país. .

Sob influência dessa herança histórica, a universidade recorrentemente tem recusado alargar as possibilidades para que as pessoas pertencentes aos estratos sociais mais vulneráveis consigam acesso e permanência com qualidade aos níveis superiores de educação formal.

No contexto dos dias atuais, visualizamos concretamente que a universidade pública ainda é um espaço elitizado, que não consegue garantir uma ampla abertura da totalidade de seus cursos de graduação e pós-graduação para os filhos da classe trabalhadora, como também para os povos indígenas, para a população quilombola, para os ribeirinhos, para a comunidade LGBTQIA+, enfim, para o povo oprimido de nosso país. Isso é o reflexo da forma como as universidades públicas foram criadas no Brasil, para perpetuar o poder hegemônico político e econômico da elite local (BRITO e CUNHA, 2009BRITO, Talamira Taita Rodrigues; CUNHA, Ana Maria de Oliveira. Revisitando a história da universidade no Brasil: política de criação, autonomia e docência. APRENDER - Caderno de Filosofia e Psicologia da Educação. Ano VII, n. 12, p. 43-63, 2009. Disponível em: <https://periodicos2.uesb.br/index.php/aprender/article/view/3105>
https://periodicos2.uesb.br/index.php/ap...
).

Embora esse cenário tenha apresentado uma visível alteração nos últimos 12 anos, principalmente depois da implementação das políticas de ações afirmativas, adotada a partir da Lei 12.711/2012, a perspectiva de acesso e permanência nos diversos cursos ofertados nas universidades públicas pela população mais vulnerável ainda é um desafio a ser enfrentado, uma vez que a meritocracia continua sendo o principal método de nivelamento para o acesso ao ensino superior. Mas não apenas isso. Ainda existe uma barreira imposta nas estruturas da universidade que a impede de se reorganizar para acolher estudantes pertencentes a esses grupos sociais. Para dar um exemplo muito básico sobre essa “preguiça institucional”, observaremos os números oficiais de matrícula de indígenas nas Instituições de Ensino Superior (IES).

A Tabela 02 indica os números oficiais dessas matrículas no território nacional. A partir dela, podemos ter uma percepção mais assertiva sobre a realidade dos anos recentes, como também teremos possibilidade de analisar os reflexos desses números no cotidiano da universidade e dos povos indígenas.

Tabela 02:
Número total de estudantes indígenas matriculados em Instituições de Ensino Superior, Públicas e Privadas no Brasil, 2011-2022

A Tabela 02 demonstra o panorama de ingresso de estudantes indígenas nas Instituições de Ensino Superior a partir de 2011, ano em que o INEP passa a fornecer os dados de matrículas nas IES divididos pelas categorias cor/raça. Esse primeiro dado já demonstra que a coleta dos dados de ingresso de indígenas nas IES é uma categoria aplicada muito recentemente e, portanto, ainda em fase de ajustes, de consolidação. Entretanto, já se somam 12 anos na coleta dos dados a partir dessas categorias e ainda percebemos falta de tratamento adequado, quando comparamos aos dados obtidos junto às IES do estado do Amapá.

Ao investigarmos diretamente nos departamentos de controle acadêmico sobre a forma de acesso desses estudantes, bem como as especificações de suas categorias culturais e étnicas, como povo a que pertencem, terra indígena de origem, aldeia de referência, língua materna, não há qualquer dado institucional consolidado sobre esses itens em nenhuma das instituições de ensino superior do Amapá. Entretanto, através das coordenações de cursos de graduação do Campus Binacional de Oiapoque, da Universidade Federal de Amapá (UNIFAP), obtivemos de forma suscinta e limitada o número de indígenas estudantes matriculados naquele campus até o ano de 2022. Foi o único dado concreto que conseguimos obter.

Sobre esse ponto da dificuldade de tratamento dos dados de estudantes indígenas nas IES, Dal Bó (2018DAL BÓ, Talita Lazarin. A presença de estudantes indígenas nas universidades: entre ações afirmativas e composições de modos de conhecer. Tese (Doutorado em Antropologia Social). São Paulo: Universidade de São Paulo: 2018. Disponível em < https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8134/tde-25102018-105344/pt-br.php>
https://www.teses.usp.br/teses/disponive...
) nos ajuda a entender que as dificuldades de sua aferição no âmbito do MEC também são consequências de um cenário de constante movimento:

De adoção de ações afirmativas em novas IES (em cursos de graduação e de pós-graduação) e de novos/as ingressantes indígenas, de desistência e de transferências, de egressos/as. Soma-se a isso, a inexistência de uma instância de acompanhamento das ações afirmativas e de produção e sistematização desses dados por parte do órgão governamental responsável pela política nacional de educação, o Ministério da Educação - MEC, de modo que as informações só podem ser rastreadas por meio de consulta a cada instituição (DAL BÓ, 2018DAL BÓ, Talita Lazarin. A presença de estudantes indígenas nas universidades: entre ações afirmativas e composições de modos de conhecer. Tese (Doutorado em Antropologia Social). São Paulo: Universidade de São Paulo: 2018. Disponível em < https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8134/tde-25102018-105344/pt-br.php>
https://www.teses.usp.br/teses/disponive...
, p. 43).

Entretanto, voltamos a enfatizar que internamente em algumas instituições, como é o caso das IES do Amapá, esse tratamento ainda hoje é praticamente nulo, inexistente. As únicas informações que existem estão nos relatórios das listas de aprovados para ingresso nos cursos das instituições, o que não corresponde a uma ideia exata da realidade, uma vez que há o constante “movimento” que Dal Bó assinalara acima, com transferências, trancamento de matrículas, ou até mesmo desistência do curso antes mesmo de realizar a matrícula, entre outras interrupções ao longo do processo. Portanto, essa realidade nos empurra para a necessidade de organização e sistematização de dados dessa natureza, considerando sua importância para as políticas educacionais, bem como para a análise, avaliação e fortalecimento da presença indígena nas universidades.

A respeito dos dados espelhados na Tabela 02, visualizamos que, a partir de 2012, há um crescimento exponencial do número de estudantes indígenas matriculados no ensino superior no Brasil. Isso indica que, no ano de 2019, o crescimento no número dessa modalidade de matrícula aumentou 476% com relação a 2011. Entretanto, a partir de 2020 percebemos uma queda acentuada no número de matrícula, fato que merece uma investigação particular. Porém, é notório que houve o crescimento do número de estudantes indígenas nas universidades, e isso corresponde principalmente às suas reivindicações por ampliação de acesso ao ensino superior.

Outro ponto que merece ser destacado nesses dados, é que, conforme mencionamos, o aumento desse número se dá também em consonância com a implementação da Lei 12.711/2012, que prevê em seu Artigo 3º a reserva de vagas para “pretos, pardos e indígenas e pessoas com deficiência (...) em proporção ao total de vagas no mínimo igual à proporção de pretos, pardos, indígenas e pessoas com deficiência na população da unidade da Federação onde está instalada a instituição”.

Associado à Lei 12.711/2012, Antonio Carlos de Souza Lima (2016 SOUZA LIMA, Antonio Carlos de. A educação superior de indígenas no Brasil: notas para balanços e possíveis perspectivas, à guisa de uma introdução. In: SOUZA LIMA, Antonio Carlos de. (Org.). A educação superior de indígenas no Brasil: balanços e perspectivas. Rio de Janeiro: E-papers, 2016. p. 11-28.) também considera que o

Decreto nº 7.824, de 11 de outubro de 2013, que a regulamenta, e à Portaria Normativa nº 18, de 11 de outubro de 2013, que “dispõe sobre a reserva de vagas em instituições federais de ensino”, juntamente com o Programa Bolsa Permanência, criado pela Portaria nº 389, de 9 de maio de 2013, foram algumas das medidas tomadas, dentre o largo conjunto de propostas para ações afirmativas no ensino superior, que tendem a modificar positivamente o quadro desanimador de 2011 e de parte de 2012 (SOUZA LIMA, 2016 SOUZA LIMA, Antonio Carlos de. A educação superior de indígenas no Brasil: notas para balanços e possíveis perspectivas, à guisa de uma introdução. In: SOUZA LIMA, Antonio Carlos de. (Org.). A educação superior de indígenas no Brasil: balanços e perspectivas. Rio de Janeiro: E-papers, 2016. p. 11-28., p. 21).

No estado do Amapá, acompanhando a tendência nacional, o número de matrículas de indígenas nas IES também cresce nesse período. Vejamos os números na Tabela 03:

Tabela 03:
Matrículas de estudantes indígenas em Instituições de Ensino Superior, Públicas e Privadas, no estado do Amapá, 2011-2022

Os dados apresentados na Tabela 03 também evidenciam o aumento de pessoas indígenas matriculadas em Instituições de Ensino Superior no estado do Amapá no intervalo de 2011 a 2022. No entanto, segundo esses dados oficiais, percebemos uma oscilação no crescimento dessa modalidade de matrículas nesta Unidade da Federação.

Seguindo a leitura da Tabela 03, a partir do ano de 2014, há um visível aumento no número de matrículas de pessoas indígenas em Instituições Públicas no Amapá. Um elemento que provavelmente contribui para esse aumento é a constituição do Campus Binacional da Universidade Federal do Amapá no município de Oiapoque, que, em 2014, instala sete (07) novos cursos de graduação naquele município do extremo norte do estado.

De acordo com os dados obtidos diretamente nas coordenações dos oito (08) cursos de graduação existentes no campus de Oiapoque, até 2022 havia 395 indígenas regularmente matriculados naquela unidade acadêmica. Comparando com os dados da Tabela 03, isso representa quase a totalidade dos indígenas estudantes do Amapá que frequentam IES pública. Consideramos, portanto, que a presença da universidade no Oiapoque tem provocado o aumento no número de matrículas de estudantes indígenas, já que o Oiapoque é a região amapaense onde se encontra o maior número de pessoas indígenas no estado do Amapá, segundo os dados do IBGE de 20105 5 Conforme o Censo do IBGE de 2010, o município de Oiapoque contava com uma população indígena de 5.569 pessoas, enquanto a população indígena total do estado do Amapá girava em torno de 7.385 indivíduos. Isso significa que o município de Oiapoque concentrava, naquele ano, 75,4% da população indígena do estado do Amapá. Disponível em: https://indigenas.ibge.gov.br/graficos-e-tabelas-2.html. Acessado em 15/04/2022. .

Mesmo que em 2014, início efetivo do funcionamento dos 08 cursos no Oiapoque, não houvesse possibilidade de entrada diferenciada para indígenas e quilombolas naquele campus, também constatamos aumento de matrícula de indígenas. Porém, o aumento mais significativo se dá a partir de 2018, quando o campus de Oiapoque adere um modelo de processo seletivo diferenciado para indígenas e quilombolas. Daí em diante, percebemos a elevação considerável de matrículas de estudantes indígenas em IES pública no estado do Amapá.

De todo modo, considerando apenas as matrículas nas IES públicas do estado, há um aumento de 3.225% em 2022 com relação a 2011. Já em nível nacional, conforme a Tabela 02, o aumento das matrículas nas IES públicas teve um crescimento de 349% no mesmo período. Ou seja, no Amapá os dados apontam um crescimento de matrículas de indígenas nas IES públicas muito acima do crescimento nacional.

É importante destacar que os números oficiais são apenas uma das fontes possíveis para analisar esses dados. Entretanto, pelas dificuldades administrativas que se impõem nas IES com relação ao tratamento desses dados, não foi possível averiguar a fundo as demais fontes. Porém, com os elementos que temos a partir das visitas in loco e de documentos coletados em sites e páginas oficiais das IES, podemos apontar aqui, pelo menos, uma inconsistência no tratamento dos dados disponibilizados pelo INEP.

A partir de 2014, de acordo com a Tabela 03, houve a matrícula de 172 estudantes indígenas em IES públicas no estado do Amapá. Considerando que nessa Unidade da Federação existem apenas 03 Instituições públicas de Ensino Superior (Universidade Federal do Amapá - UNIFAP, Universidade do Estado do Amapá - UEAP e Instituto Federal do Amapá - IFAP); considerando ainda que apenas no curso de Licenciatura Intercultural Indígena da UNIFAP havia 1646 6 De acordo com dados obtidos diretamente nos arquivos físicos da secretaria do Curso de Licenciatura Intercultural Indígena da UNIFAP. estudantes indígenas matriculados em 2014 e, pelo menos, cerca de 19 alunos matriculados no mesmo ano em outros cursos na mesma instituição7 7 Dados obtidos a partir das consultas aos editais de matrículas da UNIFAP, disponibilizados na página http://www.unifap.br/editais-academico/. Acesso em 20/02/2021. ; considerando ainda outros estudantes que realizaram suas matrículas nas outras IES, que, pelos dados de seus editais conseguimos visualizar pelo menos 09 estudantes8 8 Pesquisa realizada nos sites da Universidade do Estado Amapá e Instituto Federal do Amapá, referente ao ano 2014. http://processoseletivo.ueap.edu.br/; https://processoseletivo.ifap.edu.br/ps/. Acesso em 10/05/2021. , é possível identificar que há inconsistência nos números apresentados oficialmente.

As inconsistências nos dados estão presentes também nos demais anos espelhados na tabela acima mencionada. Esse é um fato que parece ser menor, mas não é. Senão vejamos: qual o motivo para que não haja um refinamento e cuidado específicos no tratamento desses dados? Estamos aqui falando de números relativos a pessoas que historicamente foram excluídas do contexto universitário, que ainda perseguem a ultrapassagem dos muros da academia e que, mesmo que alguns consigam adentrar ao espaço acadêmico, suas origens estão apagadas nos relatórios, nos editais, nos dados oficiais da universidade. Isso é muito grave, pois demonstra que não há disposição da universidade em ressaltar a riqueza da diversidade que a sustenta.

Uma última questão que entendo ser importante mencionar é que as Tabelas 02 e 03 indicam um número bastante elevado de matrículas em instituições privadas. Embora percebamos que essa tendência apresenta um declínio a partir de 20149 9 Considero necessário voltar a frisar a importância de ler esses dados a partir da situação que ocorreu no Campus Oiapoque em 2014, quando houve a introdução de sete novos cursos de graduação e ainda, a partir de 2018, quando houve a oferta de entrada diferenciada para indígenas nesses mesmos cursos. Percebe-se na tabela que, a partir de 2014, a entrada de indígenas em IES pública aumenta, enquanto nas IES privadas diminui. A partir de 2018 há uma acentuação ainda maior dessa tendência. nas IES do Amapá, enquanto no cenário nacional seus números são exorbitantes, o que corresponde a um expressivo aumento de 353% de matrículas de estudantes indígenas nessas IES em 2022 com relação a 2011. Isso significa dizer que, mesmo que os números tenham alterações pelas inconsistências que expusemos linhas acima, de acordo com os dados oficiais do INEP, 64% dos estudantes indígenas do ensino superior estavam matriculados em IES privadas em 2022, enquanto 36% estavam matriculados em IES públicas no mesmo ano.

No entanto, de acordo com os dados trabalhados por Mariana Paladino e Nina Paiva Almeida (2012PALADINO, Mariana; ALMEIDA, Nina Paiva. Entre a diversidade e a desigualdade: uma análise das políticas públicas para a educação escolar indígena no Brasil dos governos Lula. Rio de Janeiro: Contra Capa, 2012., p. 107), o percentual de estudantes indígenas matriculados em instituições superiores privadas já alcançava 70% em 2003. Segundo as autoras, até então o único órgão governamental que atendia parcialmente à demanda indígena por educação superior era a FUNAI, “por meio da concessão de auxílio financeiro”. Mas as autoras pontuam também que, até o final da década de 1990, essas demandas eram sobretudo individuais e familiares dentro dos núcleos indígenas. Desse modo, afirmam ainda Paladino e Almeida (2012, p. 107): “a demanda dos movimentos indígenas por educação superior, portanto, é recente”.

Todo esse cenário nos permite perceber que os povos indígenas no Brasil têm conquistado às duras penas seu espaço no ambiente acadêmico e com muita luta e mobilização reivindicam ampliação na ocupação desses territórios, embora muitas vezes esses espaços acadêmicos estejam localizados nos ambientes privados de educação superior, que requer pagamentos de mensalidades, ou, muitas vezes, depende de financiamento estudantil por parte do Governo Federal, por meio de programas como o Programa Universidade para Todos (PROUNI) ou o Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior (FIES)10 10 O PROUNI ficou estabelecido a partir da Lei nº 11.096/2005. Este programa prevê a destinação de bolsas integrais e parciais para estudantes matriculados em IES privadas, considerados em vulnerabilidade econômica. Por outro lado, as IES que aderiram ao PROUNI ficam isentas de vários impostos e contribuições, conforme prevê o Artigo 8º da citada Lei. Já o FIES foi instituído pela Lei nº 12.202/2010, que alterou a Lei 10.260/2001. Trata-se de um “financiamento a estudantes matriculados em cursos superiores não gratuitos”, e que, ao concluir seu curso de graduação e iniciar sua carreira profissional, inicia a pagar o financiamento, incluindo as correções e taxas de juros firmadas no contrato. , que, no meu entendimento, e fundamentado nas leituras de Miranda (2017MIRANDA, Paula Roberta. Fies e Prouni na expansão da educação superior: quanto vale o conhecimento no Brasil? Tese (Doutorado em Educação). Maringá: Universidade Estadual de Maringá, 2017. Disponível em: <http://repositorio.uem.br:8080/jspui/handle/1/6141>
http://repositorio.uem.br:8080/jspui/han...
), Silva e Soares (2019SILVA, Maíra Teixeira; SOARES, Felipe Furini. Educação na Bolsa de Valores: O FIES e o ensino superior privado. FINEDUCA - Revista de Financiamento da Educação, v. 9, n. 1, 2019. DOI: <http://dx.doi.org/10.22491/fineduca-2236-5907-v9-74708>
https://doi.org/10.22491/fineduca-2236-5...
), Miranda e Azevedo (2020MIRANDA, Paula Miranda; AZEVEDO, Mário Luiz Neves de. Fies e Prouni na expansão da educação superior brasileira: políticas de democratização do acesso e/ou de promoção do setor privado-mercantil? Educação & Formação, v. 5, n. 3, e1421, 2020. DOI: <https://doi.org/10.25053/redufor.v5i15set/dez.1421>
https://doi.org/10.25053/redufor.v5i15se...
), entre outros, funciona como uma transferência de verba e de responsabilidade de oferta de educação superior do Governo Federal para a esfera privada, o que representa um problema.

CONSIDERAÇÕES PROVISÓRIAS

Reafirmamos a importância que os indígenas têm dedicado aos conhecimentos produzidos nos espaços acadêmicos. Reiteramos que os dados que trabalhamos nesse artigo apontam que nas últimas décadas no Brasil houve uma movimentação mais acentuada dos indígenas em busca de formação acadêmica, o que tem elevado o número de estudantes indígenas nas universidades brasileiras. Também pontuamos que há necessidade de olhar para os dados coletados pelo INEP entendendo suas contradições e os desafios de organizá-los de acordo com as realidades locais.

Percebemos que as universidades públicas brasileiras ainda criam barreiras para construir um modelo de entrada e permanência adequados para os povos indígenas, mas aos poucos, mesmo com todas as dificuldades, o número de indígenas universitários tem aumentado gradativamente.

Outro ponto que merece destaque é que os pesquisadores indígenas estão buscando aperfeiçoamento nos espaços acadêmicos para, além de uma interlocução mais segura com o mundo dos brancos, reaver sua história e memória que foram historicamente manipuladas pelo conhecimento ocidental, fazendo com que os indígenas não se sintam completamente representados pelo que tem sido produzido a seu respeito. E nesse movimento, compreendemos que há uma possível construção de saberes dentro da academia oriundo da possibilidade de uma ciência construída a partir de uma “epistemologia ecumênica”, ou construção de saberes a partir da colaboração das coletividades (RAMOS, 2007RAMOS, Alcida Rita. Do engajamento ao desprendimento. Campos, v 8, n. 1, p. 11-32, 2007. Disponível em: < https://revistas.ufpr.br/campos/article/view/9559>
https://revistas.ufpr.br/campos/article/...
; 2016RAMOS, Alcida Rita. Por uma crítica indígena da razão antropológica. Série Antropologia, Vol. 455, Brasília: DAN/UNB, 2016.).

Ao tratarmos de uma universidade que se dedique à abertura para construção de conhecimentos plurais e conjuntos, compreendemos que a universidade passa a se constituir não como uma instituição de conquista do outro e monopolização do saber a partir do entendimento ocidental. Essa abertura é fundamental para que os povos que historicamente foram excluídos dos “espaços de saber” tenham condições de conquistá-los à luz de suas experiências culturais, políticas e sociais.

Há, por parte dos indígenas, a reivindicação de colaboração na construção e tessitura do espaço acadêmico a partir de suas próprias falas, a partir de sua presença, de seus saberes e suas práticas de conhecimento. Eles reivindicam a construção de uma forma de pensar e conhecer que levam em consideração suas ciências e suas práticas milenares de ser e estar no mundo. Reivindicam, portanto, uma universidade que esteja atenta a esse apelo, que consiga perceber a importância desse espaço ser conquistado por eles, num processo de reversão ao processo histórico de conquista e manipulação dos saberes e conhecimentos.

O antropólogo colombiano Luis Guillermo Vasco (2012VASCO, Luis Guilhermo. Hacia una Ciencia Social al servicio del Pueblo. CHARLA INAUGURAL del seminario de postgrado “Textos y contextos de las Teorías Antropológicas Contemporáneas” del profesor Carlos Salamanca, Maestría en Antropología Social, FLACSO - Buenos Aires: 2012. Disponível em: <http://www.luguiva.net/%5C/articulos/detalle.aspx?id=95>
http://www.luguiva.net/%5C/articulos/det...
) compreende a academia como um espaço importante para o debate, o diálogo e a transformação da ciência e da sociedade. Segundo esse autor, se a academia é o local onde se cria uma ciência que ainda serve de ferramenta para a dominação dos povos indígenas, não se pode deixar essa ferramenta tranquila. Tem que confrontar essas ideias, e o local desse confronto é na própria academia, onde estão os cientistas, onde se formam os pesquisadores. Portanto, esse espaço também deve ser ocupado e conquistado pelos indígenas.

Um ponto para uma última reflexão: para ocupar e conquistar, é necessário manter-se na universidade. E somos sabedores que a manutenção no ambiente acadêmico não é tarefa fácil para ninguém, e paras as pessoas indígenas os desafios se redobram, uma vez que estão longe de suas terras, de seu ambiente familiar, morando nas periferias dos centros urbanos, aprendendo a falar outra língua, tendo contato com outros tipos e normas de alimentação, tentando driblar todos os dias o racismo que lhe é dirigido.

Manter-se na universidade tem sido um grande desafio de resistência para essas pessoas. Entretanto, mesmo com todas as adversidades impostas, os indígenas têm conseguido alargar as portas da universidade, e assim, com muita luta, mobilização e enfrentamento passam a garantir que a conquista desse ambiente esteja em seu horizonte. Portanto, a necessidade em ocupar esses espaços que historicamente lhes foram negados é muito maior que as adversidades, e assim, com suas resistências, poderão alcançar a universidade em sua totalidade e não em partes.

FINANCIAMENTO

Este artigo é fruto de algumas reflexões obtidas em torno do projeto de pesquisa “Indígenas universitários do Amapá: quem são, quantos são e onde estão?”. Tal projeto contou com o financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Amapá (FAPEAP).

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  • VASCO, Luis Guilhermo. Hacia una Ciencia Social al servicio del Pueblo CHARLA INAUGURAL del seminario de postgrado “Textos y contextos de las Teorías Antropológicas Contemporáneas” del profesor Carlos Salamanca, Maestría en Antropología Social, FLACSO - Buenos Aires: 2012. Disponível em: <http://www.luguiva.net/%5C/articulos/detalle.aspx?id=95>
    » http://www.luguiva.net/%5C/articulos/detalle.aspx?id=95
  • 1
    Um exemplo é como ocorre na Universidade Federal do Pará (UFPA), que oferta quatro vagas em todos os cursos de graduação da instituição, através de um vestibular específico para indígenas e quilombolas. Na UNIFAP, embora tenha havido a reivindicação e conquista dos movimentos indígenas e quilombolas em 2018 para que fossem alargadas as possibilidades de acesso e permanência, conforme descrevemos em momento anterior (MACHADO, 2019), o vestibular específico e diferenciado se mantém somente para o Campus de Oiapoque.
  • 2
    O termo “minorias” indicado por Fávero (2006) refere-se às minorias abastadas, economicamente poderosas e ricas no Brasil no início do século XX, quando as universidades passaram a ser institucionalizadas em nosso país.
  • 3
    Disponível em https://www.gov.br/inep/pt-br/acesso-a-informacao/dados-abertos/sinopses-estatisticas/educacao-superior-graduacao. Acesso em 02/01/2024.
  • 4
    Disponível em https://www.gov.br/inep/pt-br/acesso-a-informacao/dados-abertos/sinopses-estatisticas/educacao-superior-graduacao. Acesso em 02/01/2024.
  • 5
    Conforme o Censo do IBGE de 2010, o município de Oiapoque contava com uma população indígena de 5.569 pessoas, enquanto a população indígena total do estado do Amapá girava em torno de 7.385 indivíduos. Isso significa que o município de Oiapoque concentrava, naquele ano, 75,4% da população indígena do estado do Amapá. Disponível em: https://indigenas.ibge.gov.br/graficos-e-tabelas-2.html. Acessado em 15/04/2022.
  • 6
    De acordo com dados obtidos diretamente nos arquivos físicos da secretaria do Curso de Licenciatura Intercultural Indígena da UNIFAP.
  • 7
    Dados obtidos a partir das consultas aos editais de matrículas da UNIFAP, disponibilizados na página http://www.unifap.br/editais-academico/. Acesso em 20/02/2021.
  • 8
    Pesquisa realizada nos sites da Universidade do Estado Amapá e Instituto Federal do Amapá, referente ao ano 2014. http://processoseletivo.ueap.edu.br/; https://processoseletivo.ifap.edu.br/ps/. Acesso em 10/05/2021.
  • 9
    Considero necessário voltar a frisar a importância de ler esses dados a partir da situação que ocorreu no Campus Oiapoque em 2014, quando houve a introdução de sete novos cursos de graduação e ainda, a partir de 2018, quando houve a oferta de entrada diferenciada para indígenas nesses mesmos cursos. Percebe-se na tabela que, a partir de 2014, a entrada de indígenas em IES pública aumenta, enquanto nas IES privadas diminui. A partir de 2018 há uma acentuação ainda maior dessa tendência.
  • 10
    O PROUNI ficou estabelecido a partir da Lei nº 11.096/2005. Este programa prevê a destinação de bolsas integrais e parciais para estudantes matriculados em IES privadas, considerados em vulnerabilidade econômica. Por outro lado, as IES que aderiram ao PROUNI ficam isentas de vários impostos e contribuições, conforme prevê o Artigo 8º da citada Lei. Já o FIES foi instituído pela Lei nº 12.202/2010, que alterou a Lei 10.260/2001. Trata-se de um “financiamento a estudantes matriculados em cursos superiores não gratuitos”, e que, ao concluir seu curso de graduação e iniciar sua carreira profissional, inicia a pagar o financiamento, incluindo as correções e taxas de juros firmadas no contrato.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    02 Set 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

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