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EXERCÍCIO PROFISSIONAL DE DOCENTES COM DEFICIÊNCIA VISUAL: TENSIONANDO A ACESSIBILIDADE1 1 Artigo publicado com financiamento do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq/Brasil para os serviços de edição, diagramação e conversão de XML.

EJERCICIO PROFESIONAL DE DOCENTE CON DISCAPACIDAD VISUAL: TENSANDO LA ACCESIBILIDAD

RESUMO:

Em uma sociedade que se constitui por olhares padronizados e pela lógica da normalidade, os docentes com deficiência visual se distanciam dos padrões de corpo, comportamento, jeitos de ser e fazer a docência, o que causa estranhamentos. Este artigo resulta de uma pesquisa que objetivou compreender como docentes com deficiência visual (cegos/as ou com baixa visão) enfrentam os desafios de exercer a profissão, respondendo ao seguinte problema de pesquisa: de que forma professores/as com deficiência visual narram a acessibilidade para o exercício da profissão? Para isso, realizaram-se entrevistas narrativas com sete docentes com deficiência visual, atuantes na Educação Básica nos três estados da Região Sul do Brasil. As narrativas foram organizadas em agrupamentos temáticos e examinadas a partir da perspectiva da análise do discurso, amparada pelos referenciais foucaultianos. O estudo aponta que, quanto maiores forem as barreiras sociais impostas, menores serão as possibilidades de inclusão de docentes com deficiência visual no exercício profissional. Revela também, que a inclusão e acessibilidade tem sido pensadas mais para os estudantes com deficiência e menos para os professores, cuja inserção profissional é recente e ainda causa estranhamento nos espaços escolares.

Palavras-chave:
Docentes com deficiência visual; acessibilidade; normalização; educação especial

RESUMEN:

En una sociedad que está constituida por las miradas estandarizadas y la lógica de la normalidad, los docentes con discapacidad visual se alejan de las normas de cuerpo, comportamiento, formas de ser y hacer docentes, lo que provoca el extrañamiento. Este artículo es el resultado de una investigación que tuvo como objetivo comprender cómo los profesores con discapacidad visual (ciegos/as o con baja visión) enfrentan los desafíos de ejercer la profesión, contestando al problema de investigación: ¿cómo los docentes con discapacidad visual narran la accesibilidad para el ejercicio de la profesión? Para eso, se realizaron entrevistas narrativas con siete docentes con discapacidad visual que actúan en la Educación Básica en los tres estados de la Región Sul del Brasil. Las narrativas fueron organizadas en grupos temáticos y examinadas a desde la perspectiva del análisis del discurso, apoyadas en referencias foucaultianas. El estudio apunta que: cuanto mayores son las barreras sociales impostas, menores son las posibilidades de incluir a los docentes con discapacidad visual en su ejercicio profesional. También revela que la inclusión y la accesibilidad han sido pensadas más para los estudiantes con discapacidad y menos para los docentes, cuya inserción profesional es reciente y aún provoca distanciamiento en los espacios escolares.

Palabras clave:
Profesores con discapacidade visual; accessibilidade; normalización; educación especial

ABSTRACT:

In a society that is constituted by patterned looks and the logic of normality, visually impaired teachers distance themselves from the standards of body, behavior, and ways of being and doing teaching, which causes strangeness. This article is the result of research that aimed to understand how teachers with visual impairments (blind or with low vision) face the challenges of their professional practice by answering the following research issue: how do visually impaired educators narrate accessibility for professional practice? To do so, narrative interviews were carried out with seven visually impaired educators who work in the Basic Educational System in three Southern Brazilian states. The narratives were organized in thematic groups and examined based on the discourse analysis, supported by Foucauldian references. The study points out that the higher the social barriers imposed, the lower the inclusion possibilities for visually impaired educators in professional practice. It also reveals that inclusion and accessibility have been thought of more for students with disabilities and less for teachers, whose professional insertion is recent and still causes strangeness in school spaces.

Keywords:
Visually impaired teachers; accessibility; normalization; special education

INTRODUÇÃO

Ao olhar para o contexto escolar, é possível notar que a atuação profissional de docentes com deficiência visual pode ser considerada recente e reflete os movimentos de lutas travadas e conquistadas historicamente pelo público da Educação Especial. Em uma sociedade que se constitui por olhares padronizados e pela lógica da norma/normalidade, professores/as com deficiência visual distanciam-se dos padrões de corpo, comportamento e jeitos de ser e fazer a docência, o que pode causar estranhamentos.

O Brasil é um dos países que se destaca quando o assunto é legislação para pessoas com deficiência, principalmente por contar com uma vasta gama de leis, decretos e normas que estabelecem regras e garantem o direito à inclusão e acessibilidade dessas pessoas. Destacamos, principalmente, a implantação de medidas e normas que garantem a acessibilidade, sendo este um direito primordial, que confere acesso ao exercício dos demais direitos.

Este artigo, resulta da dissertação de Mestrado em Educação da primeira autora sob orientação da segunda, na Linha de Pesquisa Diversidade, interculturalidade e educação inclusiva. A investigação buscou respostas a partir do seguinte problema de pesquisa: Como docentes com deficiência visual (cegos/as ou com baixa visão) enfrentam os desafios de exercer a profissão? Do problema de pesquisa derivam as seguintes perguntas de estudo: Quais os desafios enfrentados por pessoas com deficiência visual na organização das práticas pedagógicas? Como professores com deficiência visual narram a acessibilidade para o exercício da profissão? Como professores com deficiência visual organizam o trabalho/aulas? As motivações para a pesquisa emergem das próprias experiências da primeira autora, professora com deficiência visual, graduada em Educação Física e atuante nessa área, além da relevância social e acadêmica em abordar um tema ainda pouco explorado.

Diante disso, partindo das normativas constitucionais, este texto aborda a acessibilidade, mais especificamente a acessibilidade arquitetônica, urbanística e atitudinal, que são essenciais às pessoas com deficiência, as quais estão previstas na Lei Brasileira de Inclusão (BRASIL, 2015BRASIL. Lei 13.146, de 6 de julho de 2015. Institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência). Disponível em: <Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13146.htm >. Acesso em: 15 jun. 2023.
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). A acessibilidade consiste na possibilidade que pessoas com deficiência possuem de ter acesso e usufruir da vida em diferentes tempos e espaços, tais como trabalho, lazer e relações sociais, com segurança e autonomia. E sua efetivação, ao mesmo tempo que coloca em prática o direito à igualdade de oportunidade, proporciona à pessoa com deficiência a participação como cidadã.

A partir das normativas legais que conferem condição de acesso, que possibilitam a participação de professores e professoras com deficiência como cidadãos e cidadãs e que visam à autonomia, à igualdade de oportunidade e ao direito de estar, conviver e usufruir de diferentes contextos e espaços/lugares, constatamos que a acessibilidade é algo em construção. Contudo, tal perspectiva suscita questionamentos como: há a efetivação das normativas em relação ao acesso e à condição de trabalho dos docentes com deficiência visual? Ao ampliar o olhar para esse fenômeno por meio das lentes foucaultianas, com amparo em Veiga-Neto e Lopes (2007VEIGA-NETO, Alfredo; LOPES, Maura Corcini. Inclusão e governamentalidade. Revista Educação e Sociedade, Campinas, v. 28, n. 100, p. 947-963, out. 2007. Disponível em <Disponível em http://www.scielo.br/pdf/es/v28n100/a1528100.pdf >. Acesso em:15 jun. 2023.
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), é possível dizer que toda a discursividade em torno das políticas públicas de inclusão podem ser compreendidas como uma forma de governamento dos corpos. Ao analisar a questão por esse ângulo, as políticas públicas de inclusão possuem o objetivo de colocar todos os corpos sob o mesmo teto (VEIGA-NETO; LOPES, 2007VEIGA-NETO, Alfredo; LOPES, Maura Corcini. Inclusão e governamentalidade. Revista Educação e Sociedade, Campinas, v. 28, n. 100, p. 947-963, out. 2007. Disponível em <Disponível em http://www.scielo.br/pdf/es/v28n100/a1528100.pdf >. Acesso em:15 jun. 2023.
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).

Os autores supracitados salientam que, com a expressão colocar todos sob o mesmo teto, “estão se referindo tanto a um espaço físico - seja ele stricto sensu institucional (escola, empresa etc.), familiar etc. - quanto a espaços simbólicos - cultura, identidade, classificação diagnóstica” (VEIGA-NETO; LOPES, 2007VEIGA-NETO, Alfredo; LOPES, Maura Corcini. Inclusão e governamentalidade. Revista Educação e Sociedade, Campinas, v. 28, n. 100, p. 947-963, out. 2007. Disponível em <Disponível em http://www.scielo.br/pdf/es/v28n100/a1528100.pdf >. Acesso em:15 jun. 2023.
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, p. 9). Além disso, destacam que, para haver o governamento da população, faz-se necessário promover o ordenamento, o que ocorre na lógica das políticas públicas de inclusão por meio do direito à igualdade, ou seja, por meio da garantia de acesso para todos.

A acessibilidade, nesse cenário de políticas públicas de inclusão, torna-se um direito fundamental e estabelece uma precondição de acesso a todos os demais direitos da vida social. Isso significa vencer as barreiras impostas, por intermédio do direito à acessibilidade. Em consonância com a Lei Brasileira de Inclusão, em seu artigo 3.º, inciso IV, barreiras são conceituadas e classificadas como:

IV - qualquer entrave, obstáculo, atitude ou comportamento que limite ou impeça a participação social da pessoa, bem como o gozo, a fruição e o exercício de seus direitos à acessibilidade, à liberdade de movimento e de expressão, à comunicação, ao acesso à informação, à compreensão, à circulação com segurança, entre outros, classificadas em:

a) barreiras urbanísticas: as existentes nas vias e nos espaços públicos e privados abertos ao público ou de uso coletivo;

b) barreiras arquitetônicas: as existentes nos edifícios públicos e privados;

c) barreiras nos transportes: as existentes nos sistemas e meios de transportes;

d) barreiras nas comunicações e na informação: qualquer entrave, obstáculo, atitude ou comportamento que dificulte ou impossibilite a expressão ou o recebimento de mensagens e de informações por intermédio de sistemas de comunicação e de tecnologia da informação;

e) barreiras atitudinais: atitudes ou comportamentos que impeçam ou prejudiquem a participação social da pessoa com deficiência em igualdade de condições e oportunidades com as demais pessoas;

f) barreiras tecnológicas: as que dificultam ou impedem o acesso da pessoa com deficiência às tecnologias [...] (BRASIL, 2015BRASIL. Lei 13.146, de 6 de julho de 2015. Institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência). Disponível em: <Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13146.htm >. Acesso em: 15 jun. 2023.
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).

Para que o docente com deficiência visual possa exercer a docência com dignidade e condições, é necessário que as normas de acessibilidade arquitetônicas e urbanísticas sejam efetivas e vividas no cotidiano, a fim de romper tais barreiras. O conceito de deficiência visual, no Decreto 5.296 (2004BRASIL. Presidência da República Casa Civil Subchefia para Assuntos Jurídicos. Decreto n.º 5.296, de 02 de dezembro de 2004. Regulamenta as Leis nos 10.048, de 8 de novembro de 2000, que dá prioridade de atendimento às pessoas que especifica, e 10.098, de 19 de dezembro de 2000, que estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida, e dá outras providências. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 2 de dez. 2004. Disponível em: <http://www.planalto. gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2004/Decreto/D5296.htm>. Acesso em: 15 jun. 2023.), no seu Art. 5º, § 1º, Inciso I, alínea c), assim se apresenta:

cegueira, na qual a acuidade visual é igual ou menor que 0,05 no melhor olho, com a melhor correção óptica; a baixa visão, que significa acuidade visual entre 0,3 e 0,05 no melhor olho, com a melhor correção óptica; os casos nos quais a somatória da medida do campo visual em ambos os olhos for igual ou menor que 60º; ou a ocorrência simultânea de quaisquer das condições anteriores.

Tendo isso em vista, este artigo buscou compreender como professores/as com deficiência visual (cegos ou com baixa visão) narram a acessibilidade para o exercício da profissão. Para isso, são evidenciadas condições de acessibilidade, desde o momento em que os docentes saem de suas residências até o momento em que chegam e permanecem no espaço onde exercem sua profissão, levando em conta aspectos relacionados à acessibilidade arquitetônica, urbanística e atitudinal.

PERCURSO METODOLÓGICO

Neste estudo, foram analisadas a narrativa de sete docentes com deficiência visual, atuantes na rede básica de ensino dos três estados do Sul do Brasil: Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná. Para a seleção dos professores, foi utilizada a técnica de amostragem denominada bola de neve, que se caracteriza como uma forma de amostragem não probabilística, selecionada por meio de indicação, ou seja, de uma cadeia de referência. O processo inicia pelas sementes, que podem ser pessoas indicadas pelo/a pesquisador/a e que tenham, de alguma forma, ligação com o público da pesquisa. A partir dessas sementes é que começa a bola de neve. Dessa forma, as sementes têm o papel fundamental de indicar novas pessoas que atendam os critérios da pesquisa (DEWES, 2013DEWES, João Osvaldo.Amostragem em bola de neve e respondente-Driven Sampling: uma descrição dos métodos. Monografia Graduação - Faculdade de Estatística, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2013. Disponível em: <Disponível em: https://lume.ufrgs.br/handle/10183/93246 >. Acesso em:15 jun. 2023.
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).

Fizeram parte desta pesquisa os/as professores/as indicados/as por meio da rede de referências e que concordaram em participar do estudo, em conformidade com os critérios da pesquisa. Trata-se de professores atuantes entre 2 (dois) e 25 anos na Educação Básica nos três estados do Sul do Brasil, com formação acadêmica em Pedagogia (predominantemente), Filosofia, Educação Física e Geografia. Com o intuito de preservar a real identidade de cada participante, estes foram identificados como Docente 1, Docente 2 e assim sucessivamente, até Docente 7. Para este artigo, foram selecionados excertos de narrativas docentes relativas à acessibilidade e sua implicação no exercício da docência, considerando a recorrência e a relevância das manifestações. A geração de materialidades empíricas aconteceu por meio de entrevistas narrativas, realizadas após a aprovação do projeto no Comitê de Ética em Pesquisa envolvendo seres humanos, CAAE 39967120.0.0000.0116, na Universidade Comunitária da Região de Chapecó - Unochapecó, com o consentimento dos sujeitos pesquisados. As entrevistas narrativas aconteceram via Google Meet, considerando o período da pandemia da Covid-19 e, após, foram transcritas na íntegra. Para Andrade (2014ANDRADE, Sandra dos Santos. A entrevista narrativa ressignificada nas pesquisas educacionais pós-estruturalistas. In: MEYER, Dagmar Estermann; PARAÍSO, Malucy Alves. Metodologias de pesquisas pós-críticas em educação. Belo Horizonte: Mazza, 2014, p. 175-196., p. 181), “as narrativas são constituídas a partir da conexão entre discursos que se articulam, que se sobrepõem, que se somam ou, ainda, que se diferem ou contemporizam”.

Para realizar as entrevistas, foi adotado um roteiro com tópicos orientadores que contribuíram para a organização dos diálogos. A entrevista narrativa possibilita ao/à pesquisador/a mergulhar nos mais diversos contextos e cenários de vida. Os sujeitos entrevistados, ao narrar, rememoram fatos importantes da sua história de vida, e, dessa forma, as histórias revisitadas pelas palavras narradas, aos poucos, evocam significados (SOUSA; CABRAL, 2015SOUSA, Maria Gorete da Silva; CABRAL, Carmem Lucia de Oliveira. A narrativa como opção metodológica de pesquisa e formação de professores. Horizontes, v. 33, n. 2, p. 149-158, jul./dez. 2015.). Segundo as autoras, a narrativa não constitui um ato oral para se contar, mas, por meio do ato de contar, o sujeito entrevistado revela o meio como concebe e vivencia as coisas do mundo (SOUSA; CABRAL, 2015VEYNE, Paul. Tudo é singular na história universal: o «discurso». In: VEYNE, Paul. Foucault: seu pensamento, sua pessoa. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2011, p. 11-26.).

As narrativas foram organizadas em agrupamentos temáticos, levando em consideração a recorrência e a relevância das manifestações e examinadas com base na análise do discurso na perspectiva foucaultiana. Foram abordados e revisitados alguns aspectos históricos e conceitos relacionados à deficiência visual, além de políticas públicas de inclusão e acessibilidade. As contribuições de Foucault e outros autores que se amparam em suas teorizações auxiliaram a tensionar e desnaturalizar o que está posto, no que concerne a questões de acessibilidade, intimamente ligadas ao exercício profissional de docentes com deficiência visual.

Foucault afirma que ao analisar discursos, é preciso ficar atento, pois estão imersos em “um jogo complexo e instável em que o discurso pode ser, ao mesmo tempo, instrumento e efeito de poder, e também obstáculo, escora, ponto de resistência e ponto de partida de uma estratégia oposta” (FOUCAULT, 2005FOUCAULT, Michel. O dispositivo de sexualidade. In: História da sexualidade I: a vontade de saber. Rio de Janeiro: Graal, 2005, p. 73-124., p. 96). Vale salientar que discurso, na perspectiva foucaultiana, é entendido como uma “descrição mais precisa, mais concisa de uma formação histórica em sua nudez, é a atualização de sua última diferença individual” (VEYNE, 2011VEYNE, Paul. Tudo é singular na história universal: o «discurso». In: VEYNE, Paul. Foucault: seu pensamento, sua pessoa. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2011, p. 11-26., p. 16-17).

Nesse horizonte, os discursos deixam de ser meras narrativas, tomando a proporção de relações estabelecidas entre as pessoas, o tempo e o contexto em que ocorrem. Como afirma Oliveira (2018OLIVEIRA, Marcia Betania de. Pós-estruturalismo e teoria do discurso: perspectivas teóricas para pesquisas sobre políticas de currículo. Mossoró, Revista Brasileira de Educação, v. 23, 2018. <https://doi.org/10.1590/S1413-24782018230081>.
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), o discurso não se afunila apenas no discurso, no ato da fala e no que se apresenta, mas engloba as relações e as ações que possuem significado social.

Nessa perspectiva, “admite-se que a linguagem se produz, mantém-se e se modifica no contexto de lutas e de disputas pelo direito de significar. É com ela e nela que se constitui o que é dizível e, portanto, também pensável e compartilhável, em cada época, em cada lugar e em cada cultura” (MEYER; PARAISO, 2014MEYER, Dagmar Estermann; PARAÍSO, Marlucy Alves. Metodologias de pesquisas pós-críticas ou sobre como fazemos nossas investigações. In: MEYER, Dagmar Estermann, PARAÍSO, Marlucy Alves. Metodologias de pesquisas pós-críticas em educação. Belo Horizonte: Mazza, 2014. p. 17-24., p. 3).

DOCENTES COM DEFICIÊNCIA VISUAL: NARRATIVAS DE VIVÊNCIAS E SENTIMENTOS

O Quadro 1, apresentado a seguir, sintetiza informações sobre os/as docentes que participaram do estudo, partilhando suas histórias, por meio de entrevistas narrativas, realizadas no mês de janeiro de 2021. As informações visam a situar o/a leitor/a acerca do contexto das materialidades empíricas. Foram entrevistados quatro docentes que se identificam com o gênero masculino e três docentes que se identificam com o gênero feminino. Contudo, a fim de preservar a identidade dos/as entrevistados/as, a opção foi por não fazer diferenciação de gênero na apresentação e no destaque dos excertos de falas.

Quadro 1
Docentes participantes da pesquisa

Acessibilidade no trajeto da casa até o espaço de trabalho

Embora não seja regra, parte dos/as professores/as sem deficiência visual, ao sair de casa para o trabalho, assume o volante e o conforto de seus automóveis. Outros, quem sabe, tomam assento no banco do transporte público ou ainda, para os que residem próximo do seu trabalho, deslocam-se caminhando. Esse deslocamento, que parece ser uma atividade simples, pode apresentar barreiras para docentes com deficiência visual. Por esse motivo, os entrevistados foram questionados sobre como fazem para chegar até seus espaços de trabalho.

Para o Docente 1, a acessibilidade no município em que reside no estado do Rio Grande do Sul é complicada, tendo de criar estratégias e memorizar lugares e caminhos no trajeto:

Quando eu descia na parada perto da escola, em frente ao shopping, um local novo, calçada nova, então tem o piso tátil. Ali eu consigo me guiar até a metade do caminho, até chegar nesta tal ponte onde tem a sanga e aí tenho que me virar. Calçada não tem. Então, tem que andar pela rua, pelo cantinho da rua. Tem bueiro, tem um monte de obstáculos. A acessibilidade arquitetônica e urbanística é pouca, tenho que ir sempre criando estratégias (D1).

O Docente 3, por sua vez, conta que mora próximo ao local onde trabalha, mas que não gosta de ir andando pelas calçadas devido a serem danificadas e deparar com carros estacionados sobre elas. Por isso, prefere andar pela rua ou chamar um carro de aplicativo para chegar ou voltar, mas que é relativamengte tranquilo o deslocamento.

Geralmente ando mais pela rua do que pela calçada, não gosto de calçada, porque tem muita calçada com problema. Então, aqui é assim, é tranquilo. Agora, ultimamente, eu estou fazendo uso de aplicativo porque onde eu trabalho, para ir de ônibus, demora muito (D3).

Para chegarem ao trabalho, os docentes dependem de estratégias para driblar a falta de acessibilidade, tais como decorar lugares e caminhos e/ou pegar um carro de aplicativo. Para relembrar os leitores, conforme descrito no quadro de apresentação dos sujeitos entrevistados, somente o Docente 5 não é usuário/a de bengala longa.2 2 Bengala longa é o instrumento que as pessoas com deficiência visual usam para se deslocar pelo espaço. É utilizada à frente do corpo, em movimento de varredura, ou seja, de exploração do espaço.

Seja no trajeto casa/trabalho ou trabalho/casa, pontos de referência fazem a diferença na vida das pessoas com deficiência visual, possibilitando a memorização de caminhos por meio da cinestesia3 3 De acordo com o Dicionário online de português, cinestesia refere-se ao “conjunto de sensações que torna possível perceber os movimentos musculares, causados pelos estímulos do próprio corpo. [...] Do grego kinein, movimentar + aísthesis, sensibilidade + ia. (Disponível em: dicio.com.br. Acesso em 14 jun. 2023) ou da chamada memória tátil cinestésica. Essa forma de perceber os espaços auxilia as pessoas a chegarem aos seus destinos. No trajeto percorrido, tudo vira ponto de referência: quebra-molas, desníveis, buracos, subidas, descidas, rótulas, entre outras possibilidades. Tais referências são percebidas, por exemplo, por meio do corpo que se movimenta sentindo os balanceios do ônibus ou os desníveis da calçada com os pés ou a bengala longa. Dessa forma, o corpo sensível percebe e memoriza os trajetos que lhe são familiares.

Entre os movimentos de luta das pessoas com deficiência, o movimento pela inclusão e acessibilidade tem se consolidado e ganhado força nos últimos tempos. Todavia, o conceito de acessibilidade não se restringe apenas ao piso tátil ou, quando pensamos em pessoas cegas, ao Braille4 4 O Sistema Braille é um codigo universal de leitura tátil e de escrita, usado por pessoas cegas, inventado na França por Louis Braille, um jovem cego. Utilizando seis pontos em relevo, dispostos em duas colunas, possibilita a formacao de 63 combinações para a leitura e a escrita, além dos sinais matemáticos, químicos, fonéticos, informáticos, musicais, de pontuação e demais símbolos utilizados na grafia comum. . Existem vários outros elementos fundamentais para a acessibilidade. Conforme o artigo 3º, inciso I, da Lei Brasileira de Inclusão (BRASIL, 2015BRASIL. Lei 13.146, de 6 de julho de 2015. Institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência). Disponível em: <Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13146.htm >. Acesso em: 15 jun. 2023.
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), a acessibilidade significa

possibilidade e condição de alcance para utilização, com segurança e autonomia, de espaços, mobiliários, equipamentos urbanos, edificações, transportes, informação e comunicação, inclusive seus sistemas e tecnologias, bem como de outros serviços e instalações abertos ao público, de uso público ou privados de uso coletivo, tanto na zona urbana como na rural, por pessoa com deficiência ou com mobilidade reduzida (BRASIL, 2015BRASIL. Lei 13.146, de 6 de julho de 2015. Institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência). Disponível em: <Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13146.htm >. Acesso em: 15 jun. 2023.
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).

Isso evidencia que para haver acessibilidade e inclusão, a singularidade de cada pessoa deve ser considerada. Contudo, vivemos em uma sociedade normatizadora e normalizadora. Ou seja, normas são criadas em cada tempo e é considerado anormal quem não está nos padrões normativos estabelecidos. Nesse sentido, Veiga-Neto e Lopes afirmam o uso da norma como estratégia de dominação e relação de poder, salientando que o modo como as políticas de inclusão vem sendo pensadas e cumpridas no Brasil “parecem ignorar a própria diferença. Assim, ao invés de promoverem uma educação para todos, elas correm o risco de realizar uma inclusão excludente das diferenças” (2007, p. 947). Desse modo, compreende-se que todos estão sob a norma e que ninguém escapa dela. Antes a norma exterminava, segregava, excluía e internava em hospitais e hospícios; agora inclui, muitas vezes, para excluir.

Ser um corpo com deficiência é uma das muitas possibilidades de ser e estar no mundo. Ao encontro disso, os estudiosos do modelo social da deficiência tensionam debates e propõem uma redefinição do significado de habitar um corpo que, por muito tempo, foi entendido como anormal. A normalidade já foi compreendida de diferentes formas: como um padrão biomédico; como ordem produtiva enquadrada nas normas sociais; e como produtora de opressão pelo corpo com variações de funcionamento. Nessa perspectiva, “A deficiência traduz, portanto, a opressão ao corpo com impedimentos: o conceito de corpo deficiente ou pessoa com deficiência devem ser entendidos em termos políticos e não mais estritamente biomédicos” (DINIZ; BARBOSA; SANTOS, 2009DINIZ, Debora; BARBOSA, Lívia; SANTOS, Wederson Rufino dos. Deficiência, direitos humanos e justiça. Sur. Revista Internacional de Direitos Humanos, v. 6, n. 11. 2009, p. 64-77. <https://doi.org/10.1590/S1806-64452009000200004>.
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, p. 97). Isso significa que as verdades acerca da forma de conceituar a deficiência variam de acordo com os movimentos de cada tempo histórico.

Nesse sentido, a Convenção sobre o Direito das Pessoas com Deficiência, em seu artigo 1º, define as pessoas com deficiência como aquelas que têm “impedimentos de natureza física, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade com as demais pessoas” (BRASIL, 2007BRASIL. Presidência da República. Casa Civil. Secretaria Especial dos Direitos Humanos. Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência. Convenção sobre os direitos das pessoas com deficiência. Brasília, DF, set. 2007.). Isso significa que ser pessoa com deficiência vai além do que é definido legalmente: trata-se, sobretudo, de vivenciar diariamente as restrições impostas pelas barreiras sociais que impedem a participação plena na sociedade.

Corroborando tal ótica, as narrativas dos sujeitos entrevistados evidenciaram que os espaços públicos, de maneira geral, não favorecem ou não cumprem o que está na lei, o que acaba mascarando a falta de acessibilidade. Para Lopes e Fabris (2020aLOPES, Maura Corcini; FABRIS, Eli Henn. As políticas de inclusão: movimentos da educação especial à educação inclusiva. In: Inclusão e Educação. Belo Horizonte: AutênticaEditora, 2020a. p. 77 - 113.), embora sejam poucos os números estatísticos acerca de excluídos no Brasil, a exclusão a partir do novo cenário político e das noções de direitos dos sujeitos governados é ampla, pois, ao mesmo tempo que acolhe, impede a participação efetiva de determinados grupos na sociedade.

Lopes e Fabris (2020aLOPES, Maura Corcini; FABRIS, Eli Henn. As políticas de inclusão: movimentos da educação especial à educação inclusiva. In: Inclusão e Educação. Belo Horizonte: AutênticaEditora, 2020a. p. 77 - 113.) caracterizam esse movimento de in/exclusão como duas faces de uma mesma moeda, o que implica ser incluído pelas normas na teoria e excluído na prática pelas mesmas normas. Um exemplo disso está na fala do Docente 4, quando diz que o caminho é complicado, já que os pisos táteis não seguem alguns princípios e expressa, ainda, sua percepção de como deveria ser a acessibilidade nas calçadas:

é uma colcha de retalhos o piso tátil [...] eu acho que fala-se muito das pessoas com deficiência no campo da acessibilidade mas fala-se pouco com as pessoas com deficiência para ver como é que deve funcionar direito isso aí. [...] Acho que o melhor piso tátil que deveria existir era calçada legal, calçada boa, com remoção de barreiras arquitetônicas mais perigosas (D4).

Já na narrativa do Docente 6, ficou em evidência a in/exclusão no momento de escolher sua vaga de trabalho:

Então, nas escolas, os professores geralmente quando são ACT (referindo-se à admissão em caráter temporário), ficam nervosos pelos motivos: como será que é o público-alvo? Com quem será que eu vou lidar? Eu tinha para além desses nervosismos. Meu Deus, será que tem buraco? Será que tem degrau? Será que tem um ponto de ônibus perto? E, muitas vezes, quando se está de frente para a pessoa que tem que escolher vaga, não dá para você ficar fazendo essas mil perguntas, só tem que escolher porque tem mil pessoas atrás de você (D6).

Isso evidencia que o amparo legal concede o direito e a condição para a pessoa com deficiência realizar a prova, seja de concurso público ou de processo seletivo para vagas temporárias, e prevê, também, reserva de vagas para pessoas com deficiência, mas, no espaço de atuação, não fornece a condição digna de trabalho. A escolha de vagas torna-se uma aventura, pois os participantes só descobrirão como é o local e se há acessibilidade experienciando. Nesse caso, as normativas legais enquadram e normalizam, ou seja, colocam o sujeito para dentro do jogo do competitivo do mercado, naturalizando sua presença, que é apaziguada pela falácia de inclusão. Segundo Lopes e Fabris (2020aLOPES, Maura Corcini; FABRIS, Eli Henn. As políticas de inclusão: movimentos da educação especial à educação inclusiva. In: Inclusão e Educação. Belo Horizonte: AutênticaEditora, 2020a. p. 77 - 113., p. 46),

Com o objetivo de normalizar o sujeito ou de naturalizar a sua presença na população entre aqueles que compõem o gradiente social em que participa, o indivíduo, além de ser ‘tratado’ a partir do referencial de normalidade oriundo da norma (normação), é quantificado e mostrado como mais um que está enquadrado em uma zona de normalidade determinada pela noção de inclusão.

O Docente 6 prossegue sua narrativa contando que desistiu de uma vaga de trabalho em São José (SC) devido à falta de acessibilidade. Conta, ainda, que, ao escolher sua vaga, geralmente opta por ir trabalhar de uber (carro chamado por aplicativo) nas primeiras semanas, justamente pelo medo do desconhecido caminho e de chegar atrasado. Após algum tempo, “arrisca-se” a ir de transporte público. Em uma dessas tentativas com o transporte público, acabou torcendo o pé, que ficou preso em um buraco, pois, ao descer do ônibus, precisava percorrer mais um longo trajeto caminhando. O entrevistado narra:

Eu fui explorar, fui de ônibus e aí eu descobri que o ônibus não parava na frente, tinha que andar um bom tanto, acho que era uns cinco a dez minutos, só que não era reto, você tinha que virar, fazer várias curvas. Então, eu sabia que sozinha eu não conseguiria dar conta disso tão facilmente. [...] Enfim, não tinha piso tátil, ficava em uma comunidade periférica e não tinha acessibilidade nenhuma. Tinha bocas de lobo, e aí meu pé ficou preso em uma dessas bocas de lobo. E aí meu corpo foi para frente, meu pé ficou ali preso, eu torci o pé e tive certeza que eu não daria conta. Para alguns profissionais com deficiência, talvez não seja uma barreira muito significativa assim para desistir do trabalho. Mas para mim foi, porque eu ficava pensando: ‘e se estiver chovendo’? Eu já sofria indo para os lugares que eu conhecia, imagina num lugar que eu não conheço. Aí eu tenho que dar um monte de voltas. Eu tinha muito medo de cair, de me machucar, de não ter ninguém do lado para pedir ajuda (D6).

Tendo em vista tais relatos, pode-se afirmar que o corpo com impedimento é discriminado pela falsa acessibilidade e provoca a experiência da desigualdade. Incluir é mais do que acessar a universidade e obter um diploma de graduação ou pós-graduação; é mais do que dar condições de igualdade no momento de realizar a prova; é mais do que estar lá de corpo presente e não ser visto nem entendido; é muito mais do que ser tolerado e integrado. A inclusão extrapola os limites do compreender e alcança a empatia pelo outro.

No dia do acidente supracitado, um colega socorreu o Docente 6. Ambos ganharam carona de uma pessoa que passava pela rua naquele momento e os conduziu à escola. No mesmo dia, o Docente 6 pediu demissão por não suportar a ideia de não ter autonomia para chegar com segurança até o seu local de trabalho.

Diniz; Barbosa; Santos, (2009DINIZ, Debora; BARBOSA, Lívia; SANTOS, Wederson Rufino dos. Deficiência, direitos humanos e justiça. Sur. Revista Internacional de Direitos Humanos, v. 6, n. 11. 2009, p. 64-77. <https://doi.org/10.1590/S1806-64452009000200004>.
https://doi.org/10.1590/S1806-6445200900...
, p. 67) mencionam que, “Quanto maiores forem as barreiras sociais, maiores serão as restrições de participação impostas aos indivíduos com impedimentos corporais”. Ao encontro disso, Pieczkowski e Grapilha (2018PIECZKOWSKI, Tania Mara Zancanaro. GRAPILHA, Jiovana. Desafios e possibilidades no processo de avaliação da aprendizagem de estudantes com deficiência visual na universidade. Revista Educação em Perspectiva. Viçosa, v.9, n.1, p. 215-229, jan./abr. 2018. <https://doi.org/10.22294/eduper/ppge/ufv.v9i1.822>.
https://doi.org/10.22294/eduper/ppge/ufv...
, p. 217), constatam que “o movimento da inclusão, embora bastante comemorado pela perspectiva dos direitos à diferença, também representa inquietações e silenciamentos”. O silenciamento mencionado pelas autoras está retratado no relato do Docente 6, que desistiu de sua vaga de trabalho em razão das barreiras impostas pela falta de acessibilidade, o que gera segregação.

A segregação em forma extrema, é relatada por Dreyfus e Rabinow (2010DREYFUS, Hubert L.; RABINOW, Paul. Michel Foucault: uma trajetória filosófica: para além do estruturalismo e da hermenêutica. Tradução de Vera Portocarrero e Gilda Gomes Carneiro. 2. ed.rev. Rio de Janeiro, Brasil: Forense Universitária, 2010., p. 3-4), ao fazerem referência à Nau dos Loucos (Narrenschiff), descrita por Foucault na obra História da Loucura, afirmando que os loucos “[...] eram embarcados em navios e enviados pelos rios da Europa em busca de sua sanidade. Confinado em sua nave, o louco era ‘um prisioneiro em meio à mais livre e aberta das rotas’”. Segundo Foucault, de todas as naves romanescas ou satíricas da paisagem imaginária da Renascença, composição literária emprestada do velho ciclo dos argonautas, personagens da mitologia grega (Nau dos Príncipes, Nau das Damas Virtuosas, Nau da Saúde, dentre outras), a Nau dos Loucos - Narrenschiff

[...] é a única que teve existência real, pois eles existiram, esses barcos que levavam sua carga insana de uma cidade para outra. Os loucos tinham então uma existência facilmente errante. As cidades escorraçavam-nos de seus muros; deixava-se que corressem pelos campos distantes, quando não eram confiados a grupos de mercadores e peregrinos. (FOUCAULT, 2012FOUCAULT, Michel. História da loucura. Tradução José Teixeira Coelho Neto. São Paulo: Perspectiva, 2012., p. 09).

Nesse tempo e contexto mencionados por Foucault, os considerados anormais tiveram seus direitos negados e foram excluídos e aprisionados. Cotejando fatos, temporalidades e espaços distintos com a atualidade, é possível dizer que a norma constitui a própria Nave dos Loucos. Agora, trata-se de uma Nave Contemporânea que não apresenta a intenção explícita de excluir, matar ou segregar, mas que aprisiona os sujeitos anormais em seu próprio silenciamento frente ao direito à vida, à educação, ao trabalho, à inclusão e à acessibilidade, direitos esses garantidos pela norma. Hoje, a exclusão pode não ser tão explícita, mas acontece de outras formas.

Ainda acerca desse tema, o Docente 7, por sua vez, conta que, em seu trajeto, a acessibilidade é suficiente. No terminal de ônibus, caminha pelo piso tátil e recebe auxílio dos fiscais. Ao desembarcar do transporte, o motorista avisa o momento de atravessar a rua conforme o movimento dos carros. Além disso, seu relato indica que o local sempre tem bastante pessoas e que, quando precisa, também pede ajuda. Diante de tal cenário, cabe questionar: o que é ter acessibilidade suficiente? Será que é andar pela colcha de retalhos que é o piso tátil ou necessitar de ajuda para atravessar a rua por conta da falta de acessibilidade? Embora as normas técnicas de acessibilidade arquitetônica e o modelo de instalação de pisos estejam amparados na NBR 9050, da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNTASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 9050: acessibilidade a edificações, mobiliário, espaços e equipamentos urbanos. ABNT, 2020. Disponível em:<Disponível em:https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/upload/NBR9050_20.pdf >. Acesso em: 15 jun. 2023.
https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/...
), tais previsões legais são insuficientes. As narrativas docentes, na sua maioria, denunciam o que é invisibilizado pela norma: “acessibilidade inacessível”. As normas, apesar de engendradas para dar condição e acesso às pessoas com deficiência - neste caso, a deficiência visual -, não tem o efeito anunciado, assim, impactando negativamente o ir e vir de docentes no trajeto percorrido para chegar aos seus locais de trabalho.

Condições de acessibilidade no espaço de trabalho

Vencido o desafio para chegar até os respectivos espaços de exercício profissional, inicia outro, o de mostrar a possibilidade de ser um professor cego ou com baixa visão. Salientamos que esta pesquisa relata a história de quatro professores cegos e três com baixa visão. Indagados acerca das condições para exercer a docência, inicialmente o Docente 7 conta que em todos os lugares onde atuou deparou com mínima estrutura de acessibilidade. Além disso, relata que geralmente as escolas têm um espaço amplo, o que dificulta a autonomia e faz com que seja necessário ajuda para se deslocar pelo ambiente, exemplificando:

Nesta escola do Estado que eu trabalho, tem três ou quatro pavilhões. Três estão funcionando e um deles é bem distante dos outros, que é bem difícil acessar. Eu trabalhei pouco tempo lá, como eu te falei, por causa da pandemia. Mas era um lugar que eu já tinha percebido que eu iria demorar para entender como funcionava e, se eu precisasse, nossa! Estou lá dando aula, mas esqueci de um material lá na sala dos professores... Eu não iria conseguir sozinho! Ia depender de um estudante... Ia depender de alguém da escola. Enfim, eu iria ter a minha autonomia ali limitada (D7).

A inexistência do piso tátil e a falta do corrimão em escadas são alguns dos problemas mencionados que limitam a autonomia dos/as professores/as no espaço da escola. Ao encontro disso, o Docente 4 afirma:

no ensino regular da escola pública estadual, que é o contexto que eu sempre atuei, não há acessibilidade nenhuma. [...] Eu me adapto, tem escada para subir, mas na escada não tem, na maioria, barra de segurança, o chamado corrimão (D4).

O Docente 3 conta que, na escola onde trabalha, havia o piso tátil emborrachado. Contudo, como o piso começou a se descolar, foi sendo removido a fim de prevenir acidentes mesmo para os videntes, o que limitou a acessibilidade para pessoas com deficiência visual.

Já o Docente 6 narra que, durante um período de sua docência, acompanhou um estudante autista que, certa vez, desceu um pequeno barranco de terra que havia na escola, um barranco que ele desconhecia. A situação gerou desconforto e insegurança para o professor com baixa visão, pois acabou caindo ou, em suas palavras, “levando um balão”:

Então levei um balão. Ele desceu, ficou lá embaixo de boa e eu lá tentando chegar até ele. Aí pedi ajuda para uma aluna do primeiro ano que, gentilmente, me levou até ele. Então, são situações que envolvem, sim, barreiras arquitetônicas, porque eu fiquei muito perdido e nem sabia que tinha um barranco até estar nele. Era um barranquinho, a sorte que era pequeno (D6).

Na perspectiva do Docente 7, a arquitetura das escolas é excludente. Ela é pensada por quem enxerga e para quem enxerga, o que impacta a maneira de trabalhar e de chegar até a sala de aula. Enquanto videntes reconhecem os espaços e ambientes da escola utilizando o sentido da visão, docentes que possuem ausência total ou parcial desse sentido reconhecem os espaços do local de trabalho explorando outras possibilidades de percepção. No caso de docentes com deficiência visual, o corpo torna-se órgão da vista, à medida que o espaço desse corpo sente e percebe as coisas do mundo. Assim, a construção ou o reconhecimento espacial ocorre por meio do corpo. É preciso que os espaços e ambientes que compõem a escola sejam apresentados, sentidos, percebidos e reconhecidos pelo corpo dos/as professores/as que não enxergam, já que, como indicam as narrativas destacadas, estar em determinado espaço não é sinônimo de inclusão.

A norma e a normalização andam juntas, em um jogo de troca constante que se faz necessário para governar. Ao passo que a norma age definindo modelos a serem seguidos, homogeneizando corpos e colocando todos sob o mesmo teto, a normalização parte das diferentes curvas que envolvem os padrões de normalidade. Foucault ressalta que

[...] a norma não se define absolutamente como uma lei natural, mas pelo papel de exigência e de coerção que ela é capaz de exercer em relação aos domínios a que se aplica. Por conseguinte, a norma é portadora de uma pretensão ao poder. A norma não é simplesmemte um princípio, não é nem mesmo um princípo de inteligibilidade; é um elemento a partir do qual certo exercício do poder se acha fundado e legitimado. (2011, p. 43).

As relações de poder que emergem desse jogo incessante buscam o emparelhamento de quem se distancia da curva da normalidade (LOPES; FABRIS, 2020aLOPES, Maura Corcini; FABRIS, Eli Henn. As políticas de inclusão: movimentos da educação especial à educação inclusiva. In: Inclusão e Educação. Belo Horizonte: AutênticaEditora, 2020a. p. 77 - 113.). Ante a impossibilidade de participação em espaços não acessíveis, os professores com deficiência visual tem sua deficiência exposta, ou seja, esse aspecto das suas existências ocupa a centralidade em detrimento do próprio sujeito. Isso configura barreiras atitudinais, conforme relata o Docente 7:

Eu acho que a principal barreira, quando a gente fala de acessibilidade, o que a gente enfrenta, é a barreira atitudinal. É questão de você estar no espaço, mas você sentir que você não pertence àquele espaço.

O Docente 7 acrescenta, também, que a sociedade não reconhece a pessoa cega no papel de profissional, já que a crença de que se trata de um ser frágil e dependente não se extinguiu. Segundo ele,

É que, se não foi em todas as escolas que aconteceu isso, foi em 90% das escolas que eu trabalhei... Alguém - seja o motorista do ônibus, seja o vigilante, seja o pai de um aluno - que, quando eu estou chegando na escola, vem e pergunta: ‘Você está vindo estudar’? As pessoas não enxergam um professor cego de bengala chegando na escola para trabalhar. Eles enxergam um estudante, alguém que precisa ser atendido e não alguém que está ali para atender. Eu acho que começa nessa perspectiva social que a sociedade tem sobre a deficiência: de que a deficiência é sempre alvo de caridade e nunca pode estar numa situação confortável, em uma situação em que a pessoa com deficiência escolha estar (D7).

Nesse sentido, a asserção de Ferre (2001FERRE, Nuria Pérez de Lara. Identidade, diferença e diversidade: manter viva a pergunta. In: LARROSA, Jorge; SKLIAR, Carlos. Habitantes de Babel: políticas e poéticas da diferença. Belo Horizonte: Autêntica, 2001, p. 195-214., p. 196) contribui para a compreensão da narrativa do Docente 7: “Minha identidade me dão os outros, mas eu não sou essa identidade, pois se eles têm de dá-la a mim é porque eu, em mim mesma, por mim mesma, em minha intimidade, não a tenho”. O espelhismo da normalidade e a falta de saber impregnados na sociedade impedem de olhar o outro como pessoa capaz. Quanto mais distante da identidade que os outros dão, mais se distancia dos “Cânones da normalidade” (FERRE, 2001FERRE, Nuria Pérez de Lara. Identidade, diferença e diversidade: manter viva a pergunta. In: LARROSA, Jorge; SKLIAR, Carlos. Habitantes de Babel: políticas e poéticas da diferença. Belo Horizonte: Autêntica, 2001, p. 195-214., p. 196) e mais se perturba.

Isso evidencia que as pessoas com deficiência ainda são vistas pela ótica da benevolência e da caridade, sendo percebidas como incapazes, especiais, coitadas, que não enxergam, que são estranhas, que estão na contramão do ser professor, e não pensadas como pessoas capazes, que podem ser independentes. Assim, a sociedade em torno da comunidade escolar reduz o docente com deficiência visual ao não enxergar. Quem não enxerga não toma posto como detentor de saber, mas como incapaz ou como alguém que precisa de atendimento. Parece que, perante os olhares citados pelo Docente 7, ao professor vidente é atribuída a identidade de pessoa normal e ao docente com deficiência é atribuída a identidade do anormal, do fora da norma.

O Docente 3, por sua vez, afirma que a inclusão é engraçada, porque, quando a pessoa, ou cega ou com baixa visão, ocupa a condição de estudante, é vista e entendida de um lugar de potencialidade, mas, quando graduada, é vista a partir de outro olhar, o da limitação. Contudo, é como formado que o sujeito da inclusão pode ter a chance de ser visto pelo potencial próprio. Fazendo referência à credibilidade profissional, o Docente 3 destaca:

o aluno tem capacidade e potencial, ele vai conseguir; aí o aluno de inclusão chegou na faculdade e terminou o curso. Ali que você vai ver as pessoas que realmente acreditam na inclusão e as pessoas que não acreditam (D3).

Ainda, fazendo referência a barreiras atitudinais, o Docente 7 afirma que encontrou na escola desconfiança em relação às suas capacidades de ser professor, especialmente da parte dos pais e colegas docentes, e menos da parte dos estudantes, os quais se mostram mais confiantes e solidários. Acrescenta:

Tem as pessoas de dentro da escola que desconfiam da possibilidade de você trabalhar sozinho e você trabalhar efetivamente (D7).

Romper com práticas e pensamentos de preconceito e exclusão não é tarefa simples. A todo momento, coloca-se à prova docentes com deficiência: será que é capaz? Será que possui saberes e condições para exercer a docência? As reações de desconfiança parecem dizer que, por ser, ou cego ou com baixa visão, não se trata de uma pessoa digna e capaz de ser professor.

Os elementos narrados até aqui fazem lembrar a perspectiva foucaultiana sobre o corpo e a disciplina. Os espaços mencionados pelo autor como disciplinadores são a prisão, o hospital, a escola, entre outros - espaços e lugares em que as condutas disciplinadoras, o saber e o poder determinam as formas de produção, o funcionamento e a dimensão de uma disciplina que esquadrinha corpos em uma busca constante de normalização, visando a utilidade e eficiência (FOUCAULT, 2013FOUCAULT, Michel. Os corpos dóceis. In. Vigiar e punir. Petrópolis: Vozes, 2013, p. 116-137.). Trazendo essa reflexão para a contemporaneidade, entendemos que o ambiente escolar continua sendo um espaço definido por disciplinamentos específicos, que emanam diferentes saberes e poderes. O poder hierarquiza espaços, condutas e relações de poder, do qual ninguém escapa, nem mesmo os docentes com deficiência visual, que são vigiados pelos olhos da desconfiança e da padronização, os quais insistem em enxergar o docente com deficiência visual pela ótica da caridade, da tolerância e da incapacidade. Trata-se de olhares de desconfiança que, por meio das relações de poder, insultam o professor no exercício da profissão, na denominada inclusão profissional. A esse respeito, Veiga-Neto e Lopes (2007, p. 949) problematizam a inclusão, afirmando que:

[...] ao tratarem a diferença como diversidade, as políticas de inclusão - nos modos como vem sendo formuladas e em parte executadas no Brasil - parecem ignorar a diferença. Com isso, elas defendem a inclusão do diferente, entendendo-o como um ‘único estranho’, um exótico, um portador de algo que os outros, normais, não possuem. Resulta, dessa forma de diferenciar, o paradoxo de silenciar aqueles que ‘já estavam ali’, de reforçar as noções de normalidade e anormalidade, de fazer proliferar e de disseminar as normas e os correlatos saberes especializados, e, até mesmo, de gerar exclusão.

Enquanto as políticas públicas de inclusão forem pensadas para o anormal, o exótico e o estranho, as noções de normalidade e anormalidade estarão presentes governando corpos por meio das relações de poder. Nesse sentido, as políticas pensadas para incluir podem estar colocando o diferente em uma exclusão silenciosa. Nos casos narrados, a inclusão excludente e silenciosa aparece na forma de barreiras arquitetônicas, urbanísticas e atitudinais.

Outro fator narrado pelos docentes sobre a condição de acessibilidade para o exercício da profissão é a acessibilidade pedagógica, que inclui formações e adaptações de materiais para o professor poder exercer a docência. O Docente 2 inicia ressalta que passou do lugar de estudante sem acessibilidade para o lugar de docente sem acessibilidade. Descreve suas participações em encontros de professores para tratar de formação pedagógica, nos quais é discutida a cessibilidade para os estudantes com deficiência. No entanto, nessas ocasiões, não é assegurada a acessibilidade para o professor com deficiência visual que integra o grupo. Relata:

O pessoal usa bastante slides. Então, eu digo que eles pensam na acessibilidade para as crianças, mas não pensam na acessibilidade para o professor. Nas formações é muito slide, com muita imagem, sem descrição.

Porém, afirma que em algumas ocasiões recebe o material da capacitação antecipadamente por email, o que lhe permite o reconhecimento e a participação mais efetiva. Essa narrativa evidencia que algumas atitudes podem propiciar acessibilidade aos docentes com deficiência visual. Em certos casos, basta o conhecimento do que se faz necessário para favorecer o acesso, seja propiciar um formato de texto diferente, realizar a descrição de slides ou disponibilizar o material antecipadamente, ações possíveis mediante diálogos que propiciam o conhecimento da singularidade dos sujeitos.

Já o Docente 3 salienta que recebe o apoio de uma professora que lhe dá suporte no que for necessário, a exemplo da adaptação de materiais pedagógicos, o que lhe possibilita trabalhar com as crianças cálculos de adição e subtração. Destaca:

No material dourado, foi feito uma estrutura de EVA para que eu possa organizar as peças dentro. [...] Isso tudo tem um papel fundamental dessa professora de apoio (D3).

Contudo, a maioria dos docentes entrevistados narrou que busca, por si só, criar condições de trabalho, por meio das adaptações realizadas nos materiais pedagógicos. O Docente 1 relata:

Na biblioteca eu etiquetei todas as estantes com a fita rotuladora em Braille. Então, quando eu quero, eu pego o que preciso.

Ele conta que, para as adaptações funcionarem na biblioteca, espaço em que trabalha, foi necessário realizar combinados com outra docente que trabalha no mesmo local e com as crianças, a fim de que mantenham os livros organizados no mesmo lugar. A organização e os combinados são importantes para que docentes com deficiência visual tenham domínio, autonomia, acesso e condição em seu ambiente de trabalho. Além disso, nem todos os docentes possuem suporte de um auxiliar ou estagiário, como é o caso do Docente 1. E, por não ter suporte de outros olhos, as adaptações e os combinados são importantes para o professor cego exercer a sua profissão com autonomia. Salienta que deseja ter sua capacidade reconhecida e não ser apenas uma pessoa tolerada por atitudes de benevolência.

Duschatzky e Skliar (2001DUSCHATZKY, Silvia; SKLIAR, Carlos. O nome dos outros. Narrando a alteridade na cultura e na educação. In: LARROSA, Jorge; SKLIAR, Carlos. Habitantes de Babel: políticas e poéticas da diferença. Belo Horizonte: Autêntica, 2001, p. 119-138., p. 135) afirmam que “A tolerância debilita as diferenças discursivas e mascara as desigualdades”. Os autores ainda destacam que “A tolerância também é naturalização, indiferença frente ao estranho”. (DUSCHATZKY; SKLIAR, 2001DUSCHATZKY, Silvia; SKLIAR, Carlos. O nome dos outros. Narrando a alteridade na cultura e na educação. In: LARROSA, Jorge; SKLIAR, Carlos. Habitantes de Babel: políticas e poéticas da diferença. Belo Horizonte: Autêntica, 2001, p. 119-138., p. 137). Ou seja, a norma, por meio das políticas de inclusão, busca naturalizar todos os corpos, de modo que aqueles que se distanciam são ignorados e/ou vistos como estranhos. Sob a lógica da norma e da normalização, denomina-se de estranho o ser quando não se conhece sua especificidade e singularidade, rotulando-o como descapacitado, especial e diferente, em contraposição a quem se denomina de igual, nativo ou normal (FERRE, 2001FERRE, Nuria Pérez de Lara. Identidade, diferença e diversidade: manter viva a pergunta. In: LARROSA, Jorge; SKLIAR, Carlos. Habitantes de Babel: políticas e poéticas da diferença. Belo Horizonte: Autêntica, 2001, p. 195-214.).

O estudo apontou que o docente com deficiência visual, ao exercer sua profissão, gera estranhamentos por não se adequar ao que é comum em um professor. Ou será que ser professor na contemporaneidade poderá extrapolar as barreiras do comum e reconhecer as singularidades de um docente com seu próprio jeito de ser e fazer?

Para que aconteça a mediação pedagógica de docentes com deficiência visual, adequações, investimentos, organização e tempo para pensar como fazer e como adaptar o processo de ensino-aprendizagem são elementos necessários. Uma aula conduzida por alguém que não enxerga ou enxerga pouco “demanda a reorganização de metodologias ou de formas tradicionalmente adotadas para conduzir a aula” (PIECZKOWSKI, 2019PIECZKOWSKI, Tania Maria Zancanaro. Mediação pedagógica na relação com universitários com deficiência. Revista Educação, Santa Maria, v. 22, p. 1-21, 2019. ISSN 1984-6444. <http://dx.doi.org/10.5902/1984644428452>.
https://doi.org/10.5902/1984644428452...
, p. 10). Da mesma forma que se pensa em adequação pedagógica para estudantes com deficiência, docentes com deficiência, precisam buscar e receber meios de adequação para mediarem o conhecimento.

Os meios de adequações destacam-se nas narrativas do Docente 2, ao contar que adapta e compra, com recursos próprios, jogos e outros materiais para desenvolver as aulas. Ressalta, também, as vantagens de dispor de uma auxiliar durante as aulas, embora procure não ser dependente dela. Salienta:

Aí eu preciso que ela faça um desenho de círculo, de um quadrado ou de um triângulo [...] preciso colocar o nome deles (referindo-se aos alunos) nas folhas, aí ela coloca. Porque nem sempre se usa uma folha mais grossa. Às vezes é com tinta, aí, se vai colocar o nome em Braille, não vai ficar. Então, às vezes, eu preciso que ela coloque os nomes em tinta (D2).

O Docente 4, por sua vez, menciona que as questões de acessibilidade relacionadas à tecnologia assistiva são de sua própria responsabilidade:

Eu tenho a bengala, tenho uma máquina Braille que é minha mesmo, que é onde eu passo os textos que eu vou utilizar com os alunos, já que trabalho com Filosofia.

Araujo (2011ARAUJO, Enio Gomes. Intervenções de um professor de matemática cego. 2011. Dissertação (mestrado) - Mestrado em ensino de ciências e matemática, Universidade Federal de Sergipe, 2011. Disponível em:<Disponível em:https://docs.google.com/viewer?a=v&pid=sites&srcid=ZGVmYXVsdGRvbWFpbnxjb2xpbWFpZnN8Z3g6YjhhNGJhZTcyMDNlYWZi >. Acesso em: 15 jun. 2023.
https://docs.google.com/viewer?a=v&pid=s...
, p. 11), em sua obra Intervenções de um professor de matemática cego, abre questionamentos oportunos para serem destacados e reformulados a esse respeito: “O que você faria caso perdesse a visão e precisasse ensinar matemática a alguém? O que você faria caso perdesse a visão e precisasse ensinar Filosofia, ou Educação Física, ou Pedagogia, ou ainda Geografia a alguém?” Conforme Araujo (2011ARAUJO, Enio Gomes. Intervenções de um professor de matemática cego. 2011. Dissertação (mestrado) - Mestrado em ensino de ciências e matemática, Universidade Federal de Sergipe, 2011. Disponível em:<Disponível em:https://docs.google.com/viewer?a=v&pid=sites&srcid=ZGVmYXVsdGRvbWFpbnxjb2xpbWFpZnN8Z3g6YjhhNGJhZTcyMDNlYWZi >. Acesso em: 15 jun. 2023.
https://docs.google.com/viewer?a=v&pid=s...
, p. 11), “O que seria feito, em qualquer caso, pode ser chamado inicialmente de um processo de educação inclusiva para deficientes visuais”, um processo nada comum que extrapola as amarras na normalização e requer sensibilidade em relação ao outro, sem rotular ou segregar, mas rompendo padrões e normas que ditam o que é normal e anormal no que concerne às características humanas, para conceder espaço às singularidades. Como afirma o Docente 5, tentar aproximar-se do esperado para que haja aceitação. Segundo o entrevistado,

É uma estratégia que eu sempre adotei. Desde a época de faculdade, sempre tentava fazer coisas mais próximas do normal por causa da deficiência. Além de chegar mais próximo das coisas, tinha como estratégia utilizar cores chamativas nos materiais para conseguir enxergar. Usar arcos ou cones que são com cores chamativas verde-limão, amarelo, cores que eu consiga ver de longe, para poder conseguir dar aula (D5).

Diante desse relato, algumas perguntas são suscitadas. Quem inclui quem? A acessibilidade é para quem? O crescimento e a ampliação de políticas públicas de inclusão e o aumento de estudantes com deficiência na educação superior constituem uma realidade, mesmo que em muitas situações represente uma inclusão excludente. Araujo (2011ARAUJO, Enio Gomes. Intervenções de um professor de matemática cego. 2011. Dissertação (mestrado) - Mestrado em ensino de ciências e matemática, Universidade Federal de Sergipe, 2011. Disponível em:<Disponível em:https://docs.google.com/viewer?a=v&pid=sites&srcid=ZGVmYXVsdGRvbWFpbnxjb2xpbWFpZnN8Z3g6YjhhNGJhZTcyMDNlYWZi >. Acesso em: 15 jun. 2023.
https://docs.google.com/viewer?a=v&pid=s...
) entende que, para a docência exercida por docentes cegos acontecer com autonomia e qualidade, faz-se necessário pensar em diferentes meios e adaptações, mas, para isso, é preciso querer e fazer acontecer.

As adaptações e os meios mencionados pelo autor estão presentes no que escreve Pieczkowski (2019PIECZKOWSKI, Tania Maria Zancanaro. Mediação pedagógica na relação com universitários com deficiência. Revista Educação, Santa Maria, v. 22, p. 1-21, 2019. ISSN 1984-6444. <http://dx.doi.org/10.5902/1984644428452>.
https://doi.org/10.5902/1984644428452...
, p. 6) sobre a mediação no Ensino Superior com estudantes com deficiência quando afirma que “[...] o convívio com a diferença é uma demanda docente e, mais do que meramente conviver, é necessário reconhecer o outro na sua diferença e reinventar a docência”. Embora seja uma seara ainda pouco explorada, ser docente e ter deficiência configura uma realidade contemporânea. O convívio com a diferença é uma demanda de todos e para todos, implicando encontrar possibilidades a partir da diferença. Todavia, para isso, é preciso trocar as lentes e adotar um novo olhar, despido de padrões e de nuances de uma inclusão excludente e capacitista, que dita o normal e que idealiza corpos, comportamentos e jeitos de ser, de fazer, de se movimentar e de ser docente.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esta pesquisa possibilitou ampliar o olhar sensível em relação à outra pessoa, na medida em que apontou determinado tempo e contexto, em que as políticas públicas viabilizadas para garantir a inclusão e acessibilidade podem mascarar a exclusão silenciada. Nesse sentido, a in/exclusão ressaltada mostra que inclusão e acessibilidade no exercício profissional de docentes com deficiência visual são consideradas também desafios políticos e sociais. Evidenciou, também, que falar de exercício profissional de docentes com deficiência visual vai além de abordar questões pedagógicas, exigindo, também, a discussão relacionada ao ir e vir.

Docentes com deficiência visual, ao falarem sobre acessibilidade no exercício da profissão, consideraram aspectos do trajeto de suas residências até o ambiente laboral. Cada docente narrou a acessibilidade do trajeto conforme sua percepção e vivência, entendendo a acessibilidade como insuficiente ou, então, como ausente, mas não impeditiva para chegar ao espaço de atuação profissional. A grande maioria dos sujeitos entrevistados pontuou a escassez da acessibilidade nas vias urbanas.

Narraram, ainda, a falta de acessibilidade nas calçadas ou a ausência das calçadas, o que obriga a memorizar lugares por meio de pontos de referências e criar estratégias para o deslocamento, bem como a depender da ajuda de outras pessoas, a exemplo do motorista do transporte público ou dos fiscais do terminal urbano. Outro ponto evidenciado pelos relatos é a dificuldade no momento de escolher a vaga de trabalho, pois, ao realizar tal escolha, o docente desconhece o caminho e teme os obstáculos e as barreiras que pode encontrar no trajeto, o que pode levar à desistência da vaga de trabalho.

Já no espaço de trabalho, foi possível compreender que, apesar da existência de normas que garantem e regulamentam a acessibilidade, os docentes precisam ser protagonistas da própria inclusão. A maioria retrata a inacessibilidade nos locais de trabalho, mencionando a ausência do piso tátil e a falta de corrimões nas escadas como limitantes para a autonomia individual. Salientam, ainda, que a arquitetura é predominatemente excludente, sendo pensada por quem e para quem enxerga. Nos espaços escolares são ressaltadas as barreiras atitudinais, que ocasionam a percepção de que docentes com deficiência visual são incapazes ou estão presentes no espaço educacional na condição de aluno - no caso, aluno com deficiência. Enquanto a docentes sem deficiência é atribuída a identidade de professor e de pessoa normal que ensina, a docentes com deficiência é atribuída a identidade de anormal e a suspeita da incapacidade de exercer a profissão.

Ademais, a maioria relatou que busca, por si só, criar as condições de trabalho, por meio das adaptações dos materiais pedagógicos. Fica evidente, também, que a compra, com recursos próprios, de jogos e materiais adaptados e a seleção de diferentes formas de adequar material para o trabalho são práticas que fazem parte da docência de quem possui deficiência visual.

O estudo revela, igualmente, que as adaptações organizadas oportunizam maior autonomia para uma prática sem a dependência ou a necessidade de uma pessoa auxiliar. Contudo, foi possível perceber que a presença de auxiliar também constitui uma maneira de oportunizar condição de trabalho, posto que os olhos de quem vê se tornam uma extensão do professor que não enxerga, conferindo suporte ao preparo de materiais pedagógicos, como recorte, desenho, identificação de trabalhos em tinta e adaptações de materiais, assim como à organização dos alunos, quando necessário. Já a acessibilidade tecnológica ou de outros recursos fica a encargo dos próprios professores, que mencionaram fazer uso, durante o espaço/tempo de trabalho, de leitores de tela, da máquina Braille e da bengala longa.

As narrativas destacadas evidenciam, portanto, que estar em determinado espaço de educação como docente não é sinônimo de inclusão, pois, para exercer a docência, são necessários investimentos, adequações, organização e tempo, a fim de pensar sobre como fazer e como adaptar para ensinar. Isso significa que uma aula conduzida por docentes com deficiência visual, seja com cegueira ou com baixa visão, “demanda sensibilidade, planejamento e reorganização” (PIECZKOWSKI, 2019PIECZKOWSKI, Tania Maria Zancanaro. Mediação pedagógica na relação com universitários com deficiência. Revista Educação, Santa Maria, v. 22, p. 1-21, 2019. ISSN 1984-6444. <http://dx.doi.org/10.5902/1984644428452>.
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). Por isso, quando é dada a oportunidade para atuar como docente, sem fornecer as devidas condições de inclusão e acessibilidade, a pessoa com deficiência visual acaba sendo encaixada nos padrões de normalidade, que são delimitados pela norma, inferiorizada e enquadrada “em uma zona de normalidade determinada pela noção de inclusão” (LOPES; FABRIS, 2020bLOPES, Maura Corcini; FABRIS, Eli Henn. Norma, normação, normalização, normatização e normalidade. In: Inclusão e Educação. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2020b. p. 41 - 76., p. 46).

Assim, abordar a deficiência ultrapassa discutir um corpo, gesto ou comportamento, alcançando as restrições provocadas por um sistema de normas, que impede a plena participação de docentes com deficiência e é influenciado diretamente pelas barreiras socialmente impostas. Por outro lado, não se pode negar que movimentos em prol da acessibilidade e da inclusão são crescentes, o que mostra que vivemos um processo de conquistas e melhorias da condição de vida das pessoas com deficiência visual. Tensionar o que está posto não significa ser pessimista, mas evidenciar a complexidade desse processo, especialmente em uma sociedade que normatiza, normaliza, inferioriza e exclui a diferença. Tensionar a inclusão e a acessibilidade de docentes com deficiência visual é extrapolar as amarras da normatização e refletir sobre o lugar da deficiência e sobre o quanto dessa deficiência é resultante da falta de acessibilidade, seja ela arquitetônica, urbanística ou atitudinal, e não propriamente da pessoa.

Por fim, ressaltamos que este artigo não tem a pretensão de apontar respostas certas, generalizantes e definitivas, tampouco de apontar soluções ou encerrar as discussões que recentemente são anunciadas. Com as reflexões aqui expostas, procuramos provocar tensionamentos, na convicção de que é preciso desnaturalizar o que está posto sobre docentes com deficiência visual e seu papel no exercício da docência.

FINANCIAMENTO

Pesquisa financiada pela Universidade Comunitária da Região de Chapecó - Unochapecó; Fundo de Apoio à Manutenção e ao Desenvolvimento da Educação Superior (FUMDES) e Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

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  • 1
    Artigo publicado com financiamento do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq/Brasil para os serviços de edição, diagramação e conversão de XML.
  • 2
    Bengala longa é o instrumento que as pessoas com deficiência visual usam para se deslocar pelo espaço. É utilizada à frente do corpo, em movimento de varredura, ou seja, de exploração do espaço.
  • 3
    De acordo com o Dicionário online de português, cinestesia refere-se ao “conjunto de sensações que torna possível perceber os movimentos musculares, causados pelos estímulos do próprio corpo. [...] Do grego kinein, movimentar + aísthesis, sensibilidade + ia. (Disponível em: dicio.com.br. Acesso em 14 jun. 2023)
  • 4
    O Sistema Braille é um codigo universal de leitura tátil e de escrita, usado por pessoas cegas, inventado na França por Louis Braille, um jovem cego. Utilizando seis pontos em relevo, dispostos em duas colunas, possibilita a formacao de 63 combinações para a leitura e a escrita, além dos sinais matemáticos, químicos, fonéticos, informáticos, musicais, de pontuação e demais símbolos utilizados na grafia comum.

DECLARAÇÃO DE APROVAÇÃO NO COMITÊ DE ÉTICA

  • 6
    O projeto de pesquisa foi aprovado no Comitê de Ética envolvendo seres Humanos, na Universidade Comunitária da Região de Chapecó - Unochapecó , CAAE 39967120.0.0000.0116
  • Artigo publicado com financiamento do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq/Brasil para os serviços de edição, diagramação e conversão de XML.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    15 Jul 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

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