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ENTRE EIXOS: FILOSOFIA NO ENEM A PARTIR DAS ORIENTAÇÕES COMPLEMENTARES AOS PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS (PCN+)

ENTRE LOS EJES: LA COBERTURA FILÓFICA DEL EXAMEN NACIONAL DE EDUCACIÓN SECUNDARIA DE BRASIL (ENEM) EN TÉRMINOS DE LAS DIRECTRICES COMPLEMENTARIAS DE LOS PARÁMETROS CURRICULARES NACIONALES (PCN +)

RESUMO:

Este artigo analisa os eixos temáticos que as Orientações Complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN+) apresentam para a filosofia no ensino médio, de forma a verificar como esses eixos se materializaram em situações-problemas em itens de filosofia ao longo dos vinte anos entre a criação do exame, em 1998, e a publicação da Base Nacional Comum Curricular, em 2018. Para esta pesquisa, foram examinadas as edições do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) entre 1998 e 2018 e identificados 73 itens de Ciências Humanas com temáticas e abordagens compatíveis com o ensino de filosofia nesta etapa. Para cada um desses itens, buscou-se identificar qual aspecto dos PCN+ para a filosofia foi mobilizado, tabulando-se os quantitativos totais para cada um dos elementos acionados dos PCN+ para filosofia ao longo de vinte edições do exame. Por meio de uma análise da evolução de quantitativo e cobertura de itens de filosofia ao longo dessas duas décadas, este artigo ilustra alguns desafios e possibilidades que o exame oferece à implementação de referenciais curriculares. Tal discussão é particularmente importante neste momento em que se pensa na construção de um novo Enem a partir do Novo Ensino Médio e da nova Base Nacional Comum Curricular (BNCC), especialmente considerando a ênfase que os PCN+ e o Enem bem como a BNCC e a lei do Novo Ensino Médio dão a conceitos como integração, interdisciplinaridade e autonomia como forma de superar a fragmentação, seja entre conhecimentos, seja entre sujeitos, seja entre teoria e prática. Ao final, apresentam-se algumas indicações sobre como essas reflexões contribuem para sinalizar pontos de atenção em relação à presença da filosofia no exame, tendo em vista sua iminente reformulação a partir da BNCC.

Palavras-chave:
filosofia no ensino médio; Exame Nacional do Ensino Médio (Enem); referenciais curriculares; Base Nacional Comum Curricular (BNCC); Orientações Complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN+)

RESUMEN:

Este artículo examina cómo los temas propuestos para la filosofía en el nivel secundario por las Directrices Complementarias a los Parámetros Curriculares Nacionales de Brasil se materializaron en preguntas de filosofía en el Examen Nacional de Educación Secundaria de Brasil (Enem). Para hacerlo, se identificaron 73 preguntas de Humanidades en las pruebas Enem entre 1998 y 2018 que contenían principalmente temas filosóficos. Luego, cada una de estas preguntas se clasificó en función de los componentes de los Parámetros PCN+ que movilizaba. Mediante un análisis de la cobertura cuantitativa y cualitativa del componente de filosofía del examen a lo largo de los años, este artículo demuestra algunos desafíos y posibilidades que presentan las pruebas para la implementación del currículo normativo. Esta discusión es particularmente importante en este momento, cuando se está construyendo un nuevo Enem, para ajustarse al Nuevo Currículo de la Escuela Secundaria y al nuevo Núcleo Común Nacional (BNCC), especialmente considerando el énfasis que estos documentos ponen en conceptos como integración, interdisciplinariedad y la autonomía como medio para superar la fragmentación, ya sea entre formas de conocimiento, entre personas, entre teoría y práctica. Para concluir, presento algunas indicaciones sobre cómo estas reflexiones contribuyen a marcar puntos de atención relativos a la presencia continuada de la filosofía en el examen ante su inminente reformulación.

Palabras clave:
filosofía en la escuela secundaria; Examen Nacional de Educación Secundaria de Brasil (Enem); documentos curriculares; Núcleo Común Curricular (BNCC); Directrices Complementarias De Los Parámetros Curriculares Nacionales (PCN+).

ABSTRACT:

This article examines how the themes proposed for philosophy at the high school level by the Complementary Guidelines to the Brazilian National Curricular Parameters (Orientações Complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais - PCN+) were materialized in philosophy questions in Brazilian National High School Exam (Exame Nacional do Ensino Médio - Enem). In order to do so, 73 Humanities questions in the Enem tests betweeen 1998 and 2018 were identified as containing primarily philosophical topics. Then, each of these questions were classified in terms of the components of the PCN+ Parametres which it mobilized. By means of an analysis of the quantititative and qualitative coverage of the philosophy component of the exam through the years, this article illustrates some challenges and possibilities that the tests present to the implementation of curriculum normatives. This discussion is particularly important at this moment, when a new Enem is under construction, to adjust to the New High School Curriculum and the new National Common Core (BNCC), especially considering the emphasis that these documents place on concepts such as integration, interdisciplinarity, and autonomy as means to overcome fragmentation, be it between forms of knowledge, between people, between theory and practice. To conclude, I present a few indications about how these reflections contribute to flag points of attention relative to the continuing presence of philosophy in the exam considering its imminent reformulation.

Keywords:
high school philosophy; Brazilian National High School Exam (Enem); curriculum documents; Brazilian Common Core (BNCC); Complementary Guidelines to the Brazilian National Curriculam Parameters (PCN+)

INTRODUÇÃO

A presença da filosofia no Ensino Médio brasileiro é repleta de idas e vindas (ALVES, 2002ALVES, Dalton J. A Filosofia no Ensino Médio: Ambiguidade e Contradições na LDB. Campinas: Autores Associados, 2002.; GALLO, 2013GALLO, Sílvio. Filosofia e Exame Nacional do Ensino Médio: Desafios e Perspectivas da Avaliação. In: INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS ANÍSIO TEIXEIRA. Avaliações da Educação Básica em Debate: Ensino e Matrizes de Referências das Avaliações em Larga Escala. Brasília: Inep/MEC, 2013, p. 413-429.). Seguindo uma tendência internacional de inclusão de filosofia nas escolas (DROIT, 1995DROIT, Roger-Pol. Philosophy and democracy in the world. Paris: UNESCO, 1995.; GEHRETT, 2000GEHRETT, Christine. Doing philosophy in high school: one teacher’s account. Inquiry, v. 19, n. 2, p. 27-35, 2000. <https://doi.org/10.5840/inquiryctnews200019219>
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; McDONOUGH; BOYD, 2009McDONOUGH, Graham; BOYD, Dwight. Socrates seen in Ontario high schools (and he has not left the building!). Journal of Teaching and Learning, v. 6, n. 1, p. 55-67, 2009. <https://doi.org/10.22329/JTL.V6I1.556>
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) desde a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB, Lei n.º 9.394/96), publicada em 1996 (BRASIL, 1996BRASIL. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 23 dez. 1996.), a oferta de filosofia no ensino médio tem sido preconizada em documentos referenciais como os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), de 1999; as Orientações Educacionais Complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN+), de 2002; as Orientações Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (OCEM), de 2006BRASIL. Lei nº 11.684, de 2 de junho de 2008. Altera o art. 36 da Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir a Filosofia e a Sociologia como disciplinas obrigatórias nos currículos do ensino médio. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 3 jun. 2008.; e a redação dada pela Lei n.º 11.684/08BRASIL. Lei nº 11.684, de 2 de junho de 2008. Altera o art. 36 da Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir a Filosofia e a Sociologia como disciplinas obrigatórias nos currículos do ensino médio. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 3 jun. 2008. à LDB, tornando a filosofia e a sociologia obrigatórias no ensino médio (BRASIL, 1999BRASIL. Ministério da Educação (MEC). Secretaria de Educação Média e Tecnológica (SEMTEC). Parâmetros Curriculares Nacionais para o ensino médio. Brasília, 1999.; 2002BRASIL. Ministério da Educação (MEC). Secretaria de Educação Média e Tecnológica (SEMTEC). Orientações educacionais complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais. Brasília, 2002.; 2006BRASIL. Ministério da Educação (MEC). Orientações curriculares nacionais para o ensino médio: ciências humanas e suas tecnologias. v. 3. Brasília, 2006.; 2008BRASIL. Conselho Nacional de Educação. Resolução CNE/CEB 3/2018. Atualiza as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio. Brasília, 2018b. Disponível em:<Disponível em:https://normativasconselhos.mec.gov.br/normativa/view/CNE_RES_CNECEBN32018.pdf >. Acesso em: 21 nov. 2022.
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). Mais recentemente, a Lei n.º 13.415/2017, que institui o Novo Ensino Médio, retoma a obrigatoriedade da filosofia (BRASIL, 2017BRASIL. Lei nº 13.415, de 16 de fevereiro de 2017. Altera as Leis nºs 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, e 11.494, de 20 de junho 2007, que regulamenta o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação, a Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, e o Decreto-Lei nº 236, de 28 de fevereiro de 1967; revoga a Lei nº 11.161, de 5 de agosto de 2005; e institui a Política de Fomento à Implementação de Escolas de Ensino Médio em Tempo Integral. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 17 fev. 2017.), que havia sido revogada no ano anterior pela Medida Provisória n.º 746/2016 (BRASIL, 2016BRASIL. Medida Provisória nº 746, de 22 de setembro de 2016. Institui a Política de Fomento à Implementação de Escolas de Ensino Médio em Tempo Integral, altera a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, e a Lei nº 11.494 de 20 de junho 2007, que regulamenta o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 23 set. 2016. ), caráter confirmado pela Base Nacional Comum Curricular (BNCC), publicada em dezembro de 2018, que lista a filosofia como integrante da área de Ciências Humanas e Sociais Aplicadas (BRASIL, 2018aBRASIL. Conselho Nacional de Educação. Base Nacional Comum Curricular para o Ensino Médio. Brasília, 2018a., p. 547).

Além de reforçar a obrigatoriedade da filosofia e da sociologia no ensino médio, a Resolução n.º 3/2018 do Conselho Nacional de Educação, por sua vez, estipula em seu artigo 32 que “as matrizes do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) e dos demais processos seletivos para acesso à educação superior deverão necessariamente ser elaboradas em consonância com a Base Nacional Comum Curricular” (BRASIL, 2018bBRASIL. Conselho Nacional de Educação. Resolução CNE/CEB 3/2018. Atualiza as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio. Brasília, 2018b. Disponível em:<Disponível em:https://normativasconselhos.mec.gov.br/normativa/view/CNE_RES_CNECEBN32018.pdf >. Acesso em: 21 nov. 2022.
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, p. 15). Entretanto, conforme argumento neste artigo, historicamente há um descompasso entre a publicação dos referenciais curriculares e a materialização da presença da filosofia em questões do Enem.

Este artigo faz parte de um projeto maior, cujo objetivo foi analisar os itens de filosofia ao longo da história do Enem em termos dos referenciais curriculares publicados desde sua criação em 1998. Esse projeto investigou como traduzir os documentos curriculares produzidos nos últimos anos em termos que pudessem “nortear a presença de conhecimentos de Filosofia nos exames de larga escala, como o Enem e o Encceja” e assim consolidar sua “cidadania curricular” (GALLO, 2013GALLO, Sílvio. Filosofia e Exame Nacional do Ensino Médio: Desafios e Perspectivas da Avaliação. In: INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS ANÍSIO TEIXEIRA. Avaliações da Educação Básica em Debate: Ensino e Matrizes de Referências das Avaliações em Larga Escala. Brasília: Inep/MEC, 2013, p. 413-429., p. 426). O foco deste estudo específico são as Orientações Complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN+), de 2002. Neste artigo, analiso os eixos temáticos que os PCN+ apresentam para a filosofia no ensino médio, de forma a verificar como esses eixos e temas se materializaram em situações-problemas nas questões de Ciências Humanas ao longo da história do Enem. Por meio de uma análise da evolução de quantitativo e cobertura de itens de filosofia ao longo das edições do exame durante vinte anos, este estudo ilustra alguns desafios e possibilidades que o exame oferece à implementação dos referenciais curriculares.

Para esta pesquisa, foram examinadas num primeiro momento as edições do Enem entre 1998 e 2018 e identificados 73 itens de Ciências Humanas com temáticas e abordagens compatíveis com o ensino de filosofia nesta etapa. Em seguida, cada um desses itens foi associado a um dos eixos temáticos propostos pelos PCN+ para a filosofia, bem como a um de seus temas, e, quando possível, subtemas. Todos os 73 itens analisados neste estudo mobilizam pelo menos um tema de filosofia dos PCN+. Em caso de itens que dialogam com mais de um tema, foi escolhido para fins deste estudo o tema considerado predominante. A lista de itens utilizados e sua respectiva classificação em termos dos PCN+ encontra-se no Apêndice 1, no formato ano.item, em que item corresponde à posição da questão no caderno azul daquela edição do exame. Apesar dos PCN+ só terem sido publicados em 2002, a título de comparação, foram incluídos nessa análise, quando apropriado, os itens com temáticas de filosofia aplicados desde a criação do Enem quatro anos que os precedem (1998-2001), num total de nove itens, que são sinalizados em cores mais claras, conforme o caso. Esses itens também são listados em vermelho no Apêndice 1.

Como em estudos anteriores (MACEDO, 2015MACEDO, Ester P. N. Filosofia no Enem: um estudo analítico dos conteúdos relativos à Filosofia ao longo das edições do Enem entre 1998 e 2011. Brasília, DF: Inep, 2015. Disponível em: <Disponível em: https://download.inep.gov.br/publicacoes/diversas/temas_da_educacao_basica/filosofia_no_enem.pdf >. Acesso em: 21 nov. 2022.
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; CARNEIRO, 2015CARNEIRO, Sílvio R. G. O Enem e a leitura de textos filosóficos: análise de alguns parâmetros para a sala de aula. Revista do NESEF Filosofia e Ensino, v. 6, n. 6. p. 26-42, 2015. <http://dx.doi.org/10.5380/nesef.v6i6.54802>
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; RIBEIRO, 2020RIBEIRO, Flávia G. B. A presença e a abordagem da Sociologia no Exame Nacional do Ensino Médio a partir das diretrizes e orientações curriculares oficiais para a disciplina. Dissertação (Mestrado Profissional em Gestão e Avaliação da Educação Pública), Juiz de Fora: Universidade Federal de Juiz de Fora, 2020. Disponível em: <Disponível em: https://repositorio.ufjf.br/jspui/handle/ufjf/11656 >. Acesso em:20 abr. 2021.
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; MACEDO, 2021MACEDO, Ester. P. N. Filosofia no Enem e nas Ocem: lacunas temporais e conceituais. Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 47, 2021. <https://doi.org/10.1590/S1678-4634202147228013>
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; MACEDO, 2022aMACEDO, Ester P. N. Debater para encontrar caminhos: a evolução da presença da filosofia ao longo dos vinte anos do Enem (1998-2018). Pro-Posições, Campinas. 2022a. <https://doi.org/10.1590/1980-6248-2019-0104>
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; MACEDO, 2022bMACEDO, Ester P. N. Filosofia no Enem 1998-2018: panorama 20 anos. Brasília, DF: Inep, 2022b. Disponível em:<Disponível em:http://relatos.inep.gov.br/ojs3/index.php/relatos/article/view/4931 >. Acesso em: 21 nov. 2022.
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), a escolha dos itens para análise foi feita pela autora a partir de sua leitura dos cadernos de prova da aplicação principal do Enem nos vinte anos entre 1998 e 2018 e de sua interpretação subjetiva sobre sua adesão tanto ao campo da filosofia em geral quanto aos eixos, temas e subtemas propostos pelos PCN+ para a filosofia no ensino médio, levando em consideração que tal classificação não é rígida, e sim uma maneira de organizar a discussão em relação as expectativas dos normativos curriculares e sua operacionalização na prática, tal como materializada, por exemplo, na composição do exame. Adaptando essa metodologia para a área de sociologia em sua dissertação intitulada A presença e a abordagem da Sociologia no Exame Nacional do Ensino Médio a partir das diretrizes e orientações curriculares oficiais para a disciplina, a pesquisadora do Inep Flávia Ghignone Braga Ribeiro descreve tal metodologia da seguinte forma:

Considerando os documentos citados, em uma primeira etapa e para identificar a presença da Sociologia no Enem, foi realizada a leitura de todos os cadernos de prova de Ciências Humanas, das edições de 2009 a 2018, e todas as 45 questões de cada caderno foram classificadas considerando as subáreas, Filosofia, Geografia, História e Sociologia. É importante ressaltar que o exame apresenta proposta de abordagem interdisciplinar e contextualizada e assim não prevê quantitativos mínimos ou equitativos ou qualquer distinção entre as subáreas que compõem uma área de conhecimento. Portanto, a classificação realizada neste estudo considera essa premissa, entendendo que todas as questões da prova buscam a interdisciplinaridade, mas que, ainda assim, é possível identificar a contribuição específica das subáreas que compõem a área de conhecimento de Ciências Humanas. Essa classificação foi realizada pela autora, pesquisadora do Inep e componente de equipe pedagógica da diretoria que realiza o exame, a partir de critérios usuais dessas equipes quando demandadas a alguma tarefa com esse teor. (RIBEIRO, 2020RIBEIRO, Flávia G. B. A presença e a abordagem da Sociologia no Exame Nacional do Ensino Médio a partir das diretrizes e orientações curriculares oficiais para a disciplina. Dissertação (Mestrado Profissional em Gestão e Avaliação da Educação Pública), Juiz de Fora: Universidade Federal de Juiz de Fora, 2020. Disponível em: <Disponível em: https://repositorio.ufjf.br/jspui/handle/ufjf/11656 >. Acesso em:20 abr. 2021.
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, p. 22).

A análise apresentada neste artigo é de um diagnóstico de como os itens de filosofia do Enem se adequam ou não à proposta dos PCN+ para esse componente curricular. Ao final, a expectativa é de que mapear os pontos de maior e menor dificuldade de operacionalização contribua para garantir e se possível fortalecer a presença da filosofia no horizonte da iminente reformulação do exame. Para atingir tal objetivo, este artigo se divide em três partes. A primeira tem como foco os PCN+, suas características gerais e as características específicas do componente de filosofia. A segunda parte traz uma análise da adesão dos itens de filosofia do Enem à proposta dos PCN+, a partir de uma análise individualizada de cada eixo temático, bem como de insights trazidos por essa análise eixo a eixo. Ao final, são apresentadas algumas indicações sobre como essas reflexões contribuem para sinalizar pontos de atenção em relação à presença da filosofia no exame, considerando sua iminente reformulação a partir da nova Base Nacional Comum Curricular.

OS PCN+: ENTRE EIXOS, TEMAS E SUBTEMAS

Os PCN+ se apresentam como documento sem valor normativo, voltado à comunidade escolar em geral e aos professores em particular (BRASIL, 2002BRASIL. Ministério da Educação (MEC). Secretaria de Educação Média e Tecnológica (SEMTEC). Orientações educacionais complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais. Brasília, 2002.). Com ênfase no então “novo ensino médio” no contexto das reformas educacionais da década de 1990, os PCN+ preconizavam uma transição de uma concepção de ensino médio preparatório para o vestibular para um ensino médio visto como etapa conclusiva e significativa em si mesma, em que a interdisciplinaridade, a contextualização e a articulação de conhecimentos teriam papel fundamental. O documento postulava como ideal uma escola inserida na vida do aluno, visando uma noção de cidadania plena, focada em valores como realização pessoal, preparação para um trabalho digno e participação social e política ativa (BRASIL, 2002BRASIL. Ministério da Educação (MEC). Secretaria de Educação Média e Tecnológica (SEMTEC). Orientações educacionais complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais. Brasília, 2002.).

O objetivo dos PCN+ era complementar a proposta de competências e habilidades dos PCNs de 1999 com o que eles denominam de conceitos estruturadores. Ir além das competências propostas pelos PCN foi um passo importante, pois como disposto nos próprios PCN+:

Não há receita nem definição única ou universal para as competências, que são qualificações humanas amplas, múltiplas e que não se excluem entre si. Por exemplo, os PCN para o Ensino Médio explicitam três conjuntos de competências: o de comunicar e representar, o de investigar e compreender, assim como o de contextualizar social ou historicamente os conhecimentos. Por sua vez, de forma semelhante mas não idêntica, o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) aponta cinco competências gerais: dominar diferentes linguagens, desde idiomas até representações matemáticas e artísticas; compreender processos, sejam eles sociais, naturais, culturais ou tecnológicos; diagnosticar e enfrentar problemas reais; construir argumentações; e elaborar proposições solidárias. (BRASIL, 2002BRASIL. Ministério da Educação (MEC). Secretaria de Educação Média e Tecnológica (SEMTEC). Orientações educacionais complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais. Brasília, 2002., p. 16, grifos no original).

Nesse ponto, a noção de conceito estruturador traria possibilidades concretas de materialização das competências, de forma a superar a dicotomia entre competência e conteúdo, abrindo possibilidades concretas e dinâmicas1 1 “Conceitos e competências são uma das faces de uma moeda que inexiste sem a outra, na qual estão os conhecimentos. Assim, não há construção/reconstrução de conhecimentos sem a mobilização/desenvolvimento de competências e a construção/reconstrução de conceitos” (BRASIL, 2002, p. 32). . Dentro dessa proposta, os PCN+ acrescentaram algumas sugestões de conteúdo em relação a seu predecessor, na forma do que eles denominam “eixos temáticos”. Para construir tais eixos, foi apresentada uma lista de pré-requisitos:

  • - Os recortes permitem o trabalho contextualizado, ou seja, com questões que se relacionam com o viver em sociedade amplo e/ou particular dos educandos?

  • - Os recortes encerram questões que possam ser permanentemente problematizadas pelos educandos?

  • - Os recortes permitem o trabalho com conhecimentos e questões relacionadas a eles que possam ser apropriadas e transpostas pelo educando para situações novas?

  • - Os recortes permitem o trabalho com questões que envolvem o universo de diferentes sujeitos sociais?

  • - Os recortes permitem o trabalho com diferentes linguagens e diferentes interpretações presentes em diferentes fontes de conhecimento?

  • - Os recortes permitem o trabalho sistemático e, portanto, permanente, com atividades de pesquisa que visem ao desenvolvimento de competências, habilidades e conceitos pelo educando?

  • - Os recortes permitem o trabalho com questões situadas em diferentes épocas e lugares? (BRASIL, 2002BRASIL. Ministério da Educação (MEC). Secretaria de Educação Média e Tecnológica (SEMTEC). Orientações educacionais complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais. Brasília, 2002., p. 38).

Para a filosofia, foram propostos três eixos temáticos: o primeiro, intitulado “Relações de poder e democracia”; o segundo, “A construção do sujeito moral”, versando sobre temas de ética; e o terceiro, “O que é Filosofia”, com questões sobre a natureza da filosofia, com foco em epistemologia e estética. Todos esses três eixos parecem atender os requisitos apresentados no PCN+. Cada um dos três eixos temáticos propostos para os PCN+ para a filosofia foi dividido em três temas, subdivididos mais uma vez em alguns subtemas de caráter exemplificativo. O primeiro eixo, “Relações de poder e democracia”, trouxe como temas: 1) A democracia grega; 2) A democracia contemporânea; e 3) O avesso da democracia. O segundo eixo, “A construção do sujeito moral”, apresentou os temas: 1) Autonomia e liberdade; 2) As formas da alienação moral; e 3) Ética e política. Já o terceiro eixo temático, denominado “O que é Filosofia”, propôs os seguintes temas: 1) Filosofia, mito e senso comum; 2) Filosofia, ciência e tecnocracia; e 3) Filosofia e estética.

Focando em como esses temas se fazem presentes nos 64 itens com temáticas ou abordagens de filosofia desde a publicação dos PCN+, em 2002, obteve-se o Gráfico 1.

Gráfico 1
Quantidade de itens de Ciências Humanas do Enem por eixo e tema de filosofia dos PCN+ (2003-2018)

A análise deste gráfico revela alguns aspectos curiosos em relação à organização proposta pelos PCN+. Entre os temas que compõem cada eixo temático, nota-se uma grande variação em termos de sua representatividade nos itens de Ciências Humanas do Enem. Os temas mais recorrentes foram o III.1, “Filosofia, mito e senso comum”, com 19 itens, seguido pelo tema II.3, “Ética e política”, com 16 itens. Entre os temas menos recorrentes, estão o II.2, “Formas de alienação moral”; e III.3, “Filosofia e estética”, cada um abordado por um item, e apenas de maneira tangencial, como discutiremos abaixo.

Além disso, observa-se que o tema II.3, “Ética e política”, contou com um número maior de itens que todo o eixo I, “Relações de poder e democracia”, com todos seus três temas, todos explicitamente abordando diferentes aspectos da democracia (ou falta dela). Um ponto que surge dessa constatação é a decisão de se colocar temas mais amplos sobre ética e política de um lado e relações de poder e democracia, do outro, em eixos separados e com níveis hierárquicos diferentes. Os PCN+ descrevem a hierarquia entre eixos temáticos, temas e subtemas da seguinte forma:

  • O eixo temático escolhido deve sintetizar uma questão geral central da disciplina que seja significativa para o viver em sociedade e que se relacione com o universo de diferentes sujeitos sociais, em diferentes tempos e lugares.

  • Os temas devem estar relacionados diretamente ao eixo temático que lhes dá origem e sua quantidade pode ser variável.

  • Os subtemas devem estar relacionados diretamente aos temas que lhes dão origem e sua quantidade pode ser variável. (BRASIL, 2002BRASIL. Ministério da Educação (MEC). Secretaria de Educação Média e Tecnológica (SEMTEC). Orientações educacionais complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais. Brasília, 2002., p. 40).

Infelizmente, esse trecho encerra a parte introdutória do documento sem maiores aprofundamentos. O componente de filosofia, por sua vez, não desenvolve esse tópico, ficando muito aquém da proposta dos PCN+ como um todo, e da parte relativa às Ciências Humanas em particular. A seção dedicada à filosofia encerra-se com uma citação longa extraída da introdução dos PCN+, seguida pela tabela com os eixos temáticos, sem maiores orientações, sob o argumento de deixar o profissional livre para criar sua própria organização programática:

As sugestões temáticas que serão apresentadas - derivadas que são dos conceitos estruturadores e das competências sugeridas para a área em geral e para cada disciplina que a compõe em particular - não devem ser entendidas como listas de tópicos que possam ser tomadas por um currículo mínimo, porque é simplesmente uma proposta, nem obrigatória nem única, de uma visão ampla do trabalho em cada disciplina. (BRASIL, 2002BRASIL. Ministério da Educação (MEC). Secretaria de Educação Média e Tecnológica (SEMTEC). Orientações educacionais complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais. Brasília, 2002., p. 14).

Nesse sentido, é importante observar que, no que diz respeito à parte específica de filosofia, ao invés de induzir uma maior presença nos itens do Enem, o contrário parece ter ocorrido. Conforme indicado no Gráfico 2, nos quatro anos entre a criação do Enem, em 1998, e a publicação dos PCN+, em 2002, haviam sido aplicados nove itens de filosofia na prova, com temas e abordagens compatíveis ao que posteriormente os PCN+ organizaram em eixos temáticos. Já nos seis anos seguintes à publicação dos PCN+, em 2003, houve apenas um item de filosofia aplicado na prova, seguidos de cinco edições sem item algum neste campo do conhecimento. Só após a filosofia e a sociologia se tornarem obrigatórias, em 2008, e o exame ser reformulado, em 2009, é que itens de filosofia começaram a ressurgir no exame: primeiro de forma incipiente em 2009, só se estabilizando e consolidando a partir de 2012, dez anos após a publicação dos PCN+ (MACEDO, 2015MACEDO, Ester P. N. Filosofia no Enem: um estudo analítico dos conteúdos relativos à Filosofia ao longo das edições do Enem entre 1998 e 2011. Brasília, DF: Inep, 2015. Disponível em: <Disponível em: https://download.inep.gov.br/publicacoes/diversas/temas_da_educacao_basica/filosofia_no_enem.pdf >. Acesso em: 21 nov. 2022.
https://download.inep.gov.br/publicacoes...
; CARNEIRO, 2015CARNEIRO, Sílvio R. G. O Enem e a leitura de textos filosóficos: análise de alguns parâmetros para a sala de aula. Revista do NESEF Filosofia e Ensino, v. 6, n. 6. p. 26-42, 2015. <http://dx.doi.org/10.5380/nesef.v6i6.54802>
https://doi.org/10.5380/nesef.v6i6.54802...
; RIBEIRO, 2020RIBEIRO, Flávia G. B. A presença e a abordagem da Sociologia no Exame Nacional do Ensino Médio a partir das diretrizes e orientações curriculares oficiais para a disciplina. Dissertação (Mestrado Profissional em Gestão e Avaliação da Educação Pública), Juiz de Fora: Universidade Federal de Juiz de Fora, 2020. Disponível em: <Disponível em: https://repositorio.ufjf.br/jspui/handle/ufjf/11656 >. Acesso em:20 abr. 2021.
https://repositorio.ufjf.br/jspui/handle...
).

Gráfico 2
Distribuição de itens de Ciências Humanas do Enem por eixo de filosofia dos PCN+, ano a ano (1998-2018)

É compreensível que documentos sem efeito normativo não gerassem um efeito indutor imediato na exigência de conteúdos e temáticas de uma disciplina em um momento em que ela não era obrigatória. Contudo, é surpreendente que a publicação de um documento curricular tenha coincidido com a diminuição e mesmo interrupção de cobranças de conteúdos e temáticas que, até certo ponto, estavam sendo abordados no exame. Por mais que não tivessem valor vinculativo, à medida que referenciais curriculares, como os PCN, PCN+ e OCEM, propõem ou organizam possibilidades para o desenvolvimento de conteúdos programáticos no ensino médio, seria esperada uma certa congruência entre sua proposta e o exigido na avaliação em larga escala. Observar a aderência ou a distância entre referencial e avaliação é, portanto, uma forma de refletir sobre seus pressupostos, objetivos e eficácia, bem como sobre o tipo de escola e sociedade que eles buscam construir (DIAS; PINTO, 2019DIAS, Érika; PINTO, Fátima C. F. Educação e Sociedade. Ensaio: avaliação de políticas públicas em educação, v. 27, n. 104, p. 449-455, 2019. <https://doi.org/10.1590/S0104-40362019002701041>
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; POPKEWITZ, 2020POPKEWITZ, Thomas. Estudos curriculares, história do currículo e teoria curricular: a razão da razão. Em Aberto, v. 33, n. 107, p. 47-66, 2020. <https://doi.org/10.24109/2176-6673.emaberto.33i107.4508>
https://doi.org/10.24109/2176-6673.emabe...
).

Esse descompasso suscita algumas perguntas: que fatores explicam essa lacuna entre referencial curricular e sua materialização na avaliação em larga escala? É de se esperar um intervalo dessa ordem para que a BNCC comece a se manifestar no Enem? Até que ponto faz sentido, no ritmo de transformações da sociedade de conhecimento, uma avaliação que só começa a acompanhar o referencial anos depois de sua publicação? É possível reduzir esse descompasso? Agora, mais de duas décadas depois, o que de fato mudou entre o que documentos como o PCN e PCN+ preconizavam e o que temos nas salas de aula e nas avaliações de ensino médio?

Este estudo não visa responder todas essas perguntas, e sim trazer alguns insumos para a reflexão sobre elas, usando os PCN+ e os itens de filosofia do Enem como estudo de caso. A análise que este estudo propõe é utilizar os itens de filosofia do Enem para mapear alguns méritos e limitações da organização dos PCN+ para a área, de forma a oferecer subsídios para um debate análogo em relação à BNCC. Como disposto nos próprios PCN+,

É comum o equívoco que deixa de lado tal discussão sob a alegação de que “temos que ir direto à prática”. Tal condição inexiste, uma vez que toda e qualquer prática é antecedida por um pensar e planejar sobre o que se pretende realizar. (BRASIL, 2002BRASIL. Ministério da Educação (MEC). Secretaria de Educação Média e Tecnológica (SEMTEC). Orientações educacionais complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais. Brasília, 2002., p. 22).

De toda forma, como ambas as seções do documento frisam que os recortes propostos são sugestões abertas para que o profissional da área adeque conforme seu entendimento do campo de conhecimento em si e das características específicas de seu trabalho pedagógico, este estudo faz uso desta prerrogativa. Na próxima seção, são oferecidas algumas reflexões sobre a organização proposta para os PCN+ para a filosofia a partir da distribuição temática dos itens de filosofia do Enem, aprofundando a análise apresentada para cada um dos três eixos temáticos propostos, bem como seus temas e subtemas. O objetivo dessa análise é explorar pontos de contato e lacunas entre teoria e prática na forma de documento curricular e as possibilidades oferecidas pelo exame, de forma a “pensar e planejar sobre o que se pretende realizar” no contexto da nova BNCC, especialmente no que diz respeito à continuidade presença da filosofia no exame.

ANÁLISE A PARTIR DOS EIXOS

Eixo I: Relações de poder e democracia

Dos três eixos temáticos propostos nos PCN+ para a Filosofia, o primeiro, denominado “Relações de poder e democracia”, foi o menos explorado pelos itens de Filosofia do Enem, com quinze itens no total, se levarmos em consideração não só o título do eixo em si, mas também a adesão do item aos seus respectivos temas e subtemas (todos relacionados à democracia, ou ausência dela). Nenhum dos dez itens aplicados nos dez anos entre 1998 e 2008 abordou questões relacionadas especificamente à democracia, embora seja a temática apresentada com maior detalhe nos PCN+. O primeiro item a trabalhar algum dos temas proposto para esse eixo surgiu apenas em 2010, ano seguinte à reformulação do exame, edição que contou com dois itens: o 2010.29, com texto de Paul Valéry, e o 2010.45, com tirinha do cartunista argentino Quino. No total, foram três itens no tema 1, sobre a democracia grega (2014.11, 2014.19 e 2015.28); nove itens no tema 2, sobre democracia contemporânea (2012.07, 2012.09, 2013.22, 2014.14, 2016.24, 2017.49, 2017.64, 2017.84, e 2018.90), e três itens sobre o tema 3, intitulado “O avesso da democracia” (2010.29, 2010.45 e 2013.24).

Uma primeira questão que surge a partir da análise do eixo I é o caráter exemplificativo, e não exaustivo, dos subtemas. Por exemplo, para o tema I.2, “A democracia contemporânea”, foram propostos os seguintes subtemas:

  • Antecedentes:

  • - Montesquieu e a teoria dos três poderes

  • - Rousseau e a soberania do povo

  • O confronto entre as ideias liberais e o socialismo. (BRASIL, 2002BRASIL. Ministério da Educação (MEC). Secretaria de Educação Média e Tecnológica (SEMTEC). Orientações educacionais complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais. Brasília, 2002., p. 52).

Dos nove itens sobre democracia contemporânea aplicados no Enem ao longo dos anos, nenhum se enquadra completamente nas temáticas propostas por esses subtemas. Por um lado, os itens 2012.07 e 2013.22, se aproximam do subtema “Antecedentes: Montesquieu e a teoria dos três poderes”, em virtude da autoria de seus textos-base, mesmo não tratando diretamente sobre os três poderes. Por outro lado, o item 2017.49, sobre a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, poderia configurar como antecedente da democracia contemporânea, mesmo não sendo um dos dois únicos antecedentes listados no documento. Por sua vez, o subtema “Confronto entre ideias liberais e socialismo” não descreve adequadamente nem mesmo a itens que tratam sobre as ideias de Rawls (2017.64), Habermas (2012.09 e 2014.14), Young (2016.24) ou Bobbio (2018.90), que seriam os mais correlatos a essa temática. O ponto de contato mais próximo desses itens seria talvez o subtema “O conceito de cidadania”, não fosse pelo fato de estar subordinado ao tema “O avesso da democracia”, não havendo um tema mais amplo lidando com outros tipos de “relações de poder” neste eixo que não faça referência à democracia, ou sua ausência.

Um segundo ponto levantado pela análise deste eixo, relacionado a esse primeiro, diz respeito portanto à unidade temática entre os eixos propostos. É certo que relações de poder e democracia sintetizam “uma questão geral central da disciplina que seja significativa para o viver em sociedade e que se relacione com o universo de diferentes sujeitos sociais, em diferentes tempos e lugares” (BRASIL, 2002, p. 40). É importante, contudo, observar que dedicar todo um eixo temático dedicado a temas associados à democracia, deixando em separado e subordinado a outro eixo, um tema englobando “Ética e política” não reverteu, por exemplo, em um foco maior em conteúdos relacionados à democracia no Enem.

Essa ausência pode ser atribuída, pelo menos em parte, ao fato da matriz de Ciências Humanas do Enem de 2009 ter uma habilidade específica dedicada ao tema. Esta habilidade é a H24, que exige do respondente “Relacionar cidadania e democracia na organização das sociedades”. Na matriz original do Enem, de 1998, apesar da competência V ter como foco “Recorrer aos conhecimentos desenvolvidos na escola para elaboração de propostas de intervenção solidária na realidade, respeitando os valores humanos e considerando a diversidade sociocultural”, não havia uma habilidade tão específica para o tema da democracia. Nas Orientações Curriculares para o Ensino Médio (BRASIL, 2006BRASIL. Conselho Nacional de Educação. Resolução CNE/CEB 3/2018. Atualiza as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio. Brasília, 2018b. Disponível em:<Disponível em:https://normativasconselhos.mec.gov.br/normativa/view/CNE_RES_CNECEBN32018.pdf >. Acesso em: 21 nov. 2022.
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), a discussão sobre democracia e política só ocorreu nas formas do conteúdo 8) a política antiga; a República de Platão; a Política de Aristóteles; e do conteúdo 28) marxismo e Escola de Frankfurt, o que não faz jus a toda gama de questões possíveis de serem trabalhadas pela filosofia no ensino médio, como ilustradas pelos itens do Enem que associamos nesse estudo ao eixo I dos PCN+ para a filosofia.

Na BNCC, pode-se observar que questões mais ligadas a esse primeiro eixo, bem como a questões sobre diferentes formas de organização política de maneira mais ampla, são contemplados na competência 6 de Ciências Humanas e Sociais Aplicadas: “Participar, pessoal e coletivamente, do debate público de forma consciente e qualificada, respeitando diferentes posições, com vistas a possibilitar escolhas alinhadas ao exercício da cidadania e ao seu projeto de vida, com liberdade, autonomia, consciência crítica e responsabilidade”. Dentre as habilidades associadas a essa competência, destaca-se, em particular, no que diz respeito as temáticas relacionadas ao eixo I dos PCN+, a habilidade EM13CHS603: “Compreender e aplicar conceitos políticos básicos (Estado, poder, formas, sistemas e regimes de governo, soberania etc.) na análise da formação de diferentes países, povos e nações e de suas experiências políticas” (BRASIL, 2018aBRASIL. Conselho Nacional de Educação. Base Nacional Comum Curricular para o Ensino Médio. Brasília, 2018a., p. 565).

Eixo II: A construção do sujeito moral

Desde a publicação dos PCN+, em 2002, até 2018, ano que foi publicada a BNCC, foram aplicados 26 itens compatíveis com este eixo, tendo sido aplicados outros cinco itens em temáticas correlatas entre 1998 e 2001. Foram nove itens no tema 1, “Autonomia e liberdade”, um item no tema dois “Formas de alienação moral e 16 itens no tema 3, “Ética e política”.

No tema 1, “Autonomia e liberdade”, foram propostos três subtemas: “Descentração do indivíduo e o reconhecimento do outro”, “As várias dimensões da liberdade (ética, econômica, política)” e “Liberdade e determinismo”. Dentre esses, o subtema “As várias dimensões da liberdade” foi o mais contemplado, com itens versando sobre liberdade econômica, liberdade civil, liberdade de pensamento, além de questões sobre a felicidade, que podem ser vistas como liberdade ética. O primeiro item neste eixo foi o 2003.48, sobre escravidão em Montesquieu, que mobilizava o tema 1, “Autonomia e liberdade”. Esse foi o único item de filosofia no Enem entre a publicação dos PCN+, em 2002, e a reformulação do exame, em 2009. Itens sobre a importância do pensamento autônomo incluem o 2015.03, com texto de Paulo Freire; o item 2016.2020, com texto de Descartes; e o 2018.66, sobre a defesa da liberdade de pensamento no Iluminismo. Acerca do conceito de eudaimonia, ou felicidade, no sentido de liberdade interior ou autonomia de espírito, temos o item 2013.27, com texto de Aristóteles, os itens 2014.24, e 2018.79, com textos de Epicuro, e o 2016.01, com texto de Schopenhauer.

Já o segundo tema deste eixo, denominado “Formas de alienação moral”, apresentou maior dificuldade de materialização em itens da prova de forma independente do tema anterior. Na visão deste estudo, o item de Ciências Humanas que chegou mais próximo de fazê-lo foi o 2012.02, que trazia um texto de Kant sobre esclarecimento e maioridade moral. Contudo, uma reflexão proporcionada por esse item é sobre até que ponto “Formas de alienação moral” é um tema diferente de “Autonomia do sujeito” ou se, para fins didáticos, não teria sido mais útil considerá-lo um subtema a ele, como sua representação nos itens de filosofia da prova ao longo dos anos parece indicar. Ao se pensar em termos dos dois subtemas propostos para o tema II.2 em busca por outras possibilidades de materialização nos itens de filosofia do exame, observou-se que a questão da alienação moral tende a aparecer de forma secundária a outras. No subtema “As condutas massificadas na sociedade contemporânea”, por exemplo, está o item 2016.15 sobre a questão da ilusão de escolha na contemporaneidade. Esse item, como discutido adiante, foi também o representante mais próximo do tema III.3, “Filosofia e estética”.

O subtema “O individualismo contemporâneo e a recusa do outro”, por sua vez, poderia abarcar o item 2015.35 com texto de Slavoj Žižek sobre alteridade ou alguns dos itens do tema II.3, “Ética e Política” contemplados no subtema “Cidadania: os limites entre o público e o privado”. Exemplos incluem os itens 2010.38 e 2010.44, que traziam trechos de manuais para abordando definições de ética, ou o item 2011.02, que utilizou um texto da Folha de S. Paulo para mobilizar o imperativo categórico de Kant. Nenhum desses itens lida exclusivamente com “Formas de alienação moral”, que pareceu demasiado específico em relação aos outros temas.

No que diz respeito ao eixo II, “Construção do sujeito moral”, nota-se que questões mais relacionadas à ética encontram correspondência, na BNCC, com as habilidades associadas à competência 5 de Ciências Humanas e Sociais Aplicadas: “Reconhecer e combater as diversas formas de desigualdade e violência, adotando princípios éticos, democráticos, inclusivos e solidários, e respeitando os direitos humanos”. As habilidades relacionadas a essa competência 5 expandem as possibilidades ofertadas pelo Enem para essa temática, geralmente circunscritas à habilidade H23 da matriz de 2009, “Analisar a importância dos valores éticos na estruturação política das sociedades”, e à H25, “Identificar estratégias que promovam formas de inclusão social”.

Eixo III: O que é filosofia

Dentre os 23 itens de Ciências Humanas aplicados no Enem desde 2002 que contemplam o eixo III, “O que é Filosofia”, 19 abordam o tema III.1, “Filosofia, mito e senso comum”, sendo esse o tema mais recorrente no exame entre 1998 e 2018, com um total de 20 itens. Nesse tema, por exemplo, temos os itens 2012.28 e o 2016.23, ambos sobre o período pré-socrático, que se adequam bem ao subtema “Mito e Filosofia: o nascimento da filosofia na Grécia”. Já o 2018.49, sobre a atividade filosófica na visão de Merleau-Ponty, dialoga de maneira mais próxima com o subtema “Do senso comum ao pensamento filosófico”.

Foram identificados ainda sete itens que abordavam a teoria do conhecimento, estando assim na transição entre o tema 1 e o tema 2, “Filosofia, ciência e tecnocracia”. Exemplos desses itens incluem o item 2012.30, que comparava as teorias de Descartes e Hume; o item 2013.36, sobre a epistemologia kantiana; o item 2014.29, sobre Galileu Galilei; ou, mais recentemente, o item 2018.89, sobre apropriação do senso comum em modelos científicos. Nesses quatro itens, a questão da superação do senso comum tem tanto ou mais peso quanto as características do método científico em si, motivo pelo qual, para fins deste estudo, eles foram contabilizados como representantes do tema III.1, “Filosofia, mito e senso comum”, mesmo com o desequilíbrio numérico aportado por essa decisão metodológica.

No tema III.2, “Filosofia, ciência e tecnocracia” e seus subtemas, foram contabilizados, portanto, somente os itens lidando explicitamente com a filosofia da ciência. Essa decisão se deveu em parte ao nível de especificidade dos subtemas propostos para esse tema. Por exemplo, na prova de 2013, identificamos o item 31, sobre a visão de natureza e ciência em autores da tradição moderna, como René Descartes e Francis Bacon, que poderia ser visto como representante do subtema “O mito do cientificismo: as concepções reducionistas da ciência”. Na prova de 2014, temos o item 12, sobre clonagem, que trabalha nominalmente o subtema dos PCN+ sobre bioética. Há ainda o item 2016.25, com texto base do filósofo contemporâneo Hans Jonas, que trata sobre a ameaça das tecnologias modernas e a responsabilidade ética com as gerações futuras, sendo um bom representante do subtema “A tecnologia a serviço de objetivos humanos e os riscos da tecnocracia”.

O tema III.3, “Filosofia e estética”, traz à tona algumas limitações do exame em relação à filosofia e em relação à interação entre as áreas do conhecimento. Conforme mencionado na análise do tema II.2, “Formas de alienação moral”, o item 2016.15, com texto de Adorno e Horkheimer, na interface com a sociologia, foi o representante mais próximo desse tema nos primeiros vinte anos do Enem. Todavia, nenhum dos três subtemas propostos para o tema III.3 (“Os diversos tipos de valor”; “A arte como forma de conhecer o mundo”; “Estética e desenvolvimento da sensibilidade e imaginação) parece contemplar tanto a situação-problema do item sobre a escolha como uma ilusão da contemporaneidade quanto o subtema “As condutas massificadas na sociedade contemporânea”, do tema II.2, apesar de a alienação em questão não ser essencialmente moral. Esse é mais um item, portanto, que ilustra a fluidez entre eixos, temas e subtemas propostos pelos PCN+. Em termos da matriz de habilidades do Enem, esse mesmo item contempla a H21, “Identificar o papel dos meios de comunicação na construção da vida social”, sendo também a única vez que essa habilidade é atendida por um item de filosofia no exame período analisado.

Transpondo as temáticas do eixo III, “O que é Filosofia”, para a estrutura da BNCC, nota-se que questões sobre filosofia do conhecimento e da ciência, cerne dos dois primeiros temas desse eixo, encontrariam espaço na competência 1:

Analisar processos políticos, econômicos, sociais, ambientais e culturais nos âmbitos local, regional, nacional e mundial em diferentes tempos, a partir da pluralidade de procedimentos epistemológicos, científicos e tecnológicos, de modo a compreender e posicionar-se criticamente em relação a eles, considerando diferentes pontos de vista e tomando decisões baseadas em argumentos e fontes de natureza científica. (BRASIL, 2018aBRASIL. Conselho Nacional de Educação. Base Nacional Comum Curricular para o Ensino Médio. Brasília, 2018a., p. 559, grifo da autora).

No que diz respeito especificamente às questões relativas ao tema III.3 dos PCN+, “Filosofia e estética”, a competência 1 de Ciências Humanas e Sociais Aplicadas da BNCC oferece algumas possibilidades limitadas, como por exemplo, a habilidade EM13CHS103:

Elaborar hipóteses, selecionar evidências e compor argumentos relativos a processos políticos, econômicos, sociais, ambientais, culturais e epistemológicos, com base na sistematização de dados e informações de diversas naturezas (expressões artísticas, textos filosóficos e sociológicos, documentos históricos e geográficos, gráficos, mapas, tabelas, tradições orais, entre outros). (BRASIL, 2018aBRASIL. Conselho Nacional de Educação. Base Nacional Comum Curricular para o Ensino Médio. Brasília, 2018a., p. 559, grifo da autora).

Contudo, não é claro como uma habilidade como essa pode ser operacionalizada em uma avaliação de larga escala como o Enem, ao menos em seus moldes atuais. No contexto da iminente reformulação do Enem, é importante considerar os espaços que temas como estética podem ser trabalhados, bem como outras formas de expressão dos respondentes e de interação entre as áreas do conhecimento.

DA TEORIA PARA A PRÁTICA: REFLEXÕES SOBRE FILOSOFIA E FRAGMENTAÇÕES NA BNCC

Identificar pontos de partida e obstáculos facilita o desenvolvimento de estratégias e a mobilização de recursos para empreender a construção da nova escola de nível médio - que não há de ser mais um prédio, com professores agentes e com alunos pacientes, mas um projeto de realização humana, recíproca e dinâmica, de alunos e professores, em que o aprendizado esteja próximo das questões reais, apresentadas pela vida comunitária ou pelas circunstâncias econômicas, sociais e ambientais. Mais do que tudo, quando fundada numa prática mais solidária, essa nova escola estará atenta às perspectivas de vida de seus partícipes, ao desenvolvimento de suas competências gerais, de suas habilidades pessoais, de suas preferências culturais. (BRASIL, 2002BRASIL. Ministério da Educação (MEC). Secretaria de Educação Média e Tecnológica (SEMTEC). Orientações educacionais complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais. Brasília, 2002., p. 11-12).

Apesar das lacunas internas presentes no componente de filosofia dos PCN+ e suas tensões com a proposta do documento como um todo, os PCN+ trazem uma proposta a princípio inovadora, principalmente ao trazer elementos para se refletir sobre como superar dicotomias entre competências e conteúdos, prescrição e autonomia profissional. Contudo, como a pedra de Sísifo, a proposta de uma organização curricular que permita trabalho contextualizado e sistemático com questões que possam ser permanentemente problematizadas, envolvendo diferentes sujeitos sociais, em diferentes épocas e lugares, permitindo trabalho com diferentes linguagens, fontes e interpretações parece um ideal recorrente porém sempre inatingível. Um ponto mais geral que vem à tona nessa análise, portanto, diz respeito à diversas maneiras em que a dicotomia teoria/prática se apresenta nesse contexto, seja em relação a como o que se prescreve no documento curricular se materializa no exame, seja no que diz respeito ao distanciamento entre o que os PCN+ prescrevem de maneira geral e como a filosofia aparece encastelada dentro dessa mesma prescrição, entre muitos outros aspectos.

Embora a filosofia apareça na Base nem tão isolada como nos PCN+, nem tão diluída como na matriz de Ciências Humanas do Enem, há de se pensar em como e se haverá interação entre as quatro grandes áreas do conhecimento em geral e, em particular, como nutrir espaços no exame para questões envolvendo temáticas interdisciplinares, como estética e filosofia da ciência. Não é claro, porém, se o Enem caminha nessa direção nesse cenário pós-BNCC. De acordo com o parágrafo 1º do artigo 32 da Resolução n.º 3/2018 do Conselho Nacional de Educação:

O Exame Nacional do Ensino Médio será realizado em duas etapas, onde a primeira terá como referência a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e a segunda, o disposto nos Referenciais para a Elaboração dos Itinerários Formativos. (BRASIL, 2018bBRASIL. Conselho Nacional de Educação. Resolução CNE/CEB 3/2018. Atualiza as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio. Brasília, 2018b. Disponível em:<Disponível em:https://normativasconselhos.mec.gov.br/normativa/view/CNE_RES_CNECEBN32018.pdf >. Acesso em: 21 nov. 2022.
https://normativasconselhos.mec.gov.br/n...
, p. 15).

A proposta para o Enem nesse contexto pós-BNCC, portanto, amplia tanto o número de etapas quanto o grau de especialização. Como essa proposta será consolidada, todavia, permanece até o momento indefinido.

Ao contrário dos PCN+, não há na BNCC uma seção específica para a filosofia: a Base se atém à organização por grandes áreas do conhecimento, não detalhando as disciplinas que compõe essas áreas da maneira de seus predecessores. Ainda assim, é possível vislumbrar nas competências e habilidades de Ciências Humanas e Sociais Aplicadas da BNCC alguns espaços próprios para a filosofia, que precisarão receber bastante atenção a fim de que ela mantenha sua presença no exame. Nesta seção, discute-se brevemente como os pontos levantados neste artigo em relação à correspondência entre os itens de filosofia no Enem e os eixos temáticos dos PCN+ reverberam em relação a como a filosofia se faz presente na BNCC, delineando-se pontos que demandam maior atenção.

Tomando como ponto de partida a temática do primeiro eixo do PCN+, do ponto de vista deste estudo, é de fundamental importância demarcar um espaço específico para a democracia, não só no documento curricular, mas na própria matriz do exame. Para fins de comparação, conforme apontado acima, nenhum dos nove itens de filosofia aplicados antes da publicação dos PCN+ lidava com temas sobre democracia. Essa temática só começou a aparecer em 2010, após a reformulação da matriz. Por outro lado, uma razão para que o tema II.3, “Ética e política”, tenha sido contemplado por tantos itens no exame pode ser atribuída ao fato de ele reunir duas áreas centrais da filosofia, que encontraram no exame algumas habilidades correlacionadas (especialmente a H12, a H23 e a H25).

Talvez se houvesse nos PCN+ um eixo em separado para cada uma dessas áreas (ética e política), a distribuição dos itens do exame em termos desses eixos tivesse sido mais equilibrada. Mais do que um puro equilíbrio numérico, tal reorganização cobriria uma lacuna do eixo I, ao permitir uma discussão mais profunda sobre a democracia a partir do tratamento de outros temas de filosofia política. O primeiro eixo poderia, assim, ter sido mais amplo, de forma a abrir espaço para tratar questões de filosofia política que não são estritamente sobre democracia, embora não seja necessariamente seu avesso. Poderia se ter aproveitado a oportunidade para incluir também no escopo do eixo “Relações de poder e democracia” diferentes formas de governo ou de constitucionalidades. Tal debate teria tornado o eixo mais rico, e não necessariamente o tornaria mais acadêmico ou mais distante da proposta do documento, ao mesmo tempo que abriria maior espaço para o tratamento de temáticas não só da política, quanto da própria ética, no eixo que lhe diz respeito.

Em todo caso, um ponto importante que emerge dessa análise, em que uma área super-representada no referencial curricular é sub-representada no exame, e vice-versa, é que nem sempre o que é prescrito no referencial curricular se materializa de forma proporcional no Enem. Para tanto, é fundamental que as temáticas-chave da área também estejam presentes de forma equilibrada e congruente nas habilidades e competências da matriz de referência do exame.

Em relação a como esse tópico se relaciona com o espaço dedicado à filosofia na BNCC, vale destacar dois pontos. Primeiro, as competências e habilidades de Ciências Humanas na base são organizadas de forma a haver uma competência mais voltada à ética e outra à política. Os temas de ética encontram espaço especial na competência 5 - “Reconhecer e combater as diversas formas de desigualdade e violência, adotando princípios éticos, democráticos, inclusivos e solidários, e respeitando os direitos humanos”. Já os temas de filosofia política podem ser trabalhados na competência 6 - “Participar, pessoal e coletivamente, do debate público de forma consciente e qualificada, respeitando diferentes posições, com vistas a possibilitar escolhas alinhadas ao exercício da cidadania e ao seu projeto de vida, com liberdade, autonomia, consciência crítica e responsabilidade”. Nesta competência, há uma habilidade específica para tratar conceitos políticos básicos, que, na visão deste estudo, é essencial para compreender a democracia. A habilidade em questão é a EM13CHS603 - “Compreender e aplicar conceitos políticos básicos (Estado, poder, formas, sistemas e regimes de governo, soberania etc.) na análise da formação de diferentes países, povos e nações e de suas experiências políticas.” Referência explícita à democracia aparece na competência 5, dedicada à ética, por mais que permeie as duas competências. Tal organização reforça a fluidez e imbricamento desses tópicos, sendo qualquer tentativa de separá-los meramente pragmática, no sentido de garantir uma cobertura equilibrada de seus diferentes aspectos.

A análise dos temas do eixo II, “A construção do sujeito moral”, acrescenta outros dois aspectos para a reflexão nesse contexto. O primeiro diz respeito à fluidez conceitual entre temas dentro do mesmo eixo temático, como exemplificado pela tênue linha que separa (ou não) o tema II.1, “Autonomia do sujeito”, do tema II.2, “Formas de alienação moral”. Outro ponto mais amplo evidenciado pela análise deste tema é a questão da autonomia em si, seja como parte do estudo de filosofia no que diz respeito à autonomia dos sujeitos, seja de forma mais ampla, como concretização dos princípios curriculares na prática pedagógica. Tanto em termo de conteúdo, como em termos formais, esse eixo traz à tona aspectos associados à integração/fragmentação, tanto nos conceitos e sujeitos envolvidos, seja como o documento materializa tensões entre teoria e prática no debate acerca de sua implementação.

Conforme mencionado anteriormente, os PCN+ tinham caráter meramente sugestivo ou ilustrativo, apoiando-se no princípio de autonomia docente. Todavia, ao contrário dos PCN+, a BNCC tem caráter normativo, e isso traz alguns desafios no sentido de como preservar a autonomia docente e das redes (ALVES, 2014ALVES, Nilda. Sobre a possibilidade e a necessidade curricular de uma Base Nacional Comum. Revista e-Curriculum, v. 12, n. 03, p. 1464-1479, 2014. <https://revistas.pucsp.br/index.php/curriculum/article/view/21664/15948>
https://revistas.pucsp.br/index.php/curr...
; FERREIRA; ABREU; LOUZADA-SILVA, 2020FERREIRA, Fernando. W. ABREU, Richard J. L.; LOUZADA-SILVA, Daniel. Desafios da articulação entre o novo ensino médio e a BNCC: o caso do Distrito Federal. Em Aberto, v. 33, n. 107, p. 215-224, 2020. <https://doi.org/10.24109/2176-6673.emaberto.33i107.4527>
https://doi.org/10.24109/2176-6673.emabe...
; GARCIA; FERREIRA; MARSICO, 2020GARCIA, Maria M. A.; FERREIRA, Márcia S.; MARSICO, Juliana. O comum e a qualidade nos currículos do ensino e da formação de professores. Em Aberto, v. 33, n. 107, p. 203-214, 2020. <https://doi.org/10.24109/2176-6673.emaberto.33i107.4548>
https://doi.org/10.24109/2176-6673.emabe...
; SANTOS; FERREIRA, 2020SANTOS, André V. F.; FERREIRA, Márcia S. BNCC: múltiplas posições e olhares para pensar a qualidade da educação e a autonomia docente. Em Aberto, v. 33, n. 107, p. 27-42, 2020. <https://doi.org/10.24109/2176-6673.emaberto.33i107.4551>
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; SILVA, 2020SILVA, Francisco. O nacional e o comum no ensino médio: autonomia docente na organização do trabalho pedagógico. Em Aberto, v. 33, n. 107, p. 155-172, 2020. <https://doi.org/10.24109/2176-6673.emaberto.33i107.4489>
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; SÜSSEKIND; MASKE, 2020SÜSSEKIND, Maria Luiza; MASKE, Jeferson. “Pendurando roupas nos varais”: Base Nacional Comum Curricular, trabalho docente e qualidade. Em Aberto, v. 33, n. 107, p. 155-172, 2020. <https://doi.org/10.24109/2176-6673.emaberto.33i107.4532>
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), bem como do papel do exame nessa organização. Embora estejam presentes na BNCC menções sobre a democracia, autonomia e epistemologia, importantes no ensino médio e no exame, é importante considerar os limites desse normativo para assim construir possibilidades que permitam uma visão mais integrada e holística do exame, do ensino médio, da filosofia e da sociedade (PEDRO; MARSICO, 2020PEDRO, Gabriel; MARSICO, Juliana. Explorando os limites epistemológicos e políticos da BNCC para pensar possibilidades. Em Aberto, v. 33, n. 107, p. 225-232, 2020. <https://doi.org/10.24109/2176-6673.emaberto.33i107.4524>
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; SIEGEL, 2008SIEGEL, Harvey. Why teach epistemology in schools. In: HAND, Michel; WINSTANLEY, Carrie (Orgs.). Philosophy in schools. New York: Continuum International, 2008. p. 78-84.; MILLS, 1998MILLS, Charles W. Alternative epistemologies. In: ALCOFF, Linda Martin (Org.). Epistemology: the big questions. Malden: Blackwell, 1998. p. 392-410.; MARTIN, 2001MARTIN, Jane R. Becoming educated: A journey of alienation or integration? In: HARE, William; PORTELLI, John (Orgs.). Philosophy of education: Introductory readings. Calgary, Alberta: Detselig Enterprises, 2001, p. 69-82.; SHARP, 1994SHARP, Ann M. Introduction. Thinking: The Journal of Philosophy for Children, v. 11, n. 3-4, p. 5-9, 1994. <https://doi.org/10.5840/thinking19941131>
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; COLLADO-RUANO et al., 2018COLLADO-RUANO, Javier et al. Educación transdisciplinar: formando em competências para el buen vivir. Ensaio: avaliação de políticas públicas em educação, v. 26, n. 100, p. 619-644, 2018. <https://doi.org/10.1590/S0104-40362018002601487>
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). Para tanto, é essencial um diálogo mais ampliado entre as esferas da administração, das comunidades acadêmicas e escolares.

O eixo III, “O que é Filosofia”, por sua vez, oferece ótima oportunidade para refletir sobre a questão de fluidez não só entre os eixos, temas e subtemas de filosofia dos PCN+, como também dentro da área de Ciências Humanas e entre as diferentes áreas do conhecimento. Uma questão importante aqui é até que ponto as áreas do exame poderiam/deveriam ser mais fluidas, mais conjuntas, mais interdisciplinares, como preconizadas nos PCN+:

Desde há muito tempo, a escola estrutura seu conteúdo programático em torno do ensino das diversas disciplinas, muitas vezes de maneira enciclopédica, tentando dar conta da avalanche de conhecimentos. Além da perversa ênfase no conteúdo, essas inúmeras disciplinas permanecem estanques em seus territórios, levando a uma aprendizagem fragmentada da realidade. (BRASIL, 2002BRASIL. Ministério da Educação (MEC). Secretaria de Educação Média e Tecnológica (SEMTEC). Orientações educacionais complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais. Brasília, 2002., p. 49).

Enquanto os temas III.1, “Do senso comum ao pensamento filosófico” e o III.2, “Filosofia, ciência e tecnocracia”, trazem reflexões sobre a intersecção entre filosofia e ciência, uma limitação do Enem iluminada pelo tema III.3, “Filosofia e estética” é a falta de espaço para questões de estética na matriz de Ciências Humanas do exame. Essa temática é tratada no Enem somente na matriz de Linguagem e Códigos e suas Tecnologias, como parte do rol de habilidades da competência 4:

Competência de área 4 - Compreender a arte como saber cultural e estético gerador de significação e integrador da organização do mundo e da própria identidade. H12 - Reconhecer diferentes funções da arte, do trabalho da produção dos artistas em seus meios culturais. H13 - Analisar as diversas produções artísticas como meio de explicar diferentes culturas, padrões de beleza e preconceitos. H14 - Reconhecer o valor da diversidade artística e das inter-relações de elementos que se apresentam nas manifestações de vários grupos sociais e étnicos. (BRASIL, 2009BRASIL. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep). Matrizes de Referências do Enem. v. 4. Brasília, DF: Inep, 2009. Disponível em:<Disponível em:https://download.inep.gov.br/download/enem/matriz_referencia.pdf >. Acesso em 21 nov. 2022.
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, p. 3).

Nesse aspecto, a BNCC acompanha a matriz atual do Enem no sentido de pregar a interdisciplinaridade, ao mesmo tempo que mantém quatro áreas do conhecimento distintas: Linguagens e suas Tecnologias, Matemática e suas Tecnologias, Ciências da Natureza e suas Tecnologias, Ciências Humanas e Sociais Aplicadas. Na BNCC, como na matriz atual do Enem, temas do âmbito da estética também permanecem no âmbito de Linguagens e suas Tecnologias.

Considerando que, de acordo com as Diretrizes Curriculares Nacionais, de 1998, que norteiam os PCNs, os PCN+ e, de certa maneira, ainda reverberam na BNCC, “a identidade autônoma se constitui da ética, da estética e da política” (BRASIL, 1998BRASIL. Conselho Nacional de Educação. Base Nacional Comum Curricular para o Ensino Médio. Brasília, 2018a., p. 67), é importante pensar como esses princípios podem ser fortalecidos no ensino médio e no exame. Em particular, esses instrumentos pregam integração em vários níveis, seja entre conhecimentos (valorizando a interdisciplinaridade), seja entre sujeitos, valorizando o protagonismo e a autonomia (seja dos jovens estudantes, dos professores ou dos gestores das redes), seja entre esferas (federal, local, escolar ou acadêmica). Uma vez que esses instrumentos têm origens e aspectos em comum, as lacunas entre PCN+ e Enem podem , por sua vez, continuar a repercutir na relação ainda a ser construída entre BNCC e novo Enem.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Logo no início do documento, os PCN+ trazem a seguinte reflexão:

As reformas educacionais tiveram início há pouco mais de meia década e pode ser que leve mais uma década para promover as transformações pretendidas, em escala nacional. Mas já se percebem experiências importantes em muitas escolas brasileiras, que desenvolvem novos projetos pedagógicos e novas práticas educacionais, nas quais leituras, investigações, discussões e projetos, realizados por alunos, superam ou complementam a didática da transmissão e a pedagogia do discurso. (BRASIL, 2002BRASIL. Ministério da Educação (MEC). Secretaria de Educação Média e Tecnológica (SEMTEC). Orientações educacionais complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais. Brasília, 2002., p. 12).

Mais de vinte anos após as reformas mencionadas pelos PCN+, observa-se que, permanecem os mesmos discursos, porém muito ainda há de ser realizado em termos de uma educação que supere a rigidez do encastelamento dos saberes para uma proposta mais integrada, contextualizada e articulada com a sociedade na qual a escola está inserida. Os PCN+ trazem elementos que ainda hoje contribuem para o debate, tanto para pensar que escola queremos, quanto para refletir como a filosofia no ensino médio contribui para esse objetivo.

Neste artigo, explorou-se como os eixos temáticos de filosofia propostos pelos PCN+ foram abordados ao longo dos anos nas questões de Ciências Humanas do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Por meio de uma análise da maior ou menor recorrência de cada um dos eixos temáticos, temas e subtemas propostos, assim como a fluidez dessa organização, pontuou-se a distância entre o prescrito no referencial curricular e o operacionalizado na avaliação em larga escala. Tal discussão é particularmente importante neste momento em que se pensa na construção de um novo Enem a partir da nova Base Nacional Comum Curricular, especialmente considerando a ênfase que tais documentos dão a conceitos como integração, interdisciplinaridade e autonomia com forma de superar a fragmentação, seja entre conhecimentos, seja entre sujeitos, seja entre teorias e práticas educacionais.

As lacunas sinalizadas apontam alguns aspectos importantes a serem considerados nesse momento crítico em que não só a legislação, mas também uma crise sanitária e humanitária em nível global nos força a repensar o ensino médio e o papel do Enem nele. Mais do que nunca, é necessário se pensar na escola, no exame e no ensino de filosofia nessa etapa de maneira mais interdisciplinar e integrada com o contexto maior da sociedade. Dado que a BNCC compartilha com os PCNs e com os PCN+ muitos de seus princípios e valores (AGUIAR; TUTTMAN, 2020AGUIAR, Márcia; TUTTMAN, Malvina. O nacional e o comum no ensino médio: autonomia docente na organização do trabalho pedagógico. Em Aberto, v. 33, n. 107, p. 95-112, 2020. <https://doi.org/10.24109/2176-6673.emaberto.33i107.4533>
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; CASTRO, 2020CASTRO, Maria H. G. Breve histórico do processo de elaboração da Base Nacional Comum Curricular no Brasil. Em Aberto, v. 33, n. 107, p. 95-112, 2020. <https://doi.org/10.24109/2176-6673.emaberto.33i107.4530>
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), refletir sobre como esses dispositivos se materializaram no exame nas últimas décadas pode contribuir para o debate sobre teoria e prática no contexto da reformulação do Enem a partir da BNCC em vários aspectos, em particular no que diz respeito à presença da filosofia no exame e ao debate mais amplo que tal discussão pressupõe.

REFERÊNCIAS

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  • 1
    “Conceitos e competências são uma das faces de uma moeda que inexiste sem a outra, na qual estão os conhecimentos. Assim, não há construção/reconstrução de conhecimentos sem a mobilização/desenvolvimento de competências e a construção/reconstrução de conceitos” (BRASIL, 2002, p. 32).

APÊNDICE 1


Fonte: Elaboração própria.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    05 Jan 2024
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    22 Set 2021
  • Aceito
    26 Jun 2022
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