Acessibilidade / Reportar erro

Avaliação do risco cardiovascular de indivíduos portadores de hipertensão arterial de uma unidade pública de saúde

Resumos

OBJETIVO: Identificar o risco cardiovascular, por meio do escore de risco de Framinghan, em uma amostra de hipertensos de uma unidade pública de saúde. MÉTODOS: A casuística foi constituída por hipertensos, segundo critérios do JNC VII, 2003, de 2003, dentre 1.601 acompanhados no ano de 1999 no Ambulatório de Cardiologia e Hipertensão Arterial do Centro Saúde Escola da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo. Os pacientes foram selecionados por sorteio, com idade acima de 20 anos, ambos os gêneros, excluindo-se as gestantes. Tratou-se de estudo observacional descritivo e transversal. Utilizou-se o Escore de Risco de Framinghan para estratificação do risco cardiovascular para desenvolvimento de doença arterial coronária (morte ou infarto agudo do miocárdio - não fatal). RESULTADOS: A idade variou de 27 a 79 anos ( <img src="/img/revistas/eins/v10n1/carx.jpg" align="absmiddle" > ou = 63,2 ± 9,58). Dos 382 indivíduos estudados, 270 (70,7%) eram mulheres e 139 (36,4%) foram caracterizados como de alto risco cardiovascular por apresentarem diabetes mellitus, aterosclerose documentada por evento ou procedimento. Dos 243 estratificados, 127 (52,3%) apresentaram HDL-C < 50 mg/dL; 210 (86,4%) apresentaram pressão arterial sistólica > 120 mmHg; 46 (18,9%) eram fumantes; 33 (13,6%) eram de alto risco cardiovascular - que somados aos 139 incluídos diretamente como alto risco cardiovascular, totalizaram 172 (45%); 77 (20,2%) eram de médio risco cardiovascular e 133 (34,8%) de baixo risco. O maior percentual de indivíduos de alto risco cardiovascular situou-se acima 70 anos; de médio risco, acima de 60 anos; e de baixo risco entre 50 e 69 anos. CONCLUSÃO: O número significativo de indivíduos de alto e médio risco cardiovascular indica a necessidade de um acompanhamento mais próximo dos mesmos.

Hipertensão; Doenças cardiovasculares; Dislipidemias, hipercolesterolemia; Tabagismo, prevenção primária; Medição de risco; Centros de saúde


OBJECTIVE: To assess the cardiovascular risk, using the Framingham risk score, in a sample of hypertensive individuals coming from a public primary care unit. METHODS: The caseload comprised hypertensive individuals according to criteria established by the JNC VII, 2003, of 2003, among 1601 patients followed up in 1999, at the Cardiology and Arterial Hypertension Outpatients Clinic of the Teaching Primary Care Unit, at the Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo. The patients were selected by draw, aged over 20 years, both genders, excluding pregnant women. It was a descriptive, cross-sectional, observational study. The Framingham risk score was used to stratify cardiovascular risk of developing coronary artery disease (death or non-fatal acute myocardial infarction). RESULTS: Age range of 27-79 years (<img src="/img/revistas/eins/v10n1/carx.jpg" align="absmiddle"> = 63.2 ± 9.58). Out of 382 individuals studied, 270 (70.7%) were female and 139 (36.4%) were characterized as high cardiovascular risk for presenting diabetes mellitus, atherosclerosis documented by event or procedure. Out of 243 stratified patients, 127 (52.3%) had HDL-C < 50 mg/dL; 210 (86.4%) had systolic blood pressure > 120 mmHg; 46 (18.9%) were smokers; 33 (13.6%) had a high cardiovascular risk. Those added to 139 enrolled directly as high cardiovascular risk, totaled up 172 (45%); 77 (20.2%) of medium cardiovascular risk and 133 (34.8%) of low risk. The highest percentage of high cardiovascular risk individuals was aged over 70 years; those of medium risk were aged over 60 years; and the low risk patients were aged 50 to 69 years. CONCLUSION: The significant number of high and medium cardiovascular risk individuals indicates the need to closely follow them up.

Hypertension; Cardiovascular diseases; Dyslipidemias; Hypercholesterolemia; Smoking; Primary prevention; Risk assessment; Health centers


ARTIGO ORIGINAL

IFaculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo - USP, Ribeirão Preto (SP), Brasil

IICurso Acadêmico da Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo - USP, Ribeirão Preto (SP), Brasil

IIIAssociação Ribeirão-pretana de Ensino, Pesquisa e Assistência ao Hipertenso - Ribeirão Preto (SP), Brasil

IVPrograma de Pós-graduação (Doutorado), Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo - USP, Ribeirão Preto (SP), Brasil

VCurso Acadêmico da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo - USP, Ribeirão Preto (SP), Brasil

VIDepartamento de Pediatria e Puericultura, Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo - USP, Ribeirão Preto (SP), Brasil

Autor correspondente

RESUMO

OBJETIVO: Identificar o risco cardiovascular, por meio do escore de risco de Framinghan, em uma amostra de hipertensos de uma unidade pública de saúde.

MÉTODOS: A casuística foi constituída por hipertensos, segundo critérios do JNC VII, 2003, de 2003, dentre 1.601 acompanhados no ano de 1999 no Ambulatório de Cardiologia e Hipertensão Arterial do Centro Saúde Escola da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo. Os pacientes foram selecionados por sorteio, com idade acima de 20 anos, ambos os gêneros, excluindo-se as gestantes. Tratou-se de estudo observacional descritivo e transversal. Utilizou-se o Escore de Risco de Framinghan para estratificação do risco cardiovascular para desenvolvimento de doença arterial coronária (morte ou infarto agudo do miocárdio - não fatal).

RESULTADOS: A idade variou de 27 a 79 anos ( = 63,2 ± 9,58). Dos 382 indivíduos estudados, 270 (70,7%) eram mulheres e 139 (36,4%) foram caracterizados como de alto risco cardiovascular por apresentarem diabetes mellitus, aterosclerose documentada por evento ou procedimento. Dos 243 estratificados, 127 (52,3%) apresentaram HDL-C < 50 mg/dL; 210 (86,4%) apresentaram pressão arterial sistólica > 120 mmHg; 46 (18,9%) eram fumantes; 33 (13,6%) eram de alto risco cardiovascular - que somados aos 139 incluídos diretamente como alto risco cardiovascular, totalizaram 172 (45%); 77 (20,2%) eram de médio risco cardiovascular e 133 (34,8%) de baixo risco. O maior percentual de indivíduos de alto risco cardiovascular situou-se acima 70 anos; de médio risco, acima de 60 anos; e de baixo risco entre 50 e 69 anos.

CONCLUSÃO: O número significativo de indivíduos de alto e médio risco cardiovascular indica a necessidade de um acompanhamento mais próximo dos mesmos.

Descritores: Hipertensão/prevenção & controle; Doenças cardiovasculares/prevenção & controle; Dislipidemias, hipercolesterolemia; Tabagismo, prevenção primária; Medição de risco; Centros de saúde

INTRODUÇÃO

As doenças cardiovasculares (DCV), segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), são responsáveis por 16,7 milhões de mortes por ano. As projeções para 2020 mantêm esses agravos como principal causa de óbito, sendo que os países em desenvolvimento contribuem de maneira mais significativa do que aqueles desenvolvidos(1).

No Brasil, as DCV se configuram como a principal causa de morte a partir dos 40 anos de idade. Foram registrados 283.927 óbitos por doenças do aparelho circulatório (DAC) em 2005, ou seja, 32,2% das mortes daquele ano(2,3).

Estudo realizado no Brasil, analisando a mortalidade por DCV nas cinco regiões geográficas, revelou uma tendência de queda da mortalidade na população a partir dos 30 anos de idade, nas regiões Norte, Sudeste e Sul. Entretanto, nas regiões Nordeste e Centro-Oeste, observou-se aumento do risco de morte por DCV. Esses achados distintos observados nas diferentes regiões geográficas mostraram a importância e a variabilidade da análise regional das DCV e o risco de morte nas regiões mais desfavorecidas, do ponto de vista socioeconômico(4).

Estudo patrocinado pela Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS), publicado em 1967, referente às taxas anuais de mortalidade ajustadas por sexo, idade e enfermidades cardíacas hipertensivas por 100.000 habitantes, no período de 1962 a 1964, apontou as cidades de Ribeirão Preto (SP) (34,2), São Paulo (SP) (31,7) e Cali, na Colômbia (31,6), como as que apresentavam maiores taxas de mortalidade por enfermidade cardíaca hipertensiva(5).

No ano de 1995, as DAC representaram 30,8% dos óbitos entre pessoas residentes em Ribeirão Preto (SP). Ocorreram 199 óbitos devido a infarto agudo do miocárdio (IAM) (6,5%), constituindo esta a segunda principal causa básica de óbitos entre pessoas residentes naquela cidade(6).

Entende-se fator de risco cardiovascular (FRC) como características ou situações patológicas que tenham correlação positiva com a doença isquêmica do coração (DIC). Esse conceito emergiu de estudos epidemiológicos prospectivos que avaliaram amostras populacionais por longos períodos de tempo, demonstrando essa associação. Somente em 1963, surgiu, pela primeira vez na literatura médica, o termo "fator de risco"(7-9).

O estudo de Framingham, realizado em Massachusetts, Estados Unidos, foi iniciado em 1948, com seu trabalho de campo e de observação, a partir de 1950, com o seguimento de cerca de 5.000 adultos entre 39 e 59 anos de idade, sem DCV. Em 1957, uma análise preliminar demonstrou que homens com hipertensão arterial sistêmica (HAS), obesidade ou hipercolesterolemia no início do estudo apresentavam taxa de eventos coronarianos duas a seis vezes maiores do que aqueles não expostos a essas condições. Um relato posterior, de 6 anos de seguimento, adicionou o tabagismo como mais um preditor de risco de DIC(7-9).

A busca de formas de prevenção das DCV visa à redução da morbimortalidade e, assim, melhorar a qualidade e a expectativa de vida. A pesquisa de fatores responsáveis, sua identificação e estratificação permitem que programas preventivos possam ser desenvolvidos(10).

A estratificação do risco cardiovascular em pacientes com HAS é composta por: (1) fatores de risco maiores: tabagismo, dislipidemia, diabetes mellitus (DM), idade superior a 60 anos, gênero (homem ou mulheres pós-menopáusicas), história familiar de DCV (mulher abaixo de 65 anos ou homem abaixo de 55 anos) e (2) lesão de órgãos-alvo e manifestações clínicas de DCV, como doenças cardíacas (hipertrofia ventricular esquerda - HVE, angina ou IAM prévio, cirurgia de revascularização miocárdica (RM) prévia, e insuficiência cardíaca congestiva - ICC); acidente vascular cerebral (AVC) ou ataque isquêmico transitório, nefropatia, doença arterial periférica e retinopatia(11).

OBJETIVO

Avaliar o risco cardiovascular em uma amostra de indivíduos hipertensos oriundos de uma unidade pública de saúde incluindo análise comparativa entre os gêneros.

MÉTODOS

Casuística

Estudo observacional descritivo, do tipo transversal, cuja casuística foi constituída por uma amostra de 382 indivíduos portadores de HAS (destes, 139 foram incluídos diretamente como sendo pacientes de alto risco cardiovascular e 243 foram submetidos à avaliação pelo escore de risco cardiovascular de Framingham - ERF), segundo os critérios do Joint National Committee on Prevention, Detection, Evaluation, and Treatment of High Blood Pressure (JNC VII), de 2003(12), dentre os 1.601 pacientes atendidos durante o ano de 1999, no ambulatório de Cardiologia e Hipertensão Arterial Professor Sérgio Henrique Ferreira, do Centro Saúde Escola da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, da Universidade de São Paulo (USP). Esses indivíduos foram numerados e escolhidos aleatoriamente, por meio de sorteio, para evitar vícios de amostragem.

Os indivíduos incluídos no estudo foram somente adultos a partir de 20 anos de idade, de ambos os gêneros, sendo excluídos gestantes e idosos com idade igual ou superior a 80 anos, por não poderem ser estratificados pelo ERF (escore de risco de Framigham).

O trabalho foi submetido e aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto da USP.

Protocolo

Após a realização do sorteio, foi solicitada a assinatura da declaração de consentimento pós-informação, lida juntamente do paciente, sendo esclarecidas todas suas dúvidas sobre este trabalho e entregue ao mesmo uma cópia de igual teor. Após esse procedimento, os indivíduos foram incluídos no estudo.

Foi utilizado um instrumento padrão para a pesquisa, constituído por uma ficha ERF preenchida pelo investigador após término dos exames laboratoriais (colesterol, HDL, LDL, triglicérides e glicemia) e posterior contagem de pontos para estratificação do risco cardiovascular em 10 anos para desenvolvimento de DIC (morte ou IAM não fatal).

Os sujeitos do estudo poderiam estar usando qualquer medicamento anti-hipertensivo.

O estudo de Framingham é o referencial teórico dos FRC mais utilizado mundialmente, que evidencia uma relação causal com as DCV. Como revelam os dados desse estudo, fatores de risco cardiovasculares como HAS, DM, tabagismo e dislipidemia são FRC independentes para o desenvolvimento de DCV. Assim, com base na importância destes, justifica-se uma estratificação adequada do risco cardiovascular para ocorrência futura de DCV por meio da utilização do ERF. O estabelecimento do escore é feito por meio da somatória de pontos atribuídos aos FRC para homens e mulheres separadamente. Esse cálculo pode classificar o indivíduo como alto, médio ou baixo risco de desenvolver DCV nos próximos 10 anos(13,14).

O ERF calcula o risco absoluto de eventos coronarianos (morte, IAM e angina pectoris - AP) em 10 anos. São atribuídos pontos para idade, pressão arterial sistólica (PAS), colesterol total, HDL colesterol e tabagismo (qualquer cigarro no último mês). Quando houver divergência entre PAS e pressão arterial diastólica (PAD), deve-se considerar a maior para a pontuação.

O risco absoluto de DIC é o risco real de IAM, morte por DIC ou AP em um determinado período de tempo.

O risco de DIC é proporcional ao número e à intensidade dos FRC e pode ser caracterizado pelo ERF como:

- alto: risco absoluto > 20% em 10 anos;

- médio: risco absoluto de 10 a 20% em 10 anos;

- baixo: risco absoluto < 10% em 10 anos.

Análise estatística

A análise estatística compreendeu o cálculo de estatísticas descritivas como médias, medianas, valores mínimos, valores máximos e desvio padrão para as variáveis pertinentes, bem como a utilização do teste exato de Fisher, para comparação entre os grupos.

A estruturação do banco de dados foi realizada por meio do programa Epi-Info versão 6.04, para análise detalhada da ficha ERF.

RESULTADOS

A idade dos indivíduos incluídos no estudo variou de 27 a 79 anos, com média de 63,2 anos e desvio padrão de 9,6 anos. Dos 382 indivíduos estudados, 270 (70,7%) eram do gênero feminino (Tabela 1).

Triglicérides

Entre os 382 indivíduos estudados, 139 (36,4%) apresentaram níveis de triglicérides > 150 mg/dL e, destes, 96 (69,1%) eram do gênero feminino. Entre os indivíduos do gênero feminino, observou-se que 96 (35,6%) apresentavam nível de triglicérides acima do considerado normal e, entre os indivíduos do gênero masculino, 43 (38,4%).

Caracterização direta como pacientes de alto risco cardiovascular

Dos indivíduos estudados, 139 (36,4%) foram caracterizados como de alto risco cardiovascular por apresentarem DM, aterosclerose detectada por evento (AVC ou IAM) ou aterosclerose detectada por procedimento (RM, cirurgia com implante de ponte de safena ou de artéria mamária e angioplastia transluminal coronária - ATC, por meio de balão ou implante de stent intracoronário) (Tabela 2).

Não foi calculado o ERF para esses indivíduos, já que são estratificados diretamente como de alto risco cardiovascular.

HDL-C

Entre os 243 indivíduos estratificados pelo ERF, 127 (52,3%) apresentaram nível de HDL-C < 50 mg/dL, 63 (25,9%) entre 50 e 59 mg/dL e 53 (21,8%) > 60 mg/dL.

Colesterol total

Dos 243 indivíduos estratificados pelo ERF, 212 (87,2%) apresentaram nível de colesterol total > a 200 mg/dL.

PAS

Entre os 243 indivíduos estratificados pelo ERF, 33 (13,6%) apresentaram níveis pressóricos < 120 mmHg e 210 (86,4%) níveis iguais ou superiores a esse valor.

Tabagismo

Dos 243 indivíduos estratificados pelo ERF, 46 (18,9%) eram fumantes e 197 (81,1%) não referiram história de tabagismo. Observou-se que aproximadamente quatro em dez homens eram fumantes e apenas uma em dez mulheres possuía esse hábito.

Estratificação de risco cardiovascular por ERF

Dentre os pacientes, 33 (13,6%) foram caracterizados como pacientes de alto risco cardiovascular. Somados aos demais indivíduos (139) incluídos diretamente como de alto risco cardiovascular, totalizaram 45% dos indivíduos da amostra estudada.

Em relação ao total, 77 (31,7%) foram caracterizados como pacientes de médio risco cardiovascular. Esses indivíduos representam 20,1% da amostra estudada.

Foram caracterizados como pacientes de baixo risco cardiovascular 133 (54,7%) indivíduos em relação ao total. Esses indivíduos representam 34,8% da amostra estudada (Figura 1).


Estratificação do risco cardiovascular versus idade

O percentual mais significativo de alto risco cardiovascular foi observado na faixa etária superior a 70 anos. Em relação ao médio risco, predominou na faixa etária acima de 60 anos e o baixo risco na faixa etária entre 50 e 69 anos.

O teste exato de Fisher detectou diferenças significantes de risco nas diversas faixas etárias (p < 0,001). Alto e médio riscos cardiovasculares foram mais frequentes em pacientes com 70 anos ou mais, e baixo risco cardiovascular, em pacientes com menos de 70 anos (Tabela 3).

Estratificação do risco cardiovascular versus gênero

Observou-se um predomínio do gênero feminino entre os 139 indivíduos caracterizados diretamente como de alto risco cardiovascular: 88 (63,3%). Constatou-se também que, em relação ao total da amostra estudada, um maior percentual do gênero masculino foi caracterizado diretamente como de alto risco cardiovascular por apresentar DM ou aterosclerose (45,5%), em relação aos indivíduos do gênero feminino (32,6%), fato confirmado após a utilização do teste de Fisher.

Em relação aos indivíduos estratificados pelo ERF, observou-se que ocorreu maior percentual de indivíduos do gênero masculino caracterizados como de médio e alto risco cardiovascular (45,9 e 32,8%), sendo que, no gênero feminino, o maior percentual foi caracterizado como de baixo risco cardiovascular (65,9%). A diferença de risco entre os sexos masculino e feminino foi significante, segundo o teste de Fisher (p < 0,001) (Tabela 4). A distribuição da idade segundo gênero foi considerada homogênea (p = 0,228) (Tabela 1).

Estratificação do risco cardiovascular versus LDL-C

Após realizada a estratificação de risco cardiovascular, foram definidos limites para LDL-C, sendo que, para indivíduos de alto risco cardiovascular, LDL-C < 100 mg/dL, de médio LDL-C < 130 mg/dL e baixo risco cardiovascular, LDL-C < 160 mg/dL. Cinco indivíduos (quatro mulheres) não tiveram o LDL-C calculado, pois apresentavam nível de triglicérides acima de 400 mg/dL, não sendo possível aplicar a fórmula de Friedwald(15). Esses indivíduos foram caracterizados diretamente com alto risco cardiovascular, por apresentarem DM ou aterosclerose.

Observou-se um percentual significativo de indivíduos com nível de LDL-C > 100mg/dL (69,8%). Os indivíduos do gênero feminino apresentaram maior percentual de seu grupo com nível de LDL-C aumentado (75%), em relação aos indivíduos do gênero masculino (60,7%).

Dos 243 indivíduos que tiveram ERF calculados, 36,6% apresentaram níveis de LDL-C não controlados segundo as metas já descritas, sendo que, entre os indivíduos com LDL-C não controlados, a maior frequência foi no grupo de alto risco cardiovascular (46,1%) e, entre os indivíduos com LDL-C controlados, a maior frequência foi no grupo de baixo risco cardiovascular (71,4%).

DISCUSSÃO

Há relatos na literatura de outros trabalhos realizados em populações brasileiras utilizando o ERF para estratificação de risco cardiovascular. O projeto Bambui teve por objetivo a quantificação do risco de DIC de uma amostra de indivíduos da cidade de Bambui (MG), utilizando o ERF para estratificação de risco cardiovascular e concluindo que o risco de DIC poderia ser reduzido para 44% em homens e 38% em mulheres(16).

A avaliação dos FRC numa comunidade rural do Estado da Bahia também utilizou o ERF para estratificação de risco cardiovascular da população estudada e concluiu que os FRC, como HAS e hipercolesteromia, são frequentemente encontrados em comunidades rurais(17).

Os perfis lipídico e de risco cardiovascular em duas populações da Amazônia, utilizando o Programa de Educação Nacional de Colesterol (NCEP III) e o ERF, demonstraram que o risco das duas populações eram iguais, porém diferentes estratégias de prevenção deveriam ser aplicadas(18).

O impacto do risco cardiovascular numa amostra de portugueses adultos de acordo com o ERF revelou que o controle da PAS nessa população foi a intervenção com maior impacto na prevenção de DIC e que podem ser alcançados melhores resultados com a intervenção de vários fatores simultaneamente(19).

No presente trabalho, pode-se observar predomínio do gênero feminino entre os indivíduos estudados. A superioridade numérica de pacientes do gênero feminino em relação ao masculino deve-se, possivelmente, ao fato da maior disponibilidade de horário para frequentar unidades públicas de saúde, tendo em vista que, na maioria das vezes, os indivíduos do gênero masculino constituem a maior força de trabalho para manutenção da renda familiar, ficando com receio de se ausentar frequentemente de seu trabalho com risco de perda de emprego.

Observou-se também maior frequência de idosos na amostra estudada, fato que pode ser explicado pelo grande número de aposentados que frequentam as unidades públicas de saúde do nosso país.

Um percentual elevado de indivíduos incluídos no estudo com FRC ou condições associadas foi caracterizado como portadores de elevado risco cardiovascular, predominando no gênero masculino.

A hipertrigliceridemia não foi muito frequente na amostra estudada, não interferindo no cálculo do LDL colesterol de ambos os gêneros. Houve predomínio de trigliceridemia normal na amostra estudada, porém, ao comparar os percentuais desse parâmetro em cada grupo, observou-se que, entre os indivíduos de alto risco cardiovascular, ocorreu maior proporção de nível de triglicérides > 150 mg/dL

Entre os indivíduos caracterizados diretamente como de alto risco cardiovascular, os do gênero feminino apresentaram maior percentual de nível de triglicérides acima da normalidade, em relação aos indivíduos do gênero masculino.

Após a elaboração da estratificação de risco e estabelecidas as metas terapêuticas do nível LDL-C descritas anteriormente, a maioria dos indivíduos estudados apresentou níveis de LDL-C controlados, porém, no grupo de alto risco cardiovascular, a maioria não estava com os níveis de LDL-C controlados, ou seja, < 100 mg/dL.

Este estudo revelou um fato preocupante, pois um número significativo de indivíduos (172, 45%) caracterizados como de alto risco cardiovascular fazia seguimento clínico numa unidade pública de saúde de nível secundário, sendo que deveriam ser acompanhados numa unidade de saúde de nível terciário, o que denota uma distorção no fluxograma de atendimento médico previsto no SUS na cidade de Ribeirão Preto.

CONCLUSÃO

Diante dos resultados apresentados, observou-se um número significativo de indivíduos caracterizados como de alto e médio risco cardiovascular, de acordo com o ERF, na amostra estudada, particularmente no gênero masculino, indicando a necessidade de um acompanhamento mais próximo desses pacientes.

Agradecimentos

Fonte de auxílio: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

REFERÊNCIAS

  • 1. Ramires JA, Chagas AC. Panorama das doenças cardiovasculares no Brasil. In: Nobre F, Serrano CV, editores. Tratado de cardiologia SOCESP. São Paulo: Manole; 2005. p. 7-46.
  • 2. Sociedade Brasileira de Cardiologia-SBC; Sociedade Brasileira de Hipertensão-SBH; Sociedade Brasileira de Nefrologia-SBN. V Diretrizes Brasileiras de Hipertensão Arterial. Arq Bras Cardiol. 2007;89(3):e24-e79.
  • 3. Pan American Health Organization (PAHO). CARMEN: Initiative for integrated non-communicable diseases prevention in the Americas, 2004 [Internet]. [cited 2008 Oct 15]. Available from: http://www.paho.org/english/ad/dpc/nc/carmen-info.htm
  • 4. Mansur AP, Souza MF, Timerman A, Avakian SD, Aldrighi JM, Ramires JA. Tendência do risco de morte por doenças circulatórias, cerebrovasculares e isquêmicas do coração em treze Estados do Brasil, de 1980 a 1998. Arq Bras Cardiol. 2006;87(5):641-8.
  • 5. Puffer PR, Griffit GW. Caracteristicas de la mortalidade urbana. Washington(DC): Organización Panamericana de la Salud; 1968. p. 191-205.
  • 6. Ribeirão Preto. Prefeitura Municipal. Secretaria Municipal da Saúde. Departamento de Informática. Boletim do Sistema de Coleta e Análise de Estatística Vitais. Ribeirão Preto, SP; 1996. 4. p. 1-18.
  • 7. Kannel WB. The Framingham study: Its 50-year legacy and future promise. J Atheroscler Thromb. 2000;6(1):60-6.
  • 8. Xavier HT. Risco cardiovascular na mulher. São Paulo: BBS; 2005. Estratificação do risco cardiovascular na mulher. p.47-54.
  • 9. Lotufo PA. O escore de risco de Framingham para doenças cardiovasculares. Rev Med. 2008;87(4):232-7.
  • 10. Saraiva FJ. Como estratificar o risco cardiovascular? In: Xavier HT. Manual de dislipidemias e cardiometabolismo. São Paulo: BBS; 2004. p. 55-66.
  • 11. Silva ED, Martins JC. Rastreamento e tratamento de hipertensos de alto risco. Rev Soc Bras Clin Me. 2005;3(2):46-8.
  • 12. Chobanian AV, Bakris GL, Black HR, Cushman WC, Green LA, Izzo JL Jr, Jones DW, Materson BJ, Oparil S, Wright JT Jr, Roccella EJ; National Heart, Lung, and Blood Institute Joint National Committee on Prevention, Detection, Evaluation, and Treatment of High Blood Pressure; National High Blood Pressure Education Program Coordinating Committee. The Seventh Report of the Joint National Committee on Prevention, Detection, Evaluation, and Treatment of High Blood Pressure: the JNC 7 report. JAMA. 2003;289(19):2560-72. Erratum in: JAMA. 2003 Jul 9;290(2):197.
  • 13. Expert Panel on Detection, Evaluation, and Treatment of High Blood Cholesterol in Adults. Executive Summary of The Third Report of The National Cholesterol Education Program (NCEP) Expert Panel on Detection, Evaluation, And Treatment of High Blood Cholesterol In Adults (Adult Treatment Panel III). JAMA. 2001;285(19):2486-97.
  • 14. Santos RD; Sociedade Brasileira de Cardiologia. III Diretrizes Brasileiras sobre Dislipidemias e Diretriz de Prevenção da Aterosclerose do Departamento de Aterosclerose da Sociedade Brasileira de Cardiologia. Arq Bras Cardiol. 2001;77(Supl 3):1-48.
  • 15. Friedwald WT, Levy RI, Fredricsons DS. Estimation of the concentration of low-density lipoprotein cholesterol in plasma, without use of the preparative ultracentrifuge. Clin Chen. 1972;18(6):499-502.
  • 16. Barreto SM, Passos VM, Cardoso AR, Lima-Costa MF. Quantifying the risk of coronary artery disease in a community: the Bambui project. Arq Bras Cardiol. 2003;81(6):556-61.
  • 17. Matos AC, Ladeia AM, Assessment of cardiovascular risk factors in a rural community in the Brazilian state of Bahia. Arq Bras.Cardiol. 2003;81(3):291-302.
  • 18. Feio CM, Fonseca FA, Rego SS, Feio MN, Elias MC, Costa EA, et al. Lipid profile and cardiovascular risk in two Amazonian populations. Arq Bras Cardiol. 2003;81(6):596-9.
  • 19. Friões F, Azevedo A, Castro A, Alvelos M, Pimenta J, Vazquez B, et al. Impact of cardiovascular risk factors in an urban sample of Portuguese adults according to the Framingham risk prediction models. Rev Port Cardiol. 2003;22(4):511-20.
  • Avaliação do risco cardiovascular de indivíduos portadores de hipertensão arterial de uma unidade pública de saúde

    Evandro José CesarinoI; André Luiz Gomes VituzzoII; Julliane Messias Cordeiro SampaioIII; Danilo Avelar Sampaio FerreiraIV; Heloísa Andrião Ferreira PiresV; Luiz de SouzaVI
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      19 Set 2012
    • Data do Fascículo
      Mar 2012

    Histórico

    • Recebido
      31 Jul 2010
    • Aceito
      15 Dez 2011
    Instituto Israelita de Ensino e Pesquisa Albert Einstein Avenida Albert Einstein, 627/701 , 05651-901 São Paulo - SP, Tel.: (55 11) 2151 0904 - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: revista@einstein.br