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Infecção latente por tuberculose e tuberculose em crianças e adolescentes

RESUMO

Objetivo:

Descrever as características de pacientes com diagnóstico de tuberculose e de infecção latente por tuberculose.

Métodos:

Estudo retrospectivo, entre os anos de 2012 e 2015, com os dados dos pacientes do ambulatório do Programa Einstein na Comunidade de Paraisópolis. Para se avaliarem possíveis fatores associados ao sexo e aos diagnósticos de tuberculose e infecção latente por tuberculose, foram utilizados os testes χ2 ou exato de Fisher, para variáveis qualitativas, e de Mann-Whitney, para variáveis quantitativas ou qualitativas ordinais.

Resultados:

Foram avaliados 77 pacientes. A idade variou de 6 meses a 13,4 anos, sendo a maioria do sexo masculino (54,5%), na faixa etária de zero a 4 anos (54,5%), com diagnóstico de infecção latente por tuberculose (64,9%) e categorizada como eutrófica (71,2%). Em 92% dos casos, a prova tuberculínica foi positiva, e a maioria mostrou valores acima de 10mm (68,0%). Cerca de três quartos dos exames de raio X de tórax resultaram normais (72,7%). Depois do raio X de tórax, a tomografia computadorizada de tórax foi o segundo exame mais solicitado (29,9%), seguida da baciloscopia e da cultura do bacilo Mycobacterium tuberculosis no aspirado gástrico (28,6%). As frequências de raio X de tórax alterado (70,4% versus 4,0%), solicitações de tomografia computadorizada de tórax (55,6% versus 16,0%) e outros exames (81,5% versus 38,0%) foram significativamente maiores nos pacientes com diagnóstico de tuberculose, em relação àqueles com infecção latente por tuberculose, respectivamente.

Conclusão:

Em nossa amostra, as proporções de raio X de tórax alterados e de realização de tomografia computadorizada de tórax e de outros exames nos pacientes com diagnóstico de tuberculose foram maiores em relação àqueles com infecção latente por tuberculose.

Descritores:
Tuberculose; Mycobacterium tuberculosis; Serviços de saúde da criança; Criança; Saúde da criança

ABSTRACT

Objective:

To describe the characteristics of patients diagnosed with tuberculosis and latent tuberculosis infection.

Methods:

A retrospective study, between 2012 and 2015, with data from patients of Programa Einstein na Comunidade de Paraisópolis. To evaluate possible factors associated with patient's sex and diagnoses of tuberculosis and latent tuberculosis infection, χ2 or Fisher's exact tests were used for qualitative variables, and Mann-Whitney test for quantitative or ordinal qualitative variables.

Results:

A total of 77 patients were evaluated. Age ranged from 6 months to 13.4 years, with a majority of males (54.5%), aged zero to 4 years (54.5%), diagnosed with latent tuberculosis infection (64.9%), and classified as eutrophic (71.2%). The tuberculin test was positive in 92% and in most cases the values were above 10mm (68.0%). Approximately three-quarters of chest X-ray tests were normal (72.7%). After chest X-ray, computed tomography of thorax was the most ordered exam (29.9%), followed by smear and culture for Mycobacterium tuberculosis in the gastric aspirate (28.6%). The frequencies of altered chest X-ray (70.4% versus 4.0%), computed tomography of thorax requests (55.6% versus 16.0%) and other tests requested (81.5% versus 38.0%) were significantly higher in patients with a diagnosis of tuberculosis, relative to those with latent tuberculosis infection, respectively.

Conclusion:

In our sample, proportions of altered chest X-ray, and performing computed tomography of thorax and other tests in patients diagnosed with tuberculosis were higher than in those with latent tuberculosis infection.

Keywords:
Tuberculosis; Mycobacterium tuberculosis; Child health services; Child; Child health

INTRODUÇÃO

A tuberculose (TB) é uma doença infecciosa causada pelo bacilo Mycobacterium tuberculosis (BMT), que afeta principalmente os pulmões, mas pode atingir outros órgãos e tecidos. Globalmente, estima-se que 1,7 bilhão de pessoas estejam infectadas pelo bacilo, sendo que cerca de 5 a 15% destas pessoas desenvolverão a doença. Em 2016, ocorreram 10,4 milhões de casos novos de TB, sendo cerca de 1 milhão entre crianças.(11. World Health Organization (WHO). Global tuberculosis report 2017 [Internet]. Geneva: WHO; 2017 [cited 2018 July 4]. Available from: http://apps.who.int/iris/bitstream/handle/10665/259366/9789241565516-eng.pdf?sequence=1
http://apps.who.int/iris/bitstream/handl...
) Em relação à infecção latente por tuberculose (ILTB), estimou-se que 97 milhões de crianças e adolescentes com menos de 15 anos estariam infectados pelo BMT(22. Houben RM, Dodd PJ. The Global Burden of Latent Tuberculosis Infection: a re-estimation using mathematical modelling. PLoS Med. 2016; 13(10): e1002152. Review.)

O Brasil ocupa a 18ᵃ posição no número de casos de TB, representando 0,9% do total no mundo e 33% dos estimados para as Américas.(33. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Perspectivas brasileiras para o fim da tuberculose como problema de saúde pública. Boletim Epidemiol. 2016;47(13):1-15.) Em 2016, foram registrados 66.796 casos novos e 12.809 retratamentos da TB, sendo de 32,4 por 100 mil habitantes o coeficiente de incidência da doença.(44. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Indicadores prioritários para o monitoramento do Plano Nacional pelo fim da tuberculose como problema de saúde pública no Brasil. Boletim Epidemiol. 2017;48(8):1-11.)

Busca ativa, diagnóstico correto e tratamento imediato para os casos de TB pulmonar são as principais medidas para o controle da doença. Além disso, a avaliação dos contatos destes pacientes é uma estratégia importante para prevenir o adoecimento, buscando-se identificar e tratar a ILTB, como também diagnosticar precocemente os casos da doença ativa.(55. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância Epidemiológica. Manual de recomendações para o controle da tuberculose no Brasil [Internet]. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2011 [citado 2018 Jan 26]. [Série A. Normas e Manuais Técnicos]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/manual_recomendacoes_controle_tuberculose_brasil.pdf
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)

O diagnóstico da TB em crianças e adolescentes representa um desafio, pois a positividade do exame do escarro é usualmente mais baixa (6,8%) na comparação com adultos (52,0%).(66. Kunkel A, Abel Zur Wiesch P, Nathavitharana RR, Marx FM, Jenkins HE, Cohen T. Smear positivity in paediatric and adult tuberculosis: systematic review and meta-analysis. BMC Infect Dis. 2016;16(1):282. Review.) Além disso, os testes de imunodiagnóstico não distinguem a doença ativa da ILTB,(77. Dunn JJ, Starke JR, Revell PA. Laboratory diagnosis of mycobacterium tuberculosis infection and disease in children. J Clin Microbiol. 2016;54(6): 1434-41. Review.) e os escores e critérios diagnósticos existentes apresentam grande variação nas estimativas de sensibilidade e especificidade, tendo sido validados com diferentes padrões e populações.(88. Pearce EC, Woodward JF, Nyandiko WM, Vreeman RC, Ayaya SO. A systematic review of clinical diagnostic systems used in the diagnosis of tuberculosis in children. Aids Res Treat. 2012;2012:401896.)

OBJETIVO

Descrever as características de pacientes com diagnóstico de tuberculose e de infecção latente por tuberculose.

MÉTODOS

Trata-se de um estudo retrospectivo, com os dados dos prontuários dos pacientes com diagnóstico de TB e ILTB avaliados no ambulatório do Programa Einstein na Comunidade de Paraisópolis entre os anos de 2012 e 2015. O diagnóstico de TB foi realizado quando ocorreu o isolamento do BMT em secreções ou tecidos acometidos, utilizando o sistema de pontuação adotado pelo Ministério da Saúde do Brasil,(55. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância Epidemiológica. Manual de recomendações para o controle da tuberculose no Brasil [Internet]. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2011 [citado 2018 Jan 26]. [Série A. Normas e Manuais Técnicos]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/manual_recomendacoes_controle_tuberculose_brasil.pdf
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) ou quando o exame de imagem foi sugestivo da doença em pacientes sintomáticos. O diagnóstico de ILTB foi feito nos pacientes assintomáticos, contactantes da doença e que apresentavam prova tuberculínica (PT) positiva (igual ou superior a 5mm em crianças com 2 anos ou mais de idade ou com qualquer condição imunodepressora; e igual ou superior a 10mm naquelas com menos de 2 anos). Todas as crianças tinham recebido a vacina BCG ao nascimento. O diagnóstico de ILTB também foi feito quando a doença ativa não foi confirmada nos pacientes com PT positiva, porém não houve caso índice identificado.

A classificação do estado nutricional foi realizada por meio do cálculo do índice de massa corporal (IMC), e pela utilização das tabelas de IMC para idade e sexo da Organização Mundial da Saúde. A categoria magreza agrupou os diagnósticos de magreza e magreza acentuada; a de sobrepeso, os diagnósticos de risco de sobrepeso e sobrepeso; e a de obesidade, os diagnósticos de obesidade e obesidade grave.(99. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Estratégias para o cuidado da pessoa com doença crônica: obesidade [Internet]. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2014 [citado 2018 Jan 26]. [Cadernos de Atenção Básica, 38]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/estrategias_cuidado_doenca_cronica_obesidade_cab38.pdf
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)

A variável “caso índice” foi categorizada como “sim” ou “não” para cada pessoa identificada com TB, apresentando-se, nas tabelas, apenas as frequências absolutas e relativas dos casos categorizados como “sim”. A distribuição de probabilidade das variáveis quantitativas foi verificada por meio de boxplots e teste de Shapiro-Wilk. Variáveis qualitativas foram descritas por frequências absolutas e relativas, e as variáveis quantitativas, por medianas e quartis (primeiro e terceiro quartis), pois não se verificou a distribuição normal de frequências. Para avaliar possíveis fatores associados aos diagnósticos de TB e ILTB e a homogeneidade das medidas entre os sexos, foram utilizados os testes χ2 ou exato de Fisher, para variáveis qualitativas, e o teste de Mann-Whitney, para variáveis quantitativas ou qualitativas ordinais, com nível de significância de 5%. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em pesquisa do Hospital Israelita Albert Einstein (CAAE: 53639016.6.0000.0071).

RESULTADOS

Foram avaliados 77 pacientes. A idade variou de 6 meses a 13,4 anos, sendo a maioria do sexo masculino (54,5%), na faixa etária de zero a 4 anos (54,5%), com diagnóstico de ILTB (64,9%) e categorizada como eutrófica (71,2%). Cerca de um quarto dos pacientes (24,7%) apresentava sobrepeso ou obesidade; o pai ou a mãe representaram cerca de um terço dos casos índices; e, em 85,7% dos pacientes, o caso índice da doença foi identificado. Foram detectados dois casos índices de uma mesma família (tio e avô) em dois pacientes (Tabela 1).

Tabela 1
Características dos pacientes, distribuídas por sexo

A PT foi positiva em 92% dos casos e, em sua maioria, apresentou valores acima de 10mm (68,0%). Todos os pacientes realizaram raio X de tórax, e cerca de três quartos destes exames foram normais (72,7%). Depois do raio X de tórax, a tomografia computadorizada de tórax (TCT) foi o exame mais solicitado, isoladamente ou em conjunto com outros exames (29,9%), seguida do exame do aspirado gástrico (baciloscopia e cultura), com 28,6%. Houve diferenças estatisticamente significativas entre os sexos na distribuição de frequências da realização de outros exames e da pesquisa do BMT no aspirado gástrico (Tabela 2).

Tabela 2
Características dos exames dos pacientes, distribuídos por sexo

A idade mediana (5,0 anos versus 4,3 anos) e as proporções do sobrepeso e obesidade (28,3% versus 18,5%) foram maiores nos pacientes com diagnóstico de ILTB, na comparação com aqueles com TB, respectivamente. A proporção de não identificação de caso índice (22,2% versus 10,0%) foi maior nos pacientes com diagnóstico de TB, na comparação com aqueles com ILTB, respectivamente. Não detectamos, entretanto, diferenças estaticamente significativas nas variáveis das características dos pacientes, quando estratificadas por diagnóstico (Tabela 3).

Tabela 3
Características dos pacientes, distribuídos por diagnóstico

Observamos diferença significativa entre as proporções de exames de raio X de tórax alterados, tendo sido maior nos casos com diagnóstico de TB (70,4%), em relação aqueles com ILTB (4,0%). O primeiro grupo também apresentou maior proporção de realização de TCT (55,6% versus 16,0%) e de outros exames (81,5% versus 38,0%) (Tábela 4).

Tabela 4
Características dos exames dos pacientes, distribuídos por diagnóstico

Em relação aos pacientes com ILTB, dois apresentaram raio X de tórax alterado e realizaram a TCT, sendo uma com resultado normal e outra com alterações não compatíveis com TB. Dos oito pacientes com ILTB que realizaram a TCT, dois mostraram resultado normal e seis outras alterações não compatíveis com TB.

DISCUSSÃO

Nosso estudo apresentou as características de crianças e adolescentes com diagnóstico de ILTB e TB. O perfil de nossa amostra foi constituído por pacientes com mediana de 4,4 anos de idade, sendo a maioria do sexo masculino, com diagnóstico de ILTB e eutróficos. Para as comparações dos nossos resultados com a literatura, optamos por avaliar pesquisas realizadas no ambiente ambulatorial e com crianças e adolescentes do Brasil. Apesar disto, devem ser levadas em consideração diferentes datas, locais e amostras avaliadas, que podem ter influenciado nas características dos pacientes.

Entre os anos de 2002 e 2006, na cidade de Jacarepaguá (RJ), foram avaliados pacientes menores de 15 anos com diagnósticos de ILTB e TB. Em relação aos pacientes com ILTB, nosso estudo mostrou proporção semelhante de raio X de tórax normal (96,0% versus 100%) e proporção menor de contatos identificados (90% versus 100%). Na comparação com os pacientes com TB, o valor da mediana da PT foi semelhante (13mm versus 15mm), e a proporção de contato identificado foi menor (77,8% versus 95%).(1010. Pedrozo C, Sant'Anna CC, March MF, Lucena SC. Efficacy of the scoring system, recommended by the Brazilian National Ministry of Health, for the diagnosis of pulmonary tuberculosis in children and adolescents, regardless of their HIV status. J Bras Pneumol. 2010;36(1):92-8.) Na nossa amostra, cerca de um terço dos casos índices foi identificado como o pai ou a mãe dos pacientes, sem diferenças estatisticamente significativas entre os pacientes com diagnóstico de TB ou ILTB.

Comparando-se com estudo realizado na cidade de Salvador (BA), entre os anos de 1997 e 2007, com pacientes até 14 anos com diagnóstico de TB, nosso estudo apresentou proporção semelhante de contato domiciliar identificado (77,8% versus 80,4%), proporção maior de raio X de tórax normal (29,6% versus 0,3%) e proporção menor de adequação do estado nutricional (74,1% versus 82,2%).(1111. Coelho Filho JC, Caribé MA, Caldas SC, Martins Netto E. Is tuberculosis difficult to diagnose in childhood and adolescence? J Bras Pneumol. 2011; 37(3):288-93.) Em relação a este último aspecto, existem evidências de que a desnutrição é fator de risco para TB,(1212. Jaganath D, Mupere E. Childhood tuberculosis and malnutrition. J Infect Dis. 2012;206(12):1809-15. Review.) sendo critério de pontuação para o diagnóstico da doença.(55. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância Epidemiológica. Manual de recomendações para o controle da tuberculose no Brasil [Internet]. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2011 [citado 2018 Jan 26]. [Série A. Normas e Manuais Técnicos]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/manual_recomendacoes_controle_tuberculose_brasil.pdf
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) Entretanto, na nossa amostra, a maioria dos pacientes diagnosticados com TB (cerca de 96%) apresentava eutrofia ou excesso de peso.

Na comparação com estudo realizado na cidade do Rio de Janeiro (RJ), entre os anos de 2002 e 2009, com pacientes com diagnóstico de ILTB menores de 15 anos, nossos resultados mostraram maior proporção do sexo masculino (60,0% versus 51,4%), menor proporção de pacientes com 10 anos ou menos (78,0% versus 86,7%) e proporção semelhante de contatos identificados (90,0% versus 92,3%).(1313. Mendonça AM, Kritski AL, Sant'Anna CC. Tuberculosis contact tracing among children and adolescent referred to children's hospital in Rio de Janeiro, Brazil. Braz J Infect Dis. 2015;19(3):296-301.)

Em relação aos testes utilizados no diagnóstico da doença, estudo conduzido com menores de 15 anos e com sinais ou sintomas sugestivos de TB pulmonar mostrou diferentes sensibilidades, sendo de 22% para bacilos-copia, 60% para cultura do BMT, 64% para raio X de tórax e 75% para PT. Em relação à especificidade, a baciloscopia e a cultura do BMT apresentam valores próximos de 100%; o raio X de tórax de 78% e a PT, de 69%.(1414. Schumacher SG, van Smeden M, Dendukuri N, Joseph L, Nicol MP, Pai M, et al. Diagnostic test accuracy in childhood pulmonary tuberculosis: a bayesian latent class analysis. Am J Epidemiol. 2016;184(9):690-700.)

Quando não conseguem expectorar, as crianças acabam por engolir o escarro, e o BMT pode ser pesquisado no aspirado gástrico. Neste aspecto, revisão da literatura avaliou a acurácia do lavado/aspirado gástrico em crianças e adolescentes com menos de 15 anos e mostrou que o exame apresenta sensibilidade baixa de confirmação bacteriológica, sendo maior na cultura para o BMT(1515. Stockdale AJ, Duke T, Graham S, Kelly J, Duke T, Kelly J. Evidence behind the WHO guidelines: hospital care for children: what is the diagnostic accuracy of gastric aspiration for the diagnosis of tuberculosis in children? J Trop Pediatr. 2010;56(5):291-8. Review.)

Em relação à TCT, utilizando como controle pacientes com pneumonia bacteriana, este exame apresentou algumas características que poderiam sugerir a presença da TB em menores de 14 anos.(1616. Peng SS, Chan PC, Chang YC, Shih TT. Computed tomography of children with pulmonary Mycobacterium tuberculosis infection. J Formos Med Assoc. 2011;110(12):744-9. Review.) Nos nossos pacientes sintomáticos, mas com raio X de tórax normal, a realização da TCT se mostrou importante na identificação de alterações compatíveis com TB, ou com sua exclusão.

Finalmente, pode-se utilizar o escore de risco para O diagnóstico de TB em crianças.(55. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância Epidemiológica. Manual de recomendações para o controle da tuberculose no Brasil [Internet]. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2011 [citado 2018 Jan 26]. [Série A. Normas e Manuais Técnicos]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/manual_recomendacoes_controle_tuberculose_brasil.pdf
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) No entanto, estudo conduzido com pacientes com até 15 anos mostrou sensibilidade e especificidade diferentes, dependendo do ponto de corte utilizado. Para 30 pontos, a sensibilidade e a especificidade foram de 78,6% e 69,2%, e, para 40 pontos, de 48,2% e 87,9%, respectivamente.(1717. Cartaxo CG, Rodrigues LC, Braga CP Ximenes RA. Measuring the accuracy of a point system to diagnose tuberculosis in children with a negative smear or with no smear or culture. J Epidemiol Glob Health. 2014;4(1):29-34.)

Desta forma, o diagnóstico da TB em crianças é desafiador, existindo, além disso, diferenças importantes entre a doença nesta faixa etária e em adultos que devem ser consideradas, desde história de contato, fatores de risco e meios de diagnóstico, até tratamento e risco de transmissão.(1818. Ritz N, Curtis N. Novel concepts in the epidemiology, diagnosis and prevention of childhood tuberculosis. Swiss Med Wkly. 2014;144:w14000. Review.)

Em 2014, a assembleia da Organização Mundial da Saúde aprovou a estratégia denominada WHO End TB Strategy, com vistas a reduzir a incidência e a mortalidade global pela TB nos próximos anos.(1919. World Health Organization (WHO). Tuberculosis. WHO end TB Strategy. Global strategy and targets for tuberculosis prevention, care and control after 2015 [Internet]. Geneva: WHO; 2015 [cited 2017 June 06]. Available from: http://www.who.int/tb/post2015_strategy/en/
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) A cada ano, estimou-se em 7,5 milhões o número de crianças e adolescentes com menos de 15 anos que vivem em domicílios com adultos com TB.(2020. Yuen CM, Jenkins HE, Chang R, Mpunga J, Becerra MC. Two methods for setting child-focused tuberculosis care targets. Public Health Action. 2016; 6(2):83-96.) Esta faixa etária apresenta maior risco de progressão para a doença(1818. Ritz N, Curtis N. Novel concepts in the epidemiology, diagnosis and prevention of childhood tuberculosis. Swiss Med Wkly. 2014;144:w14000. Review.) e estima-se que cerca de 10% adoecerão, sendo a maioria dentro de 1 ano após se infectar com o BMT(2121. World Health Organization (WHO). Roadmap for childhood tuberculosis: towards zero deaths [Internet]. Geneva: WHO; 2013 [cited 2017 Apr 23]. Available from: http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/89506/1/9789241506137_eng.pdf
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) Em relação ao tratamento, tem se buscado identificar as estratégias que melhoram a adesão,(2222. Weaver MS, Lönnroth K, Howard SC, Roter DL, Lam CG. Interventions to improve adherence to treatment for paediatric tuberculosis in low-and middle-income countries: a systematic review and meta-analysis. Bull World Health Organ. 2015;93(10):700-11B. Review.) com vistas a aumentar a chance de cura, bem como reduzir a resistência aos medicamentos(2323. Dodd PJ, Sismanidis C, Seddon JA. Global burden of drug-resistant tuberculosis in children: a mathematical modelling study. Lancet Infect Dis. 2016;16(10):1193-201.) e a mortalidade pela TB em crianças.(2424. Dodd PJ, Yuen CM, Sismanidis C, Seddon JA, Jenkins HE. The global burden of tuberculosis mortality in children: a mathematical modelling study. Lancet Glob Health. 2017;5(9):e898-906.)

O Brasil elaborou seu plano nacional pelo fim da TB como problema de saúde pública, com os objetivos de reduzir a incidência e a mortalidade da doença até o ano de 2035. Este plano define as estratégias para os objetivos estabelecidos em três pilares, sendo o primeiro voltado para a prevenção e cuidado integrado centrados na pessoa; o segundo, para políticas arrojadas e sistema de apoio; e o terceiro, para intensificação da pesquisa e inovação.(2525. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância das Doenças Transmissíveis. Coordenação Geral do Programa Nacional de Controle da Tuberculose. Brasil livre da tuberculose: plano nacional pelo fim da tuberculose como problema de saúde pública [Internet]. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2017 [citado 2018 Jan 26]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/brasil_livre_tuberculose_plano_nacional.pdf
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) Neste último aspecto, nossos resultados podem contribuir com o entendimento das características da TB e da ILTB em crianças e adolescentes e auxiliar a busca pelos objetivos propostos.

CONCLUSÃO

Em nossa amostra, as proporções de exames de raio X de tórax alterados e de realização de tomografia computadorizada de tórax e de outros exames nos pacientes com diagnóstico de tuberculose foram maiores em relação àqueles com infecção latente por tuberculose.

AGRADECIMENTOS

À Dra. Ana Carolina Cintra Nunes Mafra pelas análises estatísticas dos dados.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    17 Set 2018
  • Data do Fascículo
    2018

Histórico

  • Recebido
    18 Abr 2017
  • Aceito
    22 Fev 2018
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