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Intersecções entre o pensamento freiriano e a psicanálise freudiana: uma revisão integrativa

Intersections between Freirian thought and Freudian psychoanalysis: an integrative review

Resumo

Este trabalho é uma revisão integrativa que visa levantar a produção bibliográfica em periódicos de artigos que explorem a intersecção entre o pensamento pedagógico de Paulo Freire e os arcabouços teóricos da psicanálise de Sigmund Freud. O levantamento ocorreu no segundo semestre do ano de 2022, em múltiplos repositórios, tanto os de caráter geral (Scientific Electronic Library Online/SciELO e Portal de Periódicos da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior/CAPES), quanto as bases específicas das áreas da Educação (Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação/ANPEd e EDUC@) e da Psicologia (Portal de Periódicos Eletrônicos de Psicologia/PePSIC), a partir da combinação dos descritores “Freire” e “Freud” com o descritor “psicanálise”. Das centenas de documentos recuperados, após leitura e aplicação de critérios de exclusão, elegemos oito para compor o corpo de análise deste trabalho. As dificuldades e entraves no levantamento bibliográfico evidenciaram a carência de pesquisas sobre a interlocução entre estes autores, apesar de sua aparente fecundidade. O cotejamento dos escritos apontou similitudes entre as teorias dos dois autores, que convergem em pontos fulcrais de seus trabalhos. Conceitos freudianos como narcisismo, sadismo e masoquismo indicam processos psíquicos de colonização que podem manter os oprimidos em posição de passividade ou até de identificação perante o opressor. Entender estes mecanismos psíquicos por intermédio do corpo de conhecimento transdisciplinar que é a psicanálise pode oferecer bases para a compreensão e para a luta contra os grilhões físicos e psicológicos que acorrentam o oprimido.

Palavras-chave
Freire; Freud; Psicanálise; Educação; Revisão integrativa

Abstract

This paper is an integrative review that surveys the bibliographic production in academic journals that explore the intersection between Paulo Freire’s pedagogical thought and Sigmund Freud’s psychoanalytic framework. The survey was conducted in the second half of 2022 across multiple repositories, both general ones (Scientific Electronic Library Online/SciELO and the Portal de Periódicos of the Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior/CAPES), as well as specific databases in the fields of Education in Brazil (Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação/ANPEd and EDUC@) and Psychology (Portal de Periódicos Eletrônicos de Psicologia/PePSIC), using the combination of the descriptors “Freire” and “Freud” with the descriptor “psychoanalysis.” From the hundreds of documents retrieved, after reading and applying exclusion criteria, we selected eight to comprise the body of analysis for this work. The difficulties and obstacles encountered in the bibliographic survey highlighted the scarcity of research on the dialogue between these authors, despite its apparent fecundity. The comparison of the writings indicated similarities between the theories of the two authors, which converge on crucial points of their works. Freudian concepts such as narcissism, sadism, and masochism suggest psychic processes of colonization that can keep the oppressed in a position of passivity or even identification with the oppressor. Understanding these psychic mechanisms through the transdisciplinary body of knowledge of psychoanalysis may provide foundations for the understanding of and the fight against the physical and psychological chains that bind the oppressed.

Keywords
Freire ; Freud ; Psychoanalysis ; Education ; Integrative review

Breve introdução aos autores-título

Em 1937, no ensaio Análise terminável e interminável , Sigmund Freud ( 2018FREUD, Sigmund. Moisés e o monoteísmo, compêndio de psicanálise e outros textos (1937-1939). São Paulo: Companhia das Letras, 2018. ), criador da psicanálise, já ao fim de sua vida e de sua prolífica produção intelectual, enumera três profissões que considera “impossíveis”: governar, psicanalisar e educar. Impossíveis porque, segundo ele, são ofícios nos quais já se sabe de antemão da insuficiência dos resultados que se alcançará na empreitada. Assim, a palavra “impossível” não assume, aqui, sinônimo de “impraticável”, em tom impeditivo; o que o pensador austríaco nos chama à atenção são os caráteres complexos e as enormes exigências e responsabilidades que tais profissões impõem a seus praticantes.

Para Paulo Freire, educar é uma tarefa que necessita mobilizar inúmeros “afetos”: amor, coragem, esperança, amizade. O autor brasileiro sempre professou um sonho, uma utopia de educação. Mas assim como em Freud, o impossível não é impraticável, em Freire temos a utopia – este tipo de impossível, este inalcançável – atuando não como limite, mas, sim, como guia e acalento à difícil jornada; nas belas palavras de Fernando Birri, citado por Eduardo Galeano ( 1993GALEANO, Eduardo. Las palabras andantes. Buenos Aires: Catálogos S.R.L., 1993. ), a utopia serve justamente para que não deixemos de caminhar.

Se Freire tivesse lido o ensaio de Freud discordaria radicalmente desse “impossível” afirmado tão categoricamente pelo psicanalista: o brasileiro sempre foi mais interessado no difícil necessário das possibilidades: “[...] mudar é difícil, mas é possível e urgente” (Freire, 1991FREIRE, Paulo. A educação na cidade. São Paulo: Cortez, 1991. , p. 7). O proclamado patrono da educação brasileira pensava o processo educativo como um processo deveras inacabado e incompleto por natureza. A educação como processo incompleto porque os próprios homens o são, dizia ele.

Também entendia que a educação não pode ser padronizada ou verticalizada. Muito menos esvaziada de significado, que é o que acontece quando se resume a conteúdos a serem mecanicamente memorizados. A educação para Freire é um processo que se renova a cada vez que se ensina e se aprende. Assim como cada relação entre analista e analisante (a análise propriamente dita) é única e tem suas peculiaridades, para Freire cada oportunidade de ensinar é – além de oportunidade também de aprender – também chance de repensar e refazer o próprio ato pedagógico, de (re)moldá-lo em forma menos autoritária e mais acolhedora.

Freire e Freud tinham concepções de mundo e vida bastante diferentes. Enquanto o brasileiro era esperançoso e professava essa vocação na difusão do verbo “esperançar” em seus escritos, o austríaco já era mais fatalista e um tanto quanto niilista, como bom leitor de Nietzsche. Além da personalidade possivelmente muito distinta e da distância geográfica, ambos também se separam no tempo. Freud nasceu no século XIX, em 1856, e já era um homem de meia-idade quando da passagem para o século XX, virada temporal atravessada pela publicação de A interpretação dos sonhos , em 1900, considerada a obra inaugural da psicanálise. Já Paulo Freire nasceu em 1921 e faleceu em 1997 e sua obra se inicia muito depois de Freud haver falecido, em 1939.

Entretanto, a vida dos dois é marcada pelo preconceito e pela perseguição. Freud era judeu e testemunhou em primeira mão a ascensão do antissemitismo na Europa, além de estar no coração geográfico das duas Grandes Guerras, nas quais seus filhos tiveram de lutar. Freire era nordestino de orientação política marcadamente esquerdista, foi perseguido pela ditadura civil-militar brasileira (1964-1985) e precisou se exilar de sua amada terra natal por longos anos, nos quais continuou trabalhando em sua obra.

Esta revisão integrativa é uma tentativa de promover um diálogo entre dois autores que são referências mundiais em seus campos de saber. A leitura de Paulo Freire nos revela, aqui e acolá, algumas referências nominais à psicanálise, alguma nota de rodapé citando autores da área, uma ou outra apropriação de algum conceito psicanalítico. Esta intuição de uma possível aproximação entre o referencial freiriano com o saber psicanalítico – que sempre foi multidisciplinar por suas próprias natureza e necessidade – ou mesmo de uma proposição de similaridades, de “afinidades eletivas” entre o trabalho dos autores, é o que nos compele e nos guia nesta proposta de averiguar se o pensamento destes grandes pensadores já foi cotejado ou articulado anteriormente.

Em que se pese, entretanto, que o trabalho procura respeitar e expressar as distâncias geográficas, cronológicas e políticas de ambos os autores; fatores que certamente afetam as subjetividades forjadas em suas formulações. Contudo, reiteramos, as afinidades são possíveis e expressivas, conforme demonstrarão os autores a partir dos quais construímos essa revisão integrativa.

Entraves e idiossincrasias da pesquisa nas bases

Tendo como objetivo levantar a produção científica em periódicos que articula o pensamento freiriano com o pensamento freudiano, optamos inicialmente pelos descritores “Freire” e “Freud”, cuja combinação passou a ser buscada nas bases e plataformas agregadoras de artigos científicos. As buscas foram realizadas em outubro de 2022, sendo que seus resultados representam os estudos indexados à época. Sempre que disponíveis, foram usadas as interfaces de pesquisa avançadas das plataformas, sem, entretanto, efetuarmos quaisquer tipos de restrições, como de idiomas ou recortes temporais.

A busca começou na conhecida base Scientific Electronic Library Online (SciELO), o que já revelou uma primeira idiossincrasia da pesquisa, que se repetiria por todas as outras plataformas e mecanismos de busca: a usualidade do sobrenome “Freire” no Brasil. Nessa primeira busca resultados foram encontrados, entretanto, nenhum citava ou referenciava Paulo Freire; o sobrenome do autor aparecia apenas como parte de nome de algum/a dos/as autores/as. Nova pesquisa foi efetuada na base combinando, desta vez, os descritores “Freire” e “psicanálise”; obtiveram-se dezenas de resultados, sem que nenhum, contudo, de fato se alinhasse ao objetivo deste escrito.

Como a base SciELO foi infrutífera para a pesquisa, nos direcionamos as plataformas específicas das grandes áreas que dialogam neste artigo, começando pela Educação. A seção “Biblioteca” da webpage da Associação Nacional das Pós-Graduações em Educação (ANPEd) foi a primeira a ser consultada, as duas composições de descritores anteriores foram aplicadas, porém, nenhum dos arquivos recuperados se encaixava no escopo e objetivo deste trabalho.

A próxima base de pesquisa consultada foi a EDUC@. Essa plataforma utiliza a metodologia da SciELO, porém abrange número maior de periódicos que esta. Novamente, buscas realizadas utilizando-se as duas permutações de descritores anteriormente já utilizados revelaram arquivos que, infelizmente, não coadunavam com a problemática que move este artigo.

Como estas bases não serviram para sequer começar a construção de um corpo de análise, a próxima tentativa foi em uma plataforma específica da área da Psicologia, a base de Periódicos Eletrônicos em Psicologia (PePSIC), que também utiliza metodologia SciELO. É nesta plataforma que aparecem os primeiros achados que compõem o corpus analítico deste artigo.

As duas combinações dos três descritores anteriormente explicitados retornaram três resultados cada, totalizando seis artigos. Aqui surge novamente a questão da usualidade do sobrenome Freire; quatro artigos não tratavam sobre o patrono da educação brasileira. Os dois restantes, entretanto, foram os primeiros achados da já longa busca por produções que cotejam o pensamento dos autores-chave ou cotejam o pensamento de Freire com os pressupostos de qualquer um dos autores maiores da psicanálise.

A quinta e última base consultada na tentativa de construção de um corpo de análise mais robusto foi o Portal de Periódicos da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes). Esta base possui uma abrangência bastante grande e, por isso mesmo, necessitou de alguns cuidados extras na triagem dos resultados obtidos, reportando-nos à noção presente em Petticrew e Roberts ( 2006PETTICREW, Mark; ROBERTS, Helen. Systematic reviews in the social sciences: a practical guide. Malden: Blackwell Publishing, 2006. ) de que é preciso definir critérios de inclusão, mas também critérios de exclusão.

O Portal de Periódicos da Capes indexa não apenas artigos, mas também capítulos de livros, resenhas; até mesmo uma tese de doutorado foi recuperada numa das pesquisas (trabalho erroneamente catalogado como “artigo” pela plataforma). O primeiro critério foi, então, excluir qualquer material que não fosse artigo publicado em periódico. Os trabalhos cuja revisão por pares não foi atestada pela plataforma nem pôde ser verificada também foram descartados.

A pesquisa com os descritores “Freire” e “Freud” retornou vários resultados que após aplicação dos critérios de exclusão e da eliminação de trabalhos cuja menção ao sobrenome Freire acontecia somente na autoria ou apenas em referência a outro pensador, remanesceram dois em português e dois em inglês para a análise.

A pesquisa foi repetida na mesma base, desta vez trocando o descritor “Freud” pelo descritor “psicanálise”. Após aplicação dos mesmos critérios de exclusão da pesquisa anterior na base (houve a necessidade de se acrescentar na lista de exclusão outros professores e intelectuais recorrentes na pesquisa cujo nome continha “Freire”), restaram oito artigos, dos quais após aplicação de todos os critérios de exclusão anteriores (além da ajuda da ferramenta de busca do leitor de PDF que revelou que um dos artigos sequer continha as palavras-descritores), dois trabalhos restantes foram incorporados à análise promovida nesta revisão integrativa.

O corpus analítico do trabalho é, desta forma, constituído por oito artigos que foram recuperados em apenas duas das cinco bases consultadas (PePSIC e Portal de Periódicos da Capes). O quadro a seguir apresenta os títulos, autorias e anos de publicação dos artigos, permitindo algumas considerações preliminares sobre o material.

Quadro 1- Artigos analisados

Autoria Título Ano
AGUIAR, Débora Cristina Vasconcelos; BARGUIL, Paulo Meireles. O aprendiz e a (im)possibilidade da autonomia 2021 AGUIAR, Débora Cristina Vasconcelos; BARGUIL, Paulo Meireles. O aprendiz e a (im)possibilidade da autonomia. Filosofia e Educação, Campinas, v. 13, n. 2, p. 2516-2546, maio/ago. 2021. Disponível em: https://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/index.php/rfe/article/view/8666268 . Acesso em: 6 out. 2022.
https://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/in...
ALMEIDA, Alexandre Patricio de; SANTOS, Mateus Vitor dos. Educação como mecanismo de superação das relações de opressão atravessadas pela fragilidade do Ego 2020 ALMEIDA, Alexandre Patrício de; SANTOS, Mateus Vitor dos. Educação como mecanismo de superação das relações de opressão atravessadas pela fragilidade do Ego. Dialogia, São Paulo, n. 34, p. 337-350, jan./abr. 2020. Disponível em: https://periodicos.uninove.br/dialogia/article/view/16008/8227 . Acesso em: 6 out. 2022.
https://periodicos.uninove.br/dialogia/a...
BARRETO, Vitor Hugo Lima. Freud e Freire: uma interlocução possível 2015 BARRETO, Vitor Hugo Lima. Freud e Freire: uma interlocução possível. Estudos de Psicanálise, Belo Horizonte, n. 43, p. 161-167, jul. 2015. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/ep/n43/n43a17.pdf . Acesso em: 6 out. 2022.
http://pepsic.bvsalud.org/pdf/ep/n43/n43...
CASTANHO, Pablo. A noção de libertação em Paulo Freire e o trabalho psicanalítico de grupo 2016 CASTANHO, Pablo. A noção de libertação em Paulo Freire e o trabalho psicanalítico de grupo. Vínculo – Revista do Nesme, São Paulo, v. 13, n. 2, p. 66-76, jul./dez. 2016. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/vinculo/v13n2/v13n2a08.pdf . Acesso em: 6 out. 2022.
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FREITAS, Denise de; VILLANI, Alberto; PIERSON, Alice Helena Campos. A formação de professores em Ciências: Freire dialogando com a Psicanálise 2001 FREITAS, Denise de; VILLANI, Alberto; PIERSON, Alice Helena Campos. A formação de professores em ciências: Freire dialogando com a Psicanálise. Pro-Posições, Campinas, v. 12, n. 1, p. 47-61, mar. 2001. Disponível em: https://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/index.php/proposic/article/view/8644010 . Acesso em: 6 out. 2022.
https://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/in...
KENNEDY, David. The child and postmodern subjectivity 2002 KENNEDY, David. The child and postmodern subjectivity. Educational Theory, Illinois, v. 52, n. 2, p. 155-167, 2002. Disponível em: https://doi.org/10.1111/j.1741-5446.2002.00155.x . Acesso em: 6 out. 2022.
https://doi.org/10.1111/j.1741-5446.2002...
SOUSA, Rui. Pedagogia da esperança revisitada: um encontro entre Paulo Freire e o filósofo Ernst Bloch 2021 SOUSA, Rui. Pedagogia da Esperança revisitada: um encontro entre Paulo Freire e o filósofo Ernst Bloch. Revista Espaço Acadêmico, Maringá, v. 21, n. 231, p. 258-272, nov./dez. 2021. Disponível em: https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/EspacoAcademico/article/view/55611 . Acesso em: 6 out. 2022.
https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/...
VAAGE, Leif Eric. Learning to read the Bible with desire: teaching the Eros of Exegesis in the theological classroom 2007 VAAGE, Leif Eric. Learning to read the bible with desire: teaching the Eros of exegesis in the theological classroom. Teaching Theology and Religion, Malden, v. 10, n. 2 p. 87-94, abr. 2007. Disponível em: https://doi.org/10.1111/j.1467-9647.2007.00321.x . Acesso em: 6 out. 2022.
https://doi.org/10.1111/j.1467-9647.2007...
Fonte: Elaborado pelos autores (2023).

Na próxima seção promovemos a revisão integrativa de fato, trazendo os autores em uma ordem que não expressa nenhum critério objetivo; a sequência responde, sim, a um encadeamento que julgamos o mais didático para expor e explorar os pontos de convergência e divergência dos/as autores/as.

Possibilidades de diálogo

O artigo de Barreto ( 2015 BARRETO, Vitor Hugo Lima. Freud e Freire: uma interlocução possível. Estudos de Psicanálise, Belo Horizonte, n. 43, p. 161-167, jul. 2015. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/ep/n43/n43a17.pdf . Acesso em: 6 out. 2022.
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) foi um dos primeiros achados da pesquisa e é apontado por Castanho ( 2016 CASTANHO, Pablo. A noção de libertação em Paulo Freire e o trabalho psicanalítico de grupo. Vínculo – Revista do Nesme, São Paulo, v. 13, n. 2, p. 66-76, jul./dez. 2016. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/vinculo/v13n2/v13n2a08.pdf . Acesso em: 6 out. 2022.
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), também como parte do corpus da pesquisa, o único artigo que este último havia encontrado sobre a intersecção entre os pensamentos freiriano e freudiano à época em que escreveu o seu trabalho. Essa influência já se percebe no título desta pesquisa, uma corruptela do título do texto de Barreto. A análise começa, portanto, a partir destes dois autores, ambos indexados pela plataforma PePSIC, os primeiros resultados encontrados.

Barreto é um dos poucos autores aqui analisados que realmente se esforça em empreender um diálogo entre o ideário freiriano com a psicanálise freudiana de base. Antes de tudo, porém, tecemos uma ressalva crítica: já no início de seu artigo, o autor declara que se propõe a “[...] uma análise das bases psicanalíticas utilizadas por Freire, sejam referenciadas ou não pelo autor” (Barreto, 2015 BARRETO, Vitor Hugo Lima. Freud e Freire: uma interlocução possível. Estudos de Psicanálise, Belo Horizonte, n. 43, p. 161-167, jul. 2015. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/ep/n43/n43a17.pdf . Acesso em: 6 out. 2022.
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, p. 162).

Consideramos essa declaração inicial problemática, pois parece expressar em si própria a assertiva de que Freire teria se utilizado da teoria psicanalítica em sua obra. Não existem provas textuais disso. Freire nunca afirmou ou citou ter se reportado à teoria psicanalítica, embora saibamos por intermédio de Pedagogia do oprimido que ele era leitor de Erich Fromm 2 2- Fromm foi um psicanalista estadunidense que viveu entre 1900 e 1980 e que buscou articular em sua obra a psicanálise freudiana com a teoria marxista, elaborando (com outros autores de destaque na psicanálise da primeira metade do século XX) o que mais tarde seria conhecido como “freudo-marxismo” (Roudinesco; Plon, 1998 ). Esta associação entre psicanálise e marxismo comparecerá nos artigos selecionados para a revisão aqui proposta e será de especial importância na compreensão de alguns autores. , a quem cita nominalmente no texto, e que em outros textos seus apareça a palavra “psicanálise” de forma pontual.

Feita esta ressalva, é possível observar, de maneira geral, que Barreto ( 2015 BARRETO, Vitor Hugo Lima. Freud e Freire: uma interlocução possível. Estudos de Psicanálise, Belo Horizonte, n. 43, p. 161-167, jul. 2015. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/ep/n43/n43a17.pdf . Acesso em: 6 out. 2022.
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) se empenha em traçar paralelos genuínos entre elementos das teorias de Freire e Freud, ou mesmo evidenciar possíveis respostas da psicanálise as formulações freireanas.

Em sua análise, Barreto ( 2015 BARRETO, Vitor Hugo Lima. Freud e Freire: uma interlocução possível. Estudos de Psicanálise, Belo Horizonte, n. 43, p. 161-167, jul. 2015. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/ep/n43/n43a17.pdf . Acesso em: 6 out. 2022.
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) aponta conceitos freudianos que podem explicar a perpetuação das relações de opressão que Freire denuncia em seu (talvez) mais famoso aforismo: “Quando a educação não é libertadora, o sonho do oprimido é de se tornar opressor”. Embora não se encontre ipsis litteris em Pedagogia do oprimido , essa máxima sintetiza com clareza as premissas da obra.

O autor argumenta que, para que essa transformação do oprimido em opressor aconteça, é necessária uma identificação do oprimido com o opressor, o que se explicaria psicanaliticamente através das relações inconscientes de masoquismo que os sujeitos carregam dentro de si. Masoquismo entendido aqui na acepção freudiana do termo, quando o sadismo se volta contra o próprio sujeito, é a violência contra si própria disparada por complexos morais, culpas inconscientes etc. (Freud, 2016FREUD, Sigmund. Neurose, psicose, perversão. Belo Horizonte: Autêntica, 2016. ). Outros autores do corpus analítico irão propor outros mecanismos como facilitadores da colonização do pensamento do oprimido pelo pensamento do opressor, elaborações teóricas de maior força do que a de Barreto.

Barreto ( 2015 BARRETO, Vitor Hugo Lima. Freud e Freire: uma interlocução possível. Estudos de Psicanálise, Belo Horizonte, n. 43, p. 161-167, jul. 2015. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/ep/n43/n43a17.pdf . Acesso em: 6 out. 2022.
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) aponta também o medo inconsciente da liberdade que os indivíduos carregam dentro de si como outro elemento que possibilita as dinâmicas de perpetuação da opressão entre os seres, linha de argumentação que será adiante melhor explorada por outro trabalho do corpo de análise.

Ao avançar em seu texto, o autor apresenta o conceito de sublimação, ambíguo na obra de Freud pela parca quantidade e marginalidade dos escritos do autor sobre o tema, mas de especial interesse para a educação. De acordo com Roudinesco e Plon ( 1998ROUDINESCO, Elizabeth; PLON, Michael. Dicionário de psicanálise. Rio de Janeiro: Zahar, 1998. ), a sublimação é uma operação psíquica em que a energia da libido encontraria uma maneira de expressão não sexual, que seria através da criação artística, literária ou científica. Assim, como motor da produção de ciência ou arte, a sublimação é uma das operações psíquicas que compele ao ser buscar o conhecimento e o prazer da atividade criadora.

Barreto ( 2015 BARRETO, Vitor Hugo Lima. Freud e Freire: uma interlocução possível. Estudos de Psicanálise, Belo Horizonte, n. 43, p. 161-167, jul. 2015. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/ep/n43/n43a17.pdf . Acesso em: 6 out. 2022.
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) cita também o conceito de “instinto de dominação” 3 3- Barreto ( 2015 ) utiliza esta expressão pois se reporta a traduções antigas das obras de Freud, produzidas pela Editora Imago, a primeira a publicar as obras de Freud no Brasil, e que baseou sua versão para o português na tradução inglesa da obra de Freud e não nos originais em alemão. Assim, ele utiliza “instinto de dominação” como tradução de “ instinct for mastery ”, que, por sua vez, é a escolhida para verter a palavra original em alemão, que é “ Bemächtigungstrieb ”. Algumas traduções brasileiras mais contemporâneas, como aquelas utilizadas por Castanho ( 2016 ) no próximo artigo a ser analisado, traduziram o termo alemão Bemächtigungstrieb como “pulsão de domínio”, uma tradução adequada, aceitável e bastante próxima da dos dicionários de verbetes em psicanálise mais respeitados e utilizados como fontes de consulta para este artigo – o de Roudinesco e Plon ( 1998 ) e o de Laplanche e Pontalis ( 1991 ) –, que vertem o termo em alemão para “pulsão de dominação”. como parte das tendências sadomasoquistas do sujeito, das quais derivaria sua violência e identificação com os que oprimem, mas que, revertidas de sua expressão negativa, resultariam no desejo pelo saber. Assim, advoga o autor, a busca e o desejo pelo saber para Freud são compatíveis com o desejo ontológico de libertação em Freire: a possibilidade de sublimação das tendências agressivas sadomasoquistas do indivíduo converteria o desejo por dominar em desejo/busca pelo saber, saber cuja posse poderia configurar uma maneira de evitar a identificação do oprimido com o opressor.

Ao final de seu artigo, Barreto ( 2015 BARRETO, Vitor Hugo Lima. Freud e Freire: uma interlocução possível. Estudos de Psicanálise, Belo Horizonte, n. 43, p. 161-167, jul. 2015. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/ep/n43/n43a17.pdf . Acesso em: 6 out. 2022.
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) tangencia a questão da transferência dos afetos – central na psicanálise e que será abordada adiante neste trabalho – ao elaborar que um dos incentivadores à busca pelo saber por parte do discente seria o medo infantil da perda do amor do adulto. O trabalho deste autor é profícuo em estabelecer nexos entre a teoria freudiana e pedagogia freireana, sem, entretanto, se aprofundar muito nestas ligações, de modo a comprová-las ou refutá-las.

Como já explicitado anteriormente, a posição do trabalho de Castanho ( 2016 CASTANHO, Pablo. A noção de libertação em Paulo Freire e o trabalho psicanalítico de grupo. Vínculo – Revista do Nesme, São Paulo, v. 13, n. 2, p. 66-76, jul./dez. 2016. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/vinculo/v13n2/v13n2a08.pdf . Acesso em: 6 out. 2022.
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) neste corpo de análise é ímpar e interessantíssima, pois o autor se apropria do artigo de Barreto, relendo-o criticamente, e procura novos elementos na obra de Paulo Freire, desta vez, com foco no trabalho psicanalítico clínico em grupos. Interessa ao autor a visão freireana sobre como o passado colonial de exploração do Brasil atua nas estruturas atuais de opressão e suas ramificações subjetivas.

Castanho ( 2016 CASTANHO, Pablo. A noção de libertação em Paulo Freire e o trabalho psicanalítico de grupo. Vínculo – Revista do Nesme, São Paulo, v. 13, n. 2, p. 66-76, jul./dez. 2016. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/vinculo/v13n2/v13n2a08.pdf . Acesso em: 6 out. 2022.
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) retoma a discussão sobre a “pulsão de domínio” – tradução mais adequada do que o “instinto de dominação” utilizado em Barreto ( 2015 BARRETO, Vitor Hugo Lima. Freud e Freire: uma interlocução possível. Estudos de Psicanálise, Belo Horizonte, n. 43, p. 161-167, jul. 2015. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/ep/n43/n43a17.pdf . Acesso em: 6 out. 2022.
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) – e suas relações com a sublimação e o sadomasoquismo. De acordo com o autor, a pulsão de domínio pode ser sublimada, ou seja, seu destino não precisa ser, necessariamente, o da violência e agressividade do masoquismo. É possível converter a energia desta pulsão em vontade de saber. O autor ainda acrescenta que, mesmo pela via da sublimação, a pulsão de domínio requer, para que não se converta em tendência masoquista e opressora, o abandono de alguma parcela de satisfação do ser, ou seja, para ser mais , em termos freirianos, é preciso ter um pouco menos de prazer e satisfação pulsional.

Outro ponto fulcral do trabalho de Castanho ( 2016 CASTANHO, Pablo. A noção de libertação em Paulo Freire e o trabalho psicanalítico de grupo. Vínculo – Revista do Nesme, São Paulo, v. 13, n. 2, p. 66-76, jul./dez. 2016. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/vinculo/v13n2/v13n2a08.pdf . Acesso em: 6 out. 2022.
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) é a denúncia do liberalismo econômico como um modo de pensar que engendra tipos específicos de sofrimento psíquico que servem de combustível para as relações sadomasoquistas de dominação e exploração – denúncia que encontramos recorrentemente nas obras de Paulo Freire, especialmente em sua obra Pedagogia do oprimido . Segundo o pesquisador, a lógica utilitarista desse tipo de pensamento, quando aplicada à lógica intersubjetiva que governa nossas relações interpessoais, produz individualismos, egocentrismos e, em última instância, a reificação do ser humano. Daí a necessidade da autonomia e da liberdade pregadas por Freire como promotoras de uma aprendizagem criticamente engajada; aprendizagem esta que possa gerar cidadãos do mundo conscientes de seu papel na luta de classes contra o capitalismo colonial e o sistema neoliberal que assolam e solapam o sul global, por exemplo.

O trabalho assinado por Freitas, Villani e Pierson ( 2001 FREITAS, Denise de; VILLANI, Alberto; PIERSON, Alice Helena Campos. A formação de professores em ciências: Freire dialogando com a Psicanálise. Pro-Posições, Campinas, v. 12, n. 1, p. 47-61, mar. 2001. Disponível em: https://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/index.php/proposic/article/view/8644010 . Acesso em: 6 out. 2022.
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) trata-se de relato de experiência na formação de professores das áreas de Biologia e Física, no qual os autores procuram articular os pressupostos freirianos com a psicanálise. Não há citação ou menção a Freud em nenhum momento, entretanto os pressupostos do psicanalista francês Jacques Lacan – o mais ilustre releitor e comentador de Freud – são aqui introduzidos indiretamente através de obras como as do argentino Juan-David Nasio e as do francês Leandro de Lajonquière, sendo este último o produtor de um vasto corpo de trabalho dedicado ao estudo das possibilidades de imbricação entre psicanálise e educação.

O trio analisa que o ato educativo, na perspectiva psicanalítica, parte sempre de um fértil equívoco: o aprendente acredita que o professor detém o que conhecimento que busca e que esse professor será capaz de transmiti-lo satisfatoriamente. E nesta ilusão, afirmam que se instaura a “transferência pedagógica”, sendo transferência um conceito freudiano já citado anteriormente e sobre o qual vale a pena nos debruçarmos por sua centralidade e necessidade no ato psicanalítico.

Freud ( 2014FREUD, Sigmund. Conferências introdutórias à psicanálise (1916-1917). São Paulo: Companhia das Letras, 2014. ) nos apresenta ao conceito de transferência como, literalmente, uma transferência de sentimentos e afetos (ora amorosos e amigáveis, ora hostis) da parte do paciente em análise em direção ao analista. Quando amorosa ou positiva, a transferência atua, na maioria dos casos, como uma “mola” propulsora para o tratamento psicanalítico, pois o paciente coloca o analista em um lugar idealizado de autoridade, competência e afetos. Freud extrapola, então, o fenômeno da transferência para todas as relações humanas, afirmando que não é apenas na relação médico e paciente em que ocorre essa reedição de afetos, geralmente reminiscentes da infância.

O que propõem Freitas, Villani e Pierson ( 2001 FREITAS, Denise de; VILLANI, Alberto; PIERSON, Alice Helena Campos. A formação de professores em ciências: Freire dialogando com a Psicanálise. Pro-Posições, Campinas, v. 12, n. 1, p. 47-61, mar. 2001. Disponível em: https://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/index.php/proposic/article/view/8644010 . Acesso em: 6 out. 2022.
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) em seu trabalho, em consonância com a breve inserção de Barreto ( 2015 BARRETO, Vitor Hugo Lima. Freud e Freire: uma interlocução possível. Estudos de Psicanálise, Belo Horizonte, n. 43, p. 161-167, jul. 2015. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/ep/n43/n43a17.pdf . Acesso em: 6 out. 2022.
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) na temática, é que a transferência acontece, também, dos aprendizes em direção a seus professores: aqueles colocam estes últimos em lugares de autoridade e de suposto saber. De acordo com os autores, este é um fenômeno que poderia ser utilizado de maneira pedagógica, de modo a estimular o desejo e a busca pelo saber dos discentes, ou seja, o aproveitamento do afeto para o investimento deste no ato pedagógico.

Importante aqui explicitar e explicar uma questão relativa as terminologias encontradas em Freire e Freud. Se em Freire ( 2022bFREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. 81. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2022b. ) se encontram postulados sobre a necessidade do afeto e do amor como essenciais ao ato educativo humanizado e humanizador – o que certamente coaduna com o conceito de transferência da psicanálise – é preciso perceber que o autor nunca usa a palavra “transferência” no seu sentido psicanalítico; usa-a, pois, para designar a transferência de conteúdos esvaziada de significado pessoal para os aprendentes, modus operandi da educação bancária que denuncia. Com a ressalva sempre presente acerca desta falta de correspondência terminológica, percebemos, entretanto, a afinidade entre os postulados de Freud sobre a necessidade da transferência afetiva como força motriz do tratamento psicanalítico e a necessidade, revelada por Freire, do afeto como elemento desejável no ato educativo.

A tríade de autores conclui, em fechamento, que o acoplamento da perspectiva dialógica freireana ao referencial psicanalítico encontra seu ponto de colaboração mais efetivo quando oferece sugestões sobre maneiras de se trabalhar as questões práticas do processo de aprendizagem/ensinagem.

O escrito de Aguiar e Barguil ( 2021 AGUIAR, Débora Cristina Vasconcelos; BARGUIL, Paulo Meireles. O aprendiz e a (im)possibilidade da autonomia. Filosofia e Educação, Campinas, v. 13, n. 2, p. 2516-2546, maio/ago. 2021. Disponível em: https://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/index.php/rfe/article/view/8666268 . Acesso em: 6 out. 2022.
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) versa sobre as (im)possibilidades da autonomia do estudante a partir do cotejamento das noções de autonomia de vários autores: Jean-Jacques Rousseau, Immanuel Kant, Theodor Adorno, Jacques Lacan, Giorgio Agamben, Jean Piaget e, claro, Paulo Freire e Sigmund Freud. Um dos pontos de destaque do artigo é a demonstração de como o conceito de autonomia em Piaget se atrela à noção de moralidade e como foi fortemente influenciado por Kant e Freud. Os autores explicam que, para Piaget, a autonomia se trata do último estágio do desenvolvimento da moralidade na criança, que está intrinsecamente relacionado com as dimensões afetiva e cognitiva infantis.

Aguiar e Barguil ( 2021 AGUIAR, Débora Cristina Vasconcelos; BARGUIL, Paulo Meireles. O aprendiz e a (im)possibilidade da autonomia. Filosofia e Educação, Campinas, v. 13, n. 2, p. 2516-2546, maio/ago. 2021. Disponível em: https://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/index.php/rfe/article/view/8666268 . Acesso em: 6 out. 2022.
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) convergem com Barreto ( 2015 BARRETO, Vitor Hugo Lima. Freud e Freire: uma interlocução possível. Estudos de Psicanálise, Belo Horizonte, n. 43, p. 161-167, jul. 2015. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/ep/n43/n43a17.pdf . Acesso em: 6 out. 2022.
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) na temática do medo inconsciente da liberdade ao referenciarem Adorno, quando este afirma que o fascismo adveio da Alemanha porque seu povo, ainda nos escombros das ruínas do Império Austro-Húngaro e Pós-Primeira Guerra Mundial, não estava preparado psicologicamente para sua autodeterminação, nem à altura da liberdade que lhe fora concedida. O medo da liberdade e a falta do que fazer com ela, ainda que inconsciente, gerariam, portanto, identificações narcísicas dos sujeitos com seus opressores, fenômeno denunciado por Freire como recorrente também na tessitura social brasileira do século XX.

Contra este medo é que o educador brasileiro preconiza a pedagogia da autonomia: “É neste sentido que uma pedagogia da autonomia tem de estar centrada em experiências estimuladoras da decisão e da responsabilidade, vale dizer, em experiências respeitosas de liberdade” (Freire, 2022aFREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia. 72. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2022a. , p. 105). Assim, uma educação para autonomia prepararia os sujeitos desde cedo para exercerem sua liberdade sem medos e dentro dos limites éticos.

O artigo de Almeida e Santos ( 2020 ALMEIDA, Alexandre Patrício de; SANTOS, Mateus Vitor dos. Educação como mecanismo de superação das relações de opressão atravessadas pela fragilidade do Ego. Dialogia, São Paulo, n. 34, p. 337-350, jan./abr. 2020. Disponível em: https://periodicos.uninove.br/dialogia/article/view/16008/8227 . Acesso em: 6 out. 2022.
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) articula a pedagogia freireana e a psicanálise freudiana ao propor, já em seu título, a educação como um mecanismo para superação das relações de opressão que são atravessadas pela fragilidade da instância psíquica conhecida, psicanaliticamente, como Eu 4 4- Cabe relatar, a título de rigor terminológico dentro do campo da psicanálise, que no trabalho de Almeida e Santos ( 2020 ) não existe uma padronização na nomenclatura das três instâncias que compõem o aparelho psíquico segundo a psicanálise. Essas três instâncias são chamadas em alemão de Ich, Überich e Es . A tradução inglesa, da qual se originou a primeira (e por muito tempo a única) versão brasileira, publicada pela editora Imago, valeu-se de três termos em latim para designar essas estruturas: respectivamente, ego , supergo e id . Acontece que os termos em alemão são palavras de uso corrente na linguagem alemã: Ich (eu), Überich (supereu) e Id (isso). A proposta de Freud sempre foi propor terminologias usando palavras correntes do idioma alemão e que fossem autoexplicativas. Assim, nas traduções brasileiras mais atuais, vertidas para o português diretamente do alemão, foram abandonados os termos latinos intermediários da tradução inglesa e se passou a usar e difundir os termos Eu , Supereu e Isso , traduções diretas das palavras. Eventualmente, algumas traduções continuam utilizando o termo Id , mesmo quando utilizam os termos Eu e Supereu , dada a estranheza que a aparição do pronome “isso” causa na leitura em português. Os autores do artigo em análise utilizam ora as nomenclaturas mais modernas e mais aceitas, ora as traduções consagradas que usavam os termos em latim, porém arcaicas e em franco desuso. Neste trabalho, será sempre utilizada a tríade: Id , Eu e Supereu , como forma de contrabalançar a exatidão dos termos e a fluidez da leitura, e com iniciais maiúsculas para a clara sinalização de que se tratam das estruturas elaboradas no cânone freudiano. Uma nota breve e interessante sobre as questões técnicas envolvendo as novas traduções de Freud para o português brasileiro, diretamente do alemão, pode ser encontrada em Kastner ( 2010 ). . De acordo com Freud ( 2011FREUD, Sigmund. O eu e o id, “autobiografia” e outros textos (1923-1925). São Paulo: Companhia das Letras, 2011. ), o Eu é a instância psíquica que se liga à parte consciente de nossa personalidade, sendo a mediadora entre as exigências das outras instâncias psíquicas, inconscientes (o Id e o Supereu ), e também a instância psíquica que regula a mediação do sujeito com os estímulos externos. Nessa delicada posição de regular outras instâncias e atividades em simultâneo, o Eu de um indivíduo é suscetível a traumas, resistências, identificações e narcisismos, que vão compondo a subjetividade do indivíduo.

Almeida e Santos ( 2020 ALMEIDA, Alexandre Patrício de; SANTOS, Mateus Vitor dos. Educação como mecanismo de superação das relações de opressão atravessadas pela fragilidade do Ego. Dialogia, São Paulo, n. 34, p. 337-350, jan./abr. 2020. Disponível em: https://periodicos.uninove.br/dialogia/article/view/16008/8227 . Acesso em: 6 out. 2022.
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) abordam a temática da identificação narcísica observando que, para Freud, o indivíduo é componente de muitos grupos e, por meio de múltiplos laços de identificação, constrói seu Eu, essa instância psíquica que é a sede da consciência, segundo os mais diversos modelos. Se esta instância psíquica, núcleo duro da constituição do sujeito, encontra-se fragilizada, é possível que este sujeito se identifique narcisicamente com referenciais perversos individuais ou coletivos, como os totalitarismos, por exemplo. Nessa ligação narcísica, o sujeito busca no(s) outro(s), agora tomado(s) por objeto(s) e não mais sujeito(s), aquilo que é idêntico ou semelhante a si próprio.

Os pesquisadores descrevem essas relações de identificações utilizando o nazismo como caso exemplar, evidenciando assim a necessidade de se pensar a questão dos narcisismos pessoais e coletivos na temática da opressão como motivadores da barbárie:

Logo, embora o líder deva surgir como uma figura dotada de superpoderes, ele precisa representar, concomitantemente, uma pessoa comum, como ocorreu com Hitler, para propiciar a identificação por parte de todos os indivíduos que constituem a massa. Isso faz com que os seguidores satisfaçam seu duplo desejo: de se submeterem ao líder autoritário paterno e de almejarem ser, ao mesmo tempo, a própria figura de autoridade, representada pelo grande homem comum. Essa configuração social e psíquica já nos é suficiente para pensarmos as relações de opressão existentes no contexto contemporâneo [...].

(Almeida; Santos, 2020 ALMEIDA, Alexandre Patrício de; SANTOS, Mateus Vitor dos. Educação como mecanismo de superação das relações de opressão atravessadas pela fragilidade do Ego. Dialogia, São Paulo, n. 34, p. 337-350, jan./abr. 2020. Disponível em: https://periodicos.uninove.br/dialogia/article/view/16008/8227 . Acesso em: 6 out. 2022.
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, p. 341-342).

Daí em diante, os autores introduzem o pensamento freiriano professado em Pedagogia do oprimido como tentativa de superação e resposta as identificações narcísicas, tirânicas e totalitárias que podem se produzir a partir de um psiquismo fragilizado. Nesta condição de fragilidade, a consciência é cooptada por líderes tirânicos e regimes autoritários, resultando em uma “consciência hospedeira” que compele o sujeito a agir em prol da manutenção das relações de opressão (Freire, 2022bFREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. 81. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2022b. ).

A fortificação desta instância psíquica que é o Eu passaria pelo necessário desvelamento ao próprio sujeito de que ele se identificou narcisicamente com a figura do opressor, dentro do seu conformismo e da ausência do reconhecimento de perspectivas satisfatórias em si mesmo. Esse processo é o que Freire ( 2022bFREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. 81. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2022b. ) chama de tomada da “percepção da percepção anterior”, na qual o indivíduo toma consciência de qual era seu entendimento anterior das coisas, do mundo e de si, em relação as suas novas reflexões e percepções.

O processo de conhecer suas percepções e motivações anteriores – muitas vezes, inconscientemente identificadas com o opressor – não é tarefa fácil para Freire, pois exige múltiplas frentes de análise e requer a conquista das tão almejadas autonomia e responsabilidade, e da própria liberdade, a qual os sujeitos temem. É pertinente inserir aqui um excerto da obra Pedagogia da autonomia , referenciado em Almeida e Santos ( 2020 ALMEIDA, Alexandre Patrício de; SANTOS, Mateus Vitor dos. Educação como mecanismo de superação das relações de opressão atravessadas pela fragilidade do Ego. Dialogia, São Paulo, n. 34, p. 337-350, jan./abr. 2020. Disponível em: https://periodicos.uninove.br/dialogia/article/view/16008/8227 . Acesso em: 6 out. 2022.
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), e que cita direta e nominalmente a psicanálise, como método possível de superação da identificação do oprimido com seu opressor:

É importante ter claro que faz parte do poder ideológico dominante a inculcação nos dominados da responsabilidade por sua situação. Daí a culpa que sentem eles em determinado momento de suas relações com o seu contexto e com as classes dominantes, por se acharem nesta ou naquela situação desvantajosa. [...] Enquanto sentirem assim, pensarem assim e agirem assim, reforçam o poder do sistema. Se tornam coniventes da ordem desumanizante. A alfabetização, por exemplo, numa área de miséria, só ganha sentido na dimensão humana se, com ela, se realiza uma espécie de psicanálise histórico-político-social, de que vá resultando a extrojeção da culpa indevida . A isto corresponde a “expulsão” do opressor de dentro do oprimido, enquanto sombra invasora. Sombra que, expulsa pelo oprimido, precisa ser substituída por sua autonomia e sua responsabilidade.

(Freire, 2022aFREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia. 72. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2022a. , p. 80-81, grifo nosso).

Almeida e Santos ( 2020 ALMEIDA, Alexandre Patrício de; SANTOS, Mateus Vitor dos. Educação como mecanismo de superação das relações de opressão atravessadas pela fragilidade do Ego. Dialogia, São Paulo, n. 34, p. 337-350, jan./abr. 2020. Disponível em: https://periodicos.uninove.br/dialogia/article/view/16008/8227 . Acesso em: 6 out. 2022.
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) encerram o seu trabalho afirmando que a análise das relações de opressões relacionadas à perpetuação das ideologias dominantes mostra que estas são mantidas pela consciência hospedeira do opressor que se instala no oprimido, quando dotado de um Eu frágil e vulnerável. A “consciência hospedeira” é uma expressão pela qual Freire ( 2022aFREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia. 72. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2022a. ) denuncia o resultado nefasto de uma educação alienante ao nível do sujeito: a acolhida das ideias do opressor dentro da psique do oprimido. Daí a máxima freireana de que, quando a educação não se pretende à libertação, mas sim à manutenção das relações vigentes, o modo de ser do opressor é legitimado e exposto ao sujeito como modelo exemplar. O objetivo do indivíduo passa a ser, então, sair da condição de oprimido para opressor.

Apenas uma prática pedagógica crítica, emancipatória e libertadora, com vistas à autonomia intelectual, afetiva e subjetiva do sujeito, como preconizava o grande educador brasileiro, seria capaz de superar essas identificações nefastas e de extrojetar tal “idealização” do opressor de dentro do oprimido. Além disso, Almeida e Santos ( 2020 ALMEIDA, Alexandre Patrício de; SANTOS, Mateus Vitor dos. Educação como mecanismo de superação das relações de opressão atravessadas pela fragilidade do Ego. Dialogia, São Paulo, n. 34, p. 337-350, jan./abr. 2020. Disponível em: https://periodicos.uninove.br/dialogia/article/view/16008/8227 . Acesso em: 6 out. 2022.
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) chamam a atenção para a necessidade do caráter coletivo desta educação libertadora, visto que as identificações opressoras ocorrem também no campo social da coletividade, nos comportamentos de bando ou manada.

O artigo de Vaage ( 2007 VAAGE, Leif Eric. Learning to read the bible with desire: teaching the Eros of exegesis in the theological classroom. Teaching Theology and Religion, Malden, v. 10, n. 2 p. 87-94, abr. 2007. Disponível em: https://doi.org/10.1111/j.1467-9647.2007.00321.x . Acesso em: 6 out. 2022.
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) é, possivelmente, o mais peculiar dentro do material de análise: trata-se de um relato de experiência em que o autor, professor de uma universidade teológica estadunidense, descreve uma experiência de ensino na qual elege quatro textos para trabalhar com seus alunos, objetivando despertar nos alunos o desejo e a paixão pela exegese bíblica. Ele considera estes quatro livros complementares como uma possibilidade de conversa e instrução pedagógica para sua tarefa. Os textos escolhidos pelo professor são: as Confissões , de Santo Agostinho; The ethnography of reading 5 5- A etnografia da leitura , em tradução livre, do antropólogo Jonathan Boyarin, nunca editada em português. , de Jonathan Boyarin; Freud e a filosofia , do filósofo Paul Ricoeur; e Pedagogia do oprimido . Assim, Vaage ( 2007 VAAGE, Leif Eric. Learning to read the bible with desire: teaching the Eros of exegesis in the theological classroom. Teaching Theology and Religion, Malden, v. 10, n. 2 p. 87-94, abr. 2007. Disponível em: https://doi.org/10.1111/j.1467-9647.2007.00321.x . Acesso em: 6 out. 2022.
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) faz parte dos autores selecionados que não referencia Freud nem o cita diretamente; aqui, temos a interpretação de Ricoeur sobre os escritos do fundador da psicanálise.

De acordo com Vaage ( 2007 VAAGE, Leif Eric. Learning to read the bible with desire: teaching the Eros of exegesis in the theological classroom. Teaching Theology and Religion, Malden, v. 10, n. 2 p. 87-94, abr. 2007. Disponível em: https://doi.org/10.1111/j.1467-9647.2007.00321.x . Acesso em: 6 out. 2022.
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), Ricoeur e Freud dão atenção especial para a interação entre as forças de expressão e de repressão na consciência humana. Entretanto, enquanto Freud adota um tom mais pessimista, declarando que dificilmente superaríamos nossas forças instituais em sua totalidade, não sem um grande sacrifício psíquico, Ricoeur pensa na possibilidade de uma segunda natureza para o humano, a possibilidade de erudição dos desejos selvagens, ou seja, a possibilidade de sublimação total das tendências violentas em arte e/ou busca pelo saber; a mesma sublimação delineada por Freud já abordada anteriormente nesta seção, a partir de outros trabalhos.

Sobre Freire e a pedagogia do oprimido, Vaage ( 2007 VAAGE, Leif Eric. Learning to read the bible with desire: teaching the Eros of exegesis in the theological classroom. Teaching Theology and Religion, Malden, v. 10, n. 2 p. 87-94, abr. 2007. Disponível em: https://doi.org/10.1111/j.1467-9647.2007.00321.x . Acesso em: 6 out. 2022.
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) destaca a proposição do autor brasileiro de integrar temas relevantes para os estudantes aos conteúdos programáticos, de modo a permitir uma aprendizagem engajada, desejosa e suave, ansiosa pelo saber. Dialoga com Ricoeur, desse modo, ao apontar que a subjetividade do aprendente, ditada por seu inconsciente e manifestada em seus impulsos, pulsões e desejos, tem papel preponderante na aprendizagem engajada e/ou apaixonada.

Ao observarmos o rol de referências do trabalho de Sousa ( 2021 SOUSA, Rui. Pedagogia da Esperança revisitada: um encontro entre Paulo Freire e o filósofo Ernst Bloch. Revista Espaço Acadêmico, Maringá, v. 21, n. 231, p. 258-272, nov./dez. 2021. Disponível em: https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/EspacoAcademico/article/view/55611 . Acesso em: 6 out. 2022.
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), constatamos que ele não referencia nem cita diretamente Freud: o pesquisador articula o pensamento do psicanalista austríaco com o pensamento de Paulo Freire utilizando as releituras que o filósofo Ernst Bloch fez da psicanálise. Embora de caráter fragmentário, esse artigo aponta novas possibilidades de conversa entre os autores-título do presente trabalho.

Sousa ( 2021 SOUSA, Rui. Pedagogia da Esperança revisitada: um encontro entre Paulo Freire e o filósofo Ernst Bloch. Revista Espaço Acadêmico, Maringá, v. 21, n. 231, p. 258-272, nov./dez. 2021. Disponível em: https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/EspacoAcademico/article/view/55611 . Acesso em: 6 out. 2022.
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) sustenta que no pensamento de Bloch existe uma articulação crítica da utopia e da práxis de Marx com a psicanálise freudiana, o que permite aproximá-lo de Fromm, psicanalista citado em Pedagogia do oprimido e cuja orientação marxista já foi explicitada. De acordo com o autor do artigo, há em Bloch a denúncia de que a psicanálise freudiana jamais levará em conta a variável das condições socioeconômicas na análise do indivíduo e de suas pulsões.

O autor do artigo nos direciona, então, para fragmentos de vários textos de Freire além da Pedagogia do oprimido , Pedagogia da autonomia , Pedagogia da indignação , Pedagogia da esperança , Ação cultural para a liberdade e Educação e mudança . Sousa ( 2021 SOUSA, Rui. Pedagogia da Esperança revisitada: um encontro entre Paulo Freire e o filósofo Ernst Bloch. Revista Espaço Acadêmico, Maringá, v. 21, n. 231, p. 258-272, nov./dez. 2021. Disponível em: https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/EspacoAcademico/article/view/55611 . Acesso em: 6 out. 2022.
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) elabora um mosaico de citações em que esclarece as adjacências entre o ideário freiriano e o marxismo, com base em categorias como “utopia” e “esperança”.

A vocação ontológica do “ser mais” de Freire encontraria em Bloch, segundo Sousa ( 2021 SOUSA, Rui. Pedagogia da Esperança revisitada: um encontro entre Paulo Freire e o filósofo Ernst Bloch. Revista Espaço Acadêmico, Maringá, v. 21, n. 231, p. 258-272, nov./dez. 2021. Disponível em: https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/EspacoAcademico/article/view/55611 . Acesso em: 6 out. 2022.
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), uma relação com o inconsciente humano conforme descrito pela psicanálise. Bloch sugere que o inconsciente da psicanálise não é um inconsciente que ainda não é consciente, mas, sim, um inconsciente que não sabe de si, que necessita efetuar regressões para se conhecer. Dessa forma, o filósofo chega a afirmar que, no modelo de inconsciente proposto por Freud, nada há de novo. Nesse sentido, a utopia, o sonho, a esperança e os ideais de liberdade em Freire serviriam, também, para a ampliação da consciência de si e da realidade objetiva.

Assim, Sousa ( 2021 SOUSA, Rui. Pedagogia da Esperança revisitada: um encontro entre Paulo Freire e o filósofo Ernst Bloch. Revista Espaço Acadêmico, Maringá, v. 21, n. 231, p. 258-272, nov./dez. 2021. Disponível em: https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/EspacoAcademico/article/view/55611 . Acesso em: 6 out. 2022.
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) propõe que há uma afinidade eletiva entre Ernst Bloch e Paulo Freire, na qual ocorrem relações de analogia e até de simbiose, na qual a base epistemológica fundamentada na psicanálise e no marxismo de Bloch encontraria terreno fértil na práxis educacional proposta por Freire. Essa menção à práxis ajuda a introduzir o último artigo que compõe o material analisado.

A inclusão do artigo de Kennedy ( 2002 KENNEDY, David. The child and postmodern subjectivity. Educational Theory, Illinois, v. 52, n. 2, p. 155-167, 2002. Disponível em: https://doi.org/10.1111/j.1741-5446.2002.00155.x . Acesso em: 6 out. 2022.
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) no corpo de análise foi considerada cuidadosamente. Isto se deve ao fato de que é o único trabalho levantando que não cita diretamente Paulo Freire, nem o referencia. Na verdade, a menção ao nome de Paulo Freire acontece apenas num parágrafo específico, o qual, porém, faz valer sua inserção aqui tanto por sua força de sugestão e de síntese, como por coadunar com outros trabalhos já revisados ao propor implicações práticas entre a teoria dos dois autores ora pesquisados.

Kennedy ( 2002 KENNEDY, David. The child and postmodern subjectivity. Educational Theory, Illinois, v. 52, n. 2, p. 155-167, 2002. Disponível em: https://doi.org/10.1111/j.1741-5446.2002.00155.x . Acesso em: 6 out. 2022.
https://doi.org/10.1111/j.1741-5446.2002...
) retoma em seu trabalho a discussão sobre a subjetividade infantil, desta vez, olhando-a em um contexto de pós-modernidade. Perpassa as concepções de variados autores, desde Platão até a filosofia moderna (com certa ênfase no pensamento de Jean-Jacques Rousseau), preconizando que, para a escola acolher, respeitar e aproveitar pedagogicamente a subjetividade da criança contemporânea, deve se converter em um espaço que transite entre a brincadeira e o trabalho, entre a liberdade e a autonomia. É advogando por este tipo de escola que exigiria uma reimaginação da instituição, que ele articula de forma interessante o trabalho de Rousseau com o dos autores tema deste trabalho:

Para cumprir essa aspiração, as escolas teriam que ser quase completamente reimaginadas. Para reimaginar as escolas, a infância teria que ser reimaginada. De fato, isso vem acontecendo no Ocidente durante os últimos dois séculos – começando com Rousseau, se proliferando no Romantismo, se autoarticulando em Freud, e se operacionalizando em John Dewey e Paulo Freire.

(Kennedy, 2002 KENNEDY, David. The child and postmodern subjectivity. Educational Theory, Illinois, v. 52, n. 2, p. 155-167, 2002. Disponível em: https://doi.org/10.1111/j.1741-5446.2002.00155.x . Acesso em: 6 out. 2022.
https://doi.org/10.1111/j.1741-5446.2002...
, p. 166, tradução nossa).

Assim, somos aqui remetidos novamente ao tema da subjetividade/subjetivação do ser aparecer, dessa vez começando com os ideais delineados por Rousseau, passando pelo aporte da teoria freudiana acerca do inconsciente e da radical subjetividade dos seres e, segundo o autor, se operacionalizando em Dewey e Freire. Chamo aqui a atenção para essa operacionalização – que aqui denominarei de “praxiológica”. Se Kennedy ( 2002 KENNEDY, David. The child and postmodern subjectivity. Educational Theory, Illinois, v. 52, n. 2, p. 155-167, 2002. Disponível em: https://doi.org/10.1111/j.1741-5446.2002.00155.x . Acesso em: 6 out. 2022.
https://doi.org/10.1111/j.1741-5446.2002...
) afirma que a teoria freudiana encontra uma implementação no ideário e nas práticas de Dewey e Freire, então o autor aponta para a possibilidade do diálogo entre Freire e Freud pode ultrapassar seus arcabouços teórico-filosóficos, espraiando-se para o campo das metodologias desses dois autores.

Considerações finais e pistas para trabalhos futuros

Castanho ( 2016 CASTANHO, Pablo. A noção de libertação em Paulo Freire e o trabalho psicanalítico de grupo. Vínculo – Revista do Nesme, São Paulo, v. 13, n. 2, p. 66-76, jul./dez. 2016. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/vinculo/v13n2/v13n2a08.pdf . Acesso em: 6 out. 2022.
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) encerra o seu artigo com um alerta aos pesquisadores que planejam seguir com pesquisas que explorem as interlocuções entre Freire e Freud, acerca dos riscos inerentes à tentativa de diálogo entre autores com referenciais teóricos tão diferentes. Há sempre possibilidade de equívocos e mal-entendidos na comunicação. O alerta é válido para este trabalho e para futuros, dado que em mais de um artigo analisado nesta revisão houve equívocos, incompreensões (especialmente da teoria freudiana), além de problemas terminológicos e de tradução. Certamente a padronização dos termos e a adoção unificada a determinadas traduções seriam benéficas à constituição de um campo de estudos em educação que busque dialogar com a psicanálise.

Um primeiro aspecto relevante da revisão integrativa é que os trabalhos, em sua maioria, revelam e ressaltam dimensões práticas do acoplamento dos referenciais teóricos elaborados por Freire e Freud. Embora haja muito espaço para elucubrações teóricas acerca dos pontos de aproximação entre os dois autores, percebem-se relações especiais de similitude entre o método proposto por Freire e a clínica psicanalítica. Isto fica ainda mais evidente se pensarmos que a psicanálise, segundo Freud, é a cura pela palavra e sua enunciação, e que, para Freire, dar a possibilidade de narração e enunciações aos sujeitos por meio da palavra é condição mister para sua emancipação. Nesse sentido, parece ousado, porém não de todo absurdo, propor que a educação em Freire é uma forma de terapia, de “cura”, seja dos males individuais, seja dos males grupais e coletivos.

Outro apontamento interessante nessa direção é o encontrado em Kennedy ( 2002 KENNEDY, David. The child and postmodern subjectivity. Educational Theory, Illinois, v. 52, n. 2, p. 155-167, 2002. Disponível em: https://doi.org/10.1111/j.1741-5446.2002.00155.x . Acesso em: 6 out. 2022.
https://doi.org/10.1111/j.1741-5446.2002...
), o qual sugere as possibilidades de diálogo entre Freire e Freud não apenas no campo teórico, mas também em suas práticas metodológicas. Uma investigação sobre o método psicanalítico de Freud e as metodologias de ensino de Freire pode nos revelar relações práticas e pragmáticas entre a psicanálise e a pedagogia libertadora.

Conforme aparição no texto Pedagogia do oprimido e a citação em artigos, como os de Barreto ( 2015 BARRETO, Vitor Hugo Lima. Freud e Freire: uma interlocução possível. Estudos de Psicanálise, Belo Horizonte, n. 43, p. 161-167, jul. 2015. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/ep/n43/n43a17.pdf . Acesso em: 6 out. 2022.
http://pepsic.bvsalud.org/pdf/ep/n43/n43...
) e Castanho ( 2016 CASTANHO, Pablo. A noção de libertação em Paulo Freire e o trabalho psicanalítico de grupo. Vínculo – Revista do Nesme, São Paulo, v. 13, n. 2, p. 66-76, jul./dez. 2016. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/vinculo/v13n2/v13n2a08.pdf . Acesso em: 6 out. 2022.
http://pepsic.bvsalud.org/pdf/vinculo/v1...
), seria interessante para futuros trabalhos que busquem explorar o referencial psicanalítico imiscuído no ideário freiriano, especialmente, uma leitura e pesquisa mais extensas da obra de outros psicanalistas e filósofos, lidos por Freire ou por Freud, como os mencionados Erich Fromm e o filósofo Ernst Bloch, que articulam a psicanálise ao marxismo. Esse cotejamento com outros autores pode, inclusive, contribuir para uma multi ou transdisciplinaridade dos trabalhos futuros.

Ainda sobre outros autores, o escrito de Vaage ( 2007 VAAGE, Leif Eric. Learning to read the bible with desire: teaching the Eros of exegesis in the theological classroom. Teaching Theology and Religion, Malden, v. 10, n. 2 p. 87-94, abr. 2007. Disponível em: https://doi.org/10.1111/j.1467-9647.2007.00321.x . Acesso em: 6 out. 2022.
https://doi.org/10.1111/j.1467-9647.2007...
) aponta para outro autor de interesse dentro da psicanálise, Paul Ricoeur. Este filósofo francês possui um corpo de trabalho profícuo e diversificado, do qual se destacam, em relação ao escopo desta revisão, seus estudos sobre Freud e a psicanálise como método interpretativo, tangentes a sua pesquisa sobre hermenêutica e suas inscrições na fenomenologia. A leitura e pesquisa desse autor comprometido com o pensamento psicanalítico e com a hermenêutica pode revelar métodos e chaves de leitura para a interpretação de textos à luz da psicanálise. Tendo Freire eleito a “palavra” e sua leitura como uma das categorias centrais de sua obra, a hermenêutica e as teorias da interpretação parecem um bom complemento ao estudo das interlocuções entre o brasileiro e o psicanalista austríaco.

O trabalho de Sousa ( 2021 SOUSA, Rui. Pedagogia da Esperança revisitada: um encontro entre Paulo Freire e o filósofo Ernst Bloch. Revista Espaço Acadêmico, Maringá, v. 21, n. 231, p. 258-272, nov./dez. 2021. Disponível em: https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/EspacoAcademico/article/view/55611 . Acesso em: 6 out. 2022.
https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/...
) aponta para uma interessante direção ao reelaborar a proposta de inconsciente freudiano não como um “ainda não consciente”, mas sim como um consciente que ainda não se sabe. Isso ressoa com a pedagogia freireana quando o autor cita a “percepção da percepção anterior”, na qual os indivíduos, por intermédio da educação, tomam consciência não apenas da realidade objetiva em sua verdade, mas também se apercebem de suas antigas crenças e ideologias (Freire, 2022bFREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. 81. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2022b. ). Certamente, esta é uma semelhança que vale ser investigada em trabalhos que objetivem as interlocuções entre a teoria freudiana e a pedagogia freireana.

Uma questão inicial que apareceu no trabalho de Barreto ( 2015 BARRETO, Vitor Hugo Lima. Freud e Freire: uma interlocução possível. Estudos de Psicanálise, Belo Horizonte, n. 43, p. 161-167, jul. 2015. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/ep/n43/n43a17.pdf . Acesso em: 6 out. 2022.
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), a do masoquismo do sujeito como condição para a formação da consciência hospedeira do opressor dentro do oprimido, não compareceu em outros trabalhos. Tampouco o autor em questão elaborou melhor a relação. Conforme lemos na obra de Freire ( 2022bFREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. 81. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2022b. ), existe a menção aos termos “sadismo” e “masoquismo”, mas sem uma pesquisa focada nestes elementos, centrais e de difícil apreensão dentro da teoria psicanalítica freudiana, não é possível determinar se o educador brasileiro estava se servindo destas palavras nos termos psicanalíticos ou em termos mais gerais, mundanos ou até mesmo metafóricos.

Talvez a questão mais interessante e que permita maior aprofundamento que os trabalhos demonstram é que existe em Freud a explicitação de mecanismos psíquicos que oferecem possibilidades de explicação para o fenômeno da opressão, sua manutenção e a própria cooptação do oprimido pelas tendências opressoras das classes dominantes. A psicanálise oferece elementos para se pensar quais os mecanismos que podem facilitar a colonização psíquica e a objetificação do ser humano. O estudo de Freud em cotejamento com Freire pode, assim, auxiliar no desvelamento dos meandros das relações de opressão que se operam dentro de contextos de capitalismo tardio, neoliberalismo e exploração colonial, como as denunciadas e combatidas pelo grande educador brasileiro. Esta ponte entre pedagogia e psicanálise pode, quiçá, contribuir com sugestões práticas e/ou metodológicas da clínica psicanalítica para a pedagogia que pretende ser crítica e libertadora.

Embora tenhamos nos limitado à busca em bases nacionais, o levantamento demonstrou a existência de material em outros idiomas, o que nos leva a crer que buscas em bases internacionais específicas de periódicos da educação, psicologia ou até mesmo psicanálise (se houver), possam resultar em trabalhos ainda não visitados e levar a uma ampliação das possibilidades de diálogo entre o referencial freiriano e o referencial psicanalítico. Levando em conta o ranço neoliberal ultraconservador de direita que se apoderou do Brasil na última década e a constante desqualificação de Paulo Freire por variadas vias acadêmicas e midiáticas, seria triste – porém não de todo estranho – nos depararmos com maior interesse e respeito por Paulo Freire e seu legado fora de seu amado país natal.

Finalizamos esta revisão ressaltando que, embora não exista prova referencial da influência da psicanálise dentro do trabalho de Paulo Freire, existem alusões a termos e autores suficientes para supormos e para nos apropriarmos de uma expressão utilizada por Souza ( 2021 SOUSA, Rui. Pedagogia da Esperança revisitada: um encontro entre Paulo Freire e o filósofo Ernst Bloch. Revista Espaço Acadêmico, Maringá, v. 21, n. 231, p. 258-272, nov./dez. 2021. Disponível em: https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/EspacoAcademico/article/view/55611 . Acesso em: 6 out. 2022.
https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/...
), uma afinidade eletiva entre o pensamento freiriano e a psicanálise freudiana, especialmente quando nos voltamos para a análise a nível individual e societal das relações de exploração e dominação.

Referências

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    » https://doi.org/10.1111/j.1467-9647.2007.00321.x» https://doi.org/10.1111/j.1467-9647.2007.00321.x
  • 2-
    Fromm foi um psicanalista estadunidense que viveu entre 1900 e 1980 e que buscou articular em sua obra a psicanálise freudiana com a teoria marxista, elaborando (com outros autores de destaque na psicanálise da primeira metade do século XX) o que mais tarde seria conhecido como “freudo-marxismo” (Roudinesco; Plon, 1998ROUDINESCO, Elizabeth; PLON, Michael. Dicionário de psicanálise. Rio de Janeiro: Zahar, 1998. ). Esta associação entre psicanálise e marxismo comparecerá nos artigos selecionados para a revisão aqui proposta e será de especial importância na compreensão de alguns autores.
  • 3-
    Barreto ( 2015 BARRETO, Vitor Hugo Lima. Freud e Freire: uma interlocução possível. Estudos de Psicanálise, Belo Horizonte, n. 43, p. 161-167, jul. 2015. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/ep/n43/n43a17.pdf . Acesso em: 6 out. 2022.
    http://pepsic.bvsalud.org/pdf/ep/n43/n43...
    ) utiliza esta expressão pois se reporta a traduções antigas das obras de Freud, produzidas pela Editora Imago, a primeira a publicar as obras de Freud no Brasil, e que baseou sua versão para o português na tradução inglesa da obra de Freud e não nos originais em alemão. Assim, ele utiliza “instinto de dominação” como tradução de “ instinct for mastery ”, que, por sua vez, é a escolhida para verter a palavra original em alemão, que é “ Bemächtigungstrieb ”. Algumas traduções brasileiras mais contemporâneas, como aquelas utilizadas por Castanho ( 2016 CASTANHO, Pablo. A noção de libertação em Paulo Freire e o trabalho psicanalítico de grupo. Vínculo – Revista do Nesme, São Paulo, v. 13, n. 2, p. 66-76, jul./dez. 2016. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/vinculo/v13n2/v13n2a08.pdf . Acesso em: 6 out. 2022.
    http://pepsic.bvsalud.org/pdf/vinculo/v1...
    ) no próximo artigo a ser analisado, traduziram o termo alemão Bemächtigungstrieb como “pulsão de domínio”, uma tradução adequada, aceitável e bastante próxima da dos dicionários de verbetes em psicanálise mais respeitados e utilizados como fontes de consulta para este artigo – o de Roudinesco e Plon ( 1998ROUDINESCO, Elizabeth; PLON, Michael. Dicionário de psicanálise. Rio de Janeiro: Zahar, 1998. ) e o de Laplanche e Pontalis ( 1991LAPLANCHE, Jean; PONTALIS, Jean-Bertrand. Vocabulário de psicanálise. São Paulo: Martins Fontes, 1991. ) –, que vertem o termo em alemão para “pulsão de dominação”.
  • 4-
    Cabe relatar, a título de rigor terminológico dentro do campo da psicanálise, que no trabalho de Almeida e Santos ( 2020 ALMEIDA, Alexandre Patrício de; SANTOS, Mateus Vitor dos. Educação como mecanismo de superação das relações de opressão atravessadas pela fragilidade do Ego. Dialogia, São Paulo, n. 34, p. 337-350, jan./abr. 2020. Disponível em: https://periodicos.uninove.br/dialogia/article/view/16008/8227 . Acesso em: 6 out. 2022.
    https://periodicos.uninove.br/dialogia/a...
    ) não existe uma padronização na nomenclatura das três instâncias que compõem o aparelho psíquico segundo a psicanálise. Essas três instâncias são chamadas em alemão de Ich, Überich e Es . A tradução inglesa, da qual se originou a primeira (e por muito tempo a única) versão brasileira, publicada pela editora Imago, valeu-se de três termos em latim para designar essas estruturas: respectivamente, ego , supergo e id . Acontece que os termos em alemão são palavras de uso corrente na linguagem alemã: Ich (eu), Überich (supereu) e Id (isso). A proposta de Freud sempre foi propor terminologias usando palavras correntes do idioma alemão e que fossem autoexplicativas. Assim, nas traduções brasileiras mais atuais, vertidas para o português diretamente do alemão, foram abandonados os termos latinos intermediários da tradução inglesa e se passou a usar e difundir os termos Eu , Supereu e Isso , traduções diretas das palavras. Eventualmente, algumas traduções continuam utilizando o termo Id , mesmo quando utilizam os termos Eu e Supereu , dada a estranheza que a aparição do pronome “isso” causa na leitura em português. Os autores do artigo em análise utilizam ora as nomenclaturas mais modernas e mais aceitas, ora as traduções consagradas que usavam os termos em latim, porém arcaicas e em franco desuso. Neste trabalho, será sempre utilizada a tríade: Id , Eu e Supereu , como forma de contrabalançar a exatidão dos termos e a fluidez da leitura, e com iniciais maiúsculas para a clara sinalização de que se tratam das estruturas elaboradas no cânone freudiano. Uma nota breve e interessante sobre as questões técnicas envolvendo as novas traduções de Freud para o português brasileiro, diretamente do alemão, pode ser encontrada em Kastner ( 2010 KASTNER, Tássia. Novas traduções de Freud. Blog da Psicologia da Educação, 18 maio 2010. Disponível em: https://www.ufrgs.br/psicoeduc/psicanalise/traducoes-de-freud/ . Acesso em: 16 nov. 2022.
    https://www.ufrgs.br/psicoeduc/psicanali...
    ).
  • 5-
    A etnografia da leitura , em tradução livre, do antropólogo Jonathan Boyarin, nunca editada em português.

Editado por

Editor:
Prof. Dr. Marcos Sidnei Pagotto-Euzebio

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    29 Jul 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    06 Mar 2023
  • Aceito
    14 Jun 2023
  • Revisado
    15 Maio 2023
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