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Currículo, alfabetização e interseccionalidade na educação de pessoas surdas

RESUMO

O presente artigo tem como foco a reflexão e a discussão dos atravessamentos intersecionais de deficiência, gênero, classe social, trabalho e raça em processos de ensino da leitura e da escrita para estudantes surdos(as), à luz das teorias pós-críticas do currículo. O texto problematiza relatos e situações de sala de aula, realizados em uma escola pública da Educação de Jovens e Adultos na cidade de Belo Horizonte/MG. Metodologicamente, foram realizadas rodas de conversa com docentes e a observação participante no cotidiano de uma turma da referida escola, no ano de 2021. A partir das práticas curriculares docentes observadas, foi escolhido o conto “Circuito Fechado” de Ricardo Ramos, para problematização teórica pela perspectiva interseccional. A investigação apontou desafios no fazer docente durante o ensino da Língua Brasileira de Sinais e da Língua Portuguesa, como segunda língua. Os resultados indicaram a relevância em considerar o contexto de vida discente e o conhecimento prévio de cada estudante nos processos do aprender. Por fim, o estudo revelou como diferentes marcadores sociais podem atravessar práticas curriculares, oportunizando outras composições e outras leituras de mundo.

Palavras-chave:
Currículo; Direitos Humanos; Educação; Interseccionalidade; Pessoas surdas

ABSTRACT

This article focuses on reflecting on and discussing the intersections of disability, gender, social class, work, and race in processes of teaching reading and writing to deaf students, in the light of post-critical theories of curriculum. The text questions classroom reports and situations, carried out in a public school for Youth and Adult Education in the city of Belo Horizonte - MG. Methodologically, we held discussions with teachers and participant observation in the daily life of a class at the school in 2021. Based on curricular teaching practices observed, the short story Circuito Fechado (Closed Circuit) by Ricardo Ramos was chosen for theoretical questioning from an intersectional perspective. The investigation revealed challenges in teaching Brazilian Sign Language and Portuguese as a second language. The results indicate the importance of considering the context of the student’s life and the prior knowledge of each student in learning processes. Finally, the study reveals how different social markers can cross curricular practices, providing opportunities for other compositions and other readings of the world.

Keywords:
Curriculum; Human Rights; Education; Intersectionality; Deaf People

Introdução

Veio me dizer que eu desestruturo a linguagem. Eu desestruturo a linguagem? Vejamos: eu estou sentado num lugar. Vem a palavra e tira o lugar de debaixo de mim. Eu não fazia nada para que a palavra me desalojasse (…) Ao retirar de debaixo de mim o lugar, eu desaprumei (…) Agora eu pergunto: quem desestruturou a linguagem? Fui eu ou foram as palavras? (Barros, 2021BARROS, Manoel de. Livro de Pré coisas. Rio de Janeiro: Alfaguara, 2021., p. 59).

Palavras, sons, linguagens, respiração, silêncios, pausa, língua e gestos! Quem estrutura e quem desestrutura a linguagem? Estruturada para pessoas ouvintes ou para pessoas surdas? Desestruturada para pessoas de qual classe social? De qual raça? De qual gênero? Em qual território? A partir das provocações do poeta Manoel de Barros (2021BARROS, Manoel de. Livro de Pré coisas. Rio de Janeiro: Alfaguara, 2021.), acrescentamos algumas questões retóricas inerentes aos múltiplos processos de comunicação que acontecem no currículo.

Nos estudos pós-críticos, currículo pode ser lido como um “artefato cultural que ensina, prescreve saberes, governa condutas e produz sujeitos” (Paraíso, 2019PARAÍSO, Marlucy Alves. Uma vida de professora que forma professores/as e trabalha para o alargamento do possível no currículo. Curitiba: Brazil Publishing, 2019., p. 56), o qual acontece em diferentes territórios e espaços. O currículo é o locus por excelência das possibilidades, dos improváveis, dos ditos, interditos e não ditos. Segundo Paraíso (2023), “ele é determinante para a escola se movimentar (...) existir, e é fundamental para a sociedade que se deseja construir” (Paraíso, 2023, p. 7). Convém dizer que “o currículo não existe apenas na escola (…) ele é prática, é política, ação, caminho, percurso, linguagem, texto e discurso” (Paraíso, 2023, p.8). O currículo é lugar para se desaprumar, como diria Barros (2021BARROS, Manoel de. Livro de Pré coisas. Rio de Janeiro: Alfaguara, 2021.), sair do lugar e buscar outros possíveis no mundo.

Se currículo é também linguagem, como podemos estruturá-lo e/ou desestruturá-lo? Considerando a diversidade de sujeitos e corpos presentes nos espaços educativos, torna-se um desafio estético, ético e político o ato de ensinar e o ato de aprender, sendo realizados “sem deixar ninguém de fora”. Nesse sentido, o conceito de inclusão na educação precisa ser alargado para que contemple a diversidade de sujeitos presentes nas escolas. Inclusão esta, abordada pela perspectiva interseccional (Crenshaw, 2002CRENSHAW, Kimberlé. “Documento para o Encontro de Especialistas em Aspectos da Discriminação Racial Relativos ao Gênero”. Estudos Feministas, ano 10, n. 1, p. 171-188, 2002. https://doi.org/10.1590/S0104-026X2002000100011
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; Collins; Bilge, 2016COLLINS, Patricia Hill; BILGE, Sirma. Intersecionality. Cambridge: Polity Press, 2016.), ou seja, nos atravessamentos dos marcadores sociais de raça, gênero, classe social, território, deficiência, idade, entre outros. Uma pessoa surda, por exemplo, é atravessada por outros marcadores que dialogam com a deficiência auditiva, uma vez que essa pessoa tem uma identidade de gênero, um pertencimento étnico, uma orientação sexual, uma escolha religiosa, uma classe social e etc.

Como um direito fundamental, o ato de incluir demanda o repensar das diferenças, bem como o repensar da própria instituição escola. Na perspectiva de uma educação inclusiva, Khater e Souza (2018SOUZA, Danilo Pessoa Ferreira. A educação de surdos sob a perspectiva de sua cultura e identidade. Manaus: Clube de Autores, 2018.) sinalizam ser importante que práticas curriculares reconheçam que estudantes “têm diferentes origens e histórias de vida, portanto, não podemos denegar essas diferenças que os tornam seres humanos concretos, sujeitos sociais e históricos, cidadãos de direitos” (Khater; Souza, 2018).

Em uma concepção alargada e inclusiva do currículo, a coexistência de duas abordagens de alfabetização em sala de aula - a Língua Brasileira de Sinais (Libras) e a Língua Portuguesa, ensinada como segunda língua - pode apresentar desafios para a prática docente. Freitas (2020FREITAS, Isaac Figueredo. Alfabetização dos surdos: para além do alfa e do beta. Revista Brasileira de Educação, n. 25, p. 1-16, 2020. https://doi.org/10.1590/S1413-24782020250034
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) aponta situações em que crianças surdas “pensam em Libras, estabelecem suas relações face a face em Libras com interlocutores falantes da Libras, mas na hora de escrever são instruídas a fazê-lo em língua portuguesa” (Freitas, 2020, p. 4). Tais desencontros no processo de alfabetização podem desestruturar a linguagem (Barros, 2021BARROS, Manoel de. Livro de Pré coisas. Rio de Janeiro: Alfaguara, 2021.), demandando do fazer docente outras composições e outras interlocuções no currículo. Nessa direção, Perlin e Miranda (2003PERLIN, Gladis; MIRANDA, Wilson. Surdos: o narrar e a política. Revista Ponto de Vista, Florianópolis, n. 05, p. 217-226, 2003. https://periodicos.ufsc.br/index.php/pontodevista/article/view/1282
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) afirmam que “a escrita dos surdos será sempre na língua de fronteira” (Perlin; Miranda, 2003, p. 220).

No campo da linguagem, a palavra equidade está presente no texto de várias políticas públicas educacionais contemplando os direitos humanos. Equidade pode ser lida como senso de justiça e imparcialidade (Albrecht; Rosa; Bordin, 2017ALBRECHT, Cristina Arthmar; ROSA, Roger dos Santos; BORDIN, Ronaldo. O conceito de equidade na produção científica em saúde: uma revisão. Saúde e Sociedade, São Paulo, v. 26, n. 1, p. 115-128, 2017. https://doi.org/10.1590/S0104-12902017162684
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). Desenvolver práticas educativas equânimes pressupõe a busca pela garantia do acesso e da permanência de todos(as) na escola. Equidade é uma daquelas palavras na educação que pode nos tirar do lugar, nos mover e nos desaprumar (Barros, 2021BARROS, Manoel de. Livro de Pré coisas. Rio de Janeiro: Alfaguara, 2021.). Ela pode produzir fissuras e vazamentos em modos de pensar excludentes e hierárquicos que permeiam a prática curricular e, dessa forma, pode também desestruturar a linguagem classista, racista, sexista e capacitista.

O argumento principal deste artigo é discutir como as práticas curriculares docentes na alfabetização de pessoas surdas podem ser atravessadas interseccionalmente pelos marcadores sociais de deficiência, classe social, gênero, trabalho e raça. Tais práticas acontecem no dia a dia da escola, nas composições e nos encontros (Tadeu, 2002TADEU, Tomáz. A arte do encontro e da composição: Spinoza + Currículo + Deleuze. Educação e Realidade, v. 27, n. 2, p. 47-57, 2002. https://seer.ufrgs.br/educacaoerealidade/article/view/25915
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) com a diversidade de corpos e de sujeitos discentes e docentes na escola.

Para tanto, metodologicamente, o artigo apresenta e problematiza alguns relatos e situações de sala de aula que envolvem a alfabetização de pessoas surdas em uma escola pública da Educação de Jovens e Adultos (EJA), na cidade de Belo Horizonte/Minas Gerais, no ano de 2021, a fim de evidenciar potências e possibilidades curriculares na ampliação da leitura de mundo. Vale ressaltar que os relatos foram obtidos por meio de rodas de conversa com docentes e as situações problematizadas foram colhidas por meio da observação participante do cotidiano da sala de aula. A partir das práticas curriculares docentes observadas, escolhemos o conto “Circuito Fechado” (Ramos, 2012RAMOS, Ricardo. Circuito Fechado. Revista Macondo. Fevereiro, 2012. https://revistamacondo.wordpress.com/2012/02/29/conto-circuito-fechado-ricardo-ramos/
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) para problematização teórica, pela perspectiva interseccional.

A partir deste ponto, este artigo está organizado em mais 4 seções: na seção “Direitos Humanos e interseccionalidade: outros possíveis no currículo”, são articuladas concepções do campo dos direitos humanos que impactam práticas curriculares, tendo a interseccionalidade como o principal atravessador teórico e metodológico. Na sequência, a seção “Alfabetização de pessoas surdas: do currículo maior ao menor” problematiza as especificidades dos processos de alfabetização das pessoas surdas evidenciando limites, desafios e potencialidades curriculares. A seção “Relatos e situações de sala de aula: diálogos curriculares” apresenta duas situações de sala de aula envolvendo processos de alfabetização de pessoas surdas. Ambas as situações são discutidas à luz das teorias e das concepções pós-críticas de currículo. E, por último, a seção “`À guisa das considerações finais” sistematiza as principais ideias apresentadas no artigo e sinaliza outros caminhos e outras investigações possíveis.

Direitos Humanos e interseccionalidade: outros possíveis no currículo

É importante destacar que esta escrita é tecida numa conjuntura sociopolítica de crise política, econômica, sanitária e, sobretudo, humana, num contexto pós-pandêmico. O mundo ainda tenta superar o período da pandemia da Covid-19, em que somente algumas parcelas da população mundial puderam recorrer ao distanciamento social. No tempo pandêmico restou, para a maioria das pessoas pobres, apenas mais um medo cotidiano, que foi acrescentado aos seus desafios diários. Escrever em contextos sociopolíticos de crise nos possibilita compreender que os Direitos Humanos e a Educação ainda são entendidos como campos fronteiriços em diversos setores da sociedade, onde seja possível perceber dificuldades em se estabelecerem conexões que se expressam pelo não reconhecimento da temática, ao mesmo tempo em que percebemos uma “eclosão da consciência histórica dos direitos humanos” (Comparato, 2017COMPARATO, Fábio Konder. A afirmação histórica dos direitos humanos. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2017., p. 53), somados a uma agenda de reflexões centradas em torno dos fundamentos e da significação da educação em direitos humanos.

No Brasil, temos uma história marcada pela influência colonialista, onde apenas uma parcela da população ainda acessa privilégios. O acesso aos direitos - que deveria ocorrer por todos(as), independentemente de quem sejam ou de onde estejam - ainda exclui muitos sujeitos. Nesse sentido, um conceito que pode auxiliar na compreensão da necessidade do alargamento dos acessos por todas as pessoas é o conceito de interseccionalidade (Crenshaw, 2002CRENSHAW, Kimberlé. “Documento para o Encontro de Especialistas em Aspectos da Discriminação Racial Relativos ao Gênero”. Estudos Feministas, ano 10, n. 1, p. 171-188, 2002. https://doi.org/10.1590/S0104-026X2002000100011
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; Collins; Bilge, 2016COLLINS, Patricia Hill; BILGE, Sirma. Intersecionality. Cambridge: Polity Press, 2016.). A interseccionalidade pode ser compreendida como uma ferramenta analítica capaz de contribuir para a solução de problemas não raras vezes invisibilizados, quando se trata do acesso aos direitos humanos, pois “A interseccionalidade é uma conceituação do problema que busca capturar as consequências estruturais e dinâmicas da interação entre dois ou mais eixos da subordinação” (Crenshaw, 2002, p. 177).

Assim sendo, ao trazermos o conceito de interseccionalidade para o campo da educação, concordamos que os marcadores sociais de classe, gênero, orientação sexual, raça, etnia, faixa etária, deficiência, território e escolaridade atravessam os sujeitos e, por isso, outorgam maior ou menor acesso a uma vida digna. A exclusão de pessoas de uma vida digna traduz-se em números no Brasil que superam a maioria dos países nos rankings mundiais, quando estudos denunciam a morte violenta de mulheres, a baixa concentração de renda de significativa camada da população, os homicídios de jovens negros(as), as dificuldades de acesso de pessoas com deficiência e da população LGBTQIAPN+1 1 Apesar de haver uma disputa política no meio acadêmico e no movimento social quanto ao uso das diferentes versões da sigla, optamos neste artigo pelo uso daquela que se refere a: lésbicas, gays, bissexuais, travestis/transexuais, queers, intersexuais, assexuais, pansexuais e não binários (Alves, 2017). às políticas públicas (Brasil, 1967; 1983). Potencializando os processos excludentes e o não acesso a direitos, ainda resistem, portanto, processos típicos do Brasil colônia, tais como a divisão de classes, o patriarcalismo, o sexismo, o capacitismo e o racismo.

São muitos os sujeitos de direito, excluídos de dignidade, precarizados(as), e que, na sua condição, não usufruem da equidade a que deveriam também ter acesso. E, diante de tal realidade, onde a massa da população não consegue alcançar uma vida digna, indagamos: possuem esses sujeitos consciência de que também são destinatários de direitos humanos? Em qual medida políticas ou instrumentos legais que problematizam tais questões possuem potencial para reestruturar as formas de pensar e para expandir a consciência dessas pessoas, para que elas possam se assumir enquanto sujeitos de direito?

No empenho de viabilizar a reflexão sobre possibilidades que operacionalizem processos de equidade nas políticas públicas, concordamos com Flores (2009FLORES, Joaquim Herrera. A (re)invenção dos direitos humanos. Tradução de Carlos Roberto Diogo Garcia, Antonio Henrique Graciano Suxberger e Jefferson Aparecido Dias. Florianópolis: Fundação Boiteaux, 2009.) que aponta a necessidade de mudança de perspectiva, ao sugerir que deveríamos falar em direitos humanos a partir dos processos de luta pela dignidade humana, pois há a compreensão de que toda pessoa é única, mas que, ainda assim, vive necessariamente no coletivo, onde mantém relações sociais. Desse modo, toda pessoa deve exercer o seu direito a ter direitos (Arendt, 2007ARENDT, Hannah. Origens do totalitarismo. São Paulo: Cia das Letras, 2007.), o que quer dizer: dar a uma pessoa um lugar no mundo pelo acesso, assim, para além da benevolência ou assistencialismo do Estado.

Em convergência, Lafer (2015LAFER, Celso. Direitos humanos: um percurso no Direito no século XXI. São Paulo: Atlas, 2015.) aponta a complexidade dos desafios para a afirmação dos direitos humanos, em função da distribuição desigual entre os diversos sujeitos, mas é otimista ao conferir, à ação pedagógica e à difusão do conhecimento sobre o valor dos direitos humanos, um dos mais importantes instrumentos para a formação dos sujeitos de direito. O ato de educar em direitos pode contribuir com a ressignificação de diferentes contextos sociais, principalmente aqueles(as) mais vulneráveis, a partir de preceitos humanistas. A ação democrática e coletiva, baseada em direitos, como indicado, substancializa os direitos humanos diante dos fenômenos violadores, ao passo que “é a chave da construção efetiva da cidadania democrática” (Osorio, 2004OSORIO, Jorge. Educar en los derechos humanos: desafío de la sociedad civil para fortalecer la ciudadanía democrática. In: MAGENDZO, Abraham (org.). De miradas y mensajes a la educación em derechos humanos. Santiago: Cátedra Unesco Educación en Derechos Humanos, 2004. p. 91-103., p. 91).

A política contemporânea demanda a tarefa de mapear inter-relações que conectem, de forma complexa, diversas posições dinâmicas e relacionais no âmbito do campo político e aponta ser igualmente essencial encontrar uma maneira para ocupar os espaços políticos ao mesmo tempo em que eles sejam submetidos a uma contestação democratizadora cujas condições excludentes de sua produção sejam constantemente reelaboradas. Tem-se, assim, o vislumbre da existência de condições que localizem diferentes corpos em zonas mais ou menos expostas à vulnerabilidade e à condição precária.

O termo precariedade (Butler, 2018BUTLER, Judith. Corpos em aliança e a política das ruas: notas para uma teoria performativa de assembleia. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2018.) habita em todos(as) nós como vulnerabilidade inata de todos os corpos que estão sempre submetidos ao destino final da morte. Já a condição precária traduz uma situação que é politicamente induzida, que opera por meio de uma distribuição geopolítica diferenciada de vulnerabilidades. Tais localizações são referenciadas a partir dos citados na interseccionalidade, por meio dos marcadores sociais, tais como o gênero, classe, território, raça, idade, deficiência e escolaridade. Butler (2018) propõe pensar a divisão de vidas entre “vivíveis” e “matáveis” (Butler, 2018 p.75), a partir de um mapa amplo e fluido, como um movimento que segue as demandas críticas colocadas pela interseccionalidade. Tal contexto explicita a limitação/exclusão dos sujeitos e coloca em perspectiva as vivências em encruzilhada, vidas que são recortadas por diversas condições de precariedade, o que se configura como um desafio para as políticas públicas.

Aliançar, resistir e coabitar são estratégias perante as precariedades, desse modo, não há escolha sobre com quem conviveremos, uma vez que a coabitação é compulsória e a interpelação pelo(a) outro(a) que não escolhemos é inerente à vida (Butler, 2018BUTLER, Judith. Corpos em aliança e a política das ruas: notas para uma teoria performativa de assembleia. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2018.). Uma vez que a convivência não é algo a ser escolhido e determinado pelos indivíduos livremente, seria necessário pensar formas saudáveis de convivência para a sobrevivência e tal sobrevivência deve se dar de forma sustentável, amplamente saudável. Nesse ponto, a autora retoma as noções de igualdade para afirmar que “todos teriam os mesmos direitos a conviver na terra e que escalonamentos e diferenciações constituem efetivamente políticas de morte e genocídios” (Butler, 2019, p. 98).

A construção dessas alianças e as respectivas localizações que podem ser construídas passariam necessariamente pelo reconhecimento da limitação dos movimentos identitários em significar e representar os sujeitos em seus diversos recortes de condições de precariedade, reconhecendo que, para além das identidades, são diversos aqueles movimentos que, como grupo, estão sujeitos a retrocesso em direitos políticos e civis. A aliança nesse contexto aparece como uma estratégia capaz de deslocar as políticas calcadas na identidade, uma vez que a identidade pensada em aliança estará em constante transformação, sendo a todo tempo afetada por demandas cruzadas que requerem negociação e acomodação, reconhecendo no seu cerne a necessidade compulsória de coabitação.

Diante da necessidade de coabitação de todos os corpos nos espaços escolares, propomos o debate do direito à educação, especificamente para as pessoas surdas, na possível construção de alianças, pelo viés das teorias pós-críticas do currículo, nas quais se evidencie a análise das relações de poder e os sujeitos aprendentes, de acordo com sua perspectiva - identidade e diferenças (Tadeu, 2010TADEU, Tomáz. Documento de Identidade: uma introdução às teorias do currículo. 3. ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2010., p. 17). Tal concepção imprime sensação de pertencimento nos espaços escolares, contribuindo para o aprendizado e para a socialização, dialogando com uma educação inclusiva que acolha e garanta os direitos das pessoas com deficiência.

Pensar em um currículo em ação, presente nas relações cotidianas entre docentes e discentes, significa propor discursos e práticas pedagógicas inclusivas e multiculturais, com foco no sujeito aprendente e em suas especificidades. Tal perspectiva curricular demanda agregar ou aliançar pessoas ditas excluídas, dissidentes, precarizadas ou mesmo abjetas (Butler, 2018BUTLER, Judith. Corpos em aliança e a política das ruas: notas para uma teoria performativa de assembleia. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2018.) na educação. A socialização e a compreensão de suas identidades e histórias aumentam a possibilidade de reconhecimento, corroborando para desfazer estigmas e preconceitos, bem como estimular a inclusão social (Moreira; Candau, 2013MOREIRA, Antônio Flávio; CANDAU, Vera Maria. Multiculturalismo: diferenças culturais e práticas pedagógicas. 10. ed. Petrópolis: Vozes, 2013., p. 23).

Um currículo permeável à diversidade e às potencialidades de seus sujeitos precisa promover: 1. O autorreconhecimento discente, assim, os(as) estudantes se reconheceriam como sujeitos de direitos a serem requeridos e alcançados para uma vida mais digna; 2. O pensamento crítico, a partir de si mesmas(os), também feito pelos(as) discentes, e de suas circunstâncias no enfrentamento de injustiças e discriminações; e 3. O estabelecimento de alianças entre os sujeitos, em busca de outros possíveis na educação. Hooks (2013HOOKS, Bell. Ensinando a transgredir: a Educação como prática para a liberdade. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2013.) afirma que uma possível prática da liberdade é o aprendizado da transgressão. Nesse sentido, a interseccionalidade pode ser compreendida como uma proposta teórica e metodológica de superação da política de identidade para as interseções entre elas. No ensino da leitura e escrita para pessoas surdas, objeto de reflexão deste artigo, torna-se necessário atentar para as diferenças intergrupais entre os(as) estudantes no mesmo contexto escolar, de modo a visibilizar a diversidade de corpos e sujeitos.

Alfabetização de pessoas surdas: do currículo maior ao menor

No campo interseccional (Crenshaw, 2002CRENSHAW, Kimberlé. “Documento para o Encontro de Especialistas em Aspectos da Discriminação Racial Relativos ao Gênero”. Estudos Feministas, ano 10, n. 1, p. 171-188, 2002. https://doi.org/10.1590/S0104-026X2002000100011
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; Collins; Bilge, 2016COLLINS, Patricia Hill; BILGE, Sirma. Intersecionality. Cambridge: Polity Press, 2016.), o mundo do trabalho consiste em outro importante marcador social que atravessa corpos e sujeitos na educação. Nesse sentido, estudantes surdos(as) da Educação de Jovens e Adultos, em sua maioria, trabalhadores(as), buscam na escola por melhores condições de ensino para que efetivamente possam aprender a lidar com a leitura e a escrita nas situações funcionais da língua, promovendo-se como cidadãos(ãs) participantes e críticos(as), por meio da leitura e da comunicação em Libras.

O estranhamento em relação à Língua Portuguesa para esses(as) estudantes se dá pelo fato de que, normalmente, uma segunda língua (L2) só é adquirida quando já se tem uma primeira língua (L1). Contudo, para o(a) estudante surdo(a), isso não acontece da mesma forma como ocorre para estudantes ouvintes, uma vez que estes(as) últimos(as) chegam à escola com conhecimento prévio da Língua Portuguesa. Nesse caso, o(a) estudante surdo(a) se vê na situação de aprender as duas línguas ao mesmo tempo na sala de aula (Freitas, 2018FREITAS, Luciana Aparecida Guimarães. A multimodalidade no ensino de língua portuguesa para estudantes surdos nos anos iniciais: uma proposta de material didático. Dissertação (Mestrado em Estudos das Linguagens) - Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2018.).

Na perspectiva de um currículo-maior, aquele oficial, formal e prescrito pela política pública (Paraíso, 2023PARAÍSO, Marlucy Alves. Currículos: teorias e políticas. São Paulo: Contexto, 2023.), como na Base Nacional Comum Curricular (Brasil, 2018), está disposto que a utilização de “diferentes linguagens - verbal (oral ou visual-motora, como Libras, e escrita), corporal, visual, sonora e digital” (Brasil, 2018, p. 70) deva se dar no ensino como forma de expressão e de compartilhamento de informações, experiências e sensações em prol do diálogo, da cooperação e da resolução de situações-problema e do entendimento mútuo. Em contrapartida, um currículo-menor, aquele do cotidiano da escola, das práticas docentes e das relações interpessoais (Paraíso, 2023) pode oportunizar a visibilização da diversidade linguística e da diversidade de corpos e sujeitos, realizando ajustes, acordos e repensares nos processos de ensino e de aprendizagem.

No caso do ensino da Libras, vale ressaltar que ela tem gradativamente ocupado seu espaço na educação. Pereira (2009PEREIRA, Maria Cristina da Cunha. In: PEREIRA, Maria Cristina Cunha. Leitura, escrita e surdez. 2. ed. São Paulo: FDE, 2009.) descreve que, com o tempo, o ensino da língua deixou de obedecer a padrões determinantes e normativos, ao ampliar suas práticas curriculares, partindo da concepção de que os(as) estudantes aprendem a língua a partir da interação, nos encontros e nas composições (Tadeu, 2002TADEU, Tomáz. A arte do encontro e da composição: Spinoza + Currículo + Deleuze. Educação e Realidade, v. 27, n. 2, p. 47-57, 2002. https://seer.ufrgs.br/educacaoerealidade/article/view/25915
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) com colegas e professores(as). Pereira (2009) ainda completa que a sistematização da gramática se dá no uso da língua, quando os(as) estudantes estão praticando a língua. Nesse sentido, podemos questionar, retoricamente, se as composições realizadas no aprender da língua visibilizam diferentes sujeitos, ao considerar os atravessamentos curriculares de classe social, etnia, gênero, território, trabalho, deficiência, entre outros.

Os métodos de ensino da Língua Portuguesa para surdos(as) ainda são calcados na concepção de base fonética (Freitas, 2018FREITAS, Luciana Aparecida Guimarães. A multimodalidade no ensino de língua portuguesa para estudantes surdos nos anos iniciais: uma proposta de material didático. Dissertação (Mestrado em Estudos das Linguagens) - Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2018.). Isso pode se tornar um problema, pois, ao contrário dos(as) estudantes ouvintes que chegam à escola com um conhecimento prévio de uma língua materna usada em seu contexto social, familiar e na escola, os(as) estudantes surdos(as) se veem prejudicados(as) quanto ao ensino desta língua, de natureza oral, porque, não raras vezes, não conseguem fazer a relação entre letra e som, comprometendo todo o desenvolvimento da leitura e da escrita na L2.

Os processos do ensinar e do aprender para professores(as) de estudantes surdos(as) é desafiador, pois a situação de significativa parcela destes(as) estudantes é a de um público que chega no ambiente escolar com pouco ou nenhum conhecimento sobre a Língua Portuguesa, ficando a escola com a responsabilidade de ensiná-la. Ademais, professores(as) com experiência no ensino de língua materna, sendo este baseado em métodos orais de alfabetização, têm dificuldade em pensar sobre o ensino da Língua Portuguesa sem a relação entre letra e som - o que ainda é muito comum no ensino realizado para estudantes surdos(as), tal como na feitura de exercícios de repetição e de memorização (Pereira, 2009PEREIRA, Maria Cristina da Cunha. In: PEREIRA, Maria Cristina Cunha. Leitura, escrita e surdez. 2. ed. São Paulo: FDE, 2009.).

Na prática de um currículo-menor na sala de aula entre surdos(as), torna-se necessário criar e organizar atividades que não tenham ênfase na codificação/decodificação, embora isso seja importante, mas com o propósito do letramento, ou seja, da leitura de mundo. Nesse sentido, para Kleiman (2004KLEIMAN, Angela. Texto e leitor: aspectos cognitivos da leitura. 9. ed. Campinas: Pontes, 2004.), além de a atividade de leitura ser difusa e confusa para estudantes ouvintes e mencionar a motivação para a leitura, a autonomia e a capacidade de o(a) estudante aprender, é preciso utilizá-la para se chegar a um propósito e traçar objetivos para a leitura e a escrita. Isto não seria diferente para estudantes surdos(as), principalmente por se encontrarem expostos(as) ao processo de ensino e de aprendizagem, de acordo com as concepções docentes.

Segundo Souza (2018SOUZA, Danilo Pessoa Ferreira. A educação de surdos sob a perspectiva de sua cultura e identidade. Manaus: Clube de Autores, 2018.), “no ensino de surdos o processo é facilitado quando há primeiro o conhecimento no mundo surdo, das características que o diferenciam do ouvinte” (Souza, 2018, p. 40). Sendo assim, vale ressaltar que estudantes surdos(as) precisam buscar o conhecimento prévio para realizarem a leitura de textos de qualquer gênero textual, pois o que vai determinar o aprendizado da leitura e da escrita da Língua Portuguesa é a interação desses sujeitos nos contextos de leitura textual e de mundo.

Tal perspectiva dialoga com a clássica noção de Freire (2009FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. São Paulo: Paz e Terra, 2009.) sobre os temas geradores da aprendizagem, isto é, sobre a importância em considerar o contexto de vida do sujeito educando - seja surdo ou ouvinte - nos processos educativos. Ao singularizar o discurso e a prática docente, vislumbra-se a pluralidade do currículo a partir da diversidade humana. As diferenças aqui deixam de se tornar empecilhos para se tornarem uma potente estratégia de abordagem pedagógica. No território curricular das diferenças, Perrenoud (2000PERRENOUD, Philippe. Pedagogia Diferenciada: das intenções ao ato. Porto Alegre: Artmed, 2000.) aponta a relevância de uma prática curricular reflexiva em que “a razão e o debate, o respeito à expressão e ao pensamento do outro são questões bem mais importantes” (Perrenoud, 2000, p. 149) do que normativas prescritas pelo currículo-maior. Na lida com a diversidade de sujeitos e corpos dentro e fora da escola, Butler (2018BUTLER, Judith. Corpos em aliança e a política das ruas: notas para uma teoria performativa de assembleia. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2018.) sinaliza que, mais que o respeito, é o reconhecimento do outro - diferente de mim - como sujeito de direitos que pode estabelecer alianças, cultivar vínculos, abrir caminhos e produzir outros possíveis.

Relatos e situações de sala de aula: diálogos curriculares

Para a escrita desta seção do artigo, os relatos e as situações de sala de aula que envolvem a alfabetização de estudantes surdos(as) - com idades entre 18 e 63 anos - foram colhidos durante rodas de conversa realizadas com professoras da Educação de Jovens e Adultos, no ano de 2021. As rodas de conversa foram articuladas com momentos de observação participante e registros de campo em uma sala de aula, do turno da noite, presente em uma escola pública da capital mineira. Tais estratégias metodológicas integram o escopo de uma investigação de pesquisa e extensão acadêmica que teve como foco os atravessamentos interseccionais em práticas curriculares docentes.

As professoras convidadas que participaram das rodas de conversa na escola pública utilizaram a metodologia da sequência didática (Machado; Cristóvão, 2006MACHADO, Anna Rachel; CRISTOVÃO, Vera Lúcia Lopes. A construção de modelos didáticos de gêneros: aportes e questionamentos para o ensino de gêneros. Linguagem em (Dis)curso, v. 6, n. 3, p. 547-573, 2006. http://www.educadores.diaadia.pr.gov.br/arquivos/File/pdf/construcao_modelos_didaticos_generos.pdf
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) em suas atividades de sala de aula. Em conversa com elas, ficou evidenciado o foco pedagógico no fazer e na prática, para além de somente utilizarem um material didático. As atividades foram pensadas de forma a ampliar as possibilidades de atuação docente nos encontros e nas composições com discentes, deixando espaços para arejar o currículo (Paraíso, 2019PARAÍSO, Marlucy Alves. Uma vida de professora que forma professores/as e trabalha para o alargamento do possível no currículo. Curitiba: Brazil Publishing, 2019.) e abrir brechas para outras utilizações do material didático. Por mais que uma aula seja pensada, preparada e planejada, na prática, ela é porosa e lacunar, pois está susceptível ao inusitado e ao incontrolável no currículo.

A elaboração de uma sequência didática perpassa pela ação de se pensar em uma transposição didática adequada que possa servir de objeto de ensino e de aprendizagem, conforme sugerem Machado e Cristóvão (2006MACHADO, Anna Rachel; CRISTOVÃO, Vera Lúcia Lopes. A construção de modelos didáticos de gêneros: aportes e questionamentos para o ensino de gêneros. Linguagem em (Dis)curso, v. 6, n. 3, p. 547-573, 2006. http://www.educadores.diaadia.pr.gov.br/arquivos/File/pdf/construcao_modelos_didaticos_generos.pdf
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). Para as autoras, em uma transposição didática, é importante haver um espaço entre o conhecimento prévio discente e o que pode ser evidenciado sobre os processos de ensino e de aprendizagem.

Dentre os diversos materiais didáticos utilizados pelas docentes em sala de aula, escolhemos, pela sua potência em expandir o currículo na afirmação da vida (Paraíso, 2019PARAÍSO, Marlucy Alves. Uma vida de professora que forma professores/as e trabalha para o alargamento do possível no currículo. Curitiba: Brazil Publishing, 2019.), o conto “Circuito Fechado”, de Ricardo Ramos (2012RAMOS, Ricardo. Circuito Fechado. Revista Macondo. Fevereiro, 2012. https://revistamacondo.wordpress.com/2012/02/29/conto-circuito-fechado-ricardo-ramos/
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), para problematização pelo viés interseccional (Crenshaw, 2002CRENSHAW, Kimberlé. “Documento para o Encontro de Especialistas em Aspectos da Discriminação Racial Relativos ao Gênero”. Estudos Feministas, ano 10, n. 1, p. 171-188, 2002. https://doi.org/10.1590/S0104-026X2002000100011
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; Collins; Bilge, 2016COLLINS, Patricia Hill; BILGE, Sirma. Intersecionality. Cambridge: Polity Press, 2016.). O texto, lido como um artefato cultural, é estruturado com parágrafo único, constituído de frases nominais, formadas apenas por vírgulas, pontos finais, substantivos comuns e alguns artigos organizados em grupos semânticos que juntos sugerem ações cotidianas e que, combinadas, representam uma sequência narrativa acerca da rotina diária de uma pessoa.

O texto foi apresentado pelas professoras aos(às) estudantes de três formas: 1. Um vídeo (Dias, 2011DIAS, Luana. Vídeo. Exercício e criação de vídeo para o curso de Criação de Recursos Pedagógicos para o Ensino e Aprendizagem de Língua. Youtube. Circuito Fechado - Ricardo Ramos, 2011. https://www.youtube.com/watch?v=oKrKSRs_9zI
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) disponível na internet com as imagens dos substantivos que compunham o conto; 2. Um segundo vídeo, produzido pelas professoras, com as imagens dos substantivos e a sinalização deles em Libras; e, por último, 3. O conto, propriamente dito, na Língua Portuguesa, na modalidade escrita. Devido à particularidade do referido conto, podemos vislumbrar, na prática curricular docente, um exemplo de desestruturação da linguagem (Barros, 2021BARROS, Manoel de. Livro de Pré coisas. Rio de Janeiro: Alfaguara, 2021.), uma vez que o mesmo texto foi discutido em diferentes modos de produção de significado - imagens, Libras e palavras. Na produção multimodal (Kress; Van Leeuwen, 2001KRESS, Gunther; VAN LEEUWEN, Theo. Multimodal Discourse: The modes and media of contemporary communication. London: Arnold, 2001.), diminuir a distância entre a compreensão da Língua Portuguesa e das Libras, por meio do uso de palavras escritas, sinalizadas e desenhadas, pode produzir fissuras ou desaprumos (Barros, 2021) na ordem normativa da língua, (des)fazendo e (re)fazendo o texto e, assim, tornando-o inclusivo e acessível para o maior público possível.

A ausência de elementos de coesão no texto, a exemplo dos conectivos, não interfere no desenvolvimento de Libras, devendo, portanto, ser esclarecido, aos(às) estudantes surdos(as), o motivo pelos quais tais conectivos são usados na Língua Portuguesa (Souza, 2018SOUZA, Danilo Pessoa Ferreira. A educação de surdos sob a perspectiva de sua cultura e identidade. Manaus: Clube de Autores, 2018.). De acordo com os estudos de Fernandes (2006FERNANDES, Suely. Letramentos na educação bilíngue para surdos. In: BERBERIAN, Ana Paula; MORI-DE ANGELIS, Cristiane C.; MASSI, Giselle (Orgs.). Letramento: referências em saúde e educação. São Paulo: Plexus, 2006. p. 125-147.) no campo do letramento na educação bilíngue, estudantes surdos(as) usualmente demonstram dificuldades em lidar com a leitura e a escrita de textos com estruturas linguísticas complexas. Nesse sentido, a estrutura textual do conto escolhido, por conter apenas termos de uso trivial, aproxima-se da forma como eles(as) concebem a leitura, não necessitando o texto dos conectivos para que produza o sentido ao que está sendo lido. Ressaltamos que o texto em pauta, ainda que contenha apenas substantivos e alguns adjetivos, permite ao(à) leitor(a), surdo(a) ou não, conceber, mentalmente, pela forma de organização da sequência de palavras descritas, a composição de cenas e de ações da vida real, da rotina de uma pessoa.

Apesar de se tratar de um texto totalmente verbal, o conto permite que o(a) leitor(a) vivencie uma experiência multimodal com a leitura. Os pesquisadores Kress e Van Leeuwen (2001KRESS, Gunther; VAN LEEUWEN, Theo. Multimodal Discourse: The modes and media of contemporary communication. London: Arnold, 2001.) indicam a inviabilidade de se propor textos dando ênfase somente na linguagem escrita, visto que esse é apenas um dos modos de representação. Segundo os autores, devemos levar em conta o caráter multimodal dos textos, todos os modos de significação, unindo imagem ao texto e ao contexto social.

O encontro com dois fragmentos do texto “Circuito Fechado” (Ramos, 2012RAMOS, Ricardo. Circuito Fechado. Revista Macondo. Fevereiro, 2012. https://revistamacondo.wordpress.com/2012/02/29/conto-circuito-fechado-ricardo-ramos/
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) oportunizou potentes composições e reflexões com os(as) discentes, pelo viés interseccional. O primeiro fragmento é “Chinelos, vaso, descarga. Pia, sabonete. Água. Escova, creme dental, água, espuma, creme de barbear, pincel, espuma, gilete, água, cortina, sabonete, água fria, água quente, toalha. Creme para cabelo, pente” (Ramos, 2012, s/p). O segundo fragmento é “Mesa, cadeiras, xícara e pires, prato, bule, talheres, guardanapos” (Ramos, 2012, s/p).

Ao analisar os(as) estudantes entrarem em contato com tais palavras, dispostas em contextos específicos - que podem ser inferidos no primeiro fragmento como hábitos de higiene e uso do banheiro e, no segundo fragmento, como uso da cozinha e de seus utensílios na alimentação - torna-se importante pensar se tais termos integram a realidade de todos(as) eles(as). A partir do conto, a professora que coordenava as atividades na sala problematizou com os(as) estudantes: Como é o banheiro na casa de vocês? E a cozinha? Neles têm todos esses objetos e equipamentos? Tem algum objeto no banheiro ou na cozinha de sua casa que não está no texto? (Relato de campo, 2021).

Cabe aqui uma questão retórica: a ausência, por exemplo, de descarga, no banheiro, ou de um bule, na cozinha, poderia dificultar a aprendizagem dessas palavras por certos(as) estudantes? Pela perspectiva interseccional, o marcador social de classe social se torna um importante vetor de reflexão pedagógica e curricular. As desigualdades sociais, em especial, em escolas públicas, devem ser consideradas e problematizadas na realização de atividades em sala de aula (Khater; Souza, 2018SOUZA, Danilo Pessoa Ferreira. A educação de surdos sob a perspectiva de sua cultura e identidade. Manaus: Clube de Autores, 2018.).

O marcador social do trabalho também foi contemplado na prática da professora quando, após discutir o texto coletivamente, ela perguntou aos(às) estudantes: Qual seria a profissão da pessoa retratada no conto? E qual profissão não combina com essa pessoa? Por quê? (Relato de campo, 2021). Ao trazer para o debate em sala o mundo do trabalho, a professora ampliou o alcance do texto e alargou o currículo, provocando os(as) discentes a refletirem sobre suas próprias vidas. Como pano de fundo da discussão curricular, poderíamos pensar: quais seriam as limitações das pessoas surdas na inserção no mercado de trabalho? E quais áreas profissionais possuem políticas de inclusão social em suas empresas? Apesar de a turma ser constituída exclusivamente por estudantes surdos(as), durante as reflexões realizadas a partir do texto Circuito Fechado (Ramos, 2012RAMOS, Ricardo. Circuito Fechado. Revista Macondo. Fevereiro, 2012. https://revistamacondo.wordpress.com/2012/02/29/conto-circuito-fechado-ricardo-ramos/
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) o marcador social da deficiência não ocupou papel de destaque nos diálogos, tangenciando a discussão da inserção de pessoas surdas no mercado de trabalho.

Outros marcadores atravessam corpos e sujeitos na escola, por exemplo, a raça. Segundo dados do Censo Escolar de 2022, nas escolas públicas brasileiras de Educação de Jovens e Adultos, 77,5% são estudantes negros(as) (Acesso dos estudantes..., 2023), o que revela o contexto social majoritário dessa parcela da população, se compararmos com as escolas privadas que possuem, em sua maioria, estudantes brancos. Portanto, a escola pública da EJA tem classe social e tem cor.

Na tese de doutorado intitulada “Juventude negra na EJA: os desafios de uma política pública” (Passos, 2012PASSOS, Joana Célia. Juventude negra na EJA: os desafios de uma política pública. Tese (Doutorado em Ciências da Educação) - Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2012.), a pesquisadora sinaliza a relevância de “uma abordagem que agregue tanto a dimensão da singularidade (pertencimento étnico-racial, reconhecimento) como a dimensão da igualdade (redistribuição), para que a EJA se torne de fato emancipatória” (Passos, 2012, p. 189). Tal concepção pedagógica da EJA coaduna com a perspectiva curricular pós-critica que propõe “interrogar as identidades definidas como sólidas localizações, estruturadas, unificadas (…) em que pessoas se encaixam social e culturalmente” (Paraíso, 2023PARAÍSO, Marlucy Alves. Currículos: teorias e políticas. São Paulo: Contexto, 2023., p. 76).

E a escola pública da EJA tem gênero? Durante a observação participante em sala de aula, outro fragmento do mesmo conto possibilitou reflexões com os(as) discentes, dessa vez, pelo marcador social de gênero. O fragmento é “Cueca, camisa, abotoaduras, calça, meias, sapatos, gravata, paletó. Carteira, níquéis, documentos, caneta, chaves, lenço. Relógio, maço de cigarros, caixa de fósforos, jornal” (Ramos, 2012RAMOS, Ricardo. Circuito Fechado. Revista Macondo. Fevereiro, 2012. https://revistamacondo.wordpress.com/2012/02/29/conto-circuito-fechado-ricardo-ramos/
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, s/p). Uma professora perguntou: O que vocês acham: esses objetos pertencem a um homem ou a uma mulher? (Relato de campo, 2021). Após um tempo de conversa, houve um consenso, entre a maioria dos(as) estudantes na sala de aula, de que os tais objetos pertenciam a um homem.

As palavras apresentadas nesse fragmento constituem, no senso comum, o que se chama de universo masculino. Os itens do vestuário elencados pertencem ao que é socialmente normatizado como roupas de um homem. Contudo, nos cabe refletir sobre uma das grandes falácias apontadas pelos estudos pós-críticos de gênero que consiste na generalização ou universalização do sujeito mulher e do sujeito homem (Butler, 2018BUTLER, Judith. Corpos em aliança e a política das ruas: notas para uma teoria performativa de assembleia. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2018.). Existem diversas formas de ser e estar homem, o que envolve performatividades nomeadas de masculinas. As roupas integram este conjunto performático que pode determinar, mas não encerrar, posições de sujeito no mundo (Butler, 2018). Um objeto não possui gênero, nós que atribuímos socialmente, por exemplo, o gênero masculino para uma gravata e gênero feminino para uma saia.

A moda agênero tem mostrado outros possíveis na indústria de vestimentas, na construção de masculinidades e feminilidades, ao evidenciar outros usos das roupas que não se fixam em padrões normativos binários de gênero. Segundo Alves (2022ALVES, Cláudio Eduardo Resende; LLOYD, Rebeca Cristina. Gênero e currículo: o movimento das diferenças no território da escola. In: FREITAS, Luciana; PINHEIRO, Rodrigo Carlos; MIRANDA, Dayse Garcia (Orgs.). Educação inclusiva e diversidade. Belo Horizonte: Mazza, 2022.), “a chamada moda agênero tem ganhado cada vez mais espaço para debate nos cursos profissionalizantes e técnicos de design, nas pesquisas acadêmicas e mesmo em programas de moda na televisão” (Alves, 2022, p. 199). Corroborando esse ponto de vista, Netto (2016NETTO, Antônio Zani. Moda sem gênero: um estudo para a busca de quebras de paradigmas relacionados às vestimentas. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Tecnologia em Design de Moda) - Universidade Tecnológica Federal do Paraná, Apucarana, 2016.), em sua pesquisa Moda sem gênero: um estudo para a busca de quebras de paradigmas relacionados às vestimentas (Netto, 2016), faz um breve histórico, desde os anos de 1920 até a contemporaneidade, de como alguns(algumas) estilistas utilizam a linguagem da moda para romper com estereótipos em busca por outras estéticas de gênero na moda.

Um único texto, de formato não convencional, por utilizar apenas substantivos, propiciou composições diversas com aqueles(as) discentes da turma pesquisada, desde a arquitetura da casa, passando por objetos ordinários do cotidiano doméstico, até o uso de roupas e acessórios de moda. Como pano de fundo, destaca-se a interseccionalidade com deficiência, classe social, raça e gênero, que oportunizou profícuos debates, ao transpor, para o contexto discente, algumas questões sociais, políticas e econômicas da sociedade brasileira.

Discutir cidadania e direitos humanos cabe no currículo. Refletir sobre deficiências e leitura de mundo cabe no currículo. Promover debates sobre a diversidade humana cabe no currículo. De acordo com Paraíso (2023PARAÍSO, Marlucy Alves. Currículos: teorias e políticas. São Paulo: Contexto, 2023.), “podemos olhar qualquer texto na nossa prática curricular e pensar: o que posso fazer com isso? Por isso, a aposta desse pensamento em um currículo-menor criado por docentes que se envolvem no prazer de ensinar e na alegria do aprender” (Paraíso, 2023, p. 127).

Segundo relatos da professora, houve dificuldade, por parte dos(as) estudantes, na compreensão do texto. Ela comentou: O formato do texto causou estranhamento aos alunos. Um texto somente com palavras, sem conectivos, mesmo sendo uma segunda língua (...) foi possível perceber que os alunos, de modo geral, estão habituados com textos em português, organizados com sujeito, verbo, objeto, artigos e preposições (Relato de campo, 2021). A professora destacou, ainda, que algumas palavras foram mais complexas para a compreensão dos(as) estudantes, como “níquéis” e “abotoaduras”, por serem datadas e estarem em desuso na contemporaneidade. Um resgate histórico da linguagem foi necessário durante a discussão do vocabulário textual.

Aproveitamos para retomar aqui a epígrafe de Barros (2021BARROS, Manoel de. Livro de Pré coisas. Rio de Janeiro: Alfaguara, 2021.), no intuito de exemplificar como as palavras desestruturaram a linguagem, tirando do lugar certezas pedagógicas docentes e desaprumando formas discentes de pensar o mundo. E, assim, abrindo espaço para outras práticas curriculares e outros olhares sobre o aprender e o ensinar.

Apesar da dificuldade inicial, a professora viu uma substancial oportunidade de ampliar o vocabulário dos(as) discente e, com isso, alargar a compressão de mundo deles(as). A fim de ilustrar as potencialidades no uso de um texto na prática curricular docente, a professora completou: tivemos a possibilidade de produzir textos em Libras sobre a rotina de cada aluno, assim, ficou evidente a facilidade em produzir textos na Libras e ainda mesmo na idade adulta, a dificuldade do aluno em expressar no português escrito (Relato de campo, 2021). A multimodalidade na educação, como o uso de vídeos em sala de aula, aproxima linguagens - imagem e sons - e oportuniza outras práticas curriculares. Como afirma Pereira (2009PEREIRA, Maria Cristina da Cunha. In: PEREIRA, Maria Cristina Cunha. Leitura, escrita e surdez. 2. ed. São Paulo: FDE, 2009.), no caso de estudantes surdos(as), o conhecimento prévio discente e a contextualização do conhecimento são fatores cruciais nos processos de alfabetização que buscam estabelecer conexões imagéticas e sonoras. A diversidade do fazer docente pode produzir efeitos no currículo, como a inclusão e a visibilidade das diferenças, a ampliação do acesso à educação e a expansão da consciência sobre o mundo.

À guisa de considerações finais

Retomando os efeitos da desestruturação da linguagem pelas palavras, proposto pelo poeta Barros (2021BARROS, Manoel de. Livro de Pré coisas. Rio de Janeiro: Alfaguara, 2021.) no início do artigo, resta-nos refletir sobre quais palavras teriam o poder de nos desaprumar e tirar o chão debaixo da gente. Nesse olhar poético, as palavras - interseccionalidade, equidade, deficiência, gênero, surdez, raça e classe social - podem ser lidas como palavras desestruturantes da linguagem. E a palavra currículo? Também seria uma palavra capaz de desestruturar a linguagem? Acreditamos que sim. Na cena dos estudos pós-críticos, currículo pode e deve desestruturar a linguagem educativa normativa, excludente, classista, sexista, racista e capacitista. E substituí-la por uma linguagem educativa, inclusiva, equânime, cidadã, justa e democrática.

No conto “Circuito Fechado” (Ramos, 2012RAMOS, Ricardo. Circuito Fechado. Revista Macondo. Fevereiro, 2012. https://revistamacondo.wordpress.com/2012/02/29/conto-circuito-fechado-ricardo-ramos/
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) - que, neste artigo, foi objeto de reflexão da prática docente de alfabetização numa turma de estudantes surdos(as) da EJA - as palavras circulam, se repetem, criam sequências, se agrupam, se reagrupam e ganham vida. Sugerem rotinas, hábitos de higiene, práticas de alimento, momentos de lazer, atos de vestir, atividades laborais, entre outras ações cotidianas. Palavras-imagens que ampliam formas de comunicação e reverberam no silêncio, produzindo sentidos e evocando memórias. Palavras feitas pelas mãos (como ocorre no uso da Libras), palavras feitas com o lápis de cor (como em um desenho), palavras feitas no computador (como em um texto digitado), palavras silenciosas (como na leitura com os olhos), palavras ruidosas (como na leitura oral), palavras lidas com as mãos (como ocorre no uso do Braile) entre muitas outras.

Nas composições e nos encontros realizados com o referido conto em sala de aula, foi possível perceber como marcadores sociais interseccionam os processos de leitura e de escrita. Tal exercício multimodal com o texto, numa turma de estudantes surdos(as) em processo de alfabetização, pode ser compreendido como um convite a sair do lugar, desaprumar certezas, desnaturalizar olhares, desfazer manuais e viajar por outros lugares do ensinar e do aprender.

O ato de curricular na escola “demanda o exercício permanente da arte do estranhamento na escola, isto é, perguntar de forma diferente, olhar sob outro ponto de vista, repetir a pergunta, deslocar o foco de atenção, afastar e perceber a cena de longe” (Alves; Lloyd, 2022ALVES, Cláudio Eduardo Resende; LLOYD, Rebeca Cristina. Gênero e currículo: o movimento das diferenças no território da escola. In: FREITAS, Luciana; PINHEIRO, Rodrigo Carlos; MIRANDA, Dayse Garcia (Orgs.). Educação inclusiva e diversidade. Belo Horizonte: Mazza, 2022., p. 46). No fazer docente, “é necessário organizar encontros (…) com o inusitado que força o pensamento e funciona como uma resistência” (Paraíso, 2023PARAÍSO, Marlucy Alves. Currículos: teorias e políticas. São Paulo: Contexto, 2023., p. 127). Afinal, desestruturar a linguagem pode ser um potente e necessário caminho para conceber um currículo vivo e em ação, permeável à diversidade, nômade e acessível a todos(as).

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  • 1
    Apesar de haver uma disputa política no meio acadêmico e no movimento social quanto ao uso das diferentes versões da sigla, optamos neste artigo pelo uso daquela que se refere a: lésbicas, gays, bissexuais, travestis/transexuais, queers, intersexuais, assexuais, pansexuais e não binários (Alves, 2017).
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    26 Ago 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    04 Out 2023
  • Aceito
    07 Maio 2024
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