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Investigações sobre o currículo para a alfabetização de jovens, adultos e idosos: o que dizem as propostas?

RESUMO

O artigo apresenta os principais resultados de uma pesquisa que tem como objetivo principal conhecer e analisar as propostas curriculares de alfabetização na modalidade da Educação de Jovens e Adultos (EJA) em municípios do estado do Rio de Janeiro. A pesquisa situa-se no âmbito do Programa de Incentivo à Docência na Graduação (Prodocência), vinculado à Faculdade de Educação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). O estudo aborda três temáticas interligadas: EJA, alfabetização e currículo. Assim sendo, os aportes teórico-metodológicos partem da intenção de integrar estes campos. Baseado em uma pesquisa documental, de abordagem qualitativa, o desenho metodológico da pesquisa compreende a necessidade de conhecer e reconhecer as propostas curriculares, questionando-as sobre o atendimento aos sujeitos da EJA, no sentido do cumprimento da garantia do direito à educação para todos. Ao mesmo tempo, mobiliza olhares para a alfabetização na modalidade e seus princípios, atualizando conceitos e refletindo sobre os contextos educacionais. As principais conclusões da pesquisa apontam o “alinhamento” inadequado das propostas curriculares à Base Nacional Comum Curricular (BNCC), principalmente em relação à invisibilidade da EJA no documento. O estudo assinala ainda, nas propostas das redes municipais, a ausência de uma formação docente continuada/permanente e a falta, tanto de concepções de alfabetização que orientem os currículos, quanto de intergeracionalidade.

Palavras-chave:
Educação de Jovens e Adultos (EJA); Alfabetização; Currículo; Formação Docente

ABSTRACT

The present article provides the results of a study focused on learning about and analyzing propositions in literacy discipline matrices developed for the Youth and Adult Education (YAE) modality in place in Rio de Janeiro State’s municipalities. The research was carried out in the Undergraduate Teaching Incentive Program (Prodocência) of the Education School at Rio de Janeiro State University (UERJ). The study addresses three interconnected topics: YAE, literacy and discipline matrix. Therefore, its theoretical-methodological contributions are an attempt to integrate these fields. The research followed the methodological design based on qualitative approach, and it included the need of knowing and acknowledging discipline matrix propositions, and of questioning how they apply to YAE subjects in order to ensure the right to education for all. At the same time literacy in the herein analyzed modality and its principles was also assessed to update concepts and reasoning on education contexts. Results point towards mismatch between the observed propositions and the National Common Curricular Base (BNCC), mainly when it comes to YAE invisibility in this document. In addition, the study highlights the lack of propositions by municipal education networks, such as those focused on the necessary continuous/permanent teachers’ qualification, as well as on literacy concepts to guide discipline matrices and inter-generation approaches.

Keywords:
Youth and Adult Education (EJA); Literacy; Discipline Matrix; Teacher Training

Introdução

A Educação de Jovens e Adultos (EJA) é uma modalidade de ensino da Educação Básica, nos níveis fundamental e médio, com características próprias (modelo pedagógico, currículo, material didático, tempos, espaços, processos avaliativos etc.) e funções definidas, e cujo objetivo é o alcance de um direito negado historicamente, por mais igualdade de acesso e condições de permanência e aprendizagens significativas na escola, para jovens, adultos e idosos, com trajetórias escolares prévias ou não (Brasil, 2000). Além disso, compreende o que se chama aprendizagem ao longo da vida, no contexto da educação continuada, no sentido da garantia do direito de todos à educação.

Sendo a EJA uma modalidade que possui especificidades que a diferem do ensino voltado para crianças e adolescentes, há uma demanda para a formação de educadores e, por isso, algumas universidades públicas têm investido, cada vez mais, na formação inicial de professores para atuação na área (Paiva; Fernandes, 2016PAIVA, Jane; FERNANDES, Fátima Lobato. Da concepção à prática de formação inicial: a EJA no currículo de pedagogia. Revista Teias, v. 17, ed. esp., p. 25-42, 2016. https://doi.org/10.12957/teias.2016.25007
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). Essa necessidade se dá, por um lado, pela inserção da EJA nos sistemas de ensino e, por outro lado, pela atuação dos educadores em diversos espaços sociais de formação humana, nos quais se encontram, também, educandos jovens, adultos e idosos.

Diante dos dados de analfabetismo no Brasil, apontados pela última Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua - PNAD Contínua (IBGE, 2023), de cerca de 9,6 milhões de pessoas com mais de 15 anos de idade (5,6%), é importante pensar em uma formação de educadores para a EJA nos anos iniciais que reflita sobre o processo de alfabetização e problematize propostas curriculares para esse segmento. Embora o estado do Rio de Janeiro, campo da presente pesquisa, possua na PNAD Contínua 2,1% de pessoas não alfabetizadas, esse dado corresponde a cerca de 300 mil pessoas com mais de 15 anos de idade. É preciso enfrentar esses índices reconhecendo que a situação de analfabetismo é fruto da desigualdade social, econômica, racial e educacional e não tem origem nos sujeitos, mas na estrutura social excludente (Haddad; Siqueira, 2015HADDAD, Sergio; SIQUEIRA, Filomena. Analfabetismo entre jovens e adultos no Brasil. Revista Brasileira de Alfabetização, v. 1, n. 2, p. 88-110, 2015. https://revistaabalf.com.br/index.html/index.php/rabalf/article/view/81
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).

A pesquisa aqui abordada apresenta três temáticas interligadas: EJA, alfabetização e currículo. E seus aportes teórico-metodológicos partem da intenção de integrar esses campos. A discussão sobre alfabetização na modalidade EJA passa pela problematização do que se espera desse processo na formação de sujeitos pouco ou não escolarizados, de quais são suas demandas sociais atuais e de que motivações eles trazem à escola. Torna-se necessário pensar na formação docente inicial e continuada que contribua para o desenvolvimento de práticas pedagógicas que respondam a um conceito ampliado de alfabetização (como elaboração e apropriação do sistema de escrita alfabética) e às demandas educativas dos sujeitos da EJA. Somente dessa forma será realizado um trabalho significativo, com uma perspectiva de letramento que considere os saberes prévios dos estudantes sobre a leitura e a escrita, para melhor desenvolverem-se nesse processo (Ferreira et al., 2013FERREIRA, Andréa Tereza Brito; ALBUQUERQUE, Eliana Borges C. de; MORAIS, Artur Gomes de; FERREIRA, Josemar Guedes. Práticas dos professores alfabetizadores da EJA: o que fazem os professores, o que pensam os seus alunos? Educação em Revista, v. 29, n. 3, p. 177-198, 2013. https://doi.org/10.1590/S0102-46982013000300008
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).

A partir desses pressupostos, o presente artigo busca apresentar os principais achados de uma pesquisa intitulada “Currículo da/na Educação de Jovens e Adultos: investigação sobre as propostas para a alfabetização nos municípios do Rio de Janeiro”. Tal pesquisa vem sendo executada no âmbito do Programa de Incentivo à Docência na Graduação (Prodocência), iniciado em 2022 e vinculado à Faculdade de Educação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Com o objetivo central de conhecer e analisar as propostas curriculares de alfabetização na EJA nas diversas redes municipais de ensino, o estudo tem como alguns dos seus objetivos específicos: realizar um exame aprofundado e comparativo entre as propostas curriculares apresentadas, à luz do referencial teórico da EJA e das especificidades dos sujeitos atendidos pela modalidade; e contribuir com a formação dos estudantes envolvidos (bolsistas) para o trabalho com a EJA.

Tendo como objeto de estudo as propostas curriculares para a alfabetização nas redes municipais, a pesquisa parte das seguintes questões: como se apresentam as propostas curriculares para a alfabetização na EJA nos diferentes municípios do estado do Rio de Janeiro? Os currículos consideram as especificidades da modalidade EJA e dos sujeitos educandos? Que concepções de alfabetização tais propostas curriculares apresentam? Elas se estruturam e se relacionam às Diretrizes Curriculares Nacionais para a EJA (Brasil, 2000)? Estão alinhadas à Base Nacional Comum Curricular (BNCC), conforme as Diretrizes Operacionais para a EJA (Brasil, 2021)?

A pesquisa documental, de abordagem qualitativa, busca investigar profundamente as propostas curriculares destinadas à alfabetização/primeiro segmento do Ensino Fundamental. Para isso, tomou por base os estudos clássicos sobre currículo (aqueles que tecem as teorias de autores/pesquisas desse campo) e o currículo específico na/da EJA, realizados semanalmente pela coordenadora e pelo grupo de bolsistas - formado por estudantes do curso de Pedagogia selecionados para o projeto, cuja duração será de 24 meses. Os resultados divulgados neste artigo compõem a primeira e segunda fases da pesquisa, caracterizadas pelos primeiros contatos com as propostas e as observações iniciais provocadas pelas questões de estudo.

O desenho metodológico da pesquisa compreende, então, a necessidade de conhecer e reconhecer as propostas curriculares, questionando-as sobre o atendimento aos sujeitos da EJA, no sentido do cumprimento da garantia do direito à educação para todos. Ao mesmo tempo, mobiliza olhares para a alfabetização na modalidade e seus princípios, atualizando conceitos e refletindo sobre os contextos educacionais. O desafio de pensar currículos para a alfabetização na EJA passa por reconhecer a realidade de cada sistema, de cada escola, de cada comunidade. Por isso, as propostas curriculares na modalidade necessitam dialogar com tais realidades, com as culturas e a diversidade, reconhecendo o currículo como um processo em permanente elaboração e como um território em disputa (Serra, 2017SERRA, Enio. Currículo e docência na Educação de Jovens e Adultos. In: SERRA, Enio; MOURA, Ana Paula Abreu (org.). Educação de Jovens e Adultos em debate. Jundiaí: Paco, 2017. p. 25-52.). Logo, a pesquisa aqui tratada procura aferir os contextos em que são produzidos e praticados os currículos da EJA, desde o discurso político, até sua produção e sua prática (Lopes; Macedo, 2022LOPES, Alice Casimiro; MACEDO, Elizabeth. Teorias de currículo. 8. reimp. São Paulo: Cortez, 2022.).

Reflexões necessárias sobre alfabetização e currículo na EJA

A partir dos estudos sobre a alfabetização na EJA torna-se importante observar quais concepções acompanham e orientam as ações pedagógicas, compreendendo as demandas sociais dos sujeitos atendidos. Conhecer o currículo pensado e praticado nas instituições de ensino torna-se igualmente relevante, pois o currículo é “constituído intrinsecamente dessas duas dimensões - proposta e prática - com sentidos interconectados e, constantemente, reelaborados” (Torres; Dias; Lopes, 2011TORRES, Wagner Nobrega; DIAS, Rosanne Evangelista; LOPES, Alice Casimiro. O que dizem os estudos da EJA sobre políticas de currículo? In: SOUZA, José dos Santos; SALES, Sandra Regina (org.). Educação de Jovens e Adultos: políticas e práticas educativas. Rio de Janeiro: NAU/ EDUR, 2011. p. 133-156., p. 150). Por isso, as reflexões sobre alfabetização e currículo na EJA requerem o debate a respeito do que se propõe nesse processo e do que tem sido realizado nas salas de aula da modalidade, não como ações dicotômicas, mas considerando a “recontextualização das práticas nas propostas e das propostas nas práticas” (Lopes, 2006 apud Torres; Dias; Lopes, 2011, p. 150).

O esforço de recontextualização ocorre no sentido do enfrentamento dos desafios postos para a EJA nos últimos anos, quando se observa sua invisibilidade no interior das políticas públicas educacionais, o que vem ocasionando seu apagamento em documentos oficiais, como a BNCC, por exemplo (Carvalho et al., 2020CARVALHO, Kely Rejane Souza dos Anjos; CARVALHO JÚNIOR, Ciro Ferreira de; SANTOS, Jocyleia Santana dos; SOUSA, Graciene Reis de. Trajetória, avanços e perspectivas da EJA face à BNCC. Educação em Revista, v. 21, n. 2, p. 51-64, 2020. https://doi.org/10.36311/2236-5192.2020.v21n02.05.p51
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). Essa invisibilidade tem sido a consequência da extinção e/ou descontinuidade de programas, projetos e políticas voltados à EJA no âmbito do Ministério da Educação. Simultaneamente, há o fechamento de turmas e escolas que oferecem a modalidade em todo o país, como consequência da queda constante no número de matrículas em EJA em toda a Educação Básica (Haddad; Siqueira, 2015HADDAD, Sergio; SIQUEIRA, Filomena. Analfabetismo entre jovens e adultos no Brasil. Revista Brasileira de Alfabetização, v. 1, n. 2, p. 88-110, 2015. https://revistaabalf.com.br/index.html/index.php/rabalf/article/view/81
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).

Por isso, a reflexão sobre o currículo proposto e praticado para a alfabetização na EJA vem ao encontro de uma necessidade advinda da prática pedagógica e do reconhecimento da modalidade como garantia do direito de todos à educação. Na EJA, as práticas pedagógicas de alfabetização e o currículo necessitam ser pensados a partir da compreensão de como os sujeitos aprendem, como constroem conhecimentos e como articulam essas aprendizagens com/em seu cotidiano (Leal; Morais, 2013LEAL, Telma Ferraz; MORAIS, Artur Gomes de. O aprendizado do sistema de escrita alfabética: uma tarefa complexa, cujo funcionamento precisamos compreender. In: LEAL, Telma Ferraz; ALBUQUERQUE, Eliana Borges Correia de; MORAIS, Artur Gomes de (org.). Alfabetizar letrando na EJA: fundamentos teóricos e propostas didáticas. Belo Horizonte: Autêntica, 2013. p. 31-48.), como instrumento de formação humana e integral. Compreender a especificidade pedagógica da aprendizagem dos sujeitos da EJA significa posicioná-los como centro do processo educativo.

A centralidade do educando no processo de alfabetização tem por finalidade a formação do sujeito da escrita, para que ele se reconheça como produtor de cultura capaz de impregnar de sentido as práticas no tempo presente, com a leitura e a escrita como instrumentos de autonomia e emancipação social, e não de domesticação. E com uma formação crítica que valorize sua cultura, seus saberes prévios e suas singularidades (Calháu, 2020CALHÁU, Socorro. O sujeito da escrita: fronteiras e domínios da alfabetização e do letramento na EJA. Curitiba: CRV, 2020.). Esse sentido da alfabetização traz para o trabalho em sala de aula possibilidades de articulação entre as aprendizagens escolares e a experiência existencial do alfabetizando, ressignificando o papel da escola na EJA.

De acordo com Arroyo (2008ARROYO, Miguel Gonzáles. Indagações sobre currículo: educandos e educadores: seus direitos e o currículo. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Básica, 2008., p. 46),

[…] guiar-nos na organização dos currículos pela lógica dos educandos como sujeitos do direito à formação plena, respeitada a especificidade de cada tempo de vida, terá de significar reorganizar radicalmente o que ensinar e o que aprender [...].

Ao conceber essa organização/reorganização, o currículo pensado e praticado na EJA não pode minimizar os saberes, vivências, contextos e a realidade dos sujeitos, e necessita desnaturalizar e problematizar a seleção e a produção do conhecimento, à proporção que questiona o conhecimento escolar como a única forma de conhecimento (Serra, 2017SERRA, Enio. Currículo e docência na Educação de Jovens e Adultos. In: SERRA, Enio; MOURA, Ana Paula Abreu (org.). Educação de Jovens e Adultos em debate. Jundiaí: Paco, 2017. p. 25-52.).

Por isso, quando a pesquisa se propõe a investigar como os currículos das redes municipais pensam a alfabetização, busca perceber nessas propostas o reconhecimento da alfabetização como um processo de elaboração do sistema de escrita alfabética, que não se resume a reconhecer letras e sons. Ele implica, também, em conhecer o funcionamento da língua em todas as suas dimensões, ler e compreender o que se lê; e organizar as ideias por meio da escrita, com todas as suas convenções, adequando sua escrita à situação de comunicação e aos critérios estabelecidos (Spala; Machado; Lopes, 2018SPALA, Fátima Terezinha; MACHADO, Maria Letícia Cautela de Almeida; LOPES, Paula da Silva Vidal Cid. Relações entre componentes curriculares e modos autorais de ensinar na alfabetização. Revista Contemporânea de Educação, v. 13, n. 27, 2018. https://doi.org/10.20500/rce.v13i27.15540
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). Daí a importância de distinguir o que as propostas curriculares apontam como uma alfabetização adequada à modalidade EJA, no sentido de contribuir para a emancipação e a autonomia dos sujeitos nela inseridos.

A compreensão da alfabetização como instrumento de emancipação e autonomia amplia o debate sobre uma alfabetização na perspectiva discursiva, em resposta às demandas sociais dos alfabetizandos. Essa perspectiva reconhece as relações discursivas promovidas entre os sujeitos, indicando o texto como enunciado fundamental, que se constitui na interação, na produção social e na atividade humana (Souza, 2016SOUZA, Marta Lima de. Educação de Jovens e Adultos: a alfabetização em perspectiva discursiva. Olh@res, v. 4, n. 1, p. 125-141, 2016. https://doi.org/10.34024/olhares.2016.v4.500
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). Portanto, as relações dialógicas são imprescindíveis no processo alfabetizador, como contribuição à formação do sujeito do discurso e à construção de seus enunciados. A dialogicidade, segundo Freire (1996FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996.), tem papel central em uma educação libertadora, como processo dialético-problematizador, em que se valorizam os saberes e a construção da consciência crítica. Dessa forma, concebe-se uma atualização do conceito de alfabetização, para além das práticas escolares, que considera os sujeitos como produtores de cultura e de conhecimento, como apontam Ferreira et al. (2013FERREIRA, Andréa Tereza Brito; ALBUQUERQUE, Eliana Borges C. de; MORAIS, Artur Gomes de; FERREIRA, Josemar Guedes. Práticas dos professores alfabetizadores da EJA: o que fazem os professores, o que pensam os seus alunos? Educação em Revista, v. 29, n. 3, p. 177-198, 2013. https://doi.org/10.1590/S0102-46982013000300008
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, p. 183):

Nesse sentido, as propostas de aprendizagem da língua materna que envolvem a compreensão dos diversos textos que estão presentes na sociedade estreitam a relação entre a cultura escrita e a cultura escolar, tornando o processo de ensino-aprendizagem muito mais significativo para o aluno.

A argumentação sobre a alfabetização em uma perspectiva discursiva tem sido cada vez mais presente na EJA e seus princípios e pressupostos ressaltam a necessidade de um trabalho contextualizado e significativo com os jovens, adultos e idosos, respeitando suas especificidades, suas histórias de vida e trajetórias escolares prévias. Nesse ponto, destaca-se também a relevância do olhar para a formação docente, que considere esse processo alfabetizador ampliado. Para tanto, essa formação necessita problematizar práticas pedagógicas, despindo-se de uma alfabetização técnica e instrumentalizada, tendo em vista a construção de ações que considerem a realidade dos educandos.

Nesse sentido é que se revela uma relação direta entre o currículo da alfabetização na EJA e a necessária formação docente (inicial e/ou continuada/permanente). Se há uma compreensão de que a aprendizagem da leitura e da escrita está vinculada à elaboração e à apropriação do sistema de escrita alfabética, é preciso evidenciar essa concepção no currículo e na formação de professoras e professores, conforme explicitado no Parecer nº 11/2000 (Brasil, 2000, p. 56), “o preparo de um docente voltado para a EJA deve incluir, além das exigências formativas para todo e qualquer professor, aquelas relativas à complexidade diferencial desta modalidade de ensino”.

Essa complexidade diferencial da EJA corresponde às diversidades presentes nas salas de aula (etárias, de gênero, étnicas, de locais de procedência, de religiões, de constituições familiares, de trajetórias escolares, de escolaridade dos pais, de acesso à tecnologia, de inserções e não inserções no mundo do trabalho etc.), bem como às aprendizagens demandadas pelos sujeitos que nelas se encontram. Diante dessa realidade, se põem em xeque diferentes concepções teóricas que embasam os currículos, algumas que apostam em “formações discursivas que se dão via deslocamentos de sentidos a partir de demandas contextuais e contingentes” e outras que pressupõem “projetos educacionais constitutivos do próprio jogo político” (Souza; Borges, 2023SOUZA, Bárbara Rocha; BORGES, Verônica. Currículo: disputas pela estabilização de um conhecimento “necessário, válido e útil”. Educar em Revista, v. 39, e85938, 2023. https://doi.org/10.1590/1984-0411.85938
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, p. 12).

Tendo em vista a ausência de uma política curricular para a EJA na BNCC, torna-se possível vislumbrar outros caminhos para o estabelecimento de propostas de trabalho para a modalidade. Diante desse cenário, Carvalho et al. (2020CARVALHO, Kely Rejane Souza dos Anjos; CARVALHO JÚNIOR, Ciro Ferreira de; SANTOS, Jocyleia Santana dos; SOUSA, Graciene Reis de. Trajetória, avanços e perspectivas da EJA face à BNCC. Educação em Revista, v. 21, n. 2, p. 51-64, 2020. https://doi.org/10.36311/2236-5192.2020.v21n02.05.p51
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) sugerem a construção de currículos para a EJA que proponham a contextualização das realidades locais, e que sejam compostos por estratégias de ensino específicas e diferenciadas. Além disso, que o currículo seja uma ferramenta de incentivo aos estudantes na promoção e construção de suas identidades, contribuindo com a permanência e a aprendizagem desses sujeitos.

A partir do reconhecimento das disputas no campo do currículo e compreendendo as relações entre este e o conhecimento na escola, o estudo aqui apresentado insere-se na tentativa de colaborar com as reflexões sobre as propostas para a prática pedagógica na EJA, no que diz respeito ao processo alfabetizador. Nesse contexto, descreve-se, a seguir, o desenho metodológico da pesquisa.

Sentidos do processo de investigação dos currículos

Na busca pelo alcance dos objetivos da análise aqui compartilhada, o grupo do Prodocência tem se debruçado sobre o estudo de autores do campo da alfabetização na EJA e do currículo, no intuito de compreender as relações estabelecidas pelas pesquisas atuais. O grupo tem buscado, igualmente, junto às equipes gestoras municipais de EJA, as propostas curriculares para a alfabetização na modalidade. O primeiro passo do trabalho foi contatar os gestores de 90 dos 92 municípios do estado.1 1 Duas redes municipais de ensino do Rio de Janeiro não oferecem matrículas para a modalidade EJA. Essa comunicação ocorreu por meio das páginas eletrônicas, por e-mail e pelas redes sociais das Secretarias de Educação.

A principal dificuldade encontrada nessa fase do projeto foi o fato de não se ter conseguido contatar alguns gestores da EJA das redes municipais. Sabe-se que muitas redes dispõem suas informações institucionais por meio da internet ou de redes sociais. Entretanto, algumas redes sequer possuem coordenação de EJA no âmbito das secretarias ou não têm contatos atualizados em relação à modalidade. Assim sendo, muitas vezes não se obteve retorno dos e-mails enviados e nem sempre foi possível o contato via ligação telefônica. Algumas respostas demoraram de dois a três meses.

Além disso, outro empecilho tem sido o momento de algumas redes, que não têm como disponibilizar suas propostas curriculares por encontrarem-se em fase de reelaboração, em cumprimento ao alinhamento do currículo à BNCC, conforme previsto nas Diretrizes Operacionais da Resolução no 1/2021, do Ministério da Educação (Brasil, 2021). Por causa desses desafios, foi necessário reformular o cronograma do projeto.

Devido às dificuldades expostas, obteve-se acesso a somente 36 propostas curriculares.2 2 Inicialmente, obteve-se 37 propostas curriculares, mas uma das redes não oferecia EJA no primeiro segmento do Ensino Fundamental, e por isso essa proposta foi descartada da análise. A partir da leitura atenta desses documentos, o grupo iniciou a análise buscando compreender o que tem sido prescrito à prática pedagógica para os sujeitos jovens, adultos e idosos matriculados nas escolas desses municípios, à luz das questões de estudo.

Foram elaborados critérios de análise a fim de que o grupo pudesse conduzir seu olhar para os documentos curriculares. Dentre eles, na primeira fase da pesquisa, considerou-se: o ano de publicação do currículo; como o município organiza a EJA; se o currículo é estruturado como lista de conteúdos; se especifica os objetivos; se identifica eixos de formação; se oferece orientações para a prática; se tem um caráter prescritivo; se está alinhado com a BNCC; se valoriza os saberes gerais dos educandos; se abre espaço para os diversos contextos de realidades locais; se prevê a formação docente; se menciona o referencial teórico utilizado em sua elaboração; se prevê revisões e se considera a intergeracionalidade dos sujeitos da EJA.

Na segunda fase da pesquisa, foram considerados como critérios de análise os seguintes aspectos: os rastros identitários que o currículo expressa; as pretensões formativas que o currículo declara; a definição de jovens, adultos e idosos que o currículo carrega; a perspectiva de docência e educação que assume; se o currículo reconhece e respeita as especificidades dos sujeitos jovens, adultos e idosos; se traz contribuições das Diretrizes Curriculares Nacionais da EJA; os diálogos que o currículo tece com a BNCC e em que medida o currículo colabora para a formação de leitores e escritores na EJA.

A partir das questões de estudo e dos critérios descritos acima, apresentam-se, a seguir, algumas considerações acerca das reflexões tecidas por meio do olhar atento aos documentos obtidos.

O que dizem as propostas curriculares para a alfabetização de jovens, adultos e idosos?

O movimento de investigação das propostas curriculares das redes municipais do Rio de Janeiro para a EJA se pautou pela leitura cuidadosa dos documentos e pela análise a partir do estudo do referencial teórico, das questões e dos critérios estabelecidos. De acordo com os dados iniciais levantados, percebeu-se que há alguns currículos que não dialogam com a EJA, como é o caso de, pelo menos, oito propostas. Dentre estas, algumas possuem só a carga horária dos segmentos; outras, apenas uma listagem de conteúdos a serem trabalhados ou somente uma resolução que cita a EJA, sem aprofundar o currículo prescrito para a modalidade. Embora denominadas como currículo para a EJA, essas propostas mostram-se inadequadas ou incompletas, pois não trazem orientações necessárias para o trabalho pedagógico. Esse formato de apresentação do currículo pode ser consequência da invisibilidade da EJA nos sistemas educativos e da desarticulação das Secretarias Municipais de Educação em torno da modalidade.

Por outro lado, não haver uma orientação específica para o currículo da EJA pode permitir a criação de propostas no interior das escolas que envolvam professores, estudantes e outros sujeitos da comunidade escolar. Serra (2017SERRA, Enio. Currículo e docência na Educação de Jovens e Adultos. In: SERRA, Enio; MOURA, Ana Paula Abreu (org.). Educação de Jovens e Adultos em debate. Jundiaí: Paco, 2017. p. 25-52., p. 41) sugere a construção de currículos pautada na autonomia e na autoria que compõem a gestão democrática. Segundo ele,

[...] se a construção curricular é democrática, deve ser coletiva, isto é, deve expressar os conflitos e consensos da equipe docente, deve também considerar a realidade concreta dos educandos e [...] suas interpretações sobre espaço e tempo vividos próprios das classes populares.

Currículos localmente produzidos podem ser ferramentas importantes para o reconhecimento e a valorização da realidade dos sujeitos da EJA, portanto, da mesma maneira que contribuem para a formação docente continuada/permanente, por permitirem a reflexão, o questionamento e a validação do papel intelectual dos educadores (Serra, 2017SERRA, Enio. Currículo e docência na Educação de Jovens e Adultos. In: SERRA, Enio; MOURA, Ana Paula Abreu (org.). Educação de Jovens e Adultos em debate. Jundiaí: Paco, 2017. p. 25-52.).

Arroyo (2008ARROYO, Miguel Gonzáles. Indagações sobre currículo: educandos e educadores: seus direitos e o currículo. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Básica, 2008.) também tece uma reflexão sobre a construção de currículos a partir de um trabalho coletivo. De acordo com ele, o trabalho coletivo reorienta a organização curricular na Educação Básica e tende a permitir que a produção e a seleção de conhecimentos, materiais e recursos pedagógicos contribuam para a autoria coletiva. Autoria essa que em adição à lógica do que ensinar e aprender propõe-se a indagar o currículo sobre como os conhecimentos são ordenados, organizados, por quais fundamentos, hierarquias, precedências e em quais tempos e espaços. Porém, no estudo aqui examinado, não é possível afirmar que a ausência da EJA nas oito propostas curriculares se relacione com a intenção de que as unidades escolares tenham mais autonomia na construção de seu trabalho.

Ao longo da investigação, observou-se também que as 36 propostas curriculares foram desenvolvidas a partir do ano de 2011, ou seja, são documentos relativamente recentes, sendo 33 deles elaborados a partir do ano de 2016, verificando-se que 15 propostas apresentam “alinhamento” com a BNCC, conforme previsto na Resolução CNE/CEB no 1/2021, que propõe tal medida. Ocorre que, como há uma invisibilidade da modalidade na BNCC (Carvalho et al., 2020CARVALHO, Kely Rejane Souza dos Anjos; CARVALHO JÚNIOR, Ciro Ferreira de; SANTOS, Jocyleia Santana dos; SOUSA, Graciene Reis de. Trajetória, avanços e perspectivas da EJA face à BNCC. Educação em Revista, v. 21, n. 2, p. 51-64, 2020. https://doi.org/10.36311/2236-5192.2020.v21n02.05.p51
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), o alinhamento proposto pela Resolução torna-se uma inadequação e não uma inclusão de fato, visto que a Base não considera as especificidades da EJA, conforme o Parecer CNE/CEB no 11/2000 tem orientado, ao longo de mais de duas décadas. Alinhar a EJA à BNCC significa então, em linhas gerais, pinçar objetivos e competências expressos no documento e encaixá-los na modalidade, sem uma reflexão aprofundada sobre o currículo mais adequado à realidade dos sujeitos e das salas de aula da EJA.

Como exemplo desse “alinhamento”, buscou-se identificar qual a definição de jovens, adultos e idosos as propostas curriculares carregam, no sentido de compreender como tais currículos consideram os sujeitos da EJA. A partir desse olhar, percebe-se que essas 15 propostas abordam o trabalho com os educandos reproduzindo o que a BNCC traz, quando se refere ao eixo intitulado “o sujeito e seu lugar no mundo”. As propostas para a EJA copiam esse modelo e perfilam igualmente os objetivos a serem cumpridos pelos estudantes da modalidade, sem alterarem o texto ou a forma. Elas não expõem sua compreensão sobre as especificidades dos sujeitos da EJA (Brasil, 2000), mas apenas corroboram com o texto da Base no que diz respeito às noções de pertencimento e identidade.

Torna-se importante problematizar o que a BNCC aponta como o “lugar no mundo” do estudante, pois, diante do modo como é apresentado o eixo, parece que há um lugar no mundo destinado aos educandos, sejam crianças, jovens, adultos ou idosos. Essa concepção exprime uma ideia de fatalismo, de inexorabilidade da história, como se a escola contribuísse apenas para que o sujeito reconheça o seu lugar no mundo, um lugar que já foi destinado a ele. Dessa maneira, pode vir a ocorrer o que Freire (2000FREIRE, Paulo. Pedagogia da indignação: cartas pedagógicas e outros escritos. São Paulo: UNESP, 2000., p. 122) denuncia quando afirma que práticas como estas “[...] decretam a inexorabilidade do futuro que implica necessariamente a morte do sonho e da utopia. A educação vira treinamento, quase adestramento, no uso de técnicas”.

Observa-se, a partir do exemplo citado, que boa parte dos currículos extraíram da BNCC as habilidades a serem alcançadas pelos estudantes. Esse fato mostra a simples adequação de objetivos de aprendizagem, da BNCC para a EJA, sem o reconhecimento das especificidades dos sujeitos atendidos, desconsiderando que,

[...] como política educacional, a BNCC é editada como referência orientadora da reformulação dos currículos escolares e dos processos nacionais de avaliação. Mas em seu teor não são encontrados conteúdos, métodos e especificidades voltados exclusivamente para a EJA (Carvalho et al., 2020CARVALHO, Kely Rejane Souza dos Anjos; CARVALHO JÚNIOR, Ciro Ferreira de; SANTOS, Jocyleia Santana dos; SOUSA, Graciene Reis de. Trajetória, avanços e perspectivas da EJA face à BNCC. Educação em Revista, v. 21, n. 2, p. 51-64, 2020. https://doi.org/10.36311/2236-5192.2020.v21n02.05.p51
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, p. 57).

A pesquisa verificou que essas 15 propostas tentam cumprir o alinhamento determinado no artigo 13 da Resolução CNE/CEB no 1/2021, qual seja, de que os currículos dos cursos de EJA devem garantir os direitos e objetivos de aprendizagem, expressos em competências e habilidades, nos termos da BNCC (Brasil, 2021). Todavia, como há uma invisibilidade da EJA no documento da Base, fica evidente que qualquer currículo que apenas copie desse texto unidades temáticas, objetos de conhecimento e habilidades, muito provavelmente incorrerá em inadequações.

Por isso, é importante constatar que, no grupo de propostas apuradas, encontram-se 13 documentos que oferecem contribuições muito significativas para o (re)pensar dos currículos na modalidade EJA (Arroyo, 2008ARROYO, Miguel Gonzáles. Indagações sobre currículo: educandos e educadores: seus direitos e o currículo. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Básica, 2008.), uma vez que vão ao encontro do reconhecimento do perfil dos sujeitos atendidos, valorizando sua identidade e suas culturas. Tais propostas têm como característica comum o fato de não estarem em consonância com o que é proposto na BNCC, mas criam currículos voltados a sua realidade e às especificidades dos estudantes. Nesses currículos, os sujeitos da EJA são reconhecidos como trabalhadores, tendo os mundos do trabalho como orientadores das práticas educativas. Concomitantemente, valorizam a formação integral na EJA, para além de um fazer pedagógico instrumentalizado e utilitarista. Esses currículos mereceram atenção especial no segundo momento da pesquisa.

Sobre a estrutura dessas 13 propostas, que se destacam dentre todas as analisadas, 12 municípios exibem seu documento curricular com objetivos e/ou eixos de formação. E a maioria (dez propostas) contém orientações para a prática, isto é, demonstra como pode ser executado tal currículo na escola. Afora a perspectiva mais tradicional na elaboração das propostas, essa estrutura do currículo indica caminhos para a formação e o fazer pedagógico das escolas de EJA. Observa-se que esses documentos contextualizam a história da EJA no Brasil, desde as primeiras campanhas de alfabetização do século XX, passando pela história da constituição da EJA no município, até a análise sobre a realidade atual. A partir dessa configuração, as propostas organizam seus objetivos/eixos/conteúdos em articulação com a orientação para o trabalho em sala de aula. É possível notar, em uma leitura geral, que esses dez documentos foram elaborados como propostas que abrem espaço a uma recontextualização (Serra, 2017SERRA, Enio. Currículo e docência na Educação de Jovens e Adultos. In: SERRA, Enio; MOURA, Ana Paula Abreu (org.). Educação de Jovens e Adultos em debate. Jundiaí: Paco, 2017. p. 25-52.), quando sugerem que o currículo responda a algumas demandas do contexto escolar.

Sobre o conteúdo examinado, oito currículos valorizam, em seu texto, os saberes trazidos pelos educandos da EJA e, também, abrem espaço para os diversos contextos de realidades locais, favorecendo com isso o diálogo com a realidade e as vivências dos educandos jovens, adultos e idosos, em convergência aos princípios da educação popular. Essas propostas consideram as trajetórias e histórias de vida dos estudantes. Pode-se inferir, a partir dessa leitura, que os documentos curriculares trazem não só os conteúdos a serem trabalhados, mas, também, uma estrutura que objetiva a construção da autonomia e da emancipação pelos sujeitos atendidos na modalidade. Vê-se que essa preocupação com a formação dos estudantes encontra-se em consonância com as Diretrizes Curriculares Nacionais para a EJA (Brasil, 2000). Contudo, percebe-se que existem questões importantes na reflexão sobre a EJA que sequer constam em muitas das propostas apreciadas.

Apontamentos sobre as ausências nas propostas curriculares

A pesquisa verificou que, dentre todas as 36 propostas curriculares, apenas uma prevê a formação docente, ou seja, tem como um de seus objetivos uma ação conjunta com os professores da EJA, a partir da implementação do currículo. Nesse aspecto, é importante considerar que não basta a prescrição de um documento curricular para que ele seja apropriado por escolas e professores. É preciso que haja planos de formação continuada/permanente, nos quais o currículo seja conhecido, discutido e até questionado por aqueles que estão atuando diretamente em sala de aula. Se a proposta sequer orienta para tal formação, dificilmente haverá um trabalho no sentido de realizá-la, na prática.

A formação docente na EJA é fundamental, principalmente aquela de caráter continuado/permanente (Arroyo, 2008ARROYO, Miguel Gonzáles. Indagações sobre currículo: educandos e educadores: seus direitos e o currículo. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Básica, 2008.), devido ao fato de a modalidade receber, constantemente, professores sem formação inicial para o trabalho com jovens, adultos e idosos. No que concerne ao currículo, é necessário que os professores conheçam os currículos propostos pelas redes de ensino, não só pela carência de formação inicial, mas para que possam tomar ciência e intervir nas atualizações e/ou mudanças, principalmente as que se referem aos conhecimentos sobre a leitura e a escrita.

Percebe-se, na pesquisa, que do mesmo modo que há uma ausência da formação docente a partir dos currículos propostos, também não ficam claras que concepções de alfabetização são utilizadas na EJA. De todos os documentos analisados, apenas duas propostas curriculares expressam o que compreendem como alfabetização na EJA. Por conseguinte, especificamente com relação ao processo de alfabetização, ainda há um caminho a ser percorrido no fortalecimento dessa prática no interior dos sistemas, no intuito de reconhecer a necessária formação do sujeito da escrita (Calháu, 2020CALHÁU, Socorro. O sujeito da escrita: fronteiras e domínios da alfabetização e do letramento na EJA. Curitiba: CRV, 2020.) para as demandas sociais atuais.

Sabe-se que a EJA não se resume à alfabetização, ela é muito mais do que essa etapa (Haddad; Siqueira, 2015HADDAD, Sergio; SIQUEIRA, Filomena. Analfabetismo entre jovens e adultos no Brasil. Revista Brasileira de Alfabetização, v. 1, n. 2, p. 88-110, 2015. https://revistaabalf.com.br/index.html/index.php/rabalf/article/view/81
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), pois a luta por sua inserção nos sistemas de ensino busca o direito à educação escolar como processo, como Educação Básica. Mesmo assim, é preciso considerar que o aprendizado do sistema de escrita alfabética é uma tarefa complexa, como afirmam Leal e Morais (2013LEAL, Telma Ferraz; MORAIS, Artur Gomes de. O aprendizado do sistema de escrita alfabética: uma tarefa complexa, cujo funcionamento precisamos compreender. In: LEAL, Telma Ferraz; ALBUQUERQUE, Eliana Borges Correia de; MORAIS, Artur Gomes de (org.). Alfabetizar letrando na EJA: fundamentos teóricos e propostas didáticas. Belo Horizonte: Autêntica, 2013. p. 31-48.). Segundo os autores, é necessária a compreensão do professor como um mediador que proponha situações didáticas que auxiliem os educandos em seu processo. É imprescindível, pois, a reflexão sobre como se organiza o sistema de escrita alfabética e sobre os modos de apropriação desse conhecimento pelos estudantes. É possível perceber que a ausência de uma concepção de alfabetização mais transparente nos documentos curriculares pode permitir práticas descontextualizadas e infantilizadas, que tomem a aprendizagem da leitura e da escrita de maneira mecânica e alienada.

A formação do sujeito da escrita, no sentido de uma alfabetização na perspectiva do letramento, que contribua para a emancipação e autonomia dos sujeitos, pode estar presente nas propostas curriculares, não para uma prescrição da prática, mas para que a alfabetização seja compreendida a partir dos sujeitos atendidos e de sua realidade, como jovens, adultos e idosos, trabalhadores e produtores de cultura. Torna-se importante, também, sinalizar princípios e pressupostos de uma alfabetização que ultrapasse a discussão dos métodos de ensino, e que questione o papel da escola da EJA na formação desses sujeitos e na conquista de seus sonhos e realizações. Visto que, muitas vezes alcançam a alfabetização, mas,

[…] essa convivência com a cultura letrada não tem dado conta de torná-los sujeitos da escrita, produtores de textos e consumidores dos materiais escritos que se encontram disponíveis a todos os leitores competentes, da forma como nós e eles desejamos que o sejam (Calháu, 2020CALHÁU, Socorro. O sujeito da escrita: fronteiras e domínios da alfabetização e do letramento na EJA. Curitiba: CRV, 2020., p. 35).

Ferreira et al. (2013FERREIRA, Andréa Tereza Brito; ALBUQUERQUE, Eliana Borges C. de; MORAIS, Artur Gomes de; FERREIRA, Josemar Guedes. Práticas dos professores alfabetizadores da EJA: o que fazem os professores, o que pensam os seus alunos? Educação em Revista, v. 29, n. 3, p. 177-198, 2013. https://doi.org/10.1590/S0102-46982013000300008
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) denunciam, a partir de sua análise, que muitas práticas alfabetizadoras na EJA ainda carregam um caráter assistemático e fragmentado. São práticas baseadas em cópias, exercícios de repetição e em textos extraídos de cartilhas infantis, e não na reflexão sobre o sistema de escrita alfabética. Diante dessas verificações, os autores afirmam a importância de um trabalho significativo de alfabetização na EJA, em uma perspectiva discursiva, que considere os saberes prévios dos estudantes sobre a leitura e a escrita, para fazê-los avançar no processo de alfabetização. Souza (2016SOUZA, Marta Lima de. Educação de Jovens e Adultos: a alfabetização em perspectiva discursiva. Olh@res, v. 4, n. 1, p. 125-141, 2016. https://doi.org/10.34024/olhares.2016.v4.500
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) também argumenta sobre a importância da alfabetização na perspectiva discursiva, que considere a aprendizagem e o domínio dos diferentes gêneros do discurso, com o objetivo de empregá-los livremente nas práticas sociais. Para ela,

Esta perspectiva de alfabetização também requer o respeito aos tempos e ritmos próprios à aprendizagem dos alfabetizandos, incluindo professores formados, condições de ensino e aprendizagem adequadas aos contextos com metodologia de ensino e materiais pedagógicos que considerem a diversidade discursiva, social e cultural dos educandos (Souza, 2016SOUZA, Marta Lima de. Educação de Jovens e Adultos: a alfabetização em perspectiva discursiva. Olh@res, v. 4, n. 1, p. 125-141, 2016. https://doi.org/10.34024/olhares.2016.v4.500
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, p. 132).

Outra ausência percebida na pesquisa realizada diz respeito ao trabalho com os idosos na EJA. De todas as 36 propostas curriculares examinadas, apenas 13 citam a presença dos idosos, principalmente estimulando práticas pedagógicas que sejam pautadas no documento do Estatuto da Pessoa Idosa - Lei nº 10741/2003 - (Brasil, 2003). No entanto, dentre essas propostas, apenas oito consideram a intergeracionalidade presente na EJA, demonstrando certa preocupação com o fazer pedagógico, partindo das especificidades dos sujeitos e indo ao encontro da construção de aprendizagens significativas.

Os idosos geralmente procuram a escola para se alfabetizar e/ou concluir a Educação Básica. Mas nela também encontram um espaço de socialização e de múltiplas aprendizagens. Por isso, é importante compreender as especificidades do processo de envelhecimento, conhecer a participação do idoso em cursos de EJA e salientar a importância de que a formação docente esteja voltada para o comprometimento com as questões sociais, com a dignidade humana e com as especificidades do idoso estudante (Marques; Pachane, 2010MARQUES, Denise Travassos; PACHANE, Graziela Giusti. Formação de educadores: uma perspectiva de educação de idosos em programas de EJA. Educação e Pesquisa, v. 36, n. 2, p. 475-490, 2010. https://doi.org/10.1590/S1517-97022010000200004
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). A educação é um direito também do idoso e a escola precisa ser vista como um espaço privilegiado para a conscientização e um dos pilares para o reconhecimento de sua cidadania, servindo à formação não somente das chamadas futuras gerações, mas das gerações do presente.

Marques e Pachane (2010MARQUES, Denise Travassos; PACHANE, Graziela Giusti. Formação de educadores: uma perspectiva de educação de idosos em programas de EJA. Educação e Pesquisa, v. 36, n. 2, p. 475-490, 2010. https://doi.org/10.1590/S1517-97022010000200004
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) traçam um perfil dos estudantes idosos e apontam o desafio de se conseguir aliar longevidade e qualidade de vida. Há uma grande parcela de idosos que vive em condições precárias decorrentes de uma situação econômica desfavorável, da falta de instrução, do abandono e da necessidade de realizar trabalhos “pesados” para garantir a sobrevivência. Estar na escola acaba sendo mais um desafio para estes sujeitos. Questões de saúde, segurança, bem-estar e até mesmo vergonha de voltar a estudar nessa fase da vida são limites que precisam ser enfrentados pela escola. Deriva daí a relevância de uma formação docente que compreenda como inserir os idosos nas escolas de forma realmente includente.

As ausências sentidas nos currículos investigados remetem-se às questões de formação, alfabetização e especificidades dos sujeitos da EJA. Considerá-las gera uma reflexão importante sobre o reconhecimento de um currículo que rompa os limites de uma formação para a construção de conhecimentos necessários, válidos e úteis em direção a um currículo concebido como uma prática de enunciação de sentidos, pautada na proliferação de significados (Souza; Borges, 2023SOUZA, Bárbara Rocha; BORGES, Verônica. Currículo: disputas pela estabilização de um conhecimento “necessário, válido e útil”. Educar em Revista, v. 39, e85938, 2023. https://doi.org/10.1590/1984-0411.85938
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). Esse olhar sobre o currículo reconhece-o como produção cultural, conectando, nas propostas e nas práticas, todos os seus sentidos e significados (Lopes; Macedo, 2022LOPES, Alice Casimiro; MACEDO, Elizabeth. Teorias de currículo. 8. reimp. São Paulo: Cortez, 2022.).

Considerações finais

O estudo apresentado pressupõe um olhar sobre os currículos das redes municipais, não no sentido do julgamento ou simplesmente do apontamento de inconsistências na produção das propostas. O que se espera é poder contribuir com o debate sobre tais documentos, pensando na formação humana e integral dos estudantes e na formação docente para a EJA.

Não ter conseguido acesso a todas as propostas curriculares da EJA dos municípios do estado do Rio de Janeiro representou o maior desafio da análise, o que permite compreender que não cabem generalizações nem classificações. Mas essas lacunas impulsionam novas pesquisas, no intuito de, em algum momento, se alcançar a totalidade dos currículos das redes de ensino. Além disso, com a continuidade do trabalho do Prodocência, ainda serão possíveis novas investigações e o aprofundamento daquelas aqui já expostas, em diálogo com os referenciais teóricos.

É possível afirmar que o trabalho de pesquisa tem contribuído para a reflexão e a formação dos estudantes de Pedagogia envolvidos, bem como para a coordenadora. Contatar as equipes gestoras das redes municipais, conhecer estudos dos campos explorados, fazer o levantamento e a análise dos documentos curriculares são ações que auxiliam a construção do conhecimento sobre a docência na EJA e a compreensão crítica sobre as políticas de direito à educação para todos.

Referências

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  • BRASIL. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Câmara de Educação Básica. Resolução no 1/2021 de 25 de maio de 2021. Institui Diretrizes Operacionais para a Educação de Jovens e Adultos nos aspectos relativos ao seu alinhamento à Política Nacional de Alfabetização (PNA) e à Base Nacional Comum Curricular (BNCC), e Educação de Jovens e Adultos a Distância. Brasília: CNE/ MEC, 2021.
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  • APOIO/FINANCIAMENTO

    Universidade do Estado do Rio de Janeiro UERJ), Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil, Programa de Incentivo à Docência na Graduação - Prodocência (AEDA 051/Reitoria/2021).
  • DISPONIBILIDADE DE DADOS DE PESQUISA

    Dados serão fornecidos se solicitados.
  • 1
    Duas redes municipais de ensino do Rio de Janeiro não oferecem matrículas para a modalidade EJA.
  • 2
    Inicialmente, obteve-se 37 propostas curriculares, mas uma das redes não oferecia EJA no primeiro segmento do Ensino Fundamental, e por isso essa proposta foi descartada da análise.

Disponibilidade de dados

Dados serão fornecidos se solicitados.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    26 Ago 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    11 Out 2023
  • Aceito
    07 Maio 2024
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