RESUMO
A discussão foca em políticas de igualdade racial e ações afirmativas desenvolvidas no Brasil e na Argentina. Discute o contexto das relações raciais nos dois países, com a construção de hegemonia branca e as restrições de cidadania para as populações afrodescendentes. Analisa as formas de ações afirmativas para a população afrodescendente levadas a termo nos dois países. No Brasil, discute resultados gerais das ações afirmativas derivadas do Ensino de História e Cultura Africana e Afro-Brasileira definidos pela LDB e nas ações afirmativas desenvolvidas no Ensino Superior. Na Argentina, reflete sobre duas cátedras voltadas para populações afrodescendentes. Discute os pontos de convergência e as particularidades das relações raciais e das ações afirmativas nos dois países.
Palavras-chave
Ações afirmativas; Afrodescendentes; Equidade; Relações étnico-raciais
ABSTRACT
The discussion focuses on racial equality policies and affirmative action developed in Brazil and Argentina. It analyses the context of racial relations in both countries, with the construction of white hegemony and restrictions on citizenship for Afro-descendant populations. It discusses the forms of affirmative action for the Afro-descendant population carried out in the two countries. In Brazil, it discusses general results of affirmative actions derived from the teaching of African and afro-Brazilian history and culture defined by the LDB and affirmative actions developed in higher education. In Argentina, it reflects on two chairs aimed at Afro-descendant populations. It discusses the points of convergence and the particularities of race relations and affirmative action in both countries.
Keywords
Affirmative actions; Afro-descendants; Equity; Ethnic-racial relations
RESUMEN
La discusión se centra en las políticas de igualdad racial y acción afirmativa desarrolladas en Brasil y Argentina. Discute el contexto de las relaciones raciales en ambos países, con la construcción de la hegemonía blanca y las restricciones a la ciudadanía para las poblaciones afrodescendientes. Analiza las formas de acción afirmativa para la población afrodescendiente realizadas en los dos países. En Brasil, discute resultados generales de acciones afirmativas derivadas de la enseñanza de la historia y cultura africana y afrobrasileña definida por la LDB y acciones afirmativas desarrolladas en la educación superior. En Argentina, reflexiona sobre dos cátedras dirigidas a poblaciones afrodescendientes. Discute los puntos de convergencia y las particularidades de las relaciones raciales y de acción afirmativa en ambos países.
Palabras-clave
Acciones afirmativas; Afrodescendientes; Capital; Relaciones étnico-raciales
Introdução
Neste artigo, propomos a discussão sobre igualdade racial e ações afirmativas desenvolvidas no Brasil e na Argentina. Avaliamos que o processo de racialização está arraigado num sistema-mundo no qual “as nações mais escuras do mundo, Ásia e África, Américas do Sul e Central, índias Ocidentais e as Ilhas dos mares do Sul” (DU BOIS, 1915DU BOIS, W. The African Roots of War. Atlantic Monthly, s. l., May 1915. Disponível em: https://credo.library.umass.edu/view/full/mums312-b207-i165. Acesso em: 14 abr. 2022.
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) assumiram posições de subalternidade relacionadas com um processo global de hierarquização. O processo de racialização de pessoas negras e indígenas nos processos coloniais é estrutural e estruturante desse sistema.
Compreendemos o conceito de racialização como a construção social a partir de falsas ideias imputadas sobre “raça”, a qual não existe biologicamente, mas foi construída socialmente numa relação bastante articulada com o mercantilismo europeu, que transformou os habitantes dos outros continentes em “raça”; tal ideia está arraigada de maneira forte e presente no imaginário social. Tem uma relação direta com a distribuição de poder econômico e simbólico no mundo globalizado contemporâneo, definindo maior acesso a bens materiais (quanto maior a população de brancos, descendentes de europeus, dos países, maior a renda ou a industrialização, por exemplo) e simbólicos (a participação nos discursos midiáticos estabelece brancos como padrão de humanidade e demais grupos de raça/cor como desviantes sociais). Esses processos pesam para as trajetórias dos indivíduos, mas colocamos aqui o foco necessário em processos sociais amplos, compreendendo o enfoque macro como necessário para entendê-los.
Racialização é compreendida como a imputação de características reais (cor de pele ou aparência, por exemplo) ou atribuídas (tendência a perda de controle emocional, por exemplo) a membros de determinados grupos sociais, que, ao longo do tempo, constroem conceitualmente a compreensão de membros desses grupos como “raça”.
No artigo, discutimos como o processo de racialização na América Latina atuou e atua de modo a estruturar acesso limitado para pessoas negras e indígenas a bens simbólicos e materiais, além de acesso facilitado a pessoas brancas/descendentes de europeus. Como forma de resposta social, os diferentes movimentos sociais demandaram políticas focais que pudessem atuar na direção do estabelecimento de igualdade de acesso a bens.
Apontamos que as teses sobre o caldeamento das raças e o ideário de relações raciais harmônicas estão presentes em diversos países da América Latina. Na Colômbia, o discurso de afirmação de “um país mestiço” opera para inviabilizar e condicionar estereótipos a indígenas e negros, facilitando a concentração de poder das elites (SOLER; PARDO, 2009SOLER, S.; PARDO, N. Discourse and racism in Colombia: five centuries of invisibility and exclusion. In: VAN DIJK, T. (ed.) Racism and discourse in Latin America. Lanham: Lexingtyon Books, 2009. p. 131-170; 132., p. 132). A Venezuela se autointitula “país café com leite”, em função do orgulho de se sentir mestiça, bem como o de ser uma suposta “democracia racial” (BOLIVAR et al., 2009BOLIVAR, A. et al. Discourse and racism in Venezuela: a “café com leche” country. In: VAN DIJK, T. (ed.). Racism and discourse in Latin America. Lanham: Lexingtyon Books, 2009. p. 291-328., p. 291 et seq.). Esses discursos atuam para negar o reconhecimento à identidade e a demandas de movimentos negros e indígenas, pois desmerecem as contribuições contemporâneas desses grupos para a vida social. Tais discursos estão estruturados numa lógica eurocêntrica que determina espaços de hierarquia racial e escondem as desigualdades. No Chile, a população afirma que são todos descendentes de indígenas, mas “today we are all Chileans” (MERINO et al., 2009MERINO, M. E. et al. Discursive racism in Chile: the mapuche case. In: VAN DIJK, T. (ed.). Racism and discourse in Latin America. Lanham: Lexington Books, 2009. p. 95-130; p. 102., p. 102), como forma de não reconhecer a diversidade étnico-racial e a alteridade de povos indígenas.1 1 “hoje somos todos chilenos” (tradução nossa). No México, “the ideology of mestizaje concealed the racism against the internal and external Others”2 2 “a ideologia da mestiçagem ocultou o racismo dos Outros internos e externos” (tradução nossa). (CASTELLANOS; GÓMES; PINEDA, 2009CASTELLANOS, A.; GÓMES, J.; PINEDA, F. Racist discurse in Mexico. In: VAN DIJK, T. (ed.). Racism and discourse in Latin America. Lanham: Lexington Books. 2009. p. 217- 258., p. 218) e o discurso de mestiçagem supõe uma sociedade livre do racismo por definição, ao passo que as relações com minorias raciais são “trágicas”. Além disso, “el mestizaje, entendido como este marco ideológico, estimula una retórica implícita de inclusión, mientras que simultaneamente esconde processos de exclusión y racismo”3 3 “A mestiçagem, compreendido como este marco ideológico, estimula uma retórica implícita de inclusão, enquanto simultaneamente esconde processos de exclusão” (p. 16, tradução nossa). (MORENO, 2012MORENO, M. “Yo nunca he tenido la necesidad de nombrarme”: reconociendo el racismo y el mestizaje en México. In: CASTELLANOS, A.; LANDÁZURI, G. (coord.). Racismos y otras formas de intolerância de Nort a Sur en América Latina. México: UNAM, 2012. p. 15-48., p. 16). O Peru também se considera um país mestiço. Os resultados de pesquisas no país apontam que “the Peruvian society is clearly discriminatory, and that the cultural construction of skin color constitutes a dimension of this discrimination”.4 4 “A sociedade peruana é explicitamente discriminatória e a construção social da cor da pele constitui um dimensão de tal discriminação” (ZAVALA; ZARIGUIEY, 2009). Ao mesmo tempo, o racismo, segundo os mesmos autores, é um tema tabu que, tanto na academia quanto no cotidiano, é evitado e traz desconforto quando discutido. No Equador, a afirmação de ser um país mestiço opera para desacreditar as proposições de grupos que se autoafirmam indígenas (FINE-DARE, 2013FINE-DARE, K. S. (Neo)Indigenismo and the transculturative práxis of Ethnogenesis: a case study from urban Ecuador. In: BECKER, M. (ed.). Indigenous and Afro-Ecuadorians facing the twenty-first century. Cambridge: Cambridge Scholars Publishing, 2013. p. 7-33.). Em toda a América Latina dos séculos XIX e XX, as ideias eugenistas sustentaram políticas de branqueamento com investimento dos estados, como em Cuba, Costa Rica, República Dominicana, Panamá, Colômbia, Peru e Venezuela; e, mesmo onde tais políticas de imigração europeia tiveram maior efeito de “branquear” a população, como em Chile, Argentina, Uruguai e sul do Brasil, o discurso da mestiçagem é complementar ao branqueamento, incorporado nas produções de identidades nacionais, e atua para manter a hegemonia do branco (HERNANDEZ, 2013HERNÁNDEZ, T. K. La subordinación racial en Latinoamérica. Bogotá: Siglo del Hombre Editores/Universidade de los Andes/Pontificia Universidad Javeriana-Instituto Pensar, 2013.). Então, nossa análise converge para a tese de que as ideias sobre o caldeamento das raças e o conceito de mestiçagem são figura retórica que, na América Latina, sustenta falsas ideias de democracia racial, ancorando a negação do racismo e isolando do conflito as desigualdades étnico-raciais (HERNANDEZ, 2013HERNÁNDEZ, T. K. La subordinación racial en Latinoamérica. Bogotá: Siglo del Hombre Editores/Universidade de los Andes/Pontificia Universidad Javeriana-Instituto Pensar, 2013., p. 13-36).
Os discursos sobre a mestiçagem que operam para alimentar o imaginário de países distintos como “democracias raciais”, ao mesmo tempo que instituem proibições tácitas sobre tratar de forma explícita o racismo, são traços que se repetem em contextos sociais distintos. Consideramos que essas coincidências são fruto das relações coloniais estabelecidas ao longo dos séculos e mantidas na atualidade, que operam na relação norte–sul de forma racialmente hierarquizada. A lógica hierarquizante faz parte de uma lógica de colonização promovida por europeus e seus descendentes, na qual esses se afirmaram como “civilizados” e racializaram os outros. Os resultados em longo prazo foram muito expressivos num mundo globalizado, em que há uma relação direta entre o “desenvolvimento” econômico dos países e a composição étnico-racial de sua população (QUIJANO, 2010QUIJANO, A. Colonialismo do poder e classificação social. In: SANTOS, B. S.; MENESES, M. P. (orgs.). Epistemologias do Sul. São Paulo: Cortez, 2010. p. 84-130.). As ex-colônias das Américas, da África e da Oceania apresentam grau de inserção na economia mundial diretamente proporcional à quantidade da população branca nos países. As ideias de um caldeamento das raças fazem parte de um processo de racialização supranacional, sendo utilizadas como estratégia discursiva de manutenção de poder em diversos países da América Latina. Internamente, em cada um dos países citados e em outros, a hipótese que levantamos é de que as elites brancas, ou melhor, que se autointitulam brancas usufruem de acesso diferenciado ao poder por meio de discursos muito difundidos e arraigados. As identidades nacionais afirmadas pela via da mestiçagem cumprem um papel significativo no jogo de acesso aos bens simbólicos e materiais. Inibem formas de identidade balizadas na diferença; as discriminações são dissimuladas; e os temas das relações raciais, do racismo e da discriminação tornam-se interditos sobre os quais tende a pesar um profundo silêncio nos debates e nas políticas públicas. Portanto, a reificação e a dissimulação de desigualdades étnico-raciais a que nos referimos na introdução tomam parte de processos coloniais supranacionais. Por outro lado, os contextos próprios de cada país apresentam particularidades que não podem ser menosprezadas.
Em nossa análise, vamos focar em uma característica que consideramos derivada do amplo processo de disputas discursivas e racialização na América Latina. Uma característica notória é a hegemonia branca, que foi construída e se mantém nos diversos países. Analisaremos as ações afirmativas em contextos específicos como busca de resposta política a essa hegemonia. Nossa análise recai sobre como, em diferentes países, eclodiram e foram colocadas em prática ações afirmativas que buscam contrapor as desigualdades raciais vigentes, estabelecer equidade, promover a melhora de indicadores educacionais e propor emancipação para a população negra em dois países: Brasil e Argentina.
Ações Afirmativas para População Negra no Brasil
No século XIX, as teorias racistas foram hegemônicas. As políticas de “importação” de pessoas brancas para “melhorar a raça”, políticas de investimento público para atrair imigrantes europeus, foram executadas desde os anos 1850 até início o século XX e responsáveis por mudar a composição racial das regiões sul e sudeste do Brasil.
O Brasil, assim como diversos países da América Latina, orientou a sua percepção da população a partir da ideia de “raça cósmica” formulada pelo intelectual mexicano José de Vasconcelos (1925)VASCONCELOS, J. La raza cósmica. Misión de la raza iberoamericana. A raça cósmica. Barcelona: Agencia Mundial de Libreria, 1958.. Na adaptação brasileira, sugere-se que o brasileiro típico seja fruto da miscigenação, mas, ao mesmo tempo, mantêm-se as hierarquias do racismo do século XIX, racismo esse que se dizia científico. Os brancos e suas características estéticas, de caráter, de civilidade, de razão e intelectualidade. Os negros e suas características de força, de emoção. Os indígenas e suas características de docilidade e obediência. Ingredientes unidos para operar em sociedades que estabelecem hegemonia branca ao mesmo tempo que difundem um imaginário sobre si mesmas como sociedades “tolerantes”. Estes discursos foram hegemônicos no Brasil pelo menos do início do século XX ao final da ditadura militar, nos anos 1980, e encobriram as possibilidades de pessoas negras lutarem por alteridade e identidade.
Em paralelo, durante todo o século XX, o ativismo negro buscou espaço de reconhecimento social do legado africano como constituinte da história brasileira. Ao longo do século XX, as duas principais reinvindicações dos movimentos negros brasileiros foram políticas de identidade e educação (PINTO, 2013PINTO, R. P. O movimento negro em São Paulo: luta e identidade. Ponta Grossa/São Paulo: Editora da UEPG/Fundação Carlos Chagas, 2013.). As demandas de identidade e reconhecimento também passam pela educação, visto que uma crítica importante era do contínuo apagamento da participação negra na construção de riqueza e na história brasileira. Para ter o reconhecimento da participação e do legado da população negra brasileira, eram demandadas mudanças nas esferas de produção e difusão de informação, entre as quais a escola e os currículos.
Paralelamente às demandas dos movimentos negros, o que ocorreu no decorrer do século XX foi muito mais a ocultação, o apagamento e o silêncio sobre a participação negra, que, no decorrer das décadas daquele século, mais se acentuou do que foi confrontada.
Diversos exemplos são notáveis. Personagens históricas foram embranquecidas ou esquecidas – por exemplo Machado de Assis, escritor e primeiro presidente da Academia Brasileira de Letras, embranquecido tanto na interpretação de seus escritos quanto na imagem difundida nas escolas e nos meios de comunicação (em 2009, na campanha publicitária de um grande banco estatal brasileiro, um ator branco representou o escritor, o que gerou muitas críticas e uma nova campanha, com um ator negro, como forma de retratação).
A história e a memória dos quilombos foram apagadas e ocultadas durante todo o século XX. Nesse período, segundo o discurso oficial, os quilombos não existiram, sendo, assim, esquecidos. Ainda nesse mesmo período, o movimento negro manteve vivos o interesse e a valorização como formas de preservação da memória e do conhecimento negros, bem como de sua luta por liberdade durante o período escravocrata e posterior. Somente após a Constituição de 1988, os quilombos foram reconhecidos.
Esse e outros eventos determinaram que as demandas pelo reconhecimento da história e da cultura da população afro-brasileira e africana fossem pauta dos movimentos negros em todo o século XX. No entanto, sua entrada na pauta política e sua incorporação na legislação foram bastante tardias. Na Constituição de 1988 e na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, aprovada em 1996, as propostas de obrigatoriedade de inclusão, nos currículos escolares, da história e da cultura africanas e afro-brasileiras não foram definidas como obrigatórias e tiveram sua redação modificada para assumir orientações mais generalistas, o que não teve nenhum impacto sobre os currículos. Somente em 2003, foi aprovada a Lei Federal n. 10.639, que definiu a obrigatoriedade do ensino de história e cultura afro-brasileiras e africanas.
Consideramos essa política, definida em 2003, como ação afirmativa em prol da população negra, pela definição de orientação curricular que tem como objetivo o reconhecimento da alteridade e das contribuições da população negra para o Brasil, com potencial emancipador em relação às hierarquias raciais diretamente estabelecidas.
Além das políticas curriculares, a presença negra em espaços de formação técnico-profissionalizante e no Ensino Superior foi apresentada como demanda pelo movimento negro em 1945-46 na Convenção Nacional do Negro Brasileiro e, em anos seguintes, publicada no jornal O Quilombo, que circulou entre 1948 e 1950. De forma similar ao que ocorreu no ensino, só passaram a ser adotadas no início do século XXI.
Vamos analisar alguns resultados de ambas as políticas, do ensino de história e cultura afro-brasileiras e de reserva de vagas para pessoas negras no Ensino Superior.
A análise de práticas pedagógicas e de efeitos das políticas de promoção da igualdade racial a partir da definição dada pela Lei n. 10.639/03 para a LDB e das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais (Resolução n. 01/2004 do Conselho Nacional de Educação) aponta para a efetivação de práticas pedagógicas, em processo e com impacto distinto em diferentes dimensões.
Com o objetivo de captar a incorporação da Educação das Relações Étnico-raciais (ERER) em escolas das cinco regiões brasileiras, foram realizados 36 estudos de caso, seis em cada região do país, sendo 12 na região Nordeste em função de maior número de estados (SILVA; GOMES; ARAUJO, 2013SILVA, P. V. B.; GOMES, N. L.; ARAUJO, D. C. Dossiê Relações Étnico-raciais e Práticas Pedagógicas. Educar em Revista, Curitiba, n. 47, p. 1-7, jan./mar. 2013. Disponível em: https://www.scielo.br/j/er/a/mmdHHYRMnWny6fDBk6rD6wM/?format=pdf⟨=pt. Acesso em: 14 abr. 2022. https://doi.org/10.1590/S0104-40602013000100002
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). Foram analisadas as dimensões de: estrutura física e condições da escola; envolvimento da gestão e trabalho coletivo de professoras e professores; formação continuada e material de apoio; e avanços e limites dos trabalhos de ERER realizados. Foram também observadas implementações importantes em diferentes etapas e modalidades. Na educação infantil, o trabalho com africanidades foi incorporado em práticas pedagógicas, sem assumir papel central. Foi também observado trabalho relevante com a identidade negra e a valorização das crianças negras na escola de educação infantil (SILVA; SOUZA, 2013SILVA, P. V. B.; SOUZA, G. Relações étnico-raciais e práticas pedagógicas em Educação Infantil. Educar em Revista, Curitiba, n. 47, p. 35-50, jan./mar. 2013. Disponível em: https://www.scielo.br/j/er/a/HxWhYhpq8WsCbVV9rK3D83r/?format=pdf⟨=pt. Acesso em: 14 abr. 2022. https://doi.org/10.1590/S0104-40602013000100004
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; SOUZA; PEREIRA, 2013SOUZA, F.; PEREIRA, L. Implementação da Lei 10.639/2003 mapeando embates e percalços. Educar em Revista, Curitiba, n. 47, p. 51-65, jan./mar. 2013. Disponível em: https://www.scielo.br/j/er/a/MNXGXGyqnGXvcJF4WZvfLqP/?format=pdf⟨=pt. Acesso em: 14 abr. 2022. https://doi.org/10.1590/S0104-40602013000100005
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). Em escola de educação especial dedicada a discentes surdos, foi observado o desenvolvimento de projetos com significativos resultados para estudantes, ao mesmo tempo que o limitador era a formação das professoras e dos professores (OLIVEIRA, 2013OLIVEIRA, E. A lei n. 10.639/2003 e a Educação Especial: um desafio a mais para a formação de professores. Educar em Revista, Curitiba, n. 47, p. 85-95, jan./mar. 2013. Disponível em: https://www.scielo.br/j/er/a/8vcRrSnYfVwPKqSVyQHDfPf/?format=pdf⟨=pt. Acesso em: 14 abr. 2022. https://doi.org/10.1590/S0104-40602013000100007
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), resultado similar ao conjunto de escolas da região Norte, onde projetos de intervenção realizados em diferentes escolas revelaram importantes resultados para discentes, por um lado, mas, por outro, carências especialmente na formação de professores (COELHO; COELHO, 2013COELHO, W. N. B.; COELHO, M. Os conteúdos étnico-raciais na educação brasileira: práticas em curso. Educar em Revista, Curitiba, n. 47, p. 67-84, jan./mar. 2013. Disponível em: https://www.scielo.br/j/er/a/t4drGjZZj4dpnxV7nqK4JBp/?format=pdf⟨=pt. Acesso em: 14 abr. 2022. https://doi.org/10.1590/S0104-40602013000100006
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; SILVA; ARAUJO; PACÍFICO, 2011SILVA, P. V. B.; ARAUJO, D. C.; PACÍFICO, T. M. Regional Sul. In: GOMES, N. L. (orgs.). Práticas pedagógicas de trabalho com relações étnico-raciais na escola na perspectiva da Lei n. 10.639/03. Brasília, DF: MEC/Unesco, 2012. p. 261-296. Disponível em: https://unesdoc.unesco.org/ark:/48223/pf0000260516. Acesso em: 02 fev. 2020.
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; MULLER; SANTOS; GONÇALVES, 2012MULLER, M. L.; SANTOS, A. M.; GONCALVES, V. L. S. Regional Centro-Oeste. In: GOMES, N. L. (org.). Práticas pedagógicas de trabalho com relações étnico-raciais na escola na perspectiva da Lei n. 10.639/03. Brasília, DF: MEC/Unesco, 2012. p. 215-260. Disponível em: https://unesdoc.unesco.org/ark:/48223/pf0000260516. Acesso em: 02 fev. 2020.
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). A gestão, importante dimensão para implementação da ERER, apresentou limitações maiores do que segurança e conhecimento no tocante à efetivação nas escolas (SOUZA; PEREIRA, 2013SOUZA, F.; PEREIRA, L. Implementação da Lei 10.639/2003 mapeando embates e percalços. Educar em Revista, Curitiba, n. 47, p. 51-65, jan./mar. 2013. Disponível em: https://www.scielo.br/j/er/a/MNXGXGyqnGXvcJF4WZvfLqP/?format=pdf⟨=pt. Acesso em: 14 abr. 2022. https://doi.org/10.1590/S0104-40602013000100005
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). Observou-se que escolas que desenvolviam experiências articuladas com núcleos de referência das secretarias de educação e com Núcleos de Estudos Afro-Brasileiros, bem como que desenvolviam internamente processo de planejamento e execução coletivos produziam experiências mais significativas e sustentáveis (SANTANA; LUZ; SILVA, 2013SANTANA, M. M.; LUZ, I. M.; SILVA, A. M. M. Dilemas e aporias subjacentes aos processos de implementação da Lei 10.639/2003. Educar em Revista, Curitiba, n. 47, p. 97-110, jan./mar. 2013. Disponível em: https://www.scielo.br/j/er/a/fMXQvqSDsRLVwHpz7HFpcvc/?format=pdf⟨=pt. Acesso em: 14 abr. 2022. https://doi.org/10.1590/S0104-40602013000100008
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).
A partir das dimensões da pesquisa relatada, Silva (2020)SILVA, W. S. Indicador de verificação e a Educação das Relações Étnico-Raciais: o monitoramento da Lei de Diretrizes e Bases da Educação nacional no Ensino Público do Estado do Paraná. Tese (Doutorado em Educação) – Setor de Educação, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2020. Disponível em: https://acervodigital.ufpr.br/handle/1884/69835. Acesso em: 24 abr. 2022.
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aplicou um questionário organizado em sete fatores identificados para monitoramento de implementação de ERER nas escolas: formação continuada; articulação escola–sociedade; dispositivos didáticos; representação literária; ludicidade valorativa; subsídio material; e projetos de valorização. Obteve resposta de 1.659 unidades escolares da rede estadual do Paraná. As respostas das escolas apontaram para alto grau de subsídio material dedicado ao trabalho com ERER, com representação literária também alta e pouco abaixo. Projetos de valorização, ludicidade valorativa e articulação escola–sociedade apresetaram nível médio para alto. A avaliação de dispositivos didáticos foi o único fator com resultados baixos. As respostas permitem observar que as escolas apresentam práticas pedagógicas diversas, tendo a ERER como eixo central, com identificação de casos de ações desvinculadas da prática cotidiana e tratamentos superficiais (SILVA, 2020SILVA, W. S. Indicador de verificação e a Educação das Relações Étnico-Raciais: o monitoramento da Lei de Diretrizes e Bases da Educação nacional no Ensino Público do Estado do Paraná. Tese (Doutorado em Educação) – Setor de Educação, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2020. Disponível em: https://acervodigital.ufpr.br/handle/1884/69835. Acesso em: 24 abr. 2022.
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).
Os indicadores permitem afirmar que a Educação das Relações Étnico-raciais, forma de ação afirmativa para a população negra obter melhores resultados nas escolas, está presente nelas e apresenta, ao mesmo tempo, muitas significativas dimensões e muitas limitações.
Ações Afirmativas no Ensino Superior, Eclosão e Principais Resultados
Na década de 1990, algumas mudanças passaram a se manifestar. Em 1995, ocorreu uma grande mobilização dos movimentos negros para a Marcha Zumbi dos Palmares contra o Racismo, pela Cidadania e a Vida. O pronunciamento da Presidência da República, ao receber a marcha, reconheceu que o Brasil é um país no qual a discriminação racial é vigente, estrutural e institucional.
A implantação de políticas afirmativas para negros (e indígenas) passou, a partir do final dos anos 1990, a ser reivindicada com maior intensidade. Foram importantes nesse processo os diversos eventos relacionados com a preparação para a III Conferência Mundial das Nações Unidas contra o Racismo, Xenofobia e Intolerância Correlata (realizada em Durban, em 2001). Nos eventos preparatórios, eclodiram com grande força as reivindicações de políticas afirmativas como forma de restituir a igualdade de oportunidades (SILVERIO, 2002SILVERIO, V. R. Políticas raciais compensatórias: o dilema brasileiro do século XXI. In: SABÓIA, G. V. (org.). Anais de Seminários Regionais Preparatório para a Conferência Mundial contra o Racismo. Brasília, DF: Ministério da Justiça, 2002. p. 123-137; 134.). No relatório do Comitê Nacional para a preparação da participação brasileira na conferência, uma das propostas anotadas foi a “adoção de cotas ou outras medidas afirmativas que promovam acesso de negros às universidades públicas” (SABÓIA, 2002SABÓIA, G. V. (org.). Anais de Seminários Regionais Preparatório para a Conferência Mundial contra o Racismo. Brasília, DF: Ministério da Justiça, 2002. p. 123-137.).
A adoção de ações afirmativas para a população negra passou a ser implementada em diversas áreas, passando pela publicidade oficial, por contratações para trabalho via concursos públicos ou nas redes privadas, bem como no Ensino Superior. Esse último ponto causou grande impacto no debate público no Brasil; por esse motivo e pelo objetivo deste artigo, vamos focar no Ensino Superior.
No período pós-Durban, as propostas de ação afirmativa no Ensino Superior passaram a ser implementadas por iniciativas de gestões locais, inicialmente pelo Governo do Estado do Rio de Janeiro, em 2001, e, em seguida, por iniciativa das próprias universidades.
O mapeamento realizado em 2012 identificou ações afirmativas presentes em 125 instituições de Ensino Superior: em 107 havia políticas para ingresso de estudantes egressos de escola pública; em 63, para indígenas; em 52, para pessoas negras; e em 32, para pessoas com deficiência (INCT Inclusão, 2012BRASIL. Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia e Inclusão no Ensino Superior e na Pesquisa (INCT Inclusão). Mapa das ações afirmativas: instituições públicas de ensino superior. Brasília, DF: INCT, 2012.). O aumento gradativo entre a primeira experiência e 2012 se relaciona com as estratégias do ativismo e com os resultados auferidos. O balanço dos dez anos apontou que os bons resultados em termos de inclusão pesaram bastante. À medida que as diversas avaliações das políticas foram sendo publicadas, ficaram expressos que os estudantes que ingressaram por políticas afirmativas tinham rendimento, na quase totalidade de cursos e universidades, igual ou ligeiramente superior aos estudantes que ingressavam pela concorrência geral; os índices de abandono eram muito menores; o perfil socioeconômico era muito abaixo do que as universidades atendiam antes das cotas, ou seja, a inclusão social acompanhava a racial; muitos dos estudantes negros/as incluídos pelas cotas haviam os primeiros de suas famílias a terem acesso ao Ensino Superior; e a diversidade racial pôde trazer à tona eventos isolados de discriminação, mas, em geral, fez cumprir o objetivo de melhorar a diversidade nas universidades.
Em paralelo a esse processo de discussão nas universidades e do aumento contínuo e gradativo de adoção de políticas afirmativas, o debate público sobre as políticas afirmativas para pessoas negras foi bastante intenso e ocupou espaço considerável na mídia, como também no judiciário. Entre as dezenas ou centenas de ações judiciais que as universidades que adotaram cotas para pessoas negras tiveram que responder, a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 186 foi julgada pelo Supremo Tribunal Federal, o qual se manifestou de forma unânime pela constitucionalidade das cotas para pessoas negras.
O ambiente criado por essa manifestação unânime do STF ajudou na aprovação da Lei n. 12.711, de 2012, a qual definiu cotas de 50% das vagas das universidades e institutos federais brasileiros, com subcota para pessoas negras em proporção igual à de sua participação no estado em que fica localizada a Instituição Federal de Ensino Superior. Essa lei determinou um aumento expressivo de pessoas negras frequentando universidades federais e orientou as políticas de Ensino Superior no Brasil para uma inclusão maior de pessoas negras.
Os resultados são ainda bastante iniciais e provisórios. O impacto das ações afirmativas no ingresso de pessoas negras já havia sido identificado pelas pesquisas em período anterior à lei de 2012 (SILVA; ANJOS, 2018SILVA, P. V. B.; ANJOS, C. B. Políticas Afirmativas na Pesquisa Educacional. Educar em Revista, Curitiba, v. 34, n. 69, p. 151-191, maio/jun. 2018. Disponível em: https://www.scielo.br/j/er/a/LtqZXrjkxqzcD44zzJJ9kmS/?format=pdf⟨=pt. Acesso em: 02 maio 2022. https://doi.org/10.1590/0104-4060.58095
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). Além da entrada de estudantes em significativo número, algumas políticas de permanência foram desenvolvidas e dados de diversas pesquisas apontaram integração satisfatória de estudantes cotistas e bons resultados (SILVA; ANJOS, 2018SILVA, P. V. B.; ANJOS, C. B. Políticas Afirmativas na Pesquisa Educacional. Educar em Revista, Curitiba, v. 34, n. 69, p. 151-191, maio/jun. 2018. Disponível em: https://www.scielo.br/j/er/a/LtqZXrjkxqzcD44zzJJ9kmS/?format=pdf⟨=pt. Acesso em: 02 maio 2022. https://doi.org/10.1590/0104-4060.58095
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).
Educação, Ações Afirmativas e Afrodescendentes na Argentina
Em 9 de junho de 2021, no marco da visita à Argentina do Presidente da Espanha, Pedro Sánchez, o anfitrião Alberto FernándezALBERTO, F. “Los mexicanos salieron de los indios, los brasileños salieron de la selva, pero nosotros, los argentinos, llegamos en los barcos de Europa”. La Nación, Buenos Aires, 10 jun. 2021. Disponível em: https://www.lanacion.com.ar/politica/alberto-fernandez-los-mexicanos-salieron-de-los-indios-los-brasilenos-salieron-de-la-selva-pero-nid09062021/. Acesso em: 22 ago. 2022.
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, Presidente da República Argentina, disse:
Sou alguém que acredita na Europa, porque da Europa, uma vez escreveu Octavio Paz que os mexicanos vieram dos índios, os brasileiros vieram da selva, mas nós, os argentinos, chegamos dos navios, e eram navios que vinham de lá, da Europa, e assim construímos a nossa sociedade.
(G1, 2021Presidente da Argentina erra citação e diz que ‘brasileiros vieram da selva; argentinos, da Europa. g1.globo.com, 9 jun. 2021.Disponível em https://g1.globo.com/mundo/noticia/2021/06/09/presidente-da-argentina-diz-que-brasileiros-vieram-da-selva-argentinos-da-europa.ghtml. Acesso em 03 dez 2022.
https://g1.globo.com/mundo/noticia/2021/... ).
A polêmica frase despertou protestos de cidadãos de países como o México, o Brasil e a própria Argentina. Contudo, vejamos a resposta de Felipe Calderón, ex-presidente do México: “[...] falta um pouco de cultura ao presidente da Argentina. Aqui falamos: ‘Não é culpa do índio, mas quem o faz presidente.’” (COLOMBO, 2021Colombo, S. Fernández diz que brasileiros vieram da selva e argentinos chegaram de barco da Europa. Folha de S. Paulo, São Paulo, 9 jun. 2021. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2021/06/fernandez-diz-que-brasileiros-vieram-da-selva-e-argentinos-chegaram-de-barcos-da-europa.shtml. Acesso em 03 dez 2022.
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). Ou seja, à frase insensata e racista de Fernández, Calderón responde com outra expressão racista e classista.
Assim como Alberto Fernández assume sem pudor a ideia de uma Argentina branca que descende apenas de europeus, o ex-presidente Calderón naturaliza uma expressão racista e classista em relação à população indígena de seu país e o faz sem hesitação e sem sequer perceber. Até o filho de Jair Bolsonaro, cujo governo é abertamente racista, se mostrou indignado com os comentários de Fernandez, dizendo:
O presidente argentino Alberto Fernandez disse que, enquanto seu povo veio de barco da Europa, “os brasileiros vieram da selva”. Não dirão que foi RACISTA contra os indígenas e africanos que formaram o Brasil? No entanto, digo: o navio que está afundando é o da Argentina.
Será que o filho de Bolsonaro pensa que não há racismo no Brasil e que as políticas de seu pai não são racistas com os povos indígenas e negros? Como podemos ver, o que pretendia destacar ou enaltecer a imigração europeia na Argentina acabou em acusações racistas contra o presidente Fernández e em milhares de rejeições nas redes sociais. Apesar de Alberto Fernández ter se desculpado por essas declarações, não é a primeira vez que um presidente argentino se refere à imigração europeia como a única característica da identidade nacional, vendo-a como um vínculo que une a Argentina à Europa. Por exemplo, em janeiro de 2018, durante a coletiva de imprensa do Fórum Econômico Mundial em Davos, ao se referir à relação comercial entre Argentina e Europa, o então presidente Macri afirmou: “Acredito que a associação entre o Mercosul e a União Europeia é natural, porque na América do Sul somos todos descendentes de europeus” (EN SUDAMÉRICA..., 2018EN SUDAMÉRICA todos somos descendientes de europeos. Página|12, Buenos Aires, 26 jan. 2018. Disponível em: https://www.pagina12.com.ar/91480-en-sudamerica-todos-somos-descendientes-de-europeos. Acesso em: 22 ago. 2022.
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). Igualmente, não foi a primeira vez que Macri se referiu a uma ascendência exclusivamente europeia de argentinos e argentinas. Em 2016, durante as comemorações do Bicentenário da Independência, afirmou que, na América Latina, “somos todos filhos de europeus”. É curioso que, embora seja inegável sermos todos “filhos da África”, de onde a humanidade se originou, não há nenhum presidente que a mencione. De nenhum deles ouvimos dizer com orgulho: “somos todos africanos”. E poderíamos continuar. Em 1996, o então presidente Carlos Menem, ao ser questionado em uma universidade dos Estados Unidos sobre a existência de uma população afrodescendente na Argentina, afirmou: “na Argentina não há negros; o Brasil tem esse problema” (HEGUY, 2002HEGUY, S. Un censo para saber más de la comunidad negra en Argentina. Clarín, Buenos Aires, 01 ago. 2002. Disponível em: https://www.clarin.com/sociedad/censo-saber-comunidad-negra-argentina_0_HJI-6HEeCKe.html. Acesso em: 21 ago. 2022.
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).
No entanto, o que há em comum nas palavras de Menem, Macri e Fernández é falta do conhecimento da diversidade cultural que, à custa de sangue e sofrimento, construiu a América Latina. Essa diversidade não advém de processos naturais e pacíficos; ao contrário, nasce da dominação colonial, que justamente a ancestralidade europeia, que os presidentes tão orgulhosamente exaltam, tem muito a reparar. Curiosamente, Macri e Fernández atribuem a essa ascendência europeia o traço distintivo da identidade nacional, embora ambos tenham ideologias políticas muito diferentes. O primeiro deles se destaca por ser um obstinado defensor das ideias classistas, neoliberais e de setores privilegiados da economia e da sociedade. Nesse sentido, referindo-se às palavras do ex-presidente Macri, a investigadora afro-venezuelana Esther Pineda aponta que não se trata de um erro ou de um acontecimento casual. A pensadora afirma que esses comentários “são uma posição ideológica racista, que destaca explícita rejeição e desprezo pela diversidade de nosso continente, multiétnica e multicultural; posição que também determina e direciona suas ações políticas, econômicas, sociais e culturais” (PINEDA, 2018PINEDA G. E. El racismo macrista y el re-blanqueamiento de América Latina. http://www.lr21.com.uy/mundo/1358268-el-racismo-macrista-y-el-re-blanqueamiento-de-america-latina,2018.
http://www.lr21.com.uy/mundo/1358268-el-...
).
De fato, as palavras dos líderes não apenas invisibilizam os afrodescendentes: fazem-no também com os povos indígenas. Suas palavras estão alinhadas com a narrativa histórica do branqueamento, que se consolidou na segunda metade do século XIX no país, cuja construção imaginada de nação desencorajou e combateu, por meio de diversas estratégias, povos indígenas e negros. Longe de desaparecer, o imaginário nacional eurocêntrico tem forte presença nos eventos nacionais e, além dos avanços que o Estado vem fazendo em termos de criação de políticas voltadas para os povos indígenas e afrodescendentes, uma parte importante da sociedade argentina continua se percebendo apenas como um país de descendentes europeus. Esse imaginário, que nunca foi inteiramente verdadeiro, esconde a riqueza da heterogeneidade cultural da identidade nacional, o que reflete um retrocesso para um país em que o poder, que adquiriu tal narrativa de branqueamento cultural, foi e é um dos fundamentos mais difíceis de transformar. Esse imaginário aparece com frequência nas narrativas de chefes de Estado, das lideranças políticas e da sociedade em geral. O problema aqui exposto não é apenas que outros grupos que também contribuíram e continuam contribuindo para a construção da nação sejam deixados de lado, mas que práticas eurocêntricas e, muitas vezes, racistas sejam reproduzidas em relação a grupos que não são considerados representantes da argentinidade. É uma fantasia que, de alguma forma, continua expulsando os povos nativos, ou seja, continua expulsando negros, negras e indígenas das fronteiras nacionais, bem como reforçando a ideia de que a negritude desapareceu da vida cotidiana do país.
É essencial esclarecer que a população de origem africana na Argentina diminuiu consideravelmente ao longo do século XIX, embora não tenha sido totalmente aniquilada – como difundido no senso comum e em parte da literatura especializada (OCORÓ, 2010OCORÓ, L. A. Afroargentinidad y memoria histórica: La negritud en los actos escolares del 25 de mayo”. En: Tesis de Maestría. FLACSO. Buenos Aires. Disponible en línea: http://www.flacsoandes.org/dspace/handle/10469/2997, 2010.
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).5
5
Para ampliação sobre o tema consultar Ocoró (2010).
A febre amarela, a onda de imigrantes europeus que chegaram ao país na segunda metade do século e a participação em guerras dizimaram a população. No entanto, desde a segunda metade do século XIX, o Estado implantou uma ideologia do branqueamento que, por meio de diversos mecanismos, acabou por invisibilizar essa população. Alguns autores mostram que o processo de declínio se desenvolveu mais lentamente do que tem sido sustentado pelas elites e pela narrativa hegemônica, a qual atribui às guerras o aniquilamento dessa população. Deve-se, antes, à instalação do “mito de uma Argentina branca”, cultivado por estadistas e historiadores (ANDREWS, 1989ANDREWS, G.R. Los afroargentinos de Buenos Aires (Aquí mismo y hace tiempo). Buenos Aires, ediciones de la Flor, 1989.; OTERO, 2006OTERO, H. Estadística y nación. Una historia conceptual del pensamiento censal de la Argentina moderna, 1869-1914”. En: Prometeo. Buenos Aires, Argentina, 2006.), o qual foi levando ao desaparecimento dessa população dos censos e dos relatos da nação (SOLOMIANSKY, 2003SOLOMIANSKI, A. Identidades secretas: la negritud argentina. Beatriz Viterbo Editora. 2003.).
O sistema estatístico argentino levantou leituras sobre os componentes populacionais do país que superestimaram o lugar dos imigrantes, suprimindo a presença de indígenas e negros. De fato, tanto negros quanto indígenas ocupavam um lugar marginal no sistema censitário argentino (OTERO, 2006OTERO, H. Estadística y nación. Una historia conceptual del pensamiento censal de la Argentina moderna, 1869-1914”. En: Prometeo. Buenos Aires, Argentina, 2006.). Tanto que o problema, já apontado por Andrews (1989)ANDREWS, G.R. Los afroargentinos de Buenos Aires (Aquí mismo y hace tiempo). Buenos Aires, ediciones de la Flor, 1989., quanto ao papel das estatísticas na ocultação da negritude também se expressou com a população indígena. De alguma forma, o lugar marginal do negro no censo não pode ser discutido apenas por critérios quantitativos (OTERO, 2006OTERO, H. Estadística y nación. Una historia conceptual del pensamiento censal de la Argentina moderna, 1869-1914”. En: Prometeo. Buenos Aires, Argentina, 2006.). Sem dúvida, isso obedeceu ao desejo das elites de configurar um componente populacional ideal para a nação imaginada, desencorajando e combatendo outros grupos por meio de diversas estratégias. À medida que a imigração avançou, ganhou força a ideia de seleção natural e, com ela, um discurso que enfatizava a superioridade biológica da raça branca, que, como já mencionamos, não fica isenta do contexto intelectual da época, em que as teorias racialistas tinham hegemonia.
Em síntese, o Estado argentino utilizou uma estratégia biopolítica que buscava, por meio da exclusão violenta de afro-argentinos e indígenas, favorecer um tipo de população que se ajustasse ao modelo de nação desejado (OCORÓ, 2010OCORÓ, L. A. Afroargentinidad y memoria histórica: La negritud en los actos escolares del 25 de mayo”. En: Tesis de Maestría. FLACSO. Buenos Aires. Disponible en línea: http://www.flacsoandes.org/dspace/handle/10469/2997, 2010.
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). Consequentemente, o biopoder foi usado para “fazer viver” o ideal de nação fundada na hegemonia da sociedade europeia e branca como elemento desejável para alcançar a modernidade e o progresso nacional, ao qual se opunha a comunidade afro-argentina (vista justamente como uma população indesejada, dado o alto nível de preconceito racial presente no país). Dessa forma, o racismo vai se desenhando como mecanismo do Estado (FOUCAULT, 2000FOUCAULT, M. Defender la sociedad. Curso en el Collége de France (1975-1966). Buenos Aires, Fondo de Cultura Económica, 2000.), não necessariamente por meio da legislação escrita ou do sistema econômico (MARIN, 2000), mas mais por meio de operações ideológicas eurocêntricas organizadas e estimuladas pelo Estado moderno. O paradigma da “civilização ou barbárie”, tão defendido por Domingo Sarmiento, está incluído nesses dispositivos biopolíticos. De fato, desde o final do século XIX, a liderança política intelectual argentina esteve em comunhão com as teorias racistas dominantes da Europa, o que levou à implementação de políticas racialistas para “melhorar” a população argentina. Podemos ver isso nas propostas de Sarmiento, Alberdi, Bunge e José Ingenieros, entre outros.
Ação Afirmativa e Antirracismo. Alguns Avanços na Argentina Atual
Nos últimos anos, mesmo com recursos limitados, foram desenvolvidas diversas experiências e modalidades de inclusão de afrodescendentes nas Instituições de Ensino Superior (IES) da região. No que diz respeito à Argentina, país em que as políticas e os debates raciais têm sido muito pouco frequentes, as discussões sobre ações afirmativas não conseguiram se firmar no campo acadêmico ou no campo político-institucional como problema ou necessidade a resolver. No entanto, surgiram algumas experiências que caminham nesse sentido, as quais apresentaremos mais adiante.
As diferenças entre Brasil e Argentina quanto à implementação de ações afirmativas são claramente perceptíveis. A Argentina é um dos países da região com maiores acesso, cobertura e Ensino Superior público gratuito. Por outro lado, o percentual de população afrodescendente na Argentina é muito menor do que no Brasil e as ações do movimento afro no campo educacional, bem como suas conquistas, ainda são escassas. Esses elementos afetam o alcance do debate na Argentina e, de certa forma, explicam por que a discussão não foi levantada tanto em termos de acesso ou cotas especiais, mas sim em termos de questionamento do racismo epistêmico que impõe a hegemonia dos saberes eurocêntricos, ao mesmo tempo que inferioriza e invisibiliza saberes e epistemologias de matriz africana (OCORÓ, 2021OCORÓ, L. A. Educación Superior y afrodescendientes. Avances en Argentina durante el siglo XXI. Vain, Pablo Daniel y Schewe, Lelia C., 20, 30, 2021.).
Apesar da situação descrita, durante a última década, na Argentina, os/as afrodescendentes ganharam, na agenda do Estado, uma visibilidade e uma presença que antes não tinham. Hoje, podemos dizer que o tema despertou o interesse e a atenção do Estado, bem como que foram abertas discussões à luz pública que desafiam os processos históricos de negação e invisibilidade. Nesse mesmo sentido, o “Censo Nacional de Población” de 2010 incluiu a pergunta referente ao autorreconhecimento, constituindo assim um importante passo para o reconhecimento de sua existência na realidade do país e promovendo a inclusão de seus problemas na agenda das políticas públicas. No entanto, mesmo com esses avanços, a Argentina ainda não conta com políticas educacionais específicas para essas populações, especialmente no nível superior.
De fato, como mencionamos, a Argentina não é um país em que as discussões sobre educação superior e afrodescendência, ou mesmo os debates raciais, ocupem um lugar relevante ou sejam comuns, como se dá no Brasil ou na Colômbia. Em matéria educacional, o progresso das populações afrodescendentes na Argentina é muito escasso em qualquer um dos níveis do sistema.6 6 Até o momento, não há dados suficientes sobre o nível educacional da população afrodescendente no país. No entanto, tomando como referência as estimativas do Ministério da Educação da Cidade Autônoma de Buenos Aires (CABA), com base nos dados do censo de 2010, 17,4% dos afrodescendentes não concluíram o Ensino Fundamental. Esse percentual é de 14,6% para o restante da população. Apenas 7,4% da população afrodescendente da CABA concluiu o Ensino Médio, essa proporção é de 10,9% para o restante da população (ME, 2019). Sequer está institucionalizada uma agenda educacional antirracista, apesar de, nos últimos anos, a participação dos povos indígenas e afrodescendentes ter se tornado tema central dos debates sobre a educação superior na América Latina.
Em 2020, foi criada a Direção Nacional de Equidade Racial, Pessoas Migrantes e Refugiados. Essa entidade é responsável pelo Programa Nacional da Década para a Comunidade Afro. A esse respeito, Carlos Alvarez Nazareno, diretor dessa organização afirmou: “As pessoas afro também precisam de leis de cotas trabalhistas, ações afirmativas que nos permitam gerar níveis mais altos de inclusão educacional, cultural, política, socioeconômica e acesso a todos os direitos humanos que garantam uma vida digna e livre de racismo” (NAZARENO, 2020NAZARENO, Á. C. Plan Nacional del Decenio Afro en Marcha. Argentina también es afro. Diario Página 12, Buenos Aires, 10 nov. 2020. Disponível em: https://www.pagina12.com.ar/304980-argentina-tambien-es-afro. Acesso em: maio 2021.
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). Nessa mesma perspectiva, também coordena o Plano Nacional Afro (2021–2024),
[...] cujo objetivo principal é oferecer um programa para a gestão de políticas públicas de inclusão e melhoria das condições de vida das populações afro-argentinas, afrodescendentes e africanas de todo o território nacional, reconhecendo suas contribuições e promovendo ações específicas para seu desenvolvimento e integração.7 7 Disponível em: https://www.argentina.gob.ar/derechoshumanos/equidad-racial-personas-migrantes-y-refugiadas-0. Acesso em: 22 ago. 2022.
Uma das leis mais relevantes para as populações afrodescendentes na Argentina é a Lei n. 26.852, de 2013, que estabelece, em memória à data da morte da afro-argentina María Remedios del Valle, o dia 08 de novembro como “Dia Nacional dos/as Afro-Argentinos/as e da Cultura Afro”. A lei atribui ao Ministério da Educação da Nação a incorporação da data ao calendário escolar e a promoção da cultura afro nos conteúdos curriculares de todos os níveis do sistema educacional. Também confia à Secretaria de Cultura da Nação a comemoração da data por meio de políticas públicas voltadas para visibilizar e apoiar a cultura afro.
Por outro lado, cabe destacar que a Conferência Regional de Educação Superior (CRES 2018), realizada na Universidade Nacional de Córdoba em junho de 2018, incorporou, entre suas sete diretrizes de trabalho, uma denominada: “Educação superior, diversidade cultural e interculturalidade na América Latina América”, que discutiu especialmente a situação dos indígenas e afrodescendentes no Ensino Superior, produzindo uma série de recomendações estratégicas para favorecer a inclusão desses grupos. A incorporação desse tema na agenda do CRES 2018 apresenta claramente um deslocamento a favor da ampliação dos direitos e da democratização das políticas de Ensino Superior na região.
O Programa Progresar, lançado em 2014 na gestão da ex-presidenta Cristina Fernández de Kirchner, incorporou a variável étnico-racial no perfil dos bolsistas. Esse programa destina-se a conceder apoio econômico a jovens que pretendam terminar ou retomar os seus estudos. De acordo com o relatório do Ministério da Educação Nacional, elaborado com informações do Programa Progresar, 1,4% dos inscritos são afrodescendentes. 45% desses tendo ingressado no programa como bolsistas e sendo a maioria mulheres. Embora o programa não tenha a população afrodescendente como sujeito direto de suas políticas, foi importante a inclusão da autoidentificação étnico-racial em seus registros cadastrais, já que fornece dados relevantes, o que é significativo.
Programas e Experiências Acadêmicas Voltadas para a Educação Superior e os Povos Afrodescendentes
Como mencionado anteriormente, as experiências de educação superior voltadas para os povos indígenas e afrodescendentes na Argentina são bastante recentes, pois se desenvolveram há pouco mais de duas décadas (GUAYMÁS, 2017GUAYMÁS, A. Educación superior intercultural en Argentina: experiencias, logros y desafíos para la democratización. Educación Superior y Sociedad, Caracas, v. 20, 2017.). No entanto, existem cerca de vinte universidades com programas interculturais voltados para os povos indígenas (PALADINO, 2016PALADINO, M. et al. Pueblos indígenas y educación superior: indagaciones y experiencias en Argentina y Brasil. Revista del Instituto de Investigaciones en Educación, Chaco, v. 7, n. 8, p. 6-20, 2016. Disponível em: http://hum.unne.edu.ar/revistas/educa/archivos/cont8/rev_compl.pdf. Acesso em: 22 ago. 2022.
http://hum.unne.edu.ar/revistas/educa/ar...
; VALENZUELA, 2009VALENZUELA, M. Formación docente en contexto de diversidad lingüística y cultural desarrollada en el Centro de Investigación y Formación para la modalidad Aborigen. In: MATO, D. (coord.). Diversidad cultural e interculturalidad en educación superior. Experiencias en América Latina. Caracas: IESALC-UNESCO, 2009. p. 83-92.). Todas essas instituições mantêm programas de educação intercultural direcionados, em especial, às populações indígenas, e que, em alguns casos, contemplam, nas áreas de extensão, ações direcionadas aos afrodescendentes. Em relação ao tema das populações afrodescendentes, os avanços são menores e as experiências que vêm ocorrendo nesse nível educacional são escassas. As experiências de ações afirmativas na Argentina serão destacadas a seguir.
O Programa e a Cátedra UNESCO “Educação Superior e Povos Indígenas e Afrodescendentes” da Universidade Nacional de Três de Febrero
Em experiências recentes, é de grande importância os trabalhos realizados pelo Programa de Educação Superior, Povos Indígenas e Afrodescendentes da Universidad Tres de Febrero (Untref), coordenado pelo pesquisador do Conselho Nacional de Investigação Científica e Técnica (Conicet) Daniel Mato. Tal programa foi criado em 2012 com o objetivo de analisar e documentar experiências de inclusão de indígenas e afrodescendentes em IES na América Latina. Em 2014, o Programa promoveu a criação de um espaço de articulação interuniversitária denominado “Rede Interuniversitária de Educação Superior e Povos Indígenas” (Red ESIAL), espaço do qual participam atualmente mais de sessenta universidades de onze países da América Latina. Embora tenha impacto limitado, constitui um avanço no posicionamento da disciplina no Ensino Superior. Em 2018, no âmbito do programa, foi criada a Cátedra UNESCO “Educação Superior e Povos Indígenas e Afrodescendentes na América Latina”, do Centro Interdisciplinar de Estudos Avançados (CIEA) Untref.
Essa cátedra lançou a Iniciativa pela Erradicação do Racismo no Ensino Superior (2018–2021), na qual foram desenvolvidas diferentes ações nas IES que contribuíram para inserir o tema na agenda regional e dar visibilidade às experiências de lutas antirracistas que estão sendo geradas em diferentes universidades da região. As ações implementadas nas IES, em alguns casos, foram apoiadas por processos já existentes, pois foram propostas por núcleos ou grupos de trabalho que vêm desenvolvendo o tema, embora a maioria tenha sido, de alguma forma, experiências pioneiras que inauguraram esses debates nas diferentes IES. Destaca-se também a criação da linha de trabalho “Inclusão e equidade na educação superior na Argentina”, análise interseccional de gênero, classe, “raça”/etnia das trajetórias educacionais de migrantes afro-argentinos/as e afrodescendentes, do Programa de Educação Superior e Povos Indígenas e Afrodescendentes na América Latina, analisando as trajetórias educacionais de afro-argentinas, afro-argentinos e migrantes afrodescendentes a partir de uma abordagem que leva em consideração “raça”, etnia, classe e gênero.
Cátedra “Direitos das Comunidades Negras na Argentina desde uma Perspectiva Afro”, do Departamento de Filosofia da Faculdade de Direito da Universidade de Buenos Aires (UBA)
Em abril de 2022, teve início a Cátedra “Direitos das Comunidades Negras na Argentina desde uma Perspectiva Afro”, do Departamento de Filosofia da Faculdade de Direito da UBA. Esta é uma disciplina opcional coordenada pelos/as advogados/as e ativistas afro-argentinos/as Patricia Gomes e Ali Emmanuel Delgado, da Universidade de Buenos Aires, que também são gestores/as dessa iniciativa. A cátedra tem uma perspectiva afrocentrada, na qual são priorizadas as vozes negras, a história e os referenciais teóricos, e é ministrada por professores e professoras afrodescendentes. A respeito, Ali Delgado, disse:
No meu caso eu não li nenhum autor negro durante todo meu curso, só lia os que eu mesmo procurava. Não tivemos professores ou professoras negras e os alunos visivelmente negros eram quase nulos. Foi assim que em nossa atuação como ativistas afroconscientes pudemos identificar a necessidade de enegrecer a faculdade, instituição que está imersa na lógica da academia que tem sido produtora e reprodutora dos discursos hegemônicos e dominantes de nossa sociedade [...]. A academia tem desempenhado um papel central na legitimação de discursos racistas que negaram, invisibilizaram e suprimiram populações afro-argentinas e afrodescendentes da identidade nacional
(CAMPOS, 2021CAMPOS, D. Una cátedra quiere ennegrecer el Derecho argentino. Clarín, Buenos Aires, 28 feb. 2021. Disponível em: https://www.clarin.com/revista-enie/ideas/catedra-quiere-ennegrecer-derecho-argentino_0_gI_NLc3br.html. Acesso em: 22 ago. 2022.
https://www.clarin.com/revista-enie/idea... ).
O depoimento de Ali permite destacar a marcada ausência de história e epistemologias negras nos programas acadêmicos das IES. A produção intelectual negra é pouco valorizada ou quase desconhecida nas bibliografias dos programas acadêmicos (OCORÓ, 2019OCORÓ, L. A. Entre la emancipación y la descolonización: tensiones luchas y aprendizajes de los/as investigadores/as negros/as en la educación superior. Revista Práxis Educacional, Salvador, v. 15, n. 32, abr./jun. 2019. https://doi.org/10.22481/praxis.v15i32.5043
https://doi.org/10.22481/praxis.v15i32.5...
). Numa entrevista, Florencia Gómez, ativista afro-argentina, quando questionada sobre o que ela acha que são os métodos mais importantes ou mais eficazes na luta feminista negra, mencionou:
Acredito muito na educação autogerenciada. Que é a educação que a gente dá a nós mesmas porque não tem nas escolas, na academia, tudo que se aprende são coisas de gente que realmente vem da hegemonia branca... autores brancos, teorias brancas. [...] Estamos todas no caminho da autoeducação, certo? “Olha, eu li este livro que é de uma autora negra, ou de autores negros”. Então, essas são as leituras já que nem todos/as têm acesso à educação, ou ir para uma escola, uma universidade e ter esses hábitos porque as realidades são diferentes
(GÓMEZ, 2019GÓMEZ, F. [Entrevista concedida a] Olivia S. Sabini-Leite, 2019.).
Embora as demandas pela educação superior na Argentina não sejam voltadas para o acesso e a permanência, como ocorre em outros países da região, elas visam problematizar o racismo epistêmico expresso pela falta de inclusão da história negra no currículo de todos os níveis do sistema educacional (OCORÓ, 2021OCORÓ, L. A. Educación Superior y afrodescendientes. Avances en Argentina durante el siglo XXI. Vain, Pablo Daniel y Schewe, Lelia C., 20, 30, 2021.). Ao mesmo tempo, como podemos observar na entrevista com Florencia Gómez, os ativistas do movimento geram seus próprios espaços educativos e de produção de conhecimento, que potencializam a construção de identidades afro-diaspóricas. Nesse ponto, é muito importante trazer à tona a proposição da professora Nilma Lino Gomes, que afirma que, no Brasil, “o movimento negro é educador”, e mostra como
[...] os movimentos sociais são produtores e articuladores do conhecimento construído pelos grupos não-hegemônicos e contra-hegemônicos em nossa sociedade. Atuam como pedagogos nas relações políticas e sociais. Muito do conhecimento emancipatório produzido pela sociologia, antropologia e educação no Brasil se deve ao papel desempenhado por esses movimentos, que interpelam o conhecimento científico, fazem emergir novos temas, questionam conceitos e dinamizam o conhecimento
(GOMES, 2017GOMES, N. L. O Movimento Negro educador: saberes construídos nas lutas por emancipação. 1. ed. Petrópolis: Vozes, 2017., p. 16-17).
Também é relevante mencionar que, na Universidade Nacional da Patagônia San Juan Bosco, como resultado da ação organizada de estudantes afrodescendentes do grupo Omi Obi, a “Cátedra Libre de Pueblos Originarios” teve seu nome mudado para “Cátedra Libre de Pueblos Nativos, Afrodescendentes e Migrantes da Universidade Nacional da Patagônia San Juan Bosco”. Ambas as experiências permitem mostrar como o tema começa a se instalar na agenda do movimento afro8 8 Sem dúvida, há experiências anteriores que não abordamos neste artigo, como o Programa de Universidade Aberta da Universidade Nacional de Córdoba, do qual faz parte o professor haitiano dessa mesma universidade, Henry Boisrolin, que criou a Cátedra Livre de Estudos Afro-Americanos no ano de 2012; e o Programa de Pesquisa e Extensão em Estudos Afrodescendentes e Afrodiaspóricos (UNIAFRO) da Universidade Nacional de San Martín (UNSaM), coordenado pela professora Karina Bidaseca. e, no caso da experiência da Universidade da Patagônia, a ação organizada dos/as afrodescendentes se nutre da participação de migrantes de outros países da região. De qualquer forma, ainda é preciso avançar na efetiva inclusão da história africana e afro-argentina em todos os níveis e currículos do sistema educacional, pois as IES são espaços fundamentais para contribuir com a valorização da história africana e afro-argentina.
Considerações Finais
O Brasil é o país da América Latina onde as maiores conquistas foram feitas na institucionalização de políticas contra a discriminação e em prol da equidade racial. Também é pioneiro em Políticas de Cotas ou Ações Afirmativas para a população afrodescendente no campo educacional. Na Argentina, por outro lado, estão surgindo os debates sobre educação superior e afrodescendentes. No entanto, existem algumas iniciativas desenvolvidas tanto na agenda acadêmica quanto nas práticas dos movimentos afrodescendentes, que vêm instalando a discussão sobre o tema no Ensino Superior.
Os dois países têm processos históricos com diversas similaridades, em especial um aspecto central no século XIX: a orientação de políticas migratórias para europeus, com financiamento dos respectivos países, compondo um longo período de políticas de branqueamento, tanto da população como do imaginário social. Nos aspectos demográficos, o impacto na Argentina foi maior que no Brasil, guardando semelhança com os estados da região Sul brasileira, na qual a população branca é numericamente bastante superior à população negra – particularidade em relação a todas as demais regiões brasileiras, nas quais a população negra é numericamente superior.
Outro aspecto central semelhante é a hegemonia branca constituída nos dois países, nos quais as posições de poder, de valorização e de destaque social foram ocupadas por pessoas brancas e por uma mentalidade eurocêntrica, ao passo que pessoas negras e indígenas têm menores alternativas de acesso a bens.
No caso da Argentina, como revelam as afirmações de políticos citadas no artigo, a concepção sobre si mesmos é de um país “europeu”, no qual as influências indígenas e negras são desprezíveis. No Brasil e na maioria dos demais países da América Latina, o ideário foi profundamente marcado pelas ideias da mestiçagem como marca de distinção. Além dos aspectos demográficos, outra marca de distinção ao longo do século XX tem relação com essas narrativas hegemônicas.
No Brasil, ao longo do século XX, os movimentos negros estiveram sempre ativos por causas comuns de busca de direitos, enfrentaram longos períodos de desconsideração de suas reivindicações e lograram, a partir do final dos anos 1990, grandes vitórias no reconhecimento de suas pautas, nas quais as demandas de políticas de identidade e de educação foram centrais. O retomar dos movimentos negros definiu uma estratégia política de inclusão de “mestiços”, na nomenclatura oficial dos censos brasileiros os pardos, como membros da comunidade negra, cujos direitos de cidadania são reclamados e devem ser conquistados.
Na Argentina, cujo eurocentrismo está vinculado com uma população negra numericamente menor e com diminuto impacto nos discursos hegemônicos, as reivindicações de políticas antirracistas e de promoção de equidade não incluíram as populações mestiças. Na contemporaneidade, são comuns os relatos de ofensas e discriminações racistas sofridas por pessoas “mestiças”, mas que não têm possibilidade de resposta como grupo de reivindicação de identidade “negra”, de demandas de identidade nem de políticas de equidade. Nossa hipótese é de que o processo de autorreconhecimento como país europeu, ou como o país mais europeu da América do Sul, tornou-se hegemônico e atuou para esse efeito, juntamente com determinadas particularidades dos movimentos negros argentinos que não temos espaço de discutir neste artigo.
Mesmo com essas particularidades, os últimos anos foram de maiores reconhecimento e atuação para políticas antirracistas e ações afirmativas na Argentina, como revelam os exemplos do reconhecimento acadêmico expresso nas cátedras discutidas neste artigo.
Com muitas particularidades e complexas estruturas internas, alguns elementos macro permitem reforçar a concepção de que histórias conectadas (GRUZINSK, 2003GRUZINSKI, S. O historiador, o macaco e a centaura: a “história cultural” no novo milênio. Estudos Avançados, São Paulo, v. 17, n. 49, p. 321-342, 2003. Disponível em: https://www.scielo.br/j/ea/a/BJNxbpzhPKCfRSYFmNHq5hg/?lang=pt. Acesso em: 04 abr 2022. https://doi.org/10.1590/S0103-40142003000300020
https://www.scielo.br/j/ea/a/BJNxbpzhPKC...
) atuam para o estabelecimento da hegemonia branca e do imaginário eurocêntrico nos diversos países da América Latina.
Notas
-
1
“hoje somos todos chilenos” (tradução nossa).
-
2
“a ideologia da mestiçagem ocultou o racismo dos Outros internos e externos” (tradução nossa).
-
3
“A mestiçagem, compreendido como este marco ideológico, estimula uma retórica implícita de inclusão, enquanto simultaneamente esconde processos de exclusão” (p. 16, tradução nossa).
-
4
“A sociedade peruana é explicitamente discriminatória e a construção social da cor da pele constitui um dimensão de tal discriminação” (ZAVALA; ZARIGUIEY, 2009).
-
5
Para ampliação sobre o tema consultar Ocoró (2010)OCORÓ, L. A. Afroargentinidad y memoria histórica: La negritud en los actos escolares del 25 de mayo”. En: Tesis de Maestría. FLACSO. Buenos Aires. Disponible en línea: http://www.flacsoandes.org/dspace/handle/10469/2997, 2010.
http://www.flacsoandes.org/dspace/handle... . -
6
Até o momento, não há dados suficientes sobre o nível educacional da população afrodescendente no país. No entanto, tomando como referência as estimativas do Ministério da Educação da Cidade Autônoma de Buenos Aires (CABA), com base nos dados do censo de 2010, 17,4% dos afrodescendentes não concluíram o Ensino Fundamental. Esse percentual é de 14,6% para o restante da população. Apenas 7,4% da população afrodescendente da CABA concluiu o Ensino Médio, essa proporção é de 10,9% para o restante da população (ME, 2019).
-
7
Disponível em: https://www.argentina.gob.ar/derechoshumanos/equidad-racial-personas-migrantes-y-refugiadas-0. Acesso em: 22 ago. 2022.
-
8
Sem dúvida, há experiências anteriores que não abordamos neste artigo, como o Programa de Universidade Aberta da Universidade Nacional de Córdoba, do qual faz parte o professor haitiano dessa mesma universidade, Henry Boisrolin, que criou a Cátedra Livre de Estudos Afro-Americanos no ano de 2012; e o Programa de Pesquisa e Extensão em Estudos Afrodescendentes e Afrodiaspóricos (UNIAFRO) da Universidade Nacional de San Martín (UNSaM), coordenado pela professora Karina Bidaseca.
-
Financiado pelo CNPQ, Chamada 09/2021, projeto “Ações afirmativas na América Latina: Brasil, Argentina, México, Colo?mbia,
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
27 Jan 2023 -
Data do Fascículo
2022
Histórico
-
Recebido
30 Maio 2022 -
Aceito
27 Set 2022