Resumos
A bacia do rio Doce, quinta maior do estado de Minas Gerais, mostra-se bastante degradada com impactos diretos na vegetação, no solo, na biodiversidade e na qualidade das águas. Sabendo-se da importância da bacia em questão, a utilização de bioindicadores aquáticos representa uma das formas mais modernas para se detectar níveis diferenciados de carga orgânica, sendo premente seu estudo e aplicação. Este trabalho propõe a utilização de organismos microscópicos como o fitoplâncton que, aliados a parâmetros físico-químicos, poderiam indicar poluição em seus diferentes níveis. A metodologia utilizada foi estabelecida conforme Sladecek (1973) e Greenberg (1992). Foram amostradas sete estações de coleta no ribeirão Capim, na área de influência de uma empresa de papéis reciclados, objetivando-se detectar possíveis impactos na cadeia trófica. As análises mostraram a ocorrência de 41 taxa, destacando-se a predominância dos gêneros Oscylatoria a Anacystis pertencentes à divisão Cyanophyta nos ambientes de maior estresse, e organismos da divisão Chlorophyta nos demais ambientes amostrados. Observou-se ainda a capacidade de adaptação de alguns gêneros, entre eles Euglena e Navicula, os quais se fizeram presentes em quase todos os ambientes amostrados.
Bioindicadores; fitoplâncton; sistema sapróbico; fábrica de papel
The Rio Doce’s basin, which is the fifth greatest basin of the state of Minas Gerais, Brazil, is severely degraded by the direct impacts on vegetation, soil, biodiversity, and water quality. Due to the importance of this basin, the use of aquatic bioindicators is one of the most modern methods to detect differentiated levels of organic matter, and its study and application is a relevant issue. This paper proposes the use microscopic organisms such phytoplankton, which combined with physicochemical parameters, would indicate pollution on its different levels. The applied methodology was according to Sladecek (1973) and Greenberg (1992). It was sampled seven collect stations on the Capim stream, in an area under the influence of a recycling paper industry, being the objective to assess the possible impacts on the trophic chain. The analysis presented the existence of 41 taxa, emphasizing the predominance of Oscilatoria and Anacystis genus, that belong to the Cyanophyta division, on more disturbed areas, while organisms from the Chlorophyta division were identified on the other sampled locations. Moreover, it was observed the ability that some genus like the Euglena and Navicula have to adapt to their environment, since these organisms were present on almost all samples.
Bioindicators; phytoplankton; saprobiotic system; paper industry
NOTA TÉCNICA
Utilização de bioindicadores em diferentes hidrossistemas de uma indústria de papeis reciclados em Governador Valadares MG
Use of biological indicators in different hydrosystems of an industry of recycled papers in Governador Valadares MG
Ivan César de Oliveira BastosI; Ivana Cristina LovoII; César Augusto Maximiano EstanislauIII; Leandro Moraes ScossIV
IBiólogo. Mestrando em Recursos Hídricos pela Universidade Federal de Ouro Preto UFOP
IIBióloga. Mestre em Botânica pela Universidade Federal de Viçosa UFV
IIIBiólogo. Mestre em Zoologia pela Universidade Católica de Minas Gerais PUC
IVZootecnista. Mestre em Ciência Florestal Universidade Federal de Viçosa UFV
Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Ivan César de Oliveira Bastos Instituto de Ciências Exatas e Biológicas - ICEB Universidade Federal de Ouro Preto - UFOP Campus Morro do Cruzeiro 35400-000 Ouro Preto - MG - Brasil Tel.: (31) 3559-1725 E-mail: ivancesar@iceb.ufop.br
RESUMO
A bacia do rio Doce, quinta maior do estado de Minas Gerais, mostra-se bastante degradada com impactos diretos na vegetação, no solo, na biodiversidade e na qualidade das águas. Sabendo-se da importância da bacia em questão, a utilização de bioindicadores aquáticos representa uma das formas mais modernas para se detectar níveis diferenciados de carga orgânica, sendo premente seu estudo e aplicação. Este trabalho propõe a utilização de organismos microscópicos como o fitoplâncton que, aliados a parâmetros físico-químicos, poderiam indicar poluição em seus diferentes níveis. A metodologia utilizada foi estabelecida conforme Sladecek (1973) e Greenberg (1992). Foram amostradas sete estações de coleta no ribeirão Capim, na área de influência de uma empresa de papéis reciclados, objetivando-se detectar possíveis impactos na cadeia trófica. As análises mostraram a ocorrência de 41 taxa, destacando-se a predominância dos gêneros Oscylatoria a Anacystis pertencentes à divisão Cyanophyta nos ambientes de maior estresse, e organismos da divisão Chlorophyta nos demais ambientes amostrados. Observou-se ainda a capacidade de adaptação de alguns gêneros, entre eles Euglena e Navicula, os quais se fizeram presentes em quase todos os ambientes amostrados.
Palavras-chave: Bioindicadores, fitoplâncton, sistema sapróbico, fábrica de papel.
ABSTRACT
The Rio Doces basin, which is the fifth greatest basin of the state of Minas Gerais, Brazil, is severely degraded by the direct impacts on vegetation, soil, biodiversity, and water quality. Due to the importance of this basin, the use of aquatic bioindicators is one of the most modern methods to detect differentiated levels of organic matter, and its study and application is a relevant issue. This paper proposes the use microscopic organisms such phytoplankton, which combined with physicochemical parameters, would indicate pollution on its different levels. The applied methodology was according to Sladecek (1973) and Greenberg (1992). It was sampled seven collect stations on the Capim stream, in an area under the influence of a recycling paper industry, being the objective to assess the possible impacts on the trophic chain. The analysis presented the existence of 41 taxa, emphasizing the predominance of Oscilatoria and Anacystis genus, that belong to the Cyanophyta division, on more disturbed areas, while organisms from the Chlorophyta division were identified on the other sampled locations. Moreover, it was observed the ability that some genus like the Euglena and Navicula have to adapt to their environment, since these organisms were present on almost all samples.
Keywords: Bioindicators, phytoplankton, saprobiotic system, paper industry.
INTRODUÇÃO
A bacia do Rio Doce, quinta maior do estado de Minas Gerais, vem sofrendo degradação por ação antrópica decorrente de atividades econômicas, sociais entre outras, as quais exercem impactos diretos na vegetação, no solo e na qualidade das águas nos vários afluentes que a compõem. A crescente urbanização e industrialização levaram ao aumento do volume de dejetos lançados nos cursos dágua, muitas vezes sem o tratamento adequado, resultando na elevação do teor de cargas orgânicas e hiperproliferação de microrganismos por vezes prejudiciais à micro e macro biota de cada ambiente. Sendo assim é de suma importância estudos limnológicos os quais poderiam indicar poluição em seus variados estágios na bacia em questão objetivando-se por fim, chegar a possíveis papéis de bioindicação por parte da comunidade analisada. Segundo definição de Washington (1984), bioindicadores são espécies escolhidas por sua sensibilidade ou tolerância a vários parâmetros, como poluição orgânica, derramamento de óleo, alterações de pH da água, lançamento de pesticidas, entre outros.
Esta nova ferramenta para se detectar diferentes níveis de carga orgânica em cursos dágua (bioindicadores), fundamenta-se em uma metodologia desenvolvida e aperfeiçoada por Kolenat (1848), Kolwitz & Marsson (1902, 1908, 1909), Cohn (1953) e Liberman (1963) citados por Sladecek (1973), tendo esta por premissa o sistema sapróbico. Este consiste em avaliar organismos aquáticos cuja presença e atividades vitais nos ecossistemas indicam diferentes níveis de qualidade das águas (Sladecek, 1973). O estado biológico de um ambiente aquático é típico para cada grau de contaminação e a avaliação da composição e abundância das biocenoses de um dado hidrossistema possibilita avaliar o seu grau de pureza ou poluição (Schwoerbel, 1975). O uso de parâmetros biológicos para medir a qualidade da água se baseia nas respostas dos organismos em relação ao meio onde vivem. Como os sistemas hídricos estão sujeitos a inúmeras perturbações, a biota aquática reage a esses estímulos, sejam eles naturais ou antropogênicos (Cairns Jr. et al, 1993). Assim, o sistema sapróbico de Kolwitz & Marsson (1909) enfatizava que a presença/ausência e abundância de organismos nas áreas poluídas ocorriam por características fisiológicas e comportamentais que lhes permitia tolerar tais condições. A partir dessa primeira tentativa de classificação de ambientes com base na fauna local surgiram diversas metodologias, que podem ser divididas em três grandes grupos: os índices bióticos, os modelos de predição de impacto e os protocolos de avaliação rápida.
No final da década de 1960, iniciaram-se esforços conjuntos na Europa para testar a aplicabilidade do sistema sapróbico, em especial na Alemanha e Holanda. Diversos índices bióticos surgiram e foram testados desde então (ver revisões em Cairns Jr. & Pratt, 1993; Metcalfe, 1989).
Embora o Brasil tenha sido representado na primeira reunião da Sociedade Internacional de Limnologia em 1922 (Esteves, 1998), o país não seguiu as tendências mundiais de avaliação e conservação desses sistemas. O descaso com essa metodologia de avaliação ambiental fica evidente quando se analisa o documento Programa Monitore do Ministério do Meio Ambiente (MMA, 1998), que apresenta 65 projetos de "monitoramento da qualidade das águas" no Brasil. Desses, 59 são de águas doces, dos quais 42 em rios. Desse montante, 26 (61,9%) compreendem apenas análises físicas, químicas e/ou bacteriológicas da água. Dos 16 programas de monitoramento restantes, que apresentam análises químicas e algum componente biológico, apenas quatro ainda estavam em funcionamento naquela data. Isso representa menos de 10% dos projetos de qualidade da água de rios, dos quais dois apresentam a vaga descrição "monitoramento de corpos dágua sem data prevista para finalização" (Buss, 2003).
Mesmo sem o devido apoio, alguns trabalhos têm abordado o tema, principalmente nas regiões sudeste e sul do País. Alguns exemplos são os de Barbosa (1994), Tundisi & Barbosa (1995), Navas-Pereira & Henrique (1995), Brandimarte & Shimizu (1996) e Kuhlmann et al (1998). Entretanto, a maioria dos trabalhos se localiza em represas artificiais, limitando o conhecimento a áreas isoladas e em ecossistemas lênticos. Os trabalhos desenvolvidos em ecossistemas lóticos muitas vezes não contam com infra-estrutura adequada para análise ambiental, deixando lacunas na implementação de programas de biomonitoramento. As aplicações mais bem-sucedidas são das agências ambientais em conjunto com universidades ou centros de pesquisa, na maioria das vezes importando ou adaptando índices bióticos dos países europeus (Junqueira & Campos, 1998; Marques & Barbosa, 2001).
Justifica-se assim o interesse da fábrica produtora de papéis higiênicos em questão e das demais partes envolvidas neste trabalho em monitorar a água utilizada no parque industrial em estudo. A avaliação da eficiência do tratamento em águas residuárias de papel/celulose utilizando-se esta metodologia permitirá identificar pontos estratégicos ou possíveis falhas no processo, buscando melhorá-los, além da possibilidade da adaptação desse sistema às condições naturais brasileiras, mais especificamente à região sudeste. Norteado por esse objetivo o trabalho enfocou análise taxonômica, biológica, ecológica e estatística da comunidade fitoplanctônica observada, além da avaliação dos parâmetros físico-químicos necessários para a formação do sistema sapróbico, e sua posterior aplicação em sistemas industriais. Utilizou-se para tanto o levantamento da diversidade fitoplanctônica nos diferentes ambientes aquáticos utilizados pela indústria citada, testando em conjunto a hipótese de que a diversidade desta comunidade é dependente das condições físico-químicas dos ambientes amostrados.
MATERIAL E MÉTODO
Área de estudo Governador Valadares Médio Rio Doce
Foram amostradas sete estações de coleta (Figura 1) na área de influência da empresa de papeis reciclados em questão, (18º 49 41.5" S e 41º 5309.3" W; Altitude: 153m), a qual utiliza o ribeirão Capim, afluente do rio Doce, para captação e descarte de seus efluentes. O parque industrial situa-se no bairro Sir em Governador Valadares, estado de Minas Gerais. As estações amostrais foram caracterizadas da seguinte forma:
Ponto 1- Captação das águas do Ribeirão Capim. No local foi construída uma barragem de uma margem a outra, represando a água do afluente que através de tubulações é captada e conduzida para o interior da empresa. Tal barragem localiza-se à aproximadamente 1000 m da empresa.
Ponto 2 - Este foi escolhido no Ribeirão Capim entre o percurso da lagoa de captação (barragem-jusante) e a saída da fábrica, não possuindo, portanto, nenhuma interferência do efluente fabril.
Ponto 3 - Caixa Industrial. Reservatório de água para utilização industrial, após captação e tratamento na Estação de Tratamento de Água (ETA) da empresa.
Ponto 4 - Localiza-se no início da Lagoa de Aeração, onde a água chega totalmente impura após ser utilizada no processo industrial de tratamento de celulose e reciclagem de papel.
Ponto 5 - Lagoa de Polimento. A água vinda da lagoa de aeração continua a ser oxigenada e permanece neste por certo tempo, para possibilitar seu tratamento final.
Ponto 6 - Saída do Efluente Industrial. Localizado na saída da Lagoa de Polimento, pouco antes do descarte da água utilizada no processo industrial que, após passar pelo sistema de tratamento fabril, será lançada ao Ribeirão Capim.
Ponto 7 - Devolução do Efluente ao Ribeirão Capim. Local em que a empresa retorna com a água para o Ribeirão Capim. Este ponto situa-se à aproximadamente 800 m do Rio do Doce.
Procedimentos adotados
Foram coletadas amostras mensais em cada ambiente, nos meses de Agosto, Setembro e Outubro de 2003. Para cada ambiente observou-se os seguintes procedimentos:
Durante as coletas foram obtidas amostras da comunidade fitoplanctônica com o auxílio de rede planctônica de 30µm de abertura de malha, arrastada aleatoriamente (horizontal e vertical), a fim de se obter uma maior representatividade de espécies. As amostras foram vertidas em frascos de polietileno, preservadas com solução de lugol acético na proporção de 1:100 e mantidas em ambientes com iluminação reduzida, sob temperatura baixa, conforme descrito por Bicudo & Bicudo (1970).
A identificação foi executada até o nível de gênero com o auxílio de microscópico binocular, seguindo as chaves de identificação de Prescott (1962) e Bicudo & Bicudo (1970). Estas análises foram realizadas através de observação do material entre lâmina e lamínula e desenhos a fim de identificar estruturas peculiares a cada organismo. Este procedimento foi repetido para cada gênero encontrado, até que não surgissem organismos antes não identificados na amostra.
Para as variáveis físico-químicas, as técnicas de amostragem e conservação foram realizadas de acordo com Agudo (1987). A execução das amostras foi seguida conforme Greenberg (1992). Os parâmetros observados foram D.B.O., D.Q.O., Fosfato Total, Nitrato, Nitrogênio Total, O. D., pH, Sólidos em Suspensão, Sólidos Totais, Temperatura Água/Ar e Turbidez.
RESULTADO E DISCUSSÃO
A avaliação da qualidade das águas nos pontos de amostragem estudados foi realizada sobre o ponto de vista físico-químico e biológico. Quando da análise dos resultados físico-químicos (Tabela 1), observou-se um aumento expressivo de Turbidez, Sólidos, DBO, DQO, Nitrogênio e Fosfato no ponto amostral quatro, referenciando suas relações com o efluente fabril. À medida que se seguem os pontos amostrais (5 e 6), e consequentemente o avanço do tratamento do efluente industrial bem como a junção do mesmo ao ribeirão Capim (ponto 7), verifica-se a diminuição nos níveis dos parâmetros dantes citados. Ainda, para o ponto amostral seis, representado pela saída do efluente industrial em direção ao ribeirão em estudo, este mostrou-se em acordo com a referencia normativa CONAMA (2005), estando todos os parâmetros em ajuste aos padrões de lançamento estabelecidos por tal norma. Para os pontos amostrais 1 e 2, os valores satisfatórios dos parâmetros físico-químicos analisados, são facilmente explicados pela não interferência de atividades antrópicas bruscas nestes ambientes. Os ótimos valores para o ponto amostral três, decorrem da Estação de Tratamento de Água-ETA, da indústria em estudo.
No contexto taxonômico, a comunidade fitoplanctônica do trecho estudado no ribeirão Capim apresentou-se constituída por 36 gêneros, 19 famílias, 11 ordens, 5 classes e 5 divisões. Além disto, para o gênero Micrasterias foram identificadas duas espécies e nos gêneros Cosmarium, Oscillatoria e Staurastrum identificaram-se espécies diferentes a partir do reconhecimento de estruturas celulares e morfológicas diferenciadas entre si dos gêneros em questão. A seguir a Tabela 2 mostra a classificação taxonômica dos organismos encontrados de acordo Prescott (1969) e Bicudo & Bicudo (1970). Já a Tabela 3 representa a ocorrência de cada espécie nos respectivos meses de coleta para os ambientes amostrais estudados.
Ao testar a hipótese de que a diversidade de espécies de fitoplânctons observadas nos trechos após a influência direta da fábrica (ambientes 3 à 7) é menor que a diversidade de espécies observada nos ambientes onde há influência indireta da fábrica (1 e 2), utilizamos as estimativas do procedimento Jackknife (Heltshe & Forrester, 1983) para cada área isoladamente com inferência de intervalo de confiança de 95% de probabilidade (Figura 2).
Fica claramente estabelecido que os pontos de amostragem 1 e 2 apresentam uma diversidade maior de gêneros fitoplanctônicos em relação aos demais ambientes. Este resultado indica que neste trecho do ribeirão Capim existem duas comunidades de fitoplânctons distintas, sendo que a comunidade localizada após a área de influência direta da fábrica está em um estágio inicial da sucessão, observarvando-se assim o aumento gradativo de diversidade à medida que se seguem as etapas de tratamento do esgoto industrial, ao contrário da comunidade que não sofre influência direta da fábrica, que demonstra uma estrutura mais complexa de um estágio mais avançado da sucessão.
A interação das variáveis abióticas em conjunto às análises fitoplanctônicas possibilitou-nos utilizar o sistema Sladecek (1973), sendo este considerado o mais completo, recente e amplamente divulgado a fim de se definir o grau de saprobidade de ambientes aquáticos. O termo saprobidade é utilizado para definir o conteúdo de putrefação orgânica decomposta por microrganismos aquáticos que formam as diferentes comunidades na água aberta, ao longo da vegetação litorânea e no fundo. Os graus de saprobidade mencionados estabelecem 7 níveis sapróbicos, correspondentes a diferentes teores de carga orgânica (Cetec, 1994). Criou-se então a Tabela 4 a partir de dados do Cetec (1994), os quais propõem uma adaptação do sistema Sladacek (1973) para ambientes tropicais, onde se observa a possível utilização de algumas espécies fitoplanctônicas como indicadores ambientais. Entretanto faz-se necessárias análises qualitativas, quantitativas e estatísticas mais refinadas a fim de se avaliar com clareza a ecologia destes indivíduos e a real importância dos mesmos nos diferentes ambientes em que estes se fizeram presentes.
Nas estações de amostragem 1 e 2 observou-se o predomínio de organismos fitoplanctônicos da divisão Chlorophyta, em especial a família das Desmidiaceae (Cosmarium, Hyaloteca, Micrasterias e Staurastrum). Segundo Branco (1986), estes organismos são característicos de corpos d água limpos, evidenciado pelos baixos valores das variáveis físico-químicas e da boa disponibilidade de Oxigênio Dissolvido em tais ambientes. Da presença dos organismos da divisão Chrysophyta ressalta-se o gênero Asterionella (divisão Chrysophyta) citado por Sladecek (1973) como indicador de ambiente oligo a betamesosapróbio (ßms). Segundo Esteves (1998), os organismos da divisão Chrysophyta, em grande maioria, são particularmente encontrados em corpos d agua oligotróficos, devido suas exigências morfológicas, bioquímicas e fototrópicas.
Destaca-se ainda para estes ambientes a presença do gênero Trachelomonas, divisão Euglenophyta. Segundo Branco (1986), estas algas têm carapaça formada quase exclusivamente por hidróxido de ferro e manganês, sendo indicadores de precipitação destes em sistemas aquáticos. Vale ressaltar que a região em estudo é rica em metais e caracterizada pela produção intensa de mineral.
No ponto amostral 2 observou-se a presença do gênero Synedra (divisão Chrysophyta), a qual, segundo Beyruth (1996), mostra-se claramente favorecida por ambientes de água alcalinófila e tendo como pH ótimo ao redor de 7,9-8,4. Vale observar que o pH deste ambiente esteve sempre acima de 8,1, justificado pela menor vazão de água, visto que a represa (ponto amostral 1) situa-se a menos de 200m deste ponto, alem do balanço hídrico negativo (precipitação menor que evaporação) e o período de seca prolongado da região em estudo.
A ausência de organismos fitoplanctônicos na estação 3 justifica-se devido à adição de produtos químicos a fim de ajustar o pH e impedir o crescimento de organismos indesejáveis na estação de tratamento já que a água será, a partir deste ponto, destinada à fabricação de papel e consumo na empresa.
Nos ambientes que se seguem (4, 5, 6 e 7), destaca se a presença de organismos produtores pertencentes à divisão Cyanophyta (cianobactéria), representadas pelas Famílias Oscillatoriaceae (gênero Oscillatoria (filamentosas) e Chlorococcaceae (gêneros coloniais-Anacystis, Chlorococcun e Microcystis). Branco (1986) afirma que estes organismos indicam presença de despejos de indústrias de papel e poluição orgânica, dão cor aparente à água, produzem odor séptico quando em decomposição, são potencialmente tóxicas e reproduzem intensamente em lagoas de estabilização (florações algais), principalmente se observado altos valores de N:P, conforme confirmado pelas análises físico-químicas. Para a presença do gênero Dactllococcopsis, estudos realizados por Gonzáles e Ortaz (1998), demonstraram que quanto maior o enriquecimento de ambientes com Nitrogênio e Fósforo, maior a presença e reprodução deste gênero. Shapiro (1990) relatou que as cianobactérias são eficientes na absorção de fósforo e muitas são capazes de fixar nitrogênio molecular, na ausência de nitrato e amônia. Por terem características autotróficas ou mixotróficas (assimilam compostos orgânicos), explica-se assim a facilidade dos gêneros desta divisão em se relacionarem com ambientes de baixo nível de Oxigênio Dissolvido e alto teor de carga orgânica, demonstrado pelos elevados índices de DBO, DQO, Sólidos e Turbidez das análises abióticas realizadas nos ambientes em questão.
Ressaltando ainda a presença dos gêneros coloniais Anacystis e Mycrocistis, Branco (1986) afirma que estes podem contribuir com o aumento nos índices de organismos patogênicos em lagoas de estabilização por possuírem em sua composição uma bainha de substância mucilaginosa que freqüentemente serve de abrigo a bactérias, em especial coliformes, que ali se protegem de intempéries ambientais.
Os resultados para a similaridade entre as duas comunidades (pré e pós-influência fabril) demonstram que apenas 19,5% dos gêneros de fitoplânctons que foram observados antes da influência direta da fábrica são encontrados nos demais pontos de amostragem. Estes resultados demonstram o potencial de adaptação de alguns gêneros, entre os mais importantes destacam se as Euglena e Navícula.
Nos ambientes 5, 6 e 7 os organismos da divisão Euglenophyta classificados encontravam-se em fase de reprodução, confirmando a alta produtividade destes ambientes. Já os organismos euglenóides encontrados nos ambientes 1 e 2 são provavelmente de espécies diferentes, haja vista que algumas espécies deste gênero são características de água limpa. O mesmo acontece com os organismos do gênero Navícula, da Divisão Chrysophyta, a saber que espécies desse grupo são freqüentes em ambientes de despejos industriais, suportam salinidade elevada e alta taxa de compostos orgânicos, enquanto outras são características de águas limpas (Branco 1986).
Deve ser observada ainda a presença marcante do gênero Chlamydomonas nos ambientes 5, 6 e 7, citados por Beyruth (1996) como freqüentes em lagoas de estabilização, servindo para caracterizar as fases ou condições de tratamento nestes sistemas devido às suas exigências tróficas, suportando perfeitamente ambientes ricos em matéria orgânica em decomposição, conforme confirmado pelas análises abióticas destes ambientes.
No ambiente de amostragem 7, destaca-se o aparecimento do gênero Amphora citado por Branco (1996) como resistente a despejos de indústrias de papel.
Considera-se por fim o surgimento na terceira campanha (Outubro), dos gêneros Ulotrix e Uronema, representantes da Divisão Chlorophyta, o que pode ser indício de uma melhora nas condições ambientais, já que este pertence ao grupo mais sensível às condições adversas descritas anteriormente. Estudos realizados na mesma indústria em questão por Basseti (dados não publicados), relataram a ocorrência deste gênero ainda na lagoa de polimento (ponto 6) o que nos deixa a entender que houve uma possível baixa na qualidade do efluente, visto que seus trabalhos foram realizados nos mesmos meses no ano de 2000.
CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES
Fica claro que a situação das estações de coleta que apresentaram uma maior diversidade de espécies foram aquelas com menores índices de estresse ambiental, relatadas para os ambientes 1 e 2, desconsiderando o ambiente 3 devido ao tratamento da água com intuito de atingir certo grau de potabilidade.
Visto que a classificação trófica de um ecossistema aquático baseia-se no maior número possível de características, o trabalho realizado contribuiu com informações e dados da literatura sobre as condições de crescimento exigidas pelas diferentes divisões, famílias e gêneros da comunidade de algas aquáticas e demonstrou o potencial da aplicação desses microrganismos como bioindicadores. Todavia os resultados obtidos são ainda preliminares, necessitando de uma série histórica mais ampla, bem como de aprofundamento taxonômico para uma melhor compreensão no desenvolvimento da metodologia utilizada.
Desta maneira, recomenda-se a utilização da comunidade de fitoplâncton para o monitoramento constante da qualidade da água tratada pela empresa, para que, juntamente com os parâmetros físico-químicos dos diferentes pontos de amostragem, possam indicar alterações tanto no sistema natural, antes da fábrica, como no modificado, ao longo do trecho do ribeirão Capim. Estas informações permitirão uma avaliação periódica do funcionamento do sistema de tratamento da água da fábrica, bem como poderão ser utilizadas como uma ferramenta em busca de uma melhor qualidade ambiental do sistema industrial.
Sem dúvidas o monitoramento em longo prazo, possibilitará à empresa o acompanhamento mais apurado do impacto de suas atividades no ambiente. Esses poderão contribuir no ajuste das tecnologias empregadas e na sugestão de parâmetros inovadores que complementariam os índices físico-químicos empregados atualmente.
Recebido:07/11/05
Aceito: 20/07/06
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
11 Out 2006 -
Data do Fascículo
Set 2006
Histórico
-
Aceito
20 Jul 2006 -
Recebido
07 Nov 2005