Acessibilidade / Reportar erro

OS CAMINHOS DA PROTEÇÃO DE UMA ESPÉCIE FLORESTAL EM EXTINÇÃO NA AMAZÔNIA

Na década de 70 e no início dos anos 80 a Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro manteve em Macapá (Amapá) o seu Campus Avançado. Um dos grandes méritos desta unidade foi propiciar o treinamento de alunos e professores, dando lhes uma visão real do que era o Brasil em seu interior. Foi neste período que as equipes do curso de Engenharia Florestal vislumbraram um problema: a exploração intensiva da virola.

A virola, também conhecida na região como ucuúba, é uma árvore de grande porte que ocorre nas áreas inundáveis da Amazônia. A beleza de sua madeira tomou-a uma espécie de alto valor para as empresas madeireiras que atuam na região, produzindo compensado de excelente qualidade, quase que exclusivamente para a exportação. Pouco do material fica no Brasil, a maior parte segue para a França, Estados Unidos e principalmente, Japão.

O valor comercial da espécie fez com que sua exploração se intensificasse, em especial na região do estuário amazônico, que abrange os Estados do Amapá, Pará (incluindo a Ilha de Marajó), devido à sua proximidade do porto de Belém, facilitando a exportação. Com isto, as florestas naturais foram alvo do que se chama "exploração seletiva", em que apenas as espécies de valor comercial eram cortadas. Embora tal prática possa parecer melhor do que a retirada total, suas consequências para a continuidade da floresta também são drásticas.

O resultado da exploração seletiva de virola está sendo sentido agora, cerca de 15 anos depois da intensificação de sua exploração. No início dos anos 80, as empresas cortavam cerca de 50. 000 m3 de madeira somente na Ilha de Marajó. Hoje, não conseguem retirar mais que 2.000 m3, e assim mesmo, grande parte são de árvores mais finas, com menor valor comercial. Restam, nesta região, poucas áreas de floresta natural que ainda dispõem de árvores de virola de grande porte, como a indústria de compensado requer. A falta de matéria-prima tem feito as empresas passarem a retirar madeira no alto Rio Amazonas (AM), cerca de 2. 500 Km de distância das fábricas que produzem compensado.

A exploração intensiva de virola foi facilitada por dois fatores: a abundância em que ocorria nas florestas naturais e o fato de crescerem nas áreas inundáveis. A várzea amazônica, onde cresce naturalmente, são áreas que durante o período das chuvas intensas da região, de dezembro a fevereiro, são inundadas pelos rios e pela própria chuva. A subida das águas facilita o arraste das toras através dos cursos d’água. As árvores são cortadas na floresta e transportadas em jangadas feitas com os troncos amarrados.

O inicio da exploração da virola, no Estado do Amapá, despertou o interesse da equipe do Curso de Engenharia Florestal em proteger a espécie do que poderia vir a ser um problema futuro: a sua extinção na região. Para tanto, em 1985 foram realizadas expedições no interiordo Estado com objetivo de colher sementes desta árvore e plantá-las em local protegido, com a colaboração de técnicos do Museu Angelo Moreira da Costa Lima, de Macapá. Posteriormente, sem recursos e encerradas as ações no Campus Avançado, estas atividades foram abandonadas. Mas em 1991, a equipe obteve financiamento do World Wildlife Fund (WWF-USA) e a colaboração de urna empresa madeireira da região, a EIDAI do Brasil Madeiras S. A., para continuar seus trabalhos de prospecção e colheita.

Em todas as áreas, no estuário amazônico, onde está sendo feito o corte de madeira, as equipes realizaram colheita de sementes. O objetivo deste trabalho é conservar a espécie, para que se possa, no futuro, reintroduzi-la nas áreas onde já foi explorada, protegendo-a da extinção total.

Para tanto optou-se em plantar as sementes colhidas, em locais seguros, protegidos da exploração e sob a guarda de instituições idôneas capazes de se responsabilizar pelo que ali foi armazenado. Estas áreas são o que se denomina "Banco Genético" ou "Banco de Germoplasma" onde está depositado o rico material genético oriundo das populações naturais.

Os Bancos Genéticos de virola estão estabelecidos nas regiões de Breves (Ilha de Marajó) e em Icoaraci e Igarapé-açú (Belém- PA), estando sob a guarda da UFRRJ, da Faculdade de Ciências Agrárias do Pará, da EIDAI do Brasil.

O sistema de plantio adotado tem não só a função de proteger a espécie em local isolado, como em futuro próximo será uma fonte de produção de sementes para o replantio e reposição do que foi retirado da floresta natural, assim como para os plantios comercias realizados pelas empresas.

A escassez de madeira, a intensificação da legislação e, principalmente, as pressões sociais de grupos conservacionistas, têm levado as empresas madeireiras a reavaliarem seu sistema de produção, baseado quase exclusivamente no extrativismo. A tendência é o aproveitamento de áreas já degradadas para a reposição e o plantio mais intensivo, o que requer sementes em maior quantidade e qualidade do que se obtem nas florestas naturais. É neste ponto que o Banco Genético também virá contribuir, fornecendo semente de qualidade e com isto incentivando a produção comercial da madeira para, indiretamente, reduzir as pressões sobre as florestas naturais remanescentes.

No futuro próximo, a experiência bem sucedida adquirida com a conservação da virola no estuário amazônico, poderá se estender para outras espécies que, como ela, estão a caminho da extinção provocada por sua exploração intensiva e desgastante.

Agradecimentos

A realização deste trabalho só se tornou possível pela colaboração e apoio dos “tiradores de madeira”, caboclos que habitam a região ribeirinha da Ilha de Marajó e que dependem do extrativismo para sua sobrevivência.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    26 Fev 2024
  • Data do Fascículo
    1996
Instituto de Florestas da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro Rodovia BR 465 Km 7, CEP 23897-000, Tel.: (21) 2682 0558 | (21) 3787-4033 - Seropédica - RJ - Brazil
E-mail: floram@ufrrj.br