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BAMBU LAMINADO COLADO (BLC)

GLUED LAMINATED BAMBOO (GLB)

RESUMO

Neste trabalho foram avaliadas características físico-mecânicas do Bambu Laminado Colado (BLC) confeccionado com duas espécies de bambu (Dendrocalamus giganteus e Bambusa vulgaris), submetidas a dois tipos de tratamento (lavado em água e químico). Foram testados dois adesivos comerciais: uréiaformol e resorcinol-formol. O BLC foi submetido a ensaios de variação dimensional, flexão estática, compressão simples, cisalhamento paralelo à linha de colagem e às fibras do bambu e resistência ao impacto. Os resultados obtidos indicaram o efeito das variáveis testadas e de suas interações nas características do compósito.

Palavras-chaves:
laminado colado; bambu; adesivo

ABSTRACT

In this work it was evaluated the characteristics of Glued Laminated Bamboo (GLB) manufactured from two bamboo species (Dendrocalamus giganteus and Bambusa vulgaris). Bamboo strips were submitted to two treatment types: water immersion and chemical washing-up. Two commercial adhesives were tested: urea-formaldehyde and resorcinol-formaldehyde. Dimensional variation, static bending, compression strength, shearing parallel to glued line and to bamboo fibers and impact resistance were applied to the GLB. Results showed the influence of the tested variable and its interactions on composite characteristics.

Key words:
Glulam; bamboo; glue

INTRODUÇÃO

A escassez dos recursos naturais, associada ao desenvolvimento de novas tecnologias, vem incentivando pesquisas com materiais alternativos, visando a preservação da natureza e a melhoria da qualidade de vida do homem. As boas características físicas do bambu, bem como sua forma geométrica peculiar, seu baixo custo e a facilidade para a sua obtenção, o tornam largamente utilizado como material de construção em vários países nos quais cresce com abundância, principalmente nas zonas tropicais e subtropicais da Ásia e em alguns países da América Latina.

O bambu, no entanto, apresenta várias limitações para seu emprego em construções devido à sua geometria particular, pois os colmos se assemelham a longos troncos de cone, de pequena espessura das paredes (variável ao longo da altura do colmo) e com muitos nós, os quais representam pontos de menor resistência mecânica.

No Brasil ocorrem espécies de bambu, tais como, Dendrocalamus giganteus e o Bambusa vulgaris, com potencial adequado para a fabricação do bambu laminado colado (BLC). O fator limitante dessas espécies para a produção do BLC refere-se à inexistência de equipamentos adequados para realizar a laminação das taliscas.

O processo de obtenção do BLC encontra-se ainda restrito ao nível de pesquisas dentro das universidades brasileiras, sendo os primeiros resultados apresentado por Mantilla Carrasco et al. (1995)MANTILLA CARRASCO, E. V. M.; MOREIRA, L. E.; XAVIER, P. V. Bambu laminado e colado. In: V ENCONTRO BRASILEIRO EM MADEIRAS E EM ESTRUTURAS DE MADEIRA. EBRAMEM. 1995. Belo Horizonte, MG. Anais, V. 2. p.. Os autores confeccionaram BLC, da espécie D. giganteus, utilizando o mesmo adesivo usualmente empregado para madeira laminada e colada. Os autores buscaram seguir as mesmas normas adotadas para a madeira, adaptando-as ao bambu para a confecção dos corpos-de-prova e para a realização de ensaios.

Visando contribuir para o aprimoramento do estudo do BLC, Gonçalves et al. (2002)GONÇALVES, M. T. T.; PEREIRA,M. A. R.; GARBINO, L. V. Métodos de ensaio de bambu laminado. In: VIII ENCONTRO BRASILEIRO EM MADEIRA E EM ESTRUTURA DE MADEIRA, EBRAMEM. Uberlândia - MG, 2002, Anais... CD-ROM. apresentaram recomendações para a confecção dos corpos-de-prova e relataram resultados obtidos em ensaios de caracterização mecânica desse material. Este trabalho teve como objetivos pesquisar a metodologia para a preparação das taliscas de bambu e para a prensagem das lâminas obtidas, assim como determinar características físicomecânicas do Bambu Laminado Colado (BLC).

MATERIAL E MÉTODOS

Espécies utilizadas

Colmos maduros (5 anos de idade) das espécies de bambu D. giganteus (Bambu gigante) e B. vulgaris foram coletados na Fazenda Santa Elisa, pertencente ao Instituto Agronômico de Campinas (IAC). As espécies foram escolhidas em função de suas propriedades físicas e mecânicas, além da facilidade para a sua obtenção.

Preparação das taliscas

Figura 1
A) Ferramenta desenvolvida para a produção de taliscas; B) Talisca de D. giganteus; C) Talisca de B. vulgaris: região utilizada para a fabricação do BLC.
Figure 1.
A) Device designed to strips production; B) Strip from D. giganteus; C) Strip from B. vulgaris: GLB manufacturing region.

Os colmos foram cortados com moto-serra e, a seguir, transformados em taliscas, com a utilização de ferramenta apropriada (Figura 1A) para a produção de taliscas de D. giganteus (Figura 1B). Para a espécie B. vulgaris, a largura de corte produzida pela ferramenta implicava na seleção de taliscas com maior curvatura, o que iria dificultar a realização das etapas posteriores de usinagem e colagem; desse modo, para o B. vulgaris, optou-se pelo uso de uma lâmina metálica, buscando-se eliminar as camadas externas do colmo (Figura 1C), ambas refratárias aos adesivos.

As lâminas de bambu apresentavam 3 cm de largura e 30 cm de comprimento. Para o D. giganteus a espessura (em torno de 20 mm) foi controlada por meio do uso de uma plaina (Figura 2); para o B. vulgaris (devido à curvatura acentuada das taliscas) necessitou-se do uso de um dispositivo especial adaptada à uma fresa (Figura 3), apresentando as lâminas, após a usinagem, cerca de 10 mm de espessura. O dispositivo tornou-se necessário para eliminar parte do diafragma do bambu, e de camadas mais internas do colmo e de uma fina camada externa, visando facilitar a penetração do adesivo, bem como fornecer maior uniformidade às lâminas.

Figura 2
Plaina.
Figure 2
Plane.

Figura 3
Dispositivo adaptado à fresa.
Figure 3.
Device adapted to strip production.

Tratamento das taliscas

As duas espécies de bambu utilizadas são altamente susceptíveis ao ataque do caruncho. Desse modo, para evitar o ataque nas peças fabricadas, as taliscas foram submetidas a dois tipos de tratamento: imersão em água e imersão em solução de dicromato de sódio, sulfato de cobre e ácido bórico (1% em massa de cada produto), conforme recomendado por Azzini e Beraldo (2001)AZZINI A.; BERALDO A. L. Métodos práticos de tratamento do bambu. Gráfica da Unicamp. 14 p. 2001.. A duração de ambos os tratamentos foi de uma semana.

Confecção do Bambu Laminado Colado (BLC)

O BLC foi confeccionado a partir de lâminas de bambu, coladas entre si, com as fibras dispostas paralelamente ao comprimento da peça. Devido às espessuras originais das paredes dos colmos e ao processo de obtenção das taliscas, na fabricação do BLC foram utilizadas 3 lâminas para o D. giganteus e 4 lâminas para o B. vulgaris. A metodologia para a fabricação do BLC foi a mesma utilizada para a elaboração da Madeira Laminada Colada (MLC), descrita por Mantilla Carrasco et al. (1995)MANTILLA CARRASCO, E. V. M.; MOREIRA, L. E.; XAVIER, P. V. Bambu laminado e colado. In: V ENCONTRO BRASILEIRO EM MADEIRAS E EM ESTRUTURAS DE MADEIRA. EBRAMEM. 1995. Belo Horizonte, MG. Anais, V. 2. p..

Adesivos

Foram utilizados dois adesivos comerciais, aplicados com o auxílio de um pincel, indicados para prensagem a frio. Na preparação dos mesmos obedeceu-se as recomendações do fabricante:

Resorcinol-formol (marca CASCOPHEN RS216): para cada 100 partes de adesivo foram utilizadas 20 partes de preparador endurecedor FM60-M misturado à resina, até obter-se uma mistura homogênea.

Uréia-formol (marca CASCAMITE 5-H): para cada 100 partes de adesivo foram utilizadas 10 partes do preparado endurecedor M-8, 20 partes de farinha de trigo e 20 partes de água. A farinha de trigo tem a função de extensor na mistura do adesivo, com a finalidade de concorrer para o bom resultado da colagem, tanto no aspecto técnico como no econômico.

Dispositivo para efetuar a prensagem do BLC

Devido ao fato de a resina necessitar mais de 6 h para alcançar o seu endurecimento, foi utilizado um dispositivo (Figura 4A) para a confecção dos corpos-de-prova de BLC. Efetuava-se a prensagem e, com o auxílio de uma chave, apertava-se um parafuso e travava-se o conjunto (Figura 4B), após ser alcançada a pressão de 2 MPa. O material permanecia prensado durante 24 h, sendo, posteriormente, desmoldado e preparado de acordo com o ensaio considerado.

Figura 4
Fabricação do BLC. A) Dispositivo utilizado. B) Travamento da peça.
Figure 4.
GLB manufacturing. A) Device utilized. B) Pressure applied to the sample.

Ensaios aplicados aos materiais

Caracterização física

Os ensaios de teor de umidade, massa específica aparente e variações dimensionais foram conduzidos de acordo com a NBR 7190/97, adaptando-a as especificidades do bambu. Os corpos-de-prova apresentavam dimensões nominais de 2 cm x 3 cm x 5 cm.

Compressão simples

Inicialmente buscou-se avaliar o comportamento de corpos-de-prova de BLC de pequenas dimensões (2 cm x 3 cm x 5 cm); posteriormente, apenas para o BLC à base de resorcinol-formaldeído e lâminas do bambu D. giganteus tratadas quimicamente, repetiu-se o ensaio adaptando-o à NBR 7190/97 (corpos-deprova de dimensões nominais 4 cm x 4 cm x 16 cm) e, nesse caso, obteve-se, além da tensão de ruptura, a tensão no limite de proporcionalidade e o módulo de elasticidade (relógio comparador com sensibilidade de mícrons). Os ensaios foram conduzidos em máquina universal de ensaios, adotando-se se velocidade de deslocamento do cabeçote de 10 mm/min (NBR 7190/97).

Cisalhamento na superfície colada

A resistência ao cisalhamento paralelo à direção das fibras é uma característica mecânica de grande influência nas ligações, uma vez que a maioria das transmissões de carga nas ligações adesivas ocorre por esse tipo de solicitação. A tensão de cisalhamento nessa direção foi obtida de acordo com a NBR 6230/85, adaptando-a as especificidades do bambu.

Com o propósito de verificar o comportamento do bambu à essa solicitação foram ensaiados, quanto ao cisalhamento, 24 corpos-de-prova de laminado colado de bambu com dimensões nominais 2,5 cm x 3 cm x 5 cm. A confecção dos corpos-de-prova seguiu a mesma metodologia adotada por Mantilla Carrasco et al. (1995)MANTILLA CARRASCO, E. V. M.; MOREIRA, L. E.; XAVIER, P. V. Bambu laminado e colado. In: V ENCONTRO BRASILEIRO EM MADEIRAS E EM ESTRUTURAS DE MADEIRA. EBRAMEM. 1995. Belo Horizonte, MG. Anais, V. 2. p., porém, utilizando-se uma fresadora universal, com rotação de 180 rpm, usando uma fresa de topo de 10 mm de diâmetro com 4 cortes, confeccionada em aço rápido com 12% de cobalto (Figuras 5A e 5B).

O ensaio de cisalhamento na superfície colada foi realizado utilizando-se uma máquina de ensaio de CBR, com célula de carga de 5 tf. A leitura foi efetuada com o auxílio de anel dinamométrico adaptado ao torno mecânico, adotando-se velocidade de deslocamento constante e igual a 10 mm/min.

Figura 5
Preparação do corpo-de-prova na fresa: etapas A e B.
Figure 5.
Sample preparation: stages A and B.

Ensaio de cisalhamento paralelo às fibras do bambu

Este ensaio foi realizado somente para o BLC de D. giganteus, submetido ao tratamento químico e confeccionado com o adesivo resorcinolformaldeído. A forma de colagem seguiu outra metodologia, com a finalidade de acompanhar os procedimentos de ensaios da norma NBR 7190/97 para madeiras. As lâminas foram coladas em duas etapas: primeiramente confeccionou-se um bloco com 5 lâminas; em seguida, esse bloco foi unido a um outro bloco de 5 lâminas. Confeccionado o grande bloco, este foi dividido em 4 pequenos blocos nas dimensões nominais de 4 cm x 4 cm x 4 cm.

Flexão Estática

Para a determinação da tensão no limite de proporcionalidade (LP), módulo de ruptura (MOR) e módulo de elasticidade (MOE), foram realizados ensaios de flexão estática, em máquina universal de ensaios (Figura 6). Adotou-se velocidade de deslocamento de cabeçote de 10 mm/min (NBR 7190/ 97). Um software comandava a execução da máquina e permitia a aquisição dos resultados, exportandoos para uma planilha EXCEL.

Flexão dinâmica ou resistência ao impacto

Uma das possibilidades de uso para o BLC é na fabricação de cabo de ferramentas, as quais, durante sua utilização, são submetidas a esforços de impacto. Corpos-de-prova de BLC (2 cm x 2 cm x 30 cm) foram ensaiados em um equipamento tipo Pêndulo de Charpy (Figura 7), conforme procedimento descrito na NBR 6230/85.

O ensaio foi realizado apenas com taliscas de D. giganteus, tratadas quimicamente; como adesivo utilizou-se apenas o resorcinol-formaldeído.

Figura 6
Ensaio de flexão estática.
Figure 6.
Static bending test

Figura 7
Pêndulo de Charpy.
Figure 7.
Charpy´s pendulum

Tratamento estatístico

Para comparação do efeito causado pelas diversas variáveis existentes (duas espécies de bambu, dois tratamentos químicos e dois tipos de adesivos) nas características mecânicas (resistência à compressão simples para peças curtas, flexão estática e cisalhamento na superfície colada), aplicou-se a análise de variância (Statsgraphs); para a comparação das médias adotou-se o teste de Tukey (5% de significância). Para cada ensaio foram utilizadas três repetições.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Teor de umidade

Na colagem se requer que materiais lignocelulósicos apresentem um baixo teor de umidade; no presente trabalho observou-se que a faixa de variação de umidade das taliscas situou-se entre 8% e 10%, atendendo às especificações do fabricante dos adesivos, conforme descrito nas embalagens.

Massa específica aparente

Observou-se que a faixa de variação situou-se entre 0,58 g/cm3 a 0,79 g/cm3, qualificando o BLC como material leve, quando comparado com outros materiais de construção. A massa específica aparente do BLC é função da quantidade de casca deixada no colmo ou na lâmina, do tipo de adesivo utilizado, do número de camadas utilizadas na colagem e da pressão adotada, entre outras.

Os valores obtidos mostraram-se superiores àqueles relatados por Gonçalves et al. (2002)GONÇALVES, M. T. T.; PEREIRA,M. A. R.; GARBINO, L. V. Métodos de ensaio de bambu laminado. In: VIII ENCONTRO BRASILEIRO EM MADEIRA E EM ESTRUTURA DE MADEIRA, EBRAMEM. Uberlândia - MG, 2002, Anais... CD-ROM., da ordem de 0,57 g/cm3 a 0,75 g/cm3, porém, sendo, na maior parte dos casos, inferiores à densidade de colmos de D. giganteus, segundo Ghavami (1992)GHAVAMI K. Bambu: um material alternativo na Engenharia. Revista Engenharia, n. 492, p. 23-27, 1992., da ordem de 0,80 g/cm3. Cabe ressaltar que a massa específica aparente do bambu depende de vários fatores: espécie, idade do colmo, posição de amostragem ao longo da altura do colmo, teor de umidade, dentre outros. Além disso, também existe diferença significativa quando se efetua a amostragem na direção centro-periferia. Nas camadas externas (próximas à casca) ocorre maior concentração de feixes de fibras e, em conseqüência, a massa específica aparente é mais elevada. Desse modo, a forma de efetuar a usinagem influencia diretamente a massa específica aparente das taliscas. A curvatura mais acentuada dos colmos de B. vulgaris faz com que, durante a usinagem, sejam produzidas taliscas menos densas (0,52 g/ cm3) do que aquelas originárias do D. giganteus (0,88 g/cm3).

Inchamento total

De uma forma geral o BLC apresentou comportamento muito variável nesse tipo de ensaio. Deslocamentos relativos entre as lâminas de bambu e a linha de colagem conduziram a valores nem sempre esperados, denotando a inadequação do BLC quando exposto às intempéries. Alguns tratamentos (sobretudo com a uréia-formaldeído) conduziram a resultados totalmente discrepantes.

Nas Figuras 8A e 8B (referentes a taliscas tratadas quimicamente e coladas com adesivo resorcinol-formaldeído) pode-se observar que o inchamento total percentual do BLC (considerando-se a variação entre as condições saturada e anidra) dependeu de forma significativa da duração do ensaio (2 h, 24 h e 72 h) e da direção anatômica considerada (longitudinal axial, radial e tangencial). Quanto maior foi o período de imersão maior foi a variação dimensional (inchamento) do BLC. Pôde-se constatar a natureza higroscópica do material mesmo decorridas apenas 2 h de imersão, porém, a variação máxima foi observada até 24 h, tendendo o inchamento a estabilizar-se após 72 h. Quanto à direção anatômica verificou-se que, a exemplo do que ocorre nas madeiras, a variação na direção longitudinal axial foi desprezível (da ordem de 0,5%), sendo comandada apenas pela variação do bambu. Devido à pequena variação nos valores obtidos, a avaliação do inchamento nessa direção mostrou-se sensível a erros de medição (por exemplo, o inchamento após 24 h foi superior àquele obtido após 72 h). Para as demais direções ocorreu o inverso do que se observa nas madeiras, pois a variação na direção radial (da ordem de 5%) predominou sobre a tangencial (da ordem de 3%). Cabe ressaltar, no entanto, que esses dois valores médios foram muito inferiores àqueles referentes às madeiras (da ordem de 6% na direção radial e de 10% na direção tangencial, conforme obtido em www A constituição química dos adesivos influenciou fortemente os resultados de absorção do BLC, tendo o adesivo resorcinolformaldeído (cola naval) se mostrado mais indicado do que o adesivo uréia-formaldeído. O BLC à base de B. vulgaris mostrou menor absorção do que aquele à base de D. giganteus, provavelmente devido à menor espessura das lâminas utilizadas, ou devido ao fato de apresentar maior proporção de células parenquimatosas, consideradas como relativamente impermeáveis.

Compressão simples

a) Corpos-de-prova de pequenas dimensões (2 cm x 3 cm x 5 cm)

A análise estatística indicou o efeito altamente significativo da espécie de bambu (B. vulgaris mostrou-se superior ao D. giganteus) e do tratamento aplicado (tratamento em água mostrou-se superior ao tratamento químico), assim como da interação entre essas duas variáveis. Embora nesse ensaio o efeito do adesivo não tenha sido significativo, observou-se tendência de que sua interação com as outras duas variáveis (espécie de bambu e tipo de tratamento) não possa ser totalmente desprezada, pois no teste F os valores obtidos (6% para bambu x adesivo e 8% para tratamento x adesivo) situaram-se próximos à zona de aceitação (5%).

Figura 8
Inchamento em função do tempo de imersão em água para o BLC de taliscas tratadas quimicamente e coladas com adesivo resorcinol-formol. A) B. vulgaris B) D. giganteus.
Figure 8.
Swelling vs immersion time for GLB from chemical treated strips and glued with resorcine-formaldehyde. A) B. vulgaris B) D. giganteus

Não constituiu em objetivo deste trabalho analisar a interação entre os adesivos e os constituintes do bambu. No entanto, quando se efetua a imersão das taliscas em água busca-se eliminar parcialmente ou degradar o amido existente nas células parenquimatosas do bambu. O amido residual pode criar pontes de ligação com o adesivo uréia-formaldeído, no qual se mistura farinha de trigo (também rica em amido). Da mesma forma não se pode descartar a hipótese de que ocorram reações entre as substâncias preservativas aplicadas ao bambu (ácido bórico e bórax) e os constituintes dos adesivos utilizados.

Observou-se a tendência do BLC de B. vulgaris (Figura 9A) apresentar resultados médios mais elevados (46,25 MPa e 47,25 MPa, para resorcinolformaldeído e uréia-formaldeído, respectivamente) do que para aqueles de D. giganteus (Figura 9B). Uma possível explicação para a aparente superioridade do BLC de B. vulgaris pode estar relacionada à forma de fabricação do BLC, pois devido à menor espessura da parede para essa espécie, necessitou-se de maior quantidade de camadas de colagem, as quais propiciaram maior resistência ao material.

Os resultados do presente trabalho não puderam ser comparados àqueles obtidos por GONÇALVES et al. (2002)GONÇALVES, M. T. T.; PEREIRA,M. A. R.; GARBINO, L. V. Métodos de ensaio de bambu laminado. In: VIII ENCONTRO BRASILEIRO EM MADEIRA E EM ESTRUTURA DE MADEIRA, EBRAMEM. Uberlândia - MG, 2002, Anais... CD-ROM., da ordem de 55 MPa, pois embora esses autores tenham utilizado o bambu D. giganteus, não citaram o tipo de adesivo, a forma de colagem e a quantidade de lâminas utilizadas.

Figura 9
Resistência à compressão do BLC em função dos tipos de tratamentos e dos adesivos. A) B. vulgaris B) D. giganteus.
Figure 9.
Compression strength of GLB as a function of treatments and glue types. A) B. vulgaris B) D. giganteus.

b) Corpos-de-prova 4 cm x 4 cm x 16 cm

Observou-se, em relação aos resultados relativos aos corpos-de-prova de pequenas dimensões, uma elevação significativa da resistência à compressão, denotando a influência do processo de preparação dos corpos-de-prova. Para o BLC de resorcinol-formaldeído e taliscas de D. giganteus, a tensão no limite de proporcionalidade foi de 41 MPa, sendo superior àquela referente a madeiras brasileiras consideradas leves: Mogno (33 MPa), Pinus caribaea (12 MPa), Oiticica (31 MPa) e Pinus elliottii (14 MPa). A tensão de ruptura (da ordem de 74 MPa) foi superior àquelas relatadas por Gonçalves et al. (2002)GONÇALVES, M. T. T.; PEREIRA,M. A. R.; GARBINO, L. V. Métodos de ensaio de bambu laminado. In: VIII ENCONTRO BRASILEIRO EM MADEIRA E EM ESTRUTURA DE MADEIRA, EBRAMEM. Uberlândia - MG, 2002, Anais... CD-ROM. e Wetyavivorn et al. (2003), da ordem de 55 MPa e 28 MPa, respectivamente.

O módulo de elasticidade do BLC em compressão foi da ordem de 11GPa, valor este muito inferior àquele do bambu isoladamente (de 15 GPa a 20 GPa, conforme relatado por Ghavami, 1992GHAVAMI K. Bambu: um material alternativo na Engenharia. Revista Engenharia, n. 492, p. 23-27, 1992.), porém muito superior aos valores obtidos por Wethyavivorn et al. (2002)WETHYAVIVORN, B.; INPON, I. KULSUWAN, M. Behavior of the glue-laminated bamboo composite. In: Proceedings of the Nocmat/3 - Vietnam 2002, International Conference on NonConventional Materials and Technologies. Published by Construction, Publishing House, March, 2002, p. 446-451., na faixa de 3 GPa a 4 GPa. O valor médio para o módulo de elasticidade foi inferior àquele obtido por Mantilla Carrasco et al. (1995)MANTILLA CARRASCO, E. V. M.; MOREIRA, L. E.; XAVIER, P. V. Bambu laminado e colado. In: V ENCONTRO BRASILEIRO EM MADEIRAS E EM ESTRUTURAS DE MADEIRA. EBRAMEM. 1995. Belo Horizonte, MG. Anais, V. 2. p., da ordem de 18 GPa. Os autores utilizaram para a confecção de seus corpos-de-prova a mesma espécie de bambu, o mesmo tipo de adesivo embora não se saiba qual foi a densidade superficial de aplicação de adesivo utilizado, e a forma de colagem do laminado. Além disso, os autores adotaram um maior número de lâminas. O resultado obtido no trabalho destes autores pode estar diretamente relacionado com a menor retirada de material das camadas externas (mais densas).

Flexão estática

Contrariamente ao que foi observado nos resultados do ensaio de compressão, a análise de variância para o ensaio de flexão estática indicou que apenas o efeito do adesivo (uréia-formaldeído mostrou-se superior ao resorcinol-formaldeído) e de sua interação com o tratamento químico foram altamente significativos. Tal fato pode ser atribuído em parte à diferença de viscosidade entre os adesivos. O adesivo uréia-formaldeído, por apresentar menor viscosidade, impregnou de forma mais eficiente as taliscas de bambu, reduzindo o efeito negativo da interface.

Para alguns corpos-de-prova observou-se descolamento de lâminas, quando da utilização do resorcinol-formaldeído. Este fato também foi observado por Wethyavivorn et al. (2002)WETHYAVIVORN, B.; INPON, I. KULSUWAN, M. Behavior of the glue-laminated bamboo composite. In: Proceedings of the Nocmat/3 - Vietnam 2002, International Conference on NonConventional Materials and Technologies. Published by Construction, Publishing House, March, 2002, p. 446-451., realizando ensaio com a mesma quantidade de lâminas e mesmo tipo de colagem, embora o trabalho não informe o tipo de adesivo utilizado. Esse comportamento pode ser explicado pelo acúmulo de adesivo, que trabalhou de forma diferente das taliscas de bambu. Outra possibilidade refere-se à viscosidade do adesivo. O BLC mostrou ruptura dúctil, o que o favorece, em termos de segurança, para aplicações estruturais. O módulo de ruptura para o BLC situou-se na faixa de 40 MPa a 70 MPa (Figuras 7 e 8), valores esses inferiores àqueles relatados por Gonçalves et al. (2002)GONÇALVES, M. T. T.; PEREIRA,M. A. R.; GARBINO, L. V. Métodos de ensaio de bambu laminado. In: VIII ENCONTRO BRASILEIRO EM MADEIRA E EM ESTRUTURA DE MADEIRA, EBRAMEM. Uberlândia - MG, 2002, Anais... CD-ROM. e Wethyavivorn et al. (2002)WETHYAVIVORN, B.; INPON, I. KULSUWAN, M. Behavior of the glue-laminated bamboo composite. In: Proceedings of the Nocmat/3 - Vietnam 2002, International Conference on NonConventional Materials and Technologies. Published by Construction, Publishing House, March, 2002, p. 446-451., da ordem de 166 MPa e 94 MPa, respectivamente.

Figura 10
Resistência em flexão estática do BLC em função dos tipos de tratamentos e dos adesivos. A) B. vulgaris B) D. giganteus.
Figure 10.
Flexure strength as a function of treatment and glues types. A) B. vulgaris B) D. giganteus.

Cisalhamento paralelo à linha de colagem

A análise de variância indicou influência altamente significativa da espécie de bambu (D. giganteus mostrou-se superior ao B. vulgaris); os efeitos do tratamento químico e do tipo de adesivo, embora não fossem significativos (6% e 9%, respectivamente), situaram-se muito próximos da zona de aceitação (5%). A interação entre a espécie de bambu e o tipo de tratamento também foi altamente significativa.

Nas figuras 11A e 11B pode-se verificar que os valores obtidos situaram-se na faixa de 2,25 MPa (B. vulgaris + tratamento em água e adesivo uréiaformaldeído) a 4,60 MPa (D. giganteus + tratamento em água e adesivo resorcinol-formaldeído). Os resultados mostraram-se muito aquém daqueles citados na literatura; para Wetyavivorn et al. (2003) e Gonçalves et al. (2002)GONÇALVES, M. T. T.; PEREIRA,M. A. R.; GARBINO, L. V. Métodos de ensaio de bambu laminado. In: VIII ENCONTRO BRASILEIRO EM MADEIRA E EM ESTRUTURA DE MADEIRA, EBRAMEM. Uberlândia - MG, 2002, Anais... CD-ROM. os resultados foram de 7,5 MPa e 10,0 MPa, respectivamente. Além de fatores relacionados à quantidade de lâminas utilizadas, e à massa específica aparente das taliscas, outra possível explicação para tal fato pode ser atribuída à forma de execução do corpos-de-prova, pois no presente trabalho valeu-se do fresamento, o que poderia ter causado imperfeições na linha de colagem devido à vibração provocada durante a usinagem dos corpos-de-prova.

Cisalhamento paralelo às fibras do bambu

O BLC ensaiado (D. giganteus, tratamento químico e adesivo resorcinol-formaldeído) apresentou valores médios da ordem de 20,0 MPa, valores esses superiores àqueles de madeiras usualmente empregadas na construção, tais como, Maçaranduba (14,9 MPa), Guarucaia (15,5 MPa) e Jatobá (15,7 MPa). Estes resultados sugerem que o BLC possa vir a ser um material adequado para a fabricação de cavilhas.

Figura 11
Resistência ao cisalhamento paralelo à linha de colagem do BLC em função dos tipos de tratamentos e dos adesivos. A) B. vulgaris B) D. giganteus.
Figure 11.
Shear strength as a function of treatment and glue types. A) B. vulgaris B) D. giganteus.

Flexão dinâmica

O BLC de D. giganteus, tratado quimicamente e com o adesivo resorcinol-formaldeído mostrou comportamento que o qualifica para ser utilizado em aplicações sujeitas a choques de intensidade moderada, tais como cabos de ferramentas e de utensílios domésticos. O valor médio da cota dinâmica (da ordem de 0,75) enquadra o BLC na categoria de “madeira” com moderada resistência ao choque.

CONCLUSÕES

O BLC pode ser considerado um material leve com massa específica aparente situada na faixa de 0,50 g/cm3 a 0,75 g/cm3.

Observou-se tendência de que o BLC de resorcinol-formaldeído (adesivo naval) tenha se mostrado mais estável dimensionalmente do que o BLC de uréia-formaldeído. A impermeabilização da superfície do BLC deve ser buscada visando sua proteção contra as intempéries.

A análise estatística indicou a influência das variáveis testadas (espécies de bambu, tipos de tratamentos e de adesivos) e de suas interações nas propriedades do BLC.

Não foi possível evidenciar a melhor combinação entre as variáveis (espécie de bambu, tratamento químico e tipo de adesivo) e que atendesse a todas as propriedades avaliadas do BLC.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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  • ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS - ABNT. Rio de Janeiro. NBR 7190. Projeto de estruturas de madeira. Anexo B. Ensaios de caracterização. 1997.
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    03 Nov 2023
  • Data do Fascículo
    Apr-Jun 2003
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