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Comunidades de pertencimento, desinformação e antagonismo: processos interacionais em grupos antivacina no Telegram no Brasil1 1 Este artigo foi realizado no escopo do Instituto Nacional de Comunicação Pública da Ciência e Tecnologia, com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ) e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Contou também com apoio do CNPq: Chamada Proep–COC-CNPq 2021, Chamada CNPq/MCTI Nº 10/2023 - UNIVERSAL e Chamada CNPq n.º 14/2023 – Apoio a Projetos Internacionais de Pesquisa Científica, Tecnológica e de Inovação. Pela Faperj contou com o PPSUS, Projetos Temáticos e Jovem Pesquisador Fluminense. Maia agradece à Fundação Oswaldo Cruz pela bolsa de pós-doutorado do Programa Inova Fiocruz. Massarani e Oliveira agradecem ao CNPq, respectivamente, pela bolsa de Produtividade em Pesquisa 1B e Produtividade em Pesquisa 2. Massarani e Oliveira agradecem ainda à Faperj pelo Cientista do Nosso Estado e Jovem Cientista do Nosso Estado.

Communities of belonging, disinformation, and antagonism: interactional processes in anti-vaccine groups on Telegram in Brazil

Resumo

Neste artigo, analisamos os processos interacionais presentes em grupos antivacina no Telegram no Brasil. Usando descritores associados ao tema da vacina e à contestação vacinal, identificamos sete grupos que abordaram a questão vacinal de janeiro a março de 2021, período que corresponde aos primeiros meses da vacinação contra a Covid-19 no Brasil. Utilizando o método da Teoria Fundamentada, realizamos uma análise qualitativa das conversas tecidas nos grupos estudados. Os resultados mostram que essas interações estão centradas em três eixos principais que revelam: 1) a formação de um senso de comunidade, envolvendo processos de ajuda mútua, reconhecimento de pares, deliberações sobre o grupo e a rede antivacina, testemunhais e suporte afetivo; 2) o processo de elaboração de uma identidade marcada pela diferença em relação à alteridade; e 3) o gerenciamento de processos de hesitação e dissenso, que podem resultar em rupturas no grupo. A compreensão desses processos, a partir do contexto brasileiro, visa contribuir com o desenvolvimento de estratégias de enfrentamento da desinformação quanto à saúde e vacinas.

Palavras-chave
Telegram; vacinas; processos interacionais; Covid-19

Abstract

In this article, we analyze the interactional processes in anti-vaccine groups on Telegram in Brazil. Using descriptors associated with the vaccine topic and vaccine criticism, we identified seven groups that addressed the vaccine issue from January to March 2021, the first months of vaccination against Covid-19 in Brazil. Using the Grounded Theory method, we conducted a qualitative analysis of the conversations held in the studied groups. The results show that these interactions are centered around three main axes that reveal: 1) the formation of a sense of community, involving processes of mutual aid, recognition of peers, deliberations about the group and the anti-vaccine network, testimonials, and emotional support; 2) the process of elaborating an identity marked out by difference in relation to alterity; 3) the management of hesitancy and dissent processes, which can result in group ruptures. The understanding of these processes, from the perspective of the Brazilian context, aims to contribute to the development of strategies to combat misinformation regarding health and vaccines.

Keywords
Telegram; vaccines; interactional processes; Covid-19

Introdução

A pandemia de Covid-19, que assolou o mundo em 2020, provocou uma corrida pelo desenvolvimento de imunizantes para a contenção da crise sanitária causada pelo novo coronavírus. De modo que, em dezembro de 2020, a primeira vacina já estava pronta para uso. No Brasil, a campanha de imunização começou em janeiro de 2021 e foi marcada por embates políticos, desinformação e ausência de alinhamento entre as autoridades governamentais (Monari e Sacramento, 2021MONARI, Ana Carolina; SACRAMENTO, Igor. A “vacina chinesa de João Doria”: a influência da disputa política-ideológica na desinformação sobre a vacinação contra a Covid-19. Revista Mídia e Cotidiano, [s. l.], v. 15, n. 3, p. 125-143, 2021.; Recuero e Soares, 2022RECUERO, Raquel; SOARES, Felipe. #VACHINA: How Politicians Help to Spread Disinformation About COVID-19 Vaccines. Journal of Digital Social Research, [s. l.], p. 73-97, 2022.). Não obstante a isso, o Brasil alcançou alto índice de vacinação contra a Covid-19 em comparação com outros países (cerca de 81%), ainda que a adesão às doses de reforço tenha sido mais reduzida (Our World in Data, 2023OUR WORLD IN DATA (2023). Coronavirus (COVID-19) Vaccinations. Ourworldindata, Oxford. Disponível em: https://ourworldindata.org/covid-vaccinations. Acesso em: 01 dez. 2023.
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).

Nesse contexto, em pesquisa quanto à confiança na ciência, foi possível identificar que a maioria dos brasileiros apresenta uma visão positiva sobre as vacinas contra a Covid-19 (Massarani et al., 2022MASSARANI, Luisa et al. Confiança na Ciência no Brasil em Tempos de Pandemia - Resumo executivo. [S. l.]: Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Comunicação Pública da Ciência e Tecnologia (INCT-CPCT), 2022. Disponível em: https://www.inct-cpct.ufpa.br/wp-content/uploads/2022/12/Resumo_executivo_Confianca_Ciencia_VF_Ascom_5-1.pdf.
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). Mas 46% dos entrevistados acreditam que elas produzem efeitos colaterais que representam um risco para a saúde e 40% desconfiam que as empresas farmacêuticas estariam escondendo os perigos das vacinas (Massarani et al., 2022MASSARANI, Luisa et al. Confiança na Ciência no Brasil em Tempos de Pandemia - Resumo executivo. [S. l.]: Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Comunicação Pública da Ciência e Tecnologia (INCT-CPCT), 2022. Disponível em: https://www.inct-cpct.ufpa.br/wp-content/uploads/2022/12/Resumo_executivo_Confianca_Ciencia_VF_Ascom_5-1.pdf.
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). Esses dados revelam que, ainda que haja entre os brasileiros um alto nível de aceitação das vacinas, há também uma escalada de desconfianças e carência de informações adequadas, o que pode ser influência do clima de conflito e incerteza, derivado dos embates políticos e da circulação de desinformação em plataformas digitais na pandemia (Galhardi et al., 2022GALHARDI, Cláudia Pereira et al. Fake News and vaccine hesitancy in the COVID-19 pandemic in Brazil. Ciência & Saúde Coletiva, [s. l.], v. 27, n. 5, p. 1849-1858, 2022.; Massarani et al., 2022MASSARANI, Luisa et al. Confiança na Ciência no Brasil em Tempos de Pandemia - Resumo executivo. [S. l.]: Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Comunicação Pública da Ciência e Tecnologia (INCT-CPCT), 2022. Disponível em: https://www.inct-cpct.ufpa.br/wp-content/uploads/2022/12/Resumo_executivo_Confianca_Ciencia_VF_Ascom_5-1.pdf.
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).

Assim, merece especial destaque o crescimento de grupos de contestação às vacinas em plataformas como o Telegram. Fundado em 2013, esse aplicativo de troca de mensagens se destaca como sexta mídia social mais usada no Brasil (Statista, 2023STATISTA. Brazil: leading social media platforms 2022. [S. l.], 2023. Disponível em: https://www. statista.com/statistics/1307747/social-networks-penetration-brazil/. Acesso em: 19 set. 2023.
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) e como um dos protagonistas no ecossistema de comunicação dos grupos políticos de extrema direita no país (Nascimento, Cesarino, Fonseca, 2022NASCIMENTO, Leonardo F et al. Públicos refratados: grupos de extrema-direita brasileiros na plataforma Telegram. Internet & Sociedade, [s. l.], p. 31-60, 2022.). Além disso, o Telegram tem despertado a preocupação de autoridades e pesquisadores em razão de sua leniência no combate a conteúdos enganosos de ordem sanitária e política (Nascimento et al., 2022NASCIMENTO, Leonardo F et al. Públicos refratados: grupos de extrema-direita brasileiros na plataforma Telegram. Internet & Sociedade, [s. l.], p. 31-60, 2022.) e de sua falta de colaboração no sentido de responsabilizar agentes difusores de desinformação (Monari, 2021MONARI, Ana Carolina Pontalti. “Verdades divididas” sobre a Covid-19: o uso do canal do Telegram de Bolsonaro como registro oficial do governo. Cadernos de História da Ciência, [s. l.], v. 15, 2021.).

Contudo, mesmo diante da relevância que esse aplicativo vem adquirindo no debate público, há ainda uma escassez de estudos dedicados ao seu uso no Brasil (um estudo sobre o tema que merece destaque é Nascimento et al., 2022NASCIMENTO, Leonardo F; CESARINO, Letícia; FONSECA, Paulo. Democracia digital: análise dos ecossistemas de desinformação no Telegram durante o processo eleitoral brasileiro de 2022. InternetLab, São Paulo, 2022. Disponível em: https://internetlab.org.br/wp-content/uploads/2022/08/telegram-01-relatorio-06-1.pdf. Acesso em: 14 mar. 2024.
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). Além disso, ainda que o contexto da pandemia tenha fomentado a produção de investigações sobre narrativas e argumentos utilizados por grupos e atores que contestam as vacinas no país (Costa e Silva, 2022COSTA, Tainá de Almeida; SILVA, Eunice Almeida da. Narrativas antivacinas e a crise de confiança em algumas instituições. Revista Eletrônica de Comunicação, Informação & Inovação em Saúde, [s. l.], v. 16, n. 2, 2022.; Kleina e Sampaio, 2021KLEINA, Nilton; SAMPAIO, Rafael. “Não sou eu quem está falando”: A retórica de autoridade em vlogs da Direita brasileira no YouTube sobre a vacina contra a COVID-19. Revista ECO-Pós, [s. l.], v. 24, n. 2, p. 175-200, 2021.; Monari e Sacramento, 2021MONARI, Ana Carolina; SACRAMENTO, Igor. A “vacina chinesa de João Doria”: a influência da disputa política-ideológica na desinformação sobre a vacinação contra a Covid-19. Revista Mídia e Cotidiano, [s. l.], v. 15, n. 3, p. 125-143, 2021.), há uma lacuna de investigações sobre os processos interacionais que conformam esses grupos. Em estudo anterior sobre como circula a temática das vacinas contra a Covid-19 no Telegram, identificamos quatro grupos com posições abertamente contrárias à vacinação, os quais apresentavam três linhas argumentativas na contestação aos imunizantes: 1) receios quanto à segurança e eficácia, 2) alegações de que existem interesses obscuros na gestão da pandemia e no desenvolvimento das vacinas e 3) defesa da liberdade e privacidade (Maia et al., 2023MAIA, Lídia Raquel Herculano et al. A contestação às vacinas contra Covid-19 em grupos do Telegram no Brasil. Intexto, [s. l.], n. 55, p. 127361, 2023. DOI: 10.19132/1807-8583.55.127361.
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). Nesse primeiro artigo, observamos a existência de regularidades interacionais na formação desses argumentos. Contudo, dado o foco nos argumentos que apareciam nas mensagens, o exame dessas processualidades não foi realizado.

Neste artigo, buscamos contribuir com a construção de um panorama mais amplo sobre a questão, a partir da observação das lógicas interacionais presentes nos grupos de contestação às vacinas no Telegram no Brasil. Para tanto, realizamos uma busca por descritores associados ao tema da vacina e à contestação vacinal, identificando sete grupos que abordaram o assunto no intervalo de janeiro a março de 2021, período que corresponde ao início da vacinação contra a Covid-19 no Brasil. A proposta é analisar a atuação desses grupos para identificar os processos que desenvolvem no sentido de fortalecimento e disseminação das críticas às vacinas no contexto brasileiro.

Hesitação vacinal, ativismo antivacina e Telegram

O Brasil tem uma tendência histórica de aceitação vacinal, o que pode ser atribuído especialmente ao sucesso do Programa Nacional de Imunização (PNI), que foi criado em 1973 e tem sido determinante para o enfrentamento de problemas de saúde pública relacionados às doenças imunopreveníveis (Maciel et al., 2022MACIEL, Ethel et al. A campanha de vacinação contra o SARS-CoV-2 no Brasil e a invisibilidade das evidências científicas. Ciência & Saúde Coletiva, [s. l.], v. 27, n. 3, p. 951-956, 2022.). Contudo, nos últimos anos, tem havido uma queda nas taxas de cobertura vacinal dos brasileiros, que passou de 95,07% em 2015 para 67,90% em 2022 (DATASUS, s.d.DATASUS. TabnetBD 1.0 - Imunizações - Cobertura - Brasil. Disponível em: http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/webtabx.exe?bd_pni/cpnibr.def. Acesso em: 3 maio 2023.
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). É importante ressaltar, porém, que a não vacinação nem sempre é resultado de hesitação vacinal, definida como um fenômeno complexo originado por grupos heterogêneos que podem apresentar desde atitudes de dúvidas e postergação até a completa recusa e oposição a algumas vacinas (Sato, 2018SATO, Ana Paula Sayuri. Qual a importância da hesitação vacinal na queda das coberturas vacinais no Brasil? Revista de Saúde Pública, [s. l.], v. 52, p. 96, 2018.).

Entre os vários fatores que envolvem o problema da queda na cobertura vacinal no Brasil, destacam-se: as limitações do Sistema Único de Saúde, o enfraquecimento de campanhas educativas, a percepção enganosa de que a vacinação não é mais necessária (em razão justamente do êxito do PNI em erradicar doenças como a poliomielite), as notícias falsas sobre a vacinação e, possivelmente, o crescimento de comunidades de contestação às vacinas (Sato, 2018SATO, Ana Paula Sayuri. Qual a importância da hesitação vacinal na queda das coberturas vacinais no Brasil? Revista de Saúde Pública, [s. l.], v. 52, p. 96, 2018.; Maia et al., 2023MAIA, Lídia Raquel Herculano et al. A contestação às vacinas contra Covid-19 em grupos do Telegram no Brasil. Intexto, [s. l.], n. 55, p. 127361, 2023. DOI: 10.19132/1807-8583.55.127361.
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). Durante a pandemia, esses fatores se somaram à conjuntura de politização das vacinas; à desestruturação no programa de vacinação, resultante da sobrecarga do sistema de saúde e do descaso do então governo federal com políticas públicas de saúde (Maciel et al., 2022MACIEL, Ethel et al. A campanha de vacinação contra o SARS-CoV-2 no Brasil e a invisibilidade das evidências científicas. Ciência & Saúde Coletiva, [s. l.], v. 27, n. 3, p. 951-956, 2022.); e à circulação de críticas quanto aos imunizantes por parte de lideranças políticas, como o então presidente Jair Bolsonaro (Galhardi et al., 2022GALHARDI, Cláudia Pereira et al. Fake News and vaccine hesitancy in the COVID-19 pandemic in Brazil. Ciência & Saúde Coletiva, [s. l.], v. 27, n. 5, p. 1849-1858, 2022.).

Ao longo da crise sanitária, Bolsonaro minimizou a gravidade da doença, promoveu medicamentos sem comprovação científica, demitiu dois ministros da saúde, atacou governadores que estabeleceram medidas de contenção do vírus, questionou a atuação de institutos de pesquisa e órgãos regulatórios e criticou as vacinas (Gramacho e Turgeon, 2021GRAMACHO, Wladimir G.; TURGEON, Mathieu. When politics collides with public health: COVID-19 vaccine country of origin and vaccination acceptance in Brazil. Vaccine, [s. l.], v. 39, n. 19, p. 2608-2612, 2021.; Monari, 2021MONARI, Ana Carolina; SACRAMENTO, Igor. A “vacina chinesa de João Doria”: a influência da disputa política-ideológica na desinformação sobre a vacinação contra a Covid-19. Revista Mídia e Cotidiano, [s. l.], v. 15, n. 3, p. 125-143, 2021.; Soares et al., 2021SOARES, Felipe Bonow et al. Desinformação sobre o Covid-19 no WhatsApp: a pandemia enquadrada como debate político. Ciência da Informação em Revista, [s. l.], v. 8, n. 1, p. 74-94, 2021.). Esse cenário contribuiu para a criação de um sentimento de desconfiança em relação às vacinas no país, especialmente entre seus apoiadores, como mostra um estudo realizado por Gramacho e Turgeon (2021)GRAMACHO, Wladimir G.; TURGEON, Mathieu. When politics collides with public health: COVID-19 vaccine country of origin and vaccination acceptance in Brazil. Vaccine, [s. l.], v. 39, n. 19, p. 2608-2612, 2021.. Os autores entrevistaram 2.771 brasileiros para medir a aceitação das vacinas contra a Covid-19 oriundas de diferentes países e descobriram que, embora houvesse uma predisposição em aderir à vacinação, havia, especialmente entre os apoiadores de Bolsonaro, um sentimento de rejeição à CoronaVac (vacina de origem chinesa desenvolvida em parceria com o Butantan), que foi alvo de embates entre o então presidente brasileiro e o governador de São Paulo João Doria.

Essa politização da pandemia pode ter interferido também nas percepções criadas pela população em torno do trabalho dos cientistas brasileiros. Em pesquisa sobre a confiança na ciência no Brasil, Massarani et al. (2022, p. 12)MASSARANI, Luisa et al. Confiança na Ciência no Brasil em Tempos de Pandemia - Resumo executivo. [S. l.]: Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Comunicação Pública da Ciência e Tecnologia (INCT-CPCT), 2022. Disponível em: https://www.inct-cpct.ufpa.br/wp-content/uploads/2022/12/Resumo_executivo_Confianca_Ciencia_VF_Ascom_5-1.pdf.
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identificaram que, embora um pouco mais da metade dos brasileiros (51,8%) perceba a ciência como responsável por “muitos benefícios”, cresceu o número de pessimistas (40%) que enxergam “muitos (12,5%) ou alguns riscos (27,5%) no empreendimento científico”. Além disso, um em cada três brasileiros demonstra desconfiança em relação aos cientistas do país, 44,6% dos entrevistados consideram que eles ofereceram informações contraditórias ou tendenciosas na pandemia, e 54,5% acreditam que eles permitiram a influência de ideologias políticas em suas investigações sobre o coronavírus (Massarani et al., 2022). Massuchin et al. (2021)MASSUCHIN, Michele Goulart et al. A estrutura argumentativa do descrédito na ciência: uma análise de mensagens de grupos bolsonaristas de WhatsApp na pandemia da COVID-19. Fronteiras - estudos midiáticos, [s. l.], v. 23, n. 2, p. 160-174, 2021. comentam que o declínio da confiança nesses atores de instituições epistêmicas contribui para o avanço da desinformação, aqui entendida como o ato de criar ou compartilhar informações falsas com o objetivo de enganar as pessoas (Wardle e Derakhshan, 2017WARDLE, Claire; DERAKHSHAN, Hossein. Information disorder: Toward an interdisciplinary framework for research and policymaking. [S. l.]: Council of Europe Strasbourg, 2017. v. 27.).

Nesse contexto, vemos uma reestruturação no ambiente epistêmico contemporâneo, a partir da ascensão de novos regimes de verdade (Garcia, Evangelista Cunha, Oliveira, 2021GARCIA, Marcelo; EVANGELISTA CUNHA, Simone; OLIVEIRA, Thaiane. Regimes de verdade na pandemia de Covid-19: discursos científicos e desinformativos em disputa no Youtube. Fronteiras - estudos midiáticos, [s. l.], v. 23, n. 2, p. 104–117, 2021. DOI: https://doi.org/10.4013/fem.2021.232.08.
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; Oliveira, 2020OLIVEIRA, Thaiane. Desinformação científica em tempos de crise epistêmica: Circulação de teorias da conspiração nas plataformas de mídias sociais. Fronteiras - estudos midiáticos, v. 22, n. 1, p. 21–35, 2020. https://doi.org/10.4013/fem.2020.221.03.
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) ancorados mais na experiência pessoal, nos sentidos imediatos, no pertencimento identitário e em teorias conspiratórias do que nos conhecimentos gerados pelos campos sociais legítimos (Cesarino, 2021CESARINO, Letícia. Pós-verdade e a crise do sistema de peritos: uma explicação cibernética. Ilha Revista de Antropologia, [s. l.], v. 23, n. 1, p. 73-96, 2021.; Van Zoonen, 2012VAN ZOONEN, Liesbet. I-Pistemology: Changing truth claims in popular and political culture. European Journal of Communication, [s. l.], v. 27, n. 1, p. 56-67, 2012.). Teorias da conspiração geralmente aparecem em momentos de crise social, que geram incerteza e medo coletivo, e partem de tentativas de explicar de maneira simples eventos ou situações sociais e políticas complexas com base em ideias de tramas secretas lideradas por atores poderosos (Caycho-Rodríguez et al., 2022CAYCHO-RODRÍGUEZ, Tomás et al. What Is the Support for Conspiracy Beliefs About COVID-19 Vaccines in Latin America? A Prospective Exploratory Study in 13 Countries. Frontiers in Psychology, [s. l.], v. 13, p. 855713, 2022.; Douglas et al., 2019DOUGLAS, Karen M. et al. Understanding Conspiracy Theories. Political Psychology, [s. l.], v. 40, n. S1, p. 3-35, 2019.).

Essas teorias ganham força também pela emergência de câmaras de eco, que se estruturam sobretudo nas plataformas digitais e operam por meio do “reforço de uma narrativa específica e redução da circulação de conteúdo heterogêneo” (Recuero, Soares, Zago, 2021RECUERO, Raquel; SOARES, Felipe; ZAGO, Gabriela. Polarização, Hiperpartidarismo e Câmaras de Eco: Como circula a Desinformação sobre Covid-19 no Twitter. Revista Contracampo, [s. l.], v. 40, n. 1, 2021., p. 5). Em análise de websites de ativismo antivacina, Kata (2012)KATA, Anna. Anti-vaccine activists, Web 2.0, and the postmodern paradigm – An overview of tactics and tropes used online by the anti-vaccination movement. Vaccine, [s. l.], v. 30, n. 25, p. 3778-3789, 2012. observou essa tendência à formação de câmaras de eco, fomentadas não apenas pela estrutura das redes, mas também pelo comportamento autoritário de membros desse movimento, que não hesitam em censurar e atacar opiniões contrárias.

Por outro lado, há também nessas redes antivacina a possibilidade de formação de lógicas interacionais (Braga et al., 2017BRAGA, José Luiz et al. Matrizes interacionais: a comunicação constrói a sociedade. [S. l.]: EDUEPB, 2017.) comunitárias. Nesse sentido, Dhaliwal e Mannion (2020)DHALIWAL, Dhamanpreet; MANNION, Cynthia. Antivaccine Messages on Facebook: Preliminary Audit. JMIR Public Health and Surveillance, [s. l.], v. 6, n. 4, p. e18878, 2020., em análise dos posts, comentários e links de websites compartilhados em quatro páginas do movimento antivacina norte-americano no Facebook, identificaram que o sentimento de pertencimento a um grupo de pessoas com crenças semelhantes produzia nos membros um senso de comunidade, que os conduzia a processos reiterados de ajuda mútua, que iam desde a defesa dos argumentos dos pares até a doação de dinheiro para autópsias privadas de cadáveres de crianças cujos pais não aceitavam os laudos oficiais das mortes e queriam vincular o acontecimento às vacinas. As pesquisadoras observaram ainda um alto nível de confiança nas recomendações dos membros, indicações de medicações alternativas e caseiras para o tratamento de doenças virais, a descrença na classe médica e nos governantes e debates em torno da questão da liberdade em oposição à obrigatoriedade das vacinas.

No contexto brasileiro, Costa e Silva (2022)COSTA, Tainá de Almeida; SILVA, Eunice Almeida da. Narrativas antivacinas e a crise de confiança em algumas instituições. Revista Eletrônica de Comunicação, Informação & Inovação em Saúde, [s. l.], v. 16, n. 2, 2022. e Brotas et al. (2021)BROTAS, Antonio Marcos Pereira et al. Discurso antivacina no YouTube: a mediação de influenciadores. Revista Eletrônica de Comunicação, Informação & Inovação em Saúde, [S. l.], v. 15, n. 1, 2021. DOI: 10.29397/reciis.v15i1.2281.
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também identificaram que as narrativas antivacina estavam relacionadas sobretudo ao argumento da liberdade e a desconfianças em torno das instituições democráticas e epistêmicas. Em análise do canal do Telegram de Bolsonaro como registro oficial do governo, Monari (2021)MONARI, Ana Carolina; SACRAMENTO, Igor. A “vacina chinesa de João Doria”: a influência da disputa política-ideológica na desinformação sobre a vacinação contra a Covid-19. Revista Mídia e Cotidiano, [s. l.], v. 15, n. 3, p. 125-143, 2021. observou ainda o discurso da vacinação não compulsória contra a Covid-19 em favor da liberdade individual como um dos posts mais frequentes entre os que circulavam naquele espaço.

Nascimento et al. (2022, p. 36)NASCIMENTO, Leonardo F et al. Públicos refratados: grupos de extrema-direita brasileiros na plataforma Telegram. Internet & Sociedade, [s. l.], p. 31-60, 2022. apontam que, nos últimos anos, o Telegram tem se constituído como um refúgio importante para “a extrema direita e redes de desinformação a ela associadas”. Os autores comentam que dois conjuntos de acontecimentos históricos contribuíram para o crescimento desse aplicativo de mensagens entre os públicos mencionados: a ascensão de governos de extrema-direita em diversos países e a crise sanitária provocada pelo novo coronavírus. A atuação desses grupos extremistas, no sentido de desinformar a população e atacar as instituições democráticas e epistêmicas, durante esses acontecimentos, levou à suspensão ou ao banimento de suas atividades em algumas plataformas digitais. A Meta, por exemplo, afirmou que, entre 2020 e 2021, removeu mais de 1 milhão de conteúdos no Brasil, no Facebook e Instagram, que apresentavam desinformação sobre a Covid-19 (Meta, 2021META. Facebook e Instagram removem mais de 1 milhão de conteúdos no Brasil com desinformação grave sobre COVID-19. In: NEWSROOM. 11 nov. 2021. Disponível em: https://about.fb.com/br/news/2021/11/facebook-e-instagram-removem-mais-de-1-milhao-de-conteudos-no-brasil-com-desinformacao-grave-sobre-covid-19/. Acesso em: 01 dez. 2023.
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). Não obstante, a eficácia desse tipo de ação é limitada, tendo em vista que, para escapar da moderação das gigantes tecnológicas, tais grupos migraram para plataformas que prometem privacidade e liberdade de expressão irrestrita (Santos Júnior, 2021SANTOS JÚNIOR, Marcelo Alves. Clones do YouTube: Replataformização da irrealidade e infraestruturas de desinformação sobre a Covid-19. Fronteiras - estudos midiáticos, v. 23, n. 2, p. 140–159., 2021. https://doi.org/10.4013/fem.2021.232.10.
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), como o Telegram.

Assim, algumas características específicas fazem do Telegram um espaço profícuo para a atividade de grupos extremistas e a circulação de desinformação, tais como: os recursos de anonimato, pois, ainda que seja preciso inserir um número de telefone para usar o aplicativo, tal informação pode ser mantida em sigilo, bastando apenas criar um codinome para interagir em chats, grupos e canais; a visibilidade conferida pela possibilidade de criação de grupos (públicos ou privados) com até 200 mil membros e de canais com número ilimitado de inscritos, que podem ser localizados pelo mecanismo de busca do próprio Telegram; os recursos de criptografia, que permitem o apagamento das mensagens sem deixar rastros e sem limite de tempo após o envio, o que dificulta a responsabilização pelo conteúdo compartilhado; os mecanismos de automação que favorecem a ação de bots; e a permanência de arquivos (como vídeos) que, mesmo tendo sido banidos de outras plataformas, podem circular livremente em um número irrestrito de chats e grupos no Telegram (Maia et al., 2023MAIA, Lídia Raquel Herculano et al. A contestação às vacinas contra Covid-19 em grupos do Telegram no Brasil. Intexto, [s. l.], n. 55, p. 127361, 2023. DOI: 10.19132/1807-8583.55.127361.
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; Nascimento et al., 2021NASCIMENTO, Leonardo F. et al. Poder oracular e ecossistemas digitais de comunicação: a produção de zonas de ignorância durante a pandemia de Covid-19 no Brasil. Fronteiras - estudos midiáticos, [s. l.], v. 23, n. 2, p. 190-206, 2021.; Rogers, 2020ROGERS, Richard. Deplatforming: Following extreme Internet celebrities to Telegram and alternative social media. European Journal of Communication, [s. l.], v. 35, n. 3, p. 213-229, 2020.; Fonseca, Ribeiro, Nascimento, 2022FONSECA, Paulo F. C.; RIBEIRO, Barbara E.; NASCIMENTO, Leonardo F. Demarcating Patriotic Science on Digital Platforms: Covid-19, Chloroquine and the Institutionalisation of Ignorance in Brazil. Science as Culture, [s. l.], v. 31, n. 4, p. 530-554, 2022.).

Nascimento et al. (2022)NASCIMENTO, Leonardo F et al. Públicos refratados: grupos de extrema-direita brasileiros na plataforma Telegram. Internet & Sociedade, [s. l.], p. 31-60, 2022. destacam que essas affordances possibilitam, ao mesmo tempo, privacidade e publicidade, demandas inseridas no “dilema do terrorista” (Rogers, 2020ROGERS, Richard. Deplatforming: Following extreme Internet celebrities to Telegram and alternative social media. European Journal of Communication, [s. l.], v. 35, n. 3, p. 213-229, 2020., p. 5), o qual precisa de discrição nas suas atividades para se proteger contra sanções e regulações, enquanto busca a visibilidade necessária ao recrutamento de novos membros. Assim, o Telegram tem se tornado um ambiente privilegiado para a atividade de contestação às vacinas por sua capacidade de oferecer anonimato, segurança, capilaridade e visibilidade para as pautas desses grupos.

Procedimentos metodológicos

O percurso metodológico desta investigação começou a partir de outro estudo em que analisamos as características do discurso de contestação às vacinas contra Covid-19 em grupos do Telegram no Brasil (Maia et al., 2023MAIA, Lídia Raquel Herculano et al. A contestação às vacinas contra Covid-19 em grupos do Telegram no Brasil. Intexto, [s. l.], n. 55, p. 127361, 2023. DOI: 10.19132/1807-8583.55.127361.
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). Nessa busca inicial, utilizamos os seguintes descritores associados às vacinas: vacina, vacinas, vacinar, vacinei, vacinou, vacinação, vacinal, vacinada, vacinadas, vacinados, vacinado, coronavac, pfizer, janssen, astrazeneca, v4c1n4 e vachina. Nesse estudo, chamaram a atenção os termos utilizados pelos membros de grupos abertamente contrários às vacinas para se referir à imunização contra a Covid-19. Diante disso, ampliamos nosso léxico de busca, incluindo os seguintes descritores associados à contestação vacinal: experimento, picada, colateral, colaterais e antivacina. A coleta dos dados foi realizada no dia 15 de agosto de 2022 por meio da ferramenta de exportação de postagens do Telegram2 2 Mais informações sobre as ferramentas de extração do Telegram estão disponíveis em: https://telegram.org/blog/export-and-more. , em formato HTML (do inglês HyperText Markup Language).

Considerando nossa proposta de observar a gênese dos processos interacionais entre críticos das vacinas, delimitamos a análise aos grupos em atividade entre os meses de janeiro a março de 2021, período que corresponde ao início da vacinação contra a Covid-19 no Brasil. A partir de descritores associados ao tema da vacina e à contestação vacinal, identificamos sete grupos dedicados à discussão sobre vacinação no Telegram. A coleta das conversas realizadas nos grupos resultou em um total de 20.826 mensagens de texto. Destas, foram analisadas qualitativamente apenas as que denotavam interação entre os membros, identificada pelo marcador in reply to, utilizado pelo Telegram sempre que uma resposta é direcionada a alguma mensagem postada nos grupos.

Neste estudo, seguimos os procedimentos indicados pelo Comitê de Ética em Pesquisa no Brasil (CEP), resolução nº. 510/2016, quanto às investigações envolvendo informações de acesso público. Apesar de não ser uma pesquisa envolvendo diretamente os participantes, está vinculada a projeto aprovado pelo CEP. Por questões de ética da pesquisa e segurança dos autores, não serão indicados os nomes ou links dos grupos analisados. A coleta derivou de uma observação não participante, sem qualquer tipo de interação ou produção de conteúdo nos grupos estudados. Essa postura se justifica tendo em vista que os grupos analisados são públicos e acessíveis a qualquer pessoa (mesmo aquelas que não são membros dos grupos) e que a revelação da identidade dos pesquisadores representaria um risco e inviabilizaria a própria pesquisa. Esse tipo de decisão metodológica também foi adotado por outros pesquisadores dedicados à análise de mensagens compartilhadas em grupos públicos no Telegram (Nascimento et al., 2021NASCIMENTO, Leonardo F. et al. Poder oracular e ecossistemas digitais de comunicação: a produção de zonas de ignorância durante a pandemia de Covid-19 no Brasil. Fronteiras - estudos midiáticos, [s. l.], v. 23, n. 2, p. 190-206, 2021.; Spitale, Biller-Andorno, Germani, 2022SPITALE, Giovanni; BILLER-ANDORNO, Nikola; GERMANI, Federico. Concerns Around Opposition to the Green Pass in Italy: Social Listening Analysis by Using a Mixed Methods Approach. Journal of Medical Internet Research, [s. l.], v. 24, n. 2, p. e34385, 2022.). Assim como eles, realizamos a análise das mensagens de forma anonimizada, garantindo a segurança dos pesquisadores e o anonimato dos participantes dos grupos estudados.

As mensagens coletadas foram analisadas inicialmente nos arquivos HTML exportados do Telegram, os quais nos permitiam manter os contextos interacionais-simbólicos das conversações. Após essa leitura inicial, as trocas interacionais foram transpostas para um arquivo de anotações do software NVivo 12 Pro. Realizamos, então, uma codificação desse material com base nas orientações da Teoria Fundamentada, que tem como pressuposto básico a ideia de que a teoria deve emergir dos dados empíricos coletados no campo, por meio de um movimento indutivo de pesquisa (Fragoso, Recuero, Amaral, 2011FRAGOSO, Suely; RECUERO, Raquel; AMARAL, Adriana. Métodos de pesquisa para internet. Porto Alegre: Sulina, 2011.; Glaser e Strauss, 2017GLASER, Barney G.; STRAUSS, Anselm L. The discovery of grounded theory: Strategies for qualitative research. [S. l.]: Routledge, 2017.). Desse modo, as categorias foram emergindo a partir da observação dos padrões de comportamento evidenciados nas trocas interacionais presentes na empiria. Importa ressaltar que a análise da frequência de categorias teve como unidade de codificação a interação via mensagem de texto. Assim, os dados foram codificados conforme a frequência de conversas, formadas por conjuntos de mensagens em que os participantes discutiam sobre um determinado tema. A codificação inicial passou por algumas rodadas de revisão e debate entre os autores, até que todas as semelhanças, diferenças, sequências, frequências e causalidades tivessem sido mapeadas (Nascimento et al., 2021NASCIMENTO, Leonardo F. et al. Poder oracular e ecossistemas digitais de comunicação: a produção de zonas de ignorância durante a pandemia de Covid-19 no Brasil. Fronteiras - estudos midiáticos, [s. l.], v. 23, n. 2, p. 190-206, 2021.) e sistematizadas nas categorias de análise que apresentamos no tópico a seguir.

Resultados e discussão

Com base na observação dos processos evidenciados nos grupos de contestação às vacinas no Telegram, desenvolvemos três eixos que sintetizam as lógicas interacionais presentes nesses espaços, conforme exposto no Quadro 1 a seguir.

Quadro 1
Eixos para análise dos processos interacionais evidenciados nos grupos3 3 O “n” nas categorias do Quadro 1 se refere ao número de interações codificadas em cada uma delas. .

Importa ressaltar que essas categorias não têm fronteiras rígidas, pois uma mesma mensagem pode atuar tanto como testemunhal quanto como suporte afetivo, por exemplo. Desse modo, as mensagens foram categorizadas conforme as características que mais se destacavam em cada uma delas, a fim de que pudéssemos alcançar uma organização sistemática da análise e do manuscrito.

Senso de comunidade

A entrada de novos membros nos grupos (seja a partir da adição por parte de quem já está no grupo, do mecanismo de busca do Telegram ou de links de acesso) frequentemente é seguida de agradecimentos e mensagens de boas-vindas, que estimulam a sociabilidade entre os participantes. Nessas ocasiões, alguns administradores aproveitam para apresentar o propósito daquele espaço e as crenças que movem o grupo. Uma das mais reiteradas entre elas é a de que em tais grupos encontra-se a verdade, que estaria oculta para a maioria das pessoas, mas poderia ser acessada por meio do conteúdo disponível no grupo. Essa disputa pela verdade tem sido frequente em grupos de extrema direita e em redes de desinformação sobre a pandemia (Garcia, Evangelista Cunha, Oliveira, 2021GARCIA, Marcelo; EVANGELISTA CUNHA, Simone; OLIVEIRA, Thaiane. Regimes de verdade na pandemia de Covid-19: discursos científicos e desinformativos em disputa no Youtube. Fronteiras - estudos midiáticos, [s. l.], v. 23, n. 2, p. 104–117, 2021. DOI: https://doi.org/10.4013/fem.2021.232.08.
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; Cesarino, 2021CESARINO, Letícia. Pós-verdade e a crise do sistema de peritos: uma explicação cibernética. Ilha Revista de Antropologia, [s. l.], v. 23, n. 1, p. 73-96, 2021.; Monari, 2021MONARI, Ana Carolina Pontalti; et al. Disputas narrativas e legitimação: análise dos argumentos de Bolsonaro sobre vacinação contra Covid-19 no Twitter. Liinc em Revista, [s. l.], v. 17, n. 1, p. e5707, 2021.).

Nesse processo de autolegitimação dos grupos, o prestígio de instituições epistêmicas é invocado na defesa da veracidade dos conteúdos desinformativos, que teriam supostamente o suporte de estudos científicos e dados jornalísticos, os quais são instrumentalizados e distorcidos na defesa das crenças antivacina. Não obstante, os membros dos grupos estudados frequentemente questionam as descobertas científicas — como as vacinas — e o trabalho da imprensa. Isso demonstra a posição dúbia desses grupos frente a instituições epistêmicas, como já vinha sendo observado por Oliveira (2020)OLIVEIRA, Thaiane. Desinformação científica em tempos de crise epistêmica: Circulação de teorias da conspiração nas plataformas de mídias sociais. Fronteiras - estudos midiáticos, v. 22, n. 1, p. 21–35, 2020. https://doi.org/10.4013/fem.2020.221.03.
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Já com relação a grandes plataformas de mídia, que realizam moderação de conteúdo no combate à desinformação, tais grupos apresentam uma posição constante de protesto. Em diversas mensagens, os usuários apontam insatisfação com as mídias sociais pertencentes à empresa Meta e predileção pelo Telegram, o que corrobora as observações de Rogers (2020)ROGERS, Richard. Deplatforming: Following extreme Internet celebrities to Telegram and alternative social media. European Journal of Communication, [s. l.], v. 35, n. 3, p. 213-229, 2020. sobre a migração massiva de atores anti-establishment para esse aplicativo de troca de mensagens, chamado por ele de “canto sombrio” da internet.

Assim, o Telegram é apontado pelos membros dos grupos como um espaço seguro para a atividade de contestação às vacinas. Nesses grupos, eles buscam estratégias para burlar a obrigatoriedade das vacinas por meio do apoio mútuo, da indicação de dispositivos civis e jurídicos (como leis e tratados internacionais) e até mesmo de práticas criminosas (como a venda de certificados de vacinação). Nessa busca pela fuga da ordem sanitária instituída, observamos ainda a discussão sobre possibilidades de sobrevivência longe da civilização.

Esse sentimento de vigilância e o desejo de fugir de uma suposta perseguição das autoridades epistêmicas aparece ainda no receio constante de que os grupos sejam monitorados. Nascimento et al. (2022)NASCIMENTO, Leonardo F et al. Públicos refratados: grupos de extrema-direita brasileiros na plataforma Telegram. Internet & Sociedade, [s. l.], p. 31-60, 2022. comentam que é por meio dessa vigilância em relação a infiltrados e de restrições ao acesso que esses grupos viabilizam a construção de câmaras de eco (Recuero, Soares, Zago, 2021RECUERO, Raquel; SOARES, Felipe; ZAGO, Gabriela. Polarização, Hiperpartidarismo e Câmaras de Eco: Como circula a Desinformação sobre Covid-19 no Twitter. Revista Contracampo, [s. l.], v. 40, n. 1, 2021.). As restrições ao acesso se dão sobretudo pelas estratégias de ocultamento, a partir de termos criptografados nos títulos dos grupos, e do uso de um léxico próprio, que delimita a compreensão do conteúdo a públicos circunscritos (Nascimento et al., 2022NASCIMENTO, Leonardo F; CESARINO, Letícia; FONSECA, Paulo. Democracia digital: análise dos ecossistemas de desinformação no Telegram durante o processo eleitoral brasileiro de 2022. InternetLab, São Paulo, 2022. Disponível em: https://internetlab.org.br/wp-content/uploads/2022/08/telegram-01-relatorio-06-1.pdf. Acesso em: 14 mar. 2024.
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). Van der Nagel (2018)VAN DER NAGEL, Emily. ‘Networks that work too well’: intervening in algorithmic connections. Media International Australia, [s. l.], v. 168, n. 1, p. 81-92, 2018. chama essa tática de invisibilidade, que dribla a atuação dos algoritmos e dificulta a rastreabilidade dos mecanismos de busca, de voldemorting. O termo faz referência ao universo ficcional de Harry Potter, em que os personagens evitam pronunciar o nome do vilão, Voldermort, para não serem encontrados por ele e para que coisas ruins não aconteçam. Em nosso caso, observamos que a tática é usada tanto como escape do rastreamento da atividade antivacina quanto como marcador ideológico, que fortalece os laços identitários entre os membros, já que a construção de um quadro de referências comuns, a partir de códigos compartilhados, é chave na constituição de matrizes interacionais (Braga et al., 2017BRAGA, José Luiz et al. Matrizes interacionais: a comunicação constrói a sociedade. [S. l.]: EDUEPB, 2017.). Assim, é comum o uso de termos como fraudemia, plandemia, vachina, focinheira, picada do mal, material biológico experimental, vírus chinês etc. para se referir à pandemia, às vacinas e às medidas de contenção do vírus.

No circuito de busca de estratégias para evitar as vacinas, aparece ainda a defesa da naturopatia e de medicamentos comprovadamente ineficazes para o tratamento da Covid-19, muitas vezes suportados por profissionais da medicina que têm alcançado status de influenciadores digitais na sociedade midiatizada contemporânea. Essa crença na naturopatia como contraponto à imunização já vinha sendo observada em outros estudos sobre grupos de contestação às vacinas (Dhaliwal e Mannion, 2020DHALIWAL, Dhamanpreet; MANNION, Cynthia. Antivaccine Messages on Facebook: Preliminary Audit. JMIR Public Health and Surveillance, [s. l.], v. 6, n. 4, p. e18878, 2020.; Kata, 2010KATA, Anna. A postmodern Pandora’s box: Anti-vaccination misinformation on the Internet. Vaccine, [s. l.], v. 28, n. 7, p. 1709-1716, 2010.). No contexto pandêmico brasileiro, essa discussão ganhou novos contornos com a defesa do chamado tratamento precoce, com hidroxicloroquina e ivermectina, que foi propalado por autoridades, como o então presidente Jair Bolsonaro, como única solução para a pandemia (Massuchin et al., 2021MASSUCHIN, Michele Goulart et al. A estrutura argumentativa do descrédito na ciência: uma análise de mensagens de grupos bolsonaristas de WhatsApp na pandemia da COVID-19. Fronteiras - estudos midiáticos, [s. l.], v. 23, n. 2, p. 160-174, 2021.; Monari, 2021MONARI, Ana Carolina; SACRAMENTO, Igor. A “vacina chinesa de João Doria”: a influência da disputa política-ideológica na desinformação sobre a vacinação contra a Covid-19. Revista Mídia e Cotidiano, [s. l.], v. 15, n. 3, p. 125-143, 2021.; Nascimento et al., 2021NASCIMENTO, Leonardo F. et al. Poder oracular e ecossistemas digitais de comunicação: a produção de zonas de ignorância durante a pandemia de Covid-19 no Brasil. Fronteiras - estudos midiáticos, [s. l.], v. 23, n. 2, p. 190-206, 2021.). Assim, observamos nos grupos analisados não só a constante circulação de falas de médicos que recomendam o chamado Kit Covid para um suposto tratamento precoce mas também posologias baseadas em experiências pessoais. Vale ressaltar ainda que tanto o esforço dos médicos em divulgar essas supostas curas quanto o ato dos membros de compartilhar suas experiências são recebidos com louvores pelos participantes dos grupos. Dessa forma, os membros vão tecendo laços com base em expressões de reconhecimento, ajuda mútua e suporte afetivo.

Nesse contexto, os grupos parecem funcionar como um canal de serviços para muitos membros. Enquanto uns buscam informações gerais, outros procuram sanar dúvidas pessoais, como em uma mensagem em que um membro pergunta se os efeitos colaterais das vacinas poderiam ser transmitidos sexualmente. Esse tipo de questionamento aponta para o grau de confiança que essas pessoas parecem depositar umas nas outras, o que foi percebido também por Dhaliwal e Mannion (2020)DHALIWAL, Dhamanpreet; MANNION, Cynthia. Antivaccine Messages on Facebook: Preliminary Audit. JMIR Public Health and Surveillance, [s. l.], v. 6, n. 4, p. e18878, 2020. em análise de páginas de contestação às vacinas no Facebook.

São comuns ainda as interações que envolvem menções e links para sites, redes sociais e serviços de armazenamento de conteúdo, o que denota o sentido tático dos grupos em relação à circulação de desinformação sobre a pandemia e as vacinas e corrobora as observações de Nascimento et al. (2022, p. 48), que apontam que o “Telegram não deve ser compreendido isoladamente, mas em termos da ecologia de mídia mais ampla na qual ele se insere”. Assim, as conversas constantemente envolvem pedidos de ajuda para compartilhamento dos conteúdos em outras plataformas — o que mostra que o Telegram funciona, então, como uma espécie de ponto de conexão entre ecossistemas midiáticos para grupos de contestação às vacinas.

Nós x eles

As mensagens aqui agrupadas apontam frustração, tristeza, raiva e desconfiança que alguns membros apresentam em relação ao eles, que seriam as elites econômicas, governamentais e epistêmicas. Cesarino (2021, p. 82)CESARINO, Letícia. Pós-verdade e a crise do sistema de peritos: uma explicação cibernética. Ilha Revista de Antropologia, [s. l.], v. 23, n. 1, p. 73-96, 2021. comenta que “talvez o modo mais fundamental de impor ordem à experiência on-line nessas redes tem sido o recurso à fronteira antagonística amigo-inimigo”. Assim, diante da situação de alta insegurança epistemológica (Van Zoonen, 2012VAN ZOONEN, Liesbet. I-Pistemology: Changing truth claims in popular and political culture. European Journal of Communication, [s. l.], v. 27, n. 1, p. 56-67, 2012.) causada pela pandemia de Covid-19 e pelo clima de conflito derivado dos embates políticos (Monari e Sacramento, 2021MONARI, Ana Carolina; SACRAMENTO, Igor. A “vacina chinesa de João Doria”: a influência da disputa política-ideológica na desinformação sobre a vacinação contra a Covid-19. Revista Mídia e Cotidiano, [s. l.], v. 15, n. 3, p. 125-143, 2021.), os membros dos grupos investigados procuraram culpados e fontes alternativas de conhecimento e compreensão do mundo.

Nesse processo, buscaram explicar a pandemia com base em teorias conspiratórias que envolviam suspeitas de lucro financeiro e controle populacional por parte de elites políticas e econômicas, que estariam em busca de implementar uma suposta nova ordem mundial — narrativas que também aparecem em outros estudos sobre a contestação às vacinas (Brotas et al., 2021BROTAS, Antonio Marcos Pereira et al. Discurso antivacina no YouTube: a mediação de influenciadores. Revista Eletrônica de Comunicação, Informação & Inovação em Saúde, [S. l.], v. 15, n. 1, 2021. DOI: 10.29397/reciis.v15i1.2281.
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; Caycho-Rodríguez et al., 2022CAYCHO-RODRÍGUEZ, Tomás et al. What Is the Support for Conspiracy Beliefs About COVID-19 Vaccines in Latin America? A Prospective Exploratory Study in 13 Countries. Frontiers in Psychology, [s. l.], v. 13, p. 855713, 2022.; Da Costa et al., 2020DA COSTA, Bianca Barros et al. O movimento antivacina no YouTube nos tempos de pós-verdade: Educação em saúde ou desinformação? Revista Mídia e Cotidiano, [s. l.], v. 14, n. 1, p. 220-239, 2020.). Os usuários parecem perceber uns aos outros, portanto, como verdadeiros cientistas que teriam condições de acessar o conhecimento sobre qualquer assunto apenas com base em suas próprias pesquisas, na experiência pessoal ou no que Van Zoonen (2012)VAN ZOONEN, Liesbet. I-Pistemology: Changing truth claims in popular and political culture. European Journal of Communication, [s. l.], v. 27, n. 1, p. 56-67, 2012. chama de eu-pistemologia, sem necessidade de mediações de especialistas (Cesarino, 2021CESARINO, Letícia. Pós-verdade e a crise do sistema de peritos: uma explicação cibernética. Ilha Revista de Antropologia, [s. l.], v. 23, n. 1, p. 73-96, 2021.).

Essas teorias conspiratórias traziam também uma moldura política, refletindo o cenário de politização da pandemia no Brasil (Gramacho e Turgeon, 2021GRAMACHO, Wladimir G.; TURGEON, Mathieu. When politics collides with public health: COVID-19 vaccine country of origin and vaccination acceptance in Brazil. Vaccine, [s. l.], v. 39, n. 19, p. 2608-2612, 2021.; Soares et al., 2021SOARES, Felipe Bonow et al. Desinformação sobre o Covid-19 no WhatsApp: a pandemia enquadrada como debate político. Ciência da Informação em Revista, [s. l.], v. 8, n. 1, p. 74-94, 2021.). Nesse contexto, a oposição às vacinas estava associada diretamente à crítica aos inimigos do presidente, no caso as esquerdas em geral, o que também foi observado por Nascimento et al. (2021)NASCIMENTO, Leonardo F. et al. Poder oracular e ecossistemas digitais de comunicação: a produção de zonas de ignorância durante a pandemia de Covid-19 no Brasil. Fronteiras - estudos midiáticos, [s. l.], v. 23, n. 2, p. 190-206, 2021. em análise de grupo bolsonarista no Telegram. Essa díade amigos versus inimigos reverbera ainda no modo como enxergam o empreendimento científico: existiria a ciência financiada “pelos laboratórios e seus lucros obscenos” e a ciência boa que dá suporte às crenças do grupo. Em análise do movimento bolsonarista no Telegram, Fonseca, Ribeiro e Nascimento (2022)FONSECA, Paulo F. C.; RIBEIRO, Barbara E.; NASCIMENTO, Leonardo F. Demarcating Patriotic Science on Digital Platforms: Covid-19, Chloroquine and the Institutionalisation of Ignorance in Brazil. Science as Culture, [s. l.], v. 31, n. 4, p. 530-554, 2022. observaram que os partidários do então presidente não contestavam a autoridade científica em si mesma, mas tratavam de demarcar fronteiras entre o que enxergam como ciência legítima e ilegítima. Os autores apontam que essa ignorância institucionalizada é produzida e mantida por meio de duas práticas complementares que envolvem acusações pejorativas contra a ciência convencional e a construção de laços de afeto e confiança em um modelo alternativo de ciência, que eles chamam de ciência patriótica. Nos grupos analisados, essa mesma lógica é aplicada a outras instituições e autoridades epistêmicas: alguns médicos seriam vendidos por não aceitarem o chamado tratamento precoce, enquanto outros seriam patriotas e altruístas por se arriscarem fazendo o oposto; alguns policiais seriam covardes por supostamente implementarem sanções contra quem se negava a seguir as medidas de isolamento social, enquanto outros seriam corajosos por se recusarem a fazer o mesmo etc.

Diante do sentimento de indignação e perseguição em relação à ordem instituída, alguns membros elaboravam estratégias de enfrentamento às instituições sanitárias e governamentais, que envolviam, por exemplo, a defesa de protestos em frente a quartéis e ameaças explícitas a membros do Supremo Tribunal Federal. No dia 08 de janeiro de 2023, houve uma invasão na Praça dos Três Poderes, no Distrito Federal, numa tentativa de destituir o governo legitimado pelas urnas na eleição presidencial brasileira de 2022 (Callegari, 2023CALLEGARI, José Antonio. Morte e vida democrática: autoritarismo e resistência democrática. Logeion: Filosofia da Informação, [s. l.], v. 9, n. 2, p. 32-50, 2023.). Não obstante, a partir da análise das mensagens coletadas, observamos que as investidas autoritárias e antidemocráticas contra a ordem instituída já vinham sendo gestadas em plataformas como o Telegram bem antes desse ataque de 2023.

Assim, identificamos a circulação de conteúdos que são compartilhados no intuito de manter vivo o engajamento contra vacinas, imprensa, autoridades, órgãos regulatórios, instituições sanitárias, cientistas etc. Essas mensagens normalmente trazem links, prints ou memes com xingamentos e comentários de ataque ao eles. O objetivo delas é alimentar a repulsa e o desejo de reação contra o que seriam os inimigos do grupo, além de apontar ações táticas nesse sentido. Esses inimigos dos grupos são o que Cesarino (2021)CESARINO, Letícia. Pós-verdade e a crise do sistema de peritos: uma explicação cibernética. Ilha Revista de Antropologia, [s. l.], v. 23, n. 1, p. 73-96, 2021. chama de “significantes vazios”, que podem ser preenchidos com qualquer coisa, pessoa ou instituição que esteja alinhada à ordem sanitária instituída.

Os membros dos grupos estudados reverberam, assim, a lógica populista povo versus elite utilizada por Bolsonaro em diversos momentos ao falar sobre a vacinação contra a Covid-19 (Monari e Sacramento, 2021MONARI, Ana Carolina; SACRAMENTO, Igor. A “vacina chinesa de João Doria”: a influência da disputa política-ideológica na desinformação sobre a vacinação contra a Covid-19. Revista Mídia e Cotidiano, [s. l.], v. 15, n. 3, p. 125-143, 2021.). E se colocam como despertos, porta-vozes de uma suposta verdade, que estariam envolvidos em uma missão de acordar aqueles que confiam nas vacinas – o que desperta ainda mais preocupação, considerando o contexto de quedas recentes nas coberturas vacinais no Brasil. Nesse sentido, compartilham táticas de espalhamento da desinformação sobre a pandemia que envolviam, por exemplo, o envio de links de convite para entrada em grupos antivacina. Há, assim, um sentimento de messianismo compartilhado entre os membros dos grupos, que demonstram condescendência com os que se vacinam, sentimento de dever de alertar aqueles que creem nas vacinas e frustração com quem não quer acreditar no que eles falam. Nesses espaços, a resistência aos imunizantes funciona, portanto, como prova de fé cristã e como crença a ser disseminada para outras pessoas.

Dissenso, hesitação e rupturas

Embora os usuários compartilhem pontos de vista semelhantes em relação às vacinas, em alguns momentos, surgem hesitações, dissensos e até rupturas entre os membros dos grupos. As hesitações se dão normalmente em relação aos conteúdos compartilhados, já que há, entre alguns membros, a preocupação quanto à possibilidade de circulação de informações falsas nos grupos. Em razão disso, é comum ver pedidos de que sejam apresentados fontes e detalhes sobre os conteúdos compartilhados.

Assim, como mencionado anteriormente, embora haja um discurso de descrédito ao jornalismo nesses grupos, a autoridade desse campo é constantemente invocada na tentativa de legitimação dos conteúdos compartilhados. Os membros demonstram reconhecer, portanto, a legitimidade do jornalismo e entender que era necessário que as mensagens apresentassem tom similarmente factual para serem interpretadas como verdadeiras por pessoas externas ao grupo. Não há entre eles, no entanto, o questionamento quanto à legitimidade das fontes indicadas. Desse modo, tanto no Telegram quanto em outras plataformas digitais (Massuchin et al., 2021MASSUCHIN, Michele Goulart et al. A estrutura argumentativa do descrédito na ciência: uma análise de mensagens de grupos bolsonaristas de WhatsApp na pandemia da COVID-19. Fronteiras - estudos midiáticos, [s. l.], v. 23, n. 2, p. 160-174, 2021.; Recuero e Soares, 2022RECUERO, Raquel; SOARES, Felipe. #VACHINA: How Politicians Help to Spread Disinformation About COVID-19 Vaccines. Journal of Digital Social Research, [s. l.], p. 73-97, 2022.), circulam discursos de contestação às vacinas suportados por veículos de mídia alternativa que mimetizam o formato e a estética jornalística sem, no entanto, aderir aos princípios e constrangimentos éticos que regem o campo (Massuchin et al., 2021MASSUCHIN, Michele Goulart et al. A estrutura argumentativa do descrédito na ciência: uma análise de mensagens de grupos bolsonaristas de WhatsApp na pandemia da COVID-19. Fronteiras - estudos midiáticos, [s. l.], v. 23, n. 2, p. 160-174, 2021.).

Esses momentos de hesitação quanto à veracidade dos conteúdos costumam gerar tentativas de esclarecimentos ou são deixados de lado, sem que produzam dissensos importantes. Alguns tópicos, porém, acabam gerando discussões acaloradas. Um dos principais deles diz respeito à atuação de Jair Bolsonaro na pandemia. Embora o presidente tenha criticado abertamente as vacinas contra a Covid-19 em diversas ocasiões (Monari et al., 2021MONARI, Ana Carolina Pontalti. “Verdades divididas” sobre a Covid-19: o uso do canal do Telegram de Bolsonaro como registro oficial do governo. Cadernos de História da Ciência, [s. l.], v. 15, 2021.), após o início da vacinação no país com a CoronaVac, que teve João Dória na liderança das negociações para a parceria entre o laboratório Sinovac e o Instituto Butantan, Bolsonaro empreendeu uma disputa narrativa pelo capital simbólico da imunização (Monari e Sacramento, 2021MONARI, Ana Carolina; SACRAMENTO, Igor. A “vacina chinesa de João Doria”: a influência da disputa política-ideológica na desinformação sobre a vacinação contra a Covid-19. Revista Mídia e Cotidiano, [s. l.], v. 15, n. 3, p. 125-143, 2021.). Esse reposicionamento em relação às vacinas acaba gerando controvérsias dentro dos grupos estudados, que apresentavam um posicionamento majoritariamente favorável ao então presidente.

Após o início da vacinação contra a Covid-19 no Brasil, embora os grupos continuassem adotando uma retórica antivacina, a maioria dos membros procurava formas de justificar o novo posicionamento do então presidente em relação às vacinas. Desse modo, a partir da dubiedade de posicionamento quanto às vacinas, Bolsonaro conseguia satisfazer apoiadores que endossavam a vacinação, ao mesmo tempo que mantinha o apoio daqueles que contestavam as vacinas contra a Covid-19, o que mostra que o caráter segmentar da comunicação desse político durante a campanha (Cesarino, 2019CESARINO, Letícia. Identidade e representação no bolsonarismo. Revista de Antropologia, [s. l.], v. 62, n. 3, p. 530-557, 2019.) continuava em pleno funcionamento ao longo do governo. Assim, sempre que Jair Bolsonaro era criticado por algum participante, logo outros saíam em sua defesa, colocando-o numa posição de vítima do sistema e reverberando seus discursos nesse sentido, o que reforça os achados de Nascimento et al. (2021)NASCIMENTO, Leonardo F. et al. Poder oracular e ecossistemas digitais de comunicação: a produção de zonas de ignorância durante a pandemia de Covid-19 no Brasil. Fronteiras - estudos midiáticos, [s. l.], v. 23, n. 2, p. 190-206, 2021. sobre o exercício do poder oracular bolsonarista no Telegram.

Outro tópico de discordância estava relacionado à existência do novo coronavírus – enquanto alguns achavam que a pandemia era real, outros pensavam que se tratava apenas de uma narrativa fabricada. Quando os membros não conseguiam chegar a um acordo em relação a pontos como esse, havia pedidos e ameaças de exclusão do grupo. Desse modo, como já vinha sendo observado por Kata (2012)KATA, Anna. Anti-vaccine activists, Web 2.0, and the postmodern paradigm – An overview of tactics and tropes used online by the anti-vaccination movement. Vaccine, [s. l.], v. 30, n. 25, p. 3778-3789, 2012., em grupos antivacina, opiniões contrárias são constantemente removidas e o dissenso é abertamente desencorajado. Cientes disso, alguns membros desabafam sobre a autocensura a que se submetem para não enfrentar conflitos no grupo, sendo logo confortados por pares que pediam compreensão e tolerância em relação às pequenas divergências que poderiam surgir no processo interacional.

Em outros momentos, há discussões acaloradas sobre assuntos diversos, não diretamente relacionados à pauta das vacinas, como o nazismo e os diferentes nomes de Jesus. Numa dessas situações, alguém lembra que o objetivo do grupo é a crítica às vacinas. Assim, foram poucas as vezes em que situações de dissenso conduziram a rupturas abertas nos grupos estudados. Pois, logo que surgiam divergências, os membros buscavam formas de contorná-las, fosse por meio da lembrança do que os unia, do apoio mútuo ou da autocensura. Não obstante, em alguns momentos, observamos a exclusão de participantes e o anúncio de partida de membros que não concordavam com a negação do vírus, com críticas a Bolsonaro ou com relação a outros temas que acabavam dividindo opiniões.

Já com relação às vacinas contra a Covid-19, observamos a presença de dissenso aberto em apenas três ocasiões, sendo que duas delas conduziram à saída dos dissidentes dos grupos que foram inseridos neles sem consentimento. A análise das mensagens demonstra, portanto, que há dissenso em alguma medida nos grupos estudados. Porém, há, por outro lado, um esforço constante pela redução desse dissenso. Nesse contexto, a menção aos inimigos comuns do grupo era constantemente invocada como mecanismo de coesão interna. Os sete grupos analisados formavam, então, espaços quase homogêneos de críticas às vacinas, especialmente àquelas desenvolvidas contra a Covid-19.

Assim, como já vinha sendo observado por Dhaliwal e Mannion (2020)DHALIWAL, Dhamanpreet; MANNION, Cynthia. Antivaccine Messages on Facebook: Preliminary Audit. JMIR Public Health and Surveillance, [s. l.], v. 6, n. 4, p. e18878, 2020., penetrar e transformar o sistema de ideias compartilhadas por membros de movimentos de contestação às vacinas pode ser difícil, pois eles compartilham um terreno comum de valores e crenças. Em nosso caso, observamos o mesmo desafio, pois identificamos que os membros dos grupos estudados partilham de um quadro de referências políticas e religiosas em comum e de um senso de comunidade constantemente reiterado por processos de sociabilidade e de ataque ao eles.

Considerações finais

Neste artigo, buscamos entender como se dão os processos interacionais entre participantes de sete grupos de oposição à imunização contra a Covid-19 no Telegram no Brasil. Nesse sentido, observamos que as interações entre os membros desses grupos estão centradas em três eixos principais que revelam: 1) a formação de um senso de comunidade, envolvendo processos de ajuda mútua, reconhecimento de pares, deliberações sobre o grupo e a rede antivacina, testemunhais e suporte afetivo; 2) o processo de elaboração de uma identidade marcada pela diferença em relação à alteridade, representada por um amplo espectro que inclui desde adeptos da vacinação até representantes da ordem instituída; e 3) o gerenciamento de processos de hesitação e dissenso, numa busca constante por homogeneidade.

A análise aponta, portanto, para a construção de câmaras de eco, alienantes e avessas a argumentações e demonstrações factuais, nos grupos de contestação às vacinas no Telegram. Tal processo é alimentado constantemente por práticas comunitárias e maniqueístas, que visam à criação de um senso de identidade e pertencimento em antagonismo a um suposto inimigo externo que precisaria ser combatido.

Observamos também que aspectos religiosos e políticos ajudam a compor a moldura desse sentimento comunitário. A oposição às vacinas, nesse cenário, parece funcionar como mais um marcador identitário que se soma aos demais formando um conjunto coeso e reacionário de enfrentamento às instituições epistêmicas e democráticas contemporâneas. Assumida como uma questão de identidade política e religiosa, essa contestação à imunização demonstra contornos complexos, colocando-se como um desafio para as autoridades sanitárias e democráticas que precisam trabalhar visando a recuperação das coberturas vacinais no Brasil.

Esperamos, com este estudo, contribuir para o enfrentamento desse desafio por meio do desvelamento dos processos interacionais que conformam grupos antivacina no Telegram. O olhar para essas processualidades nos permitiu observar que tais grupos são vistos como um espaço seguro para muitas pessoas que têm dúvidas quanto à segurança das vacinas. Por isso, ressaltamos a importância de se investigar esses espaços para que se possa entender esses públicos, conhecer suas dúvidas e criar canais apropriados para saná-las.

Por fim, a análise aponta ainda para a instrumentalização da legitimidade da ciência, do jornalismo e da medicina na crítica às vacinas, o que revela um espaço rico para investigações sobre como a autoridade de atores e instituições epistêmicas tem sido acionada em grupos antivacina em plataformas digitais. Tais estudos estão no norte de outras investigações em curso no nosso grupo.

  • 1
    Este artigo foi realizado no escopo do Instituto Nacional de Comunicação Pública da Ciência e Tecnologia, com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ) e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Contou também com apoio do CNPq: Chamada Proep–COC-CNPq 2021, Chamada CNPq/MCTI Nº 10/2023 - UNIVERSAL e Chamada CNPq n.º 14/2023 – Apoio a Projetos Internacionais de Pesquisa Científica, Tecnológica e de Inovação. Pela Faperj contou com o PPSUS, Projetos Temáticos e Jovem Pesquisador Fluminense. Maia agradece à Fundação Oswaldo Cruz pela bolsa de pós-doutorado do Programa Inova Fiocruz. Massarani e Oliveira agradecem ao CNPq, respectivamente, pela bolsa de Produtividade em Pesquisa 1B e Produtividade em Pesquisa 2. Massarani e Oliveira agradecem ainda à Faperj pelo Cientista do Nosso Estado e Jovem Cientista do Nosso Estado.
  • 2
    Mais informações sobre as ferramentas de extração do Telegram estão disponíveis em: https://telegram.org/blog/export-and-more.
  • 3
    O “n” nas categorias do Quadro 1 se refere ao número de interações codificadas em cada uma delas.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    08 Jul 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    07 Dez 2023
  • Aceito
    10 Mar 2024
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