Acessibilidade / Reportar erro

Previdência Social Rural em Itabaiana-SE: análise introdutória

Resumo

A universalização do direito à aposentadoria rural no Brasil é recente. O sistema de proteção social antes da Constituição Federal de 1988 possuía exigências que segregava os pequenos agricultores familiares. Diante disso, o presente trabalho busca refletir num viés empírico-analítico, o processo histórico da previdência rural no Brasil e seus impactos socioeconômicos na vida dos agricultores familiares no município de Itabaiana-SE. Os procedimentos metodológicos perpassaram por reflexões teóricas, levantamentos de dados e trabalho de campo. No recorte espacial estudado em 2020, segundo o INSS, existiam 2.989 aposentados urbanos e 6.364 rurais. Fato que demonstra a importância socioeconômica que a previdência tem na vida dos atores sociais que vivem no meio rural de Itabaiana-SE e na redução da pobreza no Brasil.

Palavras-chave:
Seguridade Social Rural; Agricultores Familiares e Pobreza Rural

Abstract

The universalization right to rural retirement in Brazil is recent. The social protection system before the Federal Constitution of 1988 had requirements that segregated small family farmers. Given this, the present work seeks reflect, empirical-analytical bias, the historical process of rural social security in Brazil and its socioeconomic impacts on the life of family farmers in the municipality of Itabaiana-SE. The methodological procedures went through theoretical reflections, data collection and fieldwork. The spatial area studied in 2020, according the INSS, there were 2,989 urban retirees and 6,364 rural retirees. A fact that demonstrates the socioeconomic importance that social security has lives social actors who live in the rural areas of Itabaiana-SE and in the reduction of poverty in Brazil.

Keywords:
Rural Social Security; Family Farmers and Rural Poverty

Resumen

La universalización del derecho a la jubilación rural en Brasil es reciente. El sistema de protección social anterior la Constitución Federal de 1988 tenía requisitos que segregaban pequeños agricultores familiares. Ante esto, presente trabajo busca reflejar, sesgo empírico-analítico, proceso histórico seguridad social rural en Brasil y sus impactos socioeconómicos vida de agricultores familiares del municipio de Itabaiana-SE. Los procedimientos metodológicos pasaron por reflexiones teóricas, recolección de datos y trabajo de campo. En área espacial estudiada en 2020, según el INSS, había 2.989 jubilados urbanos y 6.364 jubilados rurales. Un hecho que demuestra la importancia socioeconómica que tiene la seguridad social en vida de actores sociales que viven las zonas rurales de Itabaiana-SE y en la reducción de pobreza en Brasil.

Palabras clave:
Seguridad Social Rural; Agricultores Familiares y Pobreza Rural

Introdução

O meio rural brasileiro tem passado por diversas mudanças, as quais são motivadas tanto por aspectos sócio-produtivos, quanto por conquistas e acesso a direitos considerados básicos para o ser humano. O recorte do rural no Brasil perpassa por um amplo debate de natureza acadêmica e institucional, sendo impreciso especificar o que é rural e urbano. Existe um debate, por sinal bem consolidado para definir o que é urbano e rural, mas partindo sempre do conceito institucional do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em que o urbano é a sede municipal, e que na verdade distorce face a termos sedes até mesmo com menos de 1.000 habitantes.

Contudo, é importante destacar que os espaços rurais brasileiros e a agricultura familiar não são sinônimo de atraso ou de dependência estatal, mas com particularidades, que, a partir de políticas públicas potencializa o desenvolvimento local, especialmente com rendas não-agrícolas, como as aposentadorias e pensões rurais. Genericamente o espaço rural é composto por atores de características sociais, econômicas e culturais múltiplas, envolvidos em distintos contextos históricos que se materializa no espaço e também nos processos sociais. Os agricultores familiares se constituem atores da produção e da organização do espaço rural brasileiro, pois são sujeitos que cultivam a maior parte dos alimentos consumidos pela população brasileira, lutando pela sustentabilidade ambiental.

Neste contexto, a previdência social rural perfaz uma conquista histórica e um divisor de águas de seguridade social voltada para os agricultores familiares. Esta política pública estatal se diferencia de qualquer política pública existente no Brasil, pois com a Constituição Federal de 1988 (CF-88) e regulamentada pela lei 8.213, de 24 de julho de 1991, reconheceu-se direitos sociais e previdenciários a uma classe desprovida de reconhecimento social. Contudo, foi um longo caminho até a universalização da previdência rural no Brasil, que remonta desde os anos 20 do século passado.

Segundo os comandos do art. 194 da Constituição Federal, a seguridade social “compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social.” Ao passo que no art. 201 do Diploma Constitucional, em seu inciso II, fica delimitado a idade mínima que agricultores devem possuir para poderem integrar o sistema previdenciário, conforme se segue “ 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, para os trabalhadores rurais e para os que exerçam suas atividades em regime de economia familiar, nestes incluídos o produtor rural, o garimpeiro e o pescador artesanal.”

Na busca de entender a temática, se fez necessário levantamentos e revisões de literaturas, que fortaleçam a compressão da agricultura familiar e da previdência social rural no Brasil. Além disso, buscou-se entender a realidade local, nacional e internacional, com referências, em que destacamos alguns autores, como DELGADO (2015)DELGADO, Guilherme C. Social security and rural development. In: In Public Policy for Rural Development in Brazil. UFRGS Publisher, 2015, part 2, pg. 155-180;, GRISA(2014)GRISA, Catia and SCHNEIDER, Sergio. Three generations of public policies for family farming and forms of interaction between society and the state in Brazil. Rev. economy Sociol. Rural vol.52 supl.1 Brasília, 2014;, OLIVEIRA (2017)OLIVEIRA, Edvaldo. Eucalyptus and family farming-predicting impacts: the case of Planalto da Conquista-BA. In: Rural development and territorial policies: evidence in the Brazilian Northeast. Editora UESB, 2017, p.83-108;, QUINTERO (2017)QUINTERO, Sandra Patricia Duque, QUINTERO, Marta Lucía Quintero and QUINTERO, Derfrey Antonio Duque. Social security as a fundamental right for rural communities in Colombia. Legal Opinion, Vol. 16, No. 32, pp. 189-209 - ISSN 1692-2530 • Julio-December 2017 / 272 p. Medellin, Colombia;, SCHNEIDER (2003), entre outros. Também foi realizada coleta de dados secundários e documental no Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Instituto Nacional de Seguro Social(INSS) e Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural Sustentável(CMDRS).

Em linhas gerais, o município de Itabaiana-SE está localizado no Agreste Central Sergipano (Figura 01), tendo uma população estimada em 96.142 habitantes (IBGE, 2020). Destas, aproximadamente 20% são sujeitos que residem no meio rural no município. A agropecuária e o comércio são as bases da econômica municipal, sendo a batata doce, hortifrutigranjeiros, feijão, amendoim e mandioca os produtos de maior destaque no cultivo, atividades consideradas.

Mapa 1
Localização do município de Itabaiana no estado de Sergipe 2021

Em Sergipe, segundo dados do Censo Agropecuário (IBGE, 2017BRAZILIAN INSTITUTE OF GEOGRAPHY AND STATISTICS (IBGE). Demographic census 2010. Available at: https://censo2010.ibge.gov.br/;
https://censo2010.ibge.gov.br/...
), dos 72.060 estabelecimentos agropecuários considerados como de agricultura familiar, 37.012 possuem pessoas com idade superior a 55 anos. Em Itabaiana-SE dos 2.764 estabelecimentos com agricultura familiar, 1.129 possuem pessoas acima de 55 anos. Tais dados demonstram que os pequenos agricultores, mesmo aposentados, ainda assim, persistem no cotidiano e trabalham nas unidades produtivas.

O Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) já tinha emitido, entre os anos de 2006-2020, 9.764.823 benefícios previdenciários concedidos a população rural brasileira, com recurso financeiros em torno de 10 bilhões de reais. Destarte, os dados demonstram que as receitas previdenciárias fortalecem os laços locais, pois os recursos obtidos com a previdência rural têm como foco em realizar despesas básicas no segmento principalmente no segmento da alimentação, e sempre realizadas essas compras em mercados locais e investidos nas melhorias das unidades, contribuindo assim, para o desenvolvimento sócio-espacial. Deste modo, a importância em analisar como essa política social, que impacta a vida de milhares de pessoas na zona rural itabaianense, tem contribuído para a melhoria socioeconômica dos agricultores familiares no município.

Pelos termos, a aposentadoria rural está presente no município de Itabaiana-SE e possui uma importância na vida dos sujeitos que se reproduzem socialmente em suas propriedades e comunidades. Esses sujeitos ao se inserirem no sistema previdenciário brasileiro movimentam as econômicas locais e incentivam o desenvolvimento rural local. O déficit previdenciário existente no país, não é fruto das aposentadorias rurais, mas sim, nas renuncias fiscais, dívidas previdenciárias das empresas e ineficientes gestões do sistema previdenciário. A pandemia da COVID-19 provoca problemas imensuráveis na vida das pessoas, cabendo aos gestores garantir os direitos sociais e serviços públicos de qualidade a sociedade brasileira.

A dificil combinação entre a sobrevivência da agricultura familiar e a previdência social rural

O rural brasileiro caracteriza-se por relações heterogêneas de produção e socialização, não sendo sinônimo de atraso ou de exclusiva pobreza. A definição de rural no Brasil perpassa diversos dilemas, mas no sentindo institucional, o rural é o que está fora da delimitação do perímetro urbano do município. Contudo, as relações campo-cidade processam a separação nem sempre possível ou adequada no Brasil, pois as relações espaciais ocorrem inter-relacionadas entre o rural e o urbano.

Preteritamente os ideais da chamada “Revolução Verde”, expandida no Brasil por volta da década de 1970, transformou o espaço rural do país, ao lado também da consolidação do SNCR (Sistema Nacional de Crédito Rural) naquilo que determinada narrativa denominou de “modernização conservadora” (DELGADO, 2012DELGADO, Guilherme C. From financial capital in agriculture to the agribusiness economy: cyclical changes in half a century (1965-2012). Porto Alegre/RS: UFRGS publisher, 2012.). As marcas dessa revolução podem ser visualizadas nos processos de modernização em nível setorial e regional, e que nos anos 80 do século passado formaria o “complexo agroindustrial” constituindo processos a montante e a jusante do processo produtivo da nova agricultura de alta performance, com forte ‘integração técnica”, mas também determinante da “integração do capital”.

Esses processos passariam por diversas etapas de transformação, até alcançar o sistema do agronegócio em uma dimensão praticamente nacional, em que envolvem altos níveis tecnológicos, integração de mercados e forte articulação internacional em grande escala. Podemos inferir que a agricultura brasileira de nossos dias é uma das mais modernas do mundo, por envolver complexos industriais vinculados a produção agrícola, mas também da indústria beneficiadora e processadora. E claro, seus desdobramentos socioeconômicos perante a população rural, particularmente na questão dos benefícios sociais, destacando aí a previdência social rural.

Desse modo, a problemática da previdência rural entra também na agenda, isso em outra dimensão, na medida em que o principal benefício social estar praticamente concentrado em espaços rurais dominado pela agricultura familiar e com fortes quistos de pobreza rural. O que torna estruturalmente contraditório. Do outro lado, temos uma agricultura fortemente tecnificada com baixa densidade demográfica e população envelhecida. O que não seria um indutor de pobreza rural, mas de um processo inexorável de esvaziamento demográfico. Nesses espaços, a questão da previdência é secundária, na medida em que partes significativas desses agricultores familiares enquadram-se como prósperos e territorialmente estão concentrados nos rincões rurais do centro-sul.

Consideramos essa difícil combinação, que, simetricamente também é observado nos espaços urbanos socialmente segregados. Entretanto, nos espaços rurais a questão é mais problemática porque efetivamente existe um quadro de pobreza estruturalmente mais grave, quando a benefício previdenciário, principalmente no último lustro, atuou como a mais importante, se não, a única fonte de renda de milhares (ou milhões) de familiares de pequenos agricultores, praticamente concentrado no Nordeste.

A difícil combinação estaria processada em função da constituição de uma narrativa que analisa a inviabilidade socioeconômica dessa categoria social e seu processo de desaparecimento, servindo a previdência social como lastro, enquanto beneficio de caráter permanente, que ainda sustenta essas áreas socialmente empobrecidas e de baixa inserção tecnológica, tendo como resultado a inexistência de fatores ligados a produtividade do trabalho e da terra (BUAINAIN, 2014BUAINAIN, Antônio et al. The rural world in 21st century Brazil: the formation of a new agrarian and agricultural pattern. Brasília: technical editors, EMBRAPA, 2014.).

É perfeitamente factível esboçar a fragilidade dessa narrativa embasada no desaparecimento dos agricultores familiares, combinada com a forte emigração das populações rurais jovens e com ele, da previdência social como única estratégia de reprodução dessas famílias e que muitas vezes sustentam duas ou mais gerações de agricultores familiares. Uma primeira questão relaciona-se com o caráter “exclusivo” de analisar esses processos sociais rurais dentro da dimensão meramente econômica, dentro de fatores e indicadores que inferem aspectos relacionados aos ganhos de produtividade. O que não podemos esperar essa assertiva como a mais plausível e universal e que retrata a realidade de segmentos de agricultores familiares em áreas rurais pobres. Outros elementos agregam e que contribuem para que esse desaparecimento ou inviabilidade econômica desses agricultores no Nordeste seja determinante, e nos parece que fatores de natureza cultural e baixa capacidade de produção, ao lado da combinação entre a produção de subsistência e venda em mercados aninhados ou em cadeia curta, havendo amplas possibilidades de crescimento da circulação das mercadorias produzidas por estes agricultores familiares.

Portanto, a questão da previdência social rural adentra nesse processo como estratégia de reprodução da família, mas que ainda desenvolve cultivos ou criatórios em pequena escala ao estilo mercadoria-dinheiro-mercadoria, portanto, não havendo criação de excedente. É evidente que existe um processo de diminuição de agricultores familiares nos estabelecimentos agropecuários, os dados dos censos agropecuários de 2006 e 2017 mostram esse quadro (passou de 4,2 para 3,8 milhões, considerados como agricultores familiares). Ainda assim, observamos um grande vigor dessa importante categoria social e a questão da previdência rural entraria como uma espécie de resistência ao seu suposto “desaparecimento”. Desse modo, não podemos inferir esse quadro de ruptura como estivéssemos em apenas um modelo de desenvolvimento rural. O que demonstra que o beneficio tem o condão de operar como politica pública de Estado e não de governo e a sobrevivência dessa categoria é de fundamental importância, face a importância na produção de alimentos para mercados.

Observar também que o papel da previdência social, que enfrenta problemas construídos com a reforma em nível constitucional desde 2019, pois houve retirada de direitos sociais e certamente impactará na vida de milhares de brasileiros. A possibilidade de mudanças na previdência social rural, será marcada principalmente pela redução do número de beneficiários e até mesmo redução dos valores, podendo receber benefícios menores que o salário mínimo. O que podemos inferir o retorno em grande escala da pobreza rural, sendo um fator preocupante em termos estruturais. Daí a importância de aprofundarmos dessa temática na dimensão da percepção e dos dados disponíveis, tomando como objeto de estudo o espaço rural do município de Itabaiana/SE.

Como dissemos esses atores sociais que vivem e reproduzem nesses espaços tem na aposentadoria sua principal fonte de renda. Esses atores, em função de sua reprodução socioeconômica e cultural de “afeto à terra” agregam categorias sociais, como agricultor familiar, lavrador, camponês, trabalhador rural, ribeirinho, quilombola, etc. Porém, os agricultores familiares são os sujeitos de maior destaque nos espaços rurais brasileiros e são responsáveis pela produção de alimentos na perspectiva da chamada grande narrativa. Mesmo com tamanha relevância social para o país, esses sujeitos agora passam por um quadro de mudanças, infelizmente para pior, isso em função da conjuntura no início da terceira década do século XXI.

O Estado brasileiro por muitas décadas teve poucas medidas voltadas para os agricultores familiares, que produzem e vivem no espaço rural, mesmo estes sujeitos sendo extremamente importantes para o desenvolvimento rural e o cotidiano de suas vidas. Nessa toada, em meados da década de 90 do século passado, mudanças institucionais consideráveis passam a ser direcionadas para quem pratica a pequena produção agrícola: a aposentadoria rural é um dos exemplos desse processo, podendo caracterizar-se como de grande avanço civilizatório. Essa questão legalmente foi instituída a partir da vigência da Lei 11.326/2006, instrumentalizando a figura social dos agricultores familiares, definindo normativamente a definição dos sujeitos produtores agrícolas em pequenas propriedades como agricultores familiares. Segundo a lei, no artigo 3º, o agricultor familiar ou empreendedor rural tem a seguinte previsão normativa:

Aquele que pratica atividades no meio rural, atendendo, simultaneamente, aos seguintes requisitos: I - não detenha, a qualquer título, área maior do que 4 (quatro) módulos fiscais; II -utilize predominantemente mão-de-obra da própria família nas atividades econômicas do seu estabelecimento ou empreendimento; III - tenha percentual mínimo da renda familiar originada de atividades econômicas do seu estabelecimento ou empreendimento, na forma definida pelo Poder Executivo; (Redação dada pela Lei nº 12.512, de 2011) IV - dirija seu estabelecimento ou empreendimento com sua família. (BRASIL, 2006)

A institucionalização da agricultura familiar é um marco histórico que permitiu avanços na criação e expansão das políticas públicas voltadas para o meio rural brasileiro. Desta forma, buscou-se reduzir problemas socioeconômicos produtivos seculares e permitiu melhorar as condições de vida dos agricultores familiares. Contudo, “Se tardia foi a chegada de políticas de fortalecimento da agricultura familiar, tardios foram, também, os estudos sobre esse modo de produção agrícola” (OLIVEIRA, 2017, p.86OLIVEIRA, Edvaldo. Eucalyptus and family farming-predicting impacts: the case of Planalto da Conquista-BA. In: Rural development and territorial policies: evidence in the Brazilian Northeast. Editora UESB, 2017, p.83-108;). Os estudos, por muito tempo foram direcionados sobre a questão agrária brasileira, principalmente na perspectiva da Geografia Agrária brasileira, como esta seria a única agenda de estudos do mundo rural. Nesse entendimento, abordagens como os desdobramentos sociais e econômicos da aposentadoria rural tem sua importância como renda familiar estratégica. Desse lado, Grisa e Schneider(2014)GRISA, Catia and SCHNEIDER, Sergio. Three generations of public policies for family farming and forms of interaction between society and the state in Brazil. Rev. economy Sociol. Rural vol.52 supl.1 Brasília, 2014; embasam essa categoria no fato que e sua extensão na questão das políticas públicas,

Historicamente, a agricultura familiar ou “os pequenos agricultores” – como eram denominados até cerca de duas décadas atrás – sempre estiveram às margens das ações do Estado brasileiro, não raro incrementando sua fragilidade diante das opções de desenvolvimento perseguidas no País. Iniciando uma nova trajetória para a categoria social, a Constituição de 1988 incitou novos espaços de participação social e reconheceu direitos; a criação do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura (Pronaf) em 1995 desencadeou a emergência de outras políticas diferenciadas de desenvolvimento rural [...] (GRISA E SCHNEIDER 2014, p.04GRISA, Catia and SCHNEIDER, Sergio. Three generations of public policies for family farming and forms of interaction between society and the state in Brazil. Rev. economy Sociol. Rural vol.52 supl.1 Brasília, 2014;)

Apesar dessas contradições, que perpassa o benefício como “política compensatória” e do complexo contexto estrutural do “desaparecimento”, observamos ainda a forte potencialidade da agricultura familiar no Brasil, e quiça, no Nordeste. Pois mesmo com entraves sociais, econômicos e políticos, continuam na atividade agrícola ou não-agrícola enquanto fonte de renda (pluriatividade). No país, de acordo com o Censo Agropecuário (IBGE-2017BRAZILIAN INSTITUTE OF GEOGRAPHY AND STATISTICS (IBGE). Demographic census 2010. Available at: https://censo2010.ibge.gov.br/;
https://censo2010.ibge.gov.br/...
), a agricultura familiar corresponde a 77% dos estabelecimentos agropecuários brasileiros, contudo, ocupa apenas 81 milhões de hectares, isto é, 23% das terras destinadas às atividades agrícolas do país. E o índice de Gini infelizmente ainda é alto. Nos três últimos censos agropecuários (1995/96, 2006 e 2017) o índice ficou inalterado, em torno de 0,85, no valor que varia entre 0 e 1,0, quanto mais próximo de um, maior o índice de concentração da terra.

O Nordeste é a região brasileira com maior número de estabelecimentos agropecuários e de domínio da agricultura familiar (Gráfico 01), essa região, representou aproximadamente 43% do número de estabelecimentos rurais existentes no país. Contudo, percebe-se uma diminuição no número de estabelecimentos e da agricultura familiar comparados ao censo de 2006. São informações coletadas que demonstram a fragilidade ainda enfrentada pelos agricultores familiares em permanecer no espaço rural e continuar a produção agrícola e a vida desses trabalhadores, e nos parece que o benefício previdenciário pode permanecer para melhorar o quadro socioeconômico.

Gráfico 1
Estabelecimentos Agropecuários com e sem agricultores familiares no Brasil entre 2006-2017

Ato contínuo, na comparação dos Censos Agropecuários (IBGE 2006-2017BRAZILIAN INSTITUTE OF GEOGRAPHY AND STATISTICS (IBGE). Agricultural census 2006-2017. Available at: https://censos.ibge.gov.br/agro/2017/;
https://censos.ibge.gov.br/agro/2017/...
), as regiões Norte e Centro-Oeste apresentaram crescimento no número de estabelecimentos agropecuários como também do número de estabelecimentos considerados como na categoria da agricultura familiar. Na mesma linha, relevante mencionar, a problemática ambiental vivenciada em ambas regiões, em que a flora e fauna local estão sendo destruídas para dar espaço as novas fronteiras agrícolas com grandes fazendas de criação de gado e produção de soja. E nesse aspecto, o maior responsável seria o agronegócio e não a agricultura familiar. Em contraponto, a região Sudeste observa-se um crescimento no número de estabelecimentos agropecuários, mas com diminuição da agricultura familiar.

Em Sergipe, de acordo com o Censo Agropecuário (IBGE-2017BRAZILIAN INSTITUTE OF GEOGRAPHY AND STATISTICS (IBGE). Demographic census 2010. Available at: https://censo2010.ibge.gov.br/;
https://censo2010.ibge.gov.br/...
) perfazem 93.275 estabelecimentos agropecuários, sendo 72.060 enquadram-se na categoria da agricultura familiar. Os dados do censo atual, quando comparados com o censo agropecuário de 2006, demonstra uma diminuição no número de estabelecimentos agropecuários, bem como daqueles considerados como de agricultura familiar em Sergipe (Gráfico 01). A diminuição corresponde a 7.331 dos estabelecimentos agropecuários no geral e 18.270 de estabelecimentos da agricultura familiar, o que efetivamente demonstra que o processo de diminuição do número de estabelecimentos agropecuários foi mais forte na categoria da agricultura familiar.

Uma situação que remete às problemáticas socioeconômicas ainda vivenciadas no rural brasileiro e também, a absorção de pequenas áreas por fazendas monocultoras, além da expansão urbana que avança sobre propriedades produtivas familiares. Dois processos bem conhecidos em determinada literatura clássica (SILVA, 1981SILVA, José Graziano da. What is Agrarian Question? São Paulo: Brasiliense publishing house, 1981;), que denominaram como processos de fagocitose. Entretanto, o processo é bem mais complexo que simplesmente explicar a questão da concentração da propriedade, pelo convencional procedimento de compra e venda de estabelecimentos agropecuários, ou pela incorporação imobiliária em áreas periurbanas para fins de loteamento com forte impacto na constituição da renda fundiária, esta operacionalizada pelo aumento dos preços dos ativos reais no mercado de imóveis urbanos.

Dessa maneira, a agricultura familiar no Brasil possui enorme potencialidade produtiva, mesmo sendo heterogênea, isto é, a realidade da agricultura familiar no país é muito distinta, e por isso não podendo ocorrer políticas públicas verticalizadas. Os autores Schneider e Cassol (2013)SCHNEIDER, Sergio and CASSOL, Abel. Family Farming in Brazil. Job Documents Series N° 145. Job Group: Desarrollo con Cohesión Territorial. Territorial Cohesion Program for Development. Rimisp, Santiago, Chile; destacam 3 tipos de agricultura familiar no Brasil. A primeira, a Agricultura Familiar especializada, com o maior quantitativo populacional do espaço rural brasileiro, tendo a renda decorrente da agropecuária. A segunda, é Agricultura Familiar com múltiplas fontes de ingresso, que se constitui em grupo minoritário no rural e cuja renda tem como fonte outras atividades econômicas, programas sociais e aposentadoria social rural. A terceira, é a Agricultura Familiar de residentes rurais, que são sujeitos que usam o espaço rural como espaço de moradia, sendo a atividade agrícola mínima ou em atividade não agrícola.

Apesar dessas classificações, é sabido que a atividade agrícola perfaz a principal fonte de renda e de reprodução do trabalho dos agricultores familiares. Entretanto, as mudanças sociais, econômicas e culturais na sociedade operam também por outras atividades no espaço rural brasileiro. O exemplo bastante conhecido de atividades voltadas ao turismo, cuja atividade não descaracteriza o agricultor, ao contrário, lhe permite aproveitar melhor o seu estabelecimento e assim ascender a renda familiar. A autonomia dos agricultores familiares é fundamental para que estes possam continuar no espaço rural, e que operam também na articulação de políticas públicas, de transferência de renda e de benefícios sociais garantidos pela Constituição Federal-1988, como é o caso da previdência social. E quando destinada a previdência social rural, a questão torna mais relevante ainda na medida em que abrange um amplo contingente de trabalhadores e agricultores familiares que sempre formaram um grupo significativo de pobres.

Trajetoria da previdência social rural brasileira e perspectivas no município de Itabaiana-SE

O sistema previdenciário brasileiro emerge em meados da década de 20 do século passado, com viés urbano e direcionado a uma pequena parcela da população do país, sendo um sistema contributivo direto. Era evidente que o pequenos agricultores familiares que viviam no meio rural era excluído, e que sempre se caracterizou como uma fração social historicamente marginalizada. Não havia qualquer previsão normativa de proteção social desses trabalhadores rurais Assim, por muitas décadas esses foram colocados “de lado” dos direitos previdenciários no Brasil, ampliando ainda mais o fosso social, na medida em que uma minoria, geralmente concentrada nas atividades industriais e de serviços, teria essa tutela normativa. Portanto, um fenômeno tipicamente brasileiros do ponto de vista dos chamados direitos sociais.

Por outro lado, somente a partir da década de 1970 se caracterizaria como uma nova marca no processo de proteção social via benefício previdenciário, ou seja, de avanços no sistema previdenciário rural brasileiro. Assim, lavradores, camponeses, trabalhadores rurais avulsos, etc. passaram a ter o direito institucionalizado em lei, que assegurariam aposentadorias e pensões. Ainda assim, apesar desses avanços conquistados, o sistema previdenciário continuaria seletivo, desigual e precário e mais preocupante: não era um benefício universal e protegia poucos. Os autores Delgado e Jr, (1999, p.01)DELGADO, Guilherme C. and JR José Celso Cardoso. The elderly and rural social security in Brazil: the recent experience of universalization. Institute of Research and Applied Economics-IPEA, Rio de Janeiro, December 1999; observam que:

Demorou praticamente meio século, desde a promulgação da Lei Eloi Chaves em 1923, que regulamentou a criação das Caixas de Aposentadorias e Pensões (CAP) dos trabalhadores urbanos, para que se inaugurasse no Brasil um sistema de assistência social aos idosos e inválidos do setor rural. Tal sistema, inaugurado pela Lei Complementar nº 11, de 1971, e implementado a partir de 1972 com o Programa de Assistência ao Trabalhador Rural/Fundo de Assistência e Previdência do Trabalhador Rural (PRORURAL/FUNRURAL), assistia os trabalhadores rurais, pescadores (a partir de 1972) e garimpeiros (a partir de 1975), oferecendo benefícios precários de aposentadoria por idade aos 65 anos, limitados ao cabeça do casal e tendo meio salário mínimo como teto. (DELGADO e JR, 1999, p.1DELGADO, Guilherme C. and JR José Celso Cardoso. The elderly and rural social security in Brazil: the recent experience of universalization. Institute of Research and Applied Economics-IPEA, Rio de Janeiro, December 1999;)

Durante o interregno 1972-1977, o Programa de Assistência ao Trabalhador Rural (PRORURAL) era separado do sistema previdenciário urbano, ou seja, o Brasil não tinha unificado o sistema previdenciário, mesmo com a institucionalização provocada pelo FUNRURAL/PRORURAL. O Fundo de Assistência e Previdência do Trabalhador Rural (FUNRURAL) estava assegurando uma pequena parcela masculina da população rural. Neste contexto, o Instituto Nacional de Previdência Social (INPS) planejava os programas assistenciais da população trabalhadora urbana. A limitação dos recursos públicos disponíveis e a fragilidade do planejamento estatal em relação ao setor, demonstraram a fragilidade do atendimento voltado à população rural, além dos pífios resultados sociais de proteção social destinado aos pequenos produtores rurais, agregando-se que a esmagadora maioria recebia salário-mínimo, e nesse período havia os valores do salário básico eram corroídos sequencialmente pela espiral inflacionária.

Nos termos do parágrafo único da Lei Complementar nº 11, de 25 de maio de 1971, podemos observar mais uma restrição aos beneficiários da aposentadoria rural, como disposto em seu comando normativo, que: “Não será devida a aposentadoria a mais de um componente da unidade familiar, cabendo apenas o benefício ao respectivo chefe ou arrimo”. A lei que criaria o Programa de Assistência ao Trabalhador Rural menciona e deixa claro que o direito era assegurado apenas ao homem, gerando uma desigualdade de gênero no meio rural brasileiro, observando que nesse período a composição das famílias rurais era constituída por muitos membros dependentes. Além disso, o benefício seria concedido apenas a um membro da família independente de quantos membros se encaixassem nas exigências.

Nessa quadra, o PRORURAL além de ser desigual, não considerava as particularidades dos lavradores, pequenos agricultores e trabalhadores rurais avulsos, exigindo que os mesmos assegurasse o recolhimento das contribuições e a sua não efetivação geraria multas para o mesmo, numa autêntica assimetria de informações entre a instituição e o beneficiário previdenciário. Valadares e Galiza (2016, p.08)VALADARES, Alexandre Arbex and GALIZA, Marcelo. Rural Social Security: Contextualizing the debate around funding and access rules. Institute of Research and Applied Economics-IPEA, Brasília, May 2016., destacam que a manutenção do programa deveria provir de “[...] 2% sobre o valor de comercialização do produtor, recolhida pelo adquirente ou pelo produtor que vendesse diretamente o consumidor, e, ainda, de uma alíquota de 2,4% sobre a folha de pagamento das empresas” (op. cit.). Sendo um programa que enfrentou diversos entraves operacionais e não beneficiou o público rural de forma qualitativa, desdobrando seus resultados negativos para os mais pobres.

Esse modelo de sistema previdenciário, que o trabalhador contribuiria para usufruir no futuro, de acordo com Schwarzer (2000)SCHWARZER, Helmut. Socioeconomic impacts of the rural pension system in Brazil — empirical evidence from a case study in the state of Pará. Institute of Research and Applied Economics-IPEA, Rio de Janeiro, June 2000;, é chamado de modelo bismarckiano. Tal modelo foi assumido pelo Estado brasileiro de formar descriminante com relação aos agricultores familiares, pois esses trabalhadores possuem particularidades como a sazonalidade dos cultivos e atividades, além de não possuírem um rendimento fixo. Esses entraves perpassam por diversas décadas e geram dilemas sociais no meio rural brasileiro.

O PRORURAL era administrado pelo Fundo de Assistência e Previdência do Trabalhador Rural (FUNRURAL), entretanto, seus principais beneficiários eram os trabalhadores das agroindústrias que tinham carteira assinada, se considerarmos como estrato a força de trabalho que vivem no meio rural. De acordo com Delgado (2015, p.435)DELGADO, Guilherme C. Social security and rural development. In: In Public Policy for Rural Development in Brazil. UFRGS Publisher, 2015, part 2, pg. 155-180;, o programa “[...] não incluiu todos os riscos incapacitantes ao trabalho, que são protegidos pela Previdência Social à época”. Esses mecanismos estatais foram insuficientes para assegurar os agricultores familiares a uma aposentadoria rural digna capaz de proporcionar segurança social.

Em 1988, com a promulgação da Constituição Federal (CF.), a questão das desigualdades (sociais, regionais, raciais, setoriais, etc.) eram inseridas como normas preditivas, e nele novos direitos sociais seriam incluídos visando tutelar direitos, de caráter universal, diretamente para os agricultores familiares, trabalhadores rurais, etc. Além dos avanços que a CF de 1988 proporcionou, as leis infra-constitucionais em vigência a partir de 1991, asseguraram e regulamentaram a previdência social para os atores sociais sempre esquecidos. Essas mudanças institucionais permitiram uma segurança social aos agricultores familiares e uma igualdade de direitos previdenciários no Brasil. Segundo Delgado e Jr, (1999, p.01)DELGADO, Guilherme C. and JR José Celso Cardoso. The elderly and rural social security in Brazil: the recent experience of universalization. Institute of Research and Applied Economics-IPEA, Rio de Janeiro, December 1999; as principais mudanças foram:

a) equiparação de condições de acesso para homens e mulheres (o antigo regime era específico para o cabeça do casal); b) redução do limite de idade para aposentadoria por idade (60 anos para homens e 55 para mulheres); e c) estabelecimento de um piso de aposentadorias e pensões em um salário mínimo (o regime anterior estabelecia teto em meio salário mínimo para o público do FUNRURAL e pensões limitadas a 30% do benefício principal). (DELGADO; JR, 1999, p.1DELGADO, Guilherme C. and JR José Celso Cardoso. The elderly and rural social security in Brazil: the recent experience of universalization. Institute of Research and Applied Economics-IPEA, Rio de Janeiro, December 1999;)

Em análise dos dados disponibilizados no site da Secretaria Especial de Previdência e Trabalho (SEPT), conforme consta nos boletins estatísticos da previdência social, em dezembro de 2020, o Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) já tinha emitido, entre os anos de 2006-2020, precisamente 9.764.823 benefícios concedidos à população rural, com montante de R$ 9.099.309.452 destinados. Os valores pagos a cada beneficiário rural teve em média de R$931,85, enquanto no urbano a média seria de R$1.505,89. Além do direito à aposentadoria, a população rural teria acesso a outros direitos como: pensão por morte, auxílios doenças, acidente e salário-maternidade ou ainda de transferência de renda, como o Benefício da Prestação Continuada(BPC).

A previdência rural é hoje uma ação institucional aparentemente democrática, representando a superação das perversidades-limitações das legislações anteriores e garantindo melhorias na vida de milhões de pessoas com este direito, mesmo que ainda se enfrente diversos entraves até alcança-lo a efetividade. Contudo, sua importância é maior que os problemas de planejamento e atendimento ao público alvo. Na América Latina, o Brasil é uma das referências na proteção social dos agricultores familiares, tendo uma seguridade avançada que atrai os olhares do mercado financeiro e do segmento que opera na previdência privada.

Os direitos precisam ser assegurados de forma universal, que saiam do papel e se firmem na vida dos brasileiros de forma equitativa e pública. Como atestado por Quintero et.al (2017)QUINTERO, Sandra Patricia Duque, QUINTERO, Marta Lucía Quintero and QUINTERO, Derfrey Antonio Duque. Social security as a fundamental right for rural communities in Colombia. Legal Opinion, Vol. 16, No. 32, pp. 189-209 - ISSN 1692-2530 • Julio-December 2017 / 272 p. Medellin, Colombia;

Es necessário entonces, avanzar hacia enfoques que hagan más integrales y universales los sistemas de seguridad social, dado su rol en la superación de condiciones tradicionales de pobreza y en la construcción de sociedades más incluyentes, esto es, trascender el concepto de “sistema” de seguridad social a un concepto de “derecho fundamental” de la seguridad social, con enfoque diferencial para las comunidades rurales en Colombia. (QUINTERO; Et. all., 2017 P. 206QUINTERO, Sandra Patricia Duque, QUINTERO, Marta Lucía Quintero and QUINTERO, Derfrey Antonio Duque. Social security as a fundamental right for rural communities in Colombia. Legal Opinion, Vol. 16, No. 32, pp. 189-209 - ISSN 1692-2530 • Julio-December 2017 / 272 p. Medellin, Colombia;)

Em Itabaiana-SE, a população rural é de aproximadamente 19 mil habitantes segundo dados do IBGE(2021). Destes, 6.364 são idosos aposentados e atendidos pelo INSS. Em sua maioria enquadraram-se como moradores do meio rural e ainda exercem, mesmo em proporções menores, como “agricultores familiares idosos”, operando em que a aposentadoria é a renda principal da unidade familiar e a renda extraída da atividade agrícola como recurso financeiro complementar, mas que efetivamente se expressa como continuidade nas atividades sócioprodutivos existente no espaço rural de Itabaiana.

A previdência rural é um estimulo na melhoria da vida dos agricultores itabaianenses e permite a esses atores sociais superar privações históricas na reprodução socioeconômica do município, ampliando até mesmo o consumo de produtos duráveis e não duráveis. Pois esses beneficiários em suas unidades produtivas ainda atuam produzindo culturas tradicionais como batata doce, mandioca, feijão, milho e hortifrutigranjeiro, atividades agrícolas praticamente consolidadas no município.

O número de agricultores família beneficiários do INSS em Itabaiana-SE, permite que essa política ofereça dignidade à população rural, e os ganhos reais do salário mínimo nos últimos quinze anos, tem demonstrado mudanças qualitativas para aqueles que estão na faixa etária considerada como idosa, pois sentem-se protegidos pela garantia de ter acesso a aposentadoria e a outros serviços concedidos pelo INSS. Basta observar que descendentes, parentes de segundo grau (como os netos) ou até mesmo parentes colaterais, dependem diretamente desses benefícios, sendo um fato comum.

O empobrecimento de brasileiros nos últimos cinco anos certamente tem apontado essa dependência familiar, por sinal um processo que explica o fenômeno da migração de retorno, face a crise econômica que se estende e agora agravada pela pandemia da COVID-19. Daí o questionamento se realmente temos o fenômeno do “esvaziamento demográfico”, quando a “eterna” crise econômica brasileira altera substancialmente não apenas o padrão demográfico, mas a organização espacial do meio rural, em destaque na região Nordeste e que se reproduz também no município de Itabaiana/SE.

Portanto, a expectativa de vida entre os agricultores familiares deverá aumentar e com ele das possibilidades de ampliação do mercado de consumo. Entretanto, salientar que o país enfrenta uma de suas maiores crises e certamente para os próximos anos a tendência será a perda da capacidade aquisitiva, o que terá consequências no meio rural extremamente negativa. Ainda assim, os recursos direcionados a estes atores sociais rurais formam um processo atrativo de melhorias sociais e econômicas para o país. Entretanto, esses sujeitos enfrentam diversos problemas, devido a negação de seus direitos, tais como o desmonte da saúde pública nos espaços rurais e o avanço neoliberal sobre o sistema previdenciário brasileiro, então se faz urgente o acesso qualitativo e equitativo aos serviços públicos para os idosos e toda a população do país.

Considerações finais

A renda previdenciária dinamiza o consumo e a produção, favorecendo os indicadores econômicos de bem-estar social de todos os seus beneficiários. Sendo assim, o sistema previdenciário social contribui decisivamente para o combate à pobreza rural e rompe com os laços históricos que compreendiam os agricultores familiares como “não trabalhadores”, assegurando-lhes um direito básico, que lhes proporcionam melhorias qualitativas de vida individual e social.

A pobreza rural ainda é vivenciada por milhões de brasileiros, privados de oportunidades que poderiam melhorar suas vidas. A pobreza é demarcada para além da ausência de alimentos na mesa, perfazendo barreiras impostas diariamente a classe trabalhadora rural. No espaço rural fica evidente que a existência de aposentados rurais que condiciona menor índice de pobreza nas unidades produtivas, pois a previdência proporciona uma renda mínima aos agricultores familiares, reduz a fome, a desnutrição e consequentemente, incentiva e estimula de forma simplória o desenvolvimento rural.

Quando é assegurado o direito social a todos os brasileiros e a outros benefícios do sistema previdenciário brasileiro, este fato permite a valorização dos agricultores familiares e contribui para uma melhor qualidade de vida no meio rural. Consequentemente, promove melhorias de vida no espaço rural, de forma que permite aos idosos continuarem na sua propriedade, se reproduzindo socialmente. Os benefícios além de serem utilizados pelos agricultores idosos aposentados, permitem que os filhos continuem com os pais na produção agrícola. Fato que diminui a migração campo-cidade e incentiva a continuidade da pequena produção agrícola. Cabe destacar, que, a melhoria das condições de vida é para toda a sociedade brasileira voltada ao rural, pois os recursos previdenciários ampliam o consumo, quando estes benefícios são diretamente aplicados.

A previdência social rural brasileira perpassou por um processo longo até sua universalização, fato que está sendo ameaçado pela reforma da previdência, instituída no país, mas que não afeta os agricultores diretamente, deixando marcas de uma possível reforma previdenciária rural futura. Nos próximos anos devido o déficit financeiro estatal que o país vivencia, criado pelas renuncias financeiras, gestões desastrosas e com os investimentos decorrentes da pandemia da COVID-19, caberá a sociedade resistir a futuras investidas de retirada dos direitos sociais com a vigência da emenda constitucional o campo da previdência social. Destarte, a previdência social rural precisa ter continuidade, readequação e melhorias para que o rural brasileiro continue cultural e socialmente vivo.

References

  • BRAZIL. Constitution of the Federative Republic of Brazil From 1988 Brasília, October 5, 1988;
  • BRAZIL. Complementary Law No. 11, of May 25, 1971 - Establishes the Rural Worker Assistance Program, and makes other provisions. Official Federal Gazette -Section 1 - 5/26/1971, Page 3969;
  • BRAZIL. LAW No. 11,326, OF JULY 24, 2006. - Establishes guidelines for the formulation of the National Policy on Family Agriculture and Rural Family Enterprises. Presidency of the Republic Civil House Sub-chief for Legal Affairs, Brasília, 2006;
  • BRAZIL. LAW No. 11,718, OF JUNE 20, 2008 - Adds article to Law No. 5,889, of June 8, 1973 and amends Laws No. 8,171, of January 17, 1991, 7,102, of June 20, 1993, 9,017, of March 30, 1995, and 8,212 and 8,213, both of July 24, 1991. Presidency of the Republic Civil House Sub-chief for Legal Affairs. Brasilia, June 20, 2008;
  • BRAZIL. Constitutional Amendment No. 103, of November 12, 2019 - amends the social security system and establishes transition rules and transitional provisions. Brasília, on November 12, 2019;
  • BUAINAIN, Antônio et al. The rural world in 21st century Brazil: the formation of a new agrarian and agricultural pattern. Brasília: technical editors, EMBRAPA, 2014.
  • DELGADO, Guilherme C. and JR José Celso Cardoso. The elderly and rural social security in Brazil: the recent experience of universalization. Institute of Research and Applied Economics-IPEA, Rio de Janeiro, December 1999;
  • DELGADO, Guilherme C. From financial capital in agriculture to the agribusiness economy: cyclical changes in half a century (1965-2012). Porto Alegre/RS: UFRGS publisher, 2012.
  • DELGADO, Guilherme C. Social security and rural development. In: In Public Policy for Rural Development in Brazil UFRGS Publisher, 2015, part 2, pg. 155-180;
  • GRISA, Catia and SCHNEIDER, Sergio. Three generations of public policies for family farming and forms of interaction between society and the state in Brazil. Rev. economy Sociol. Rural vol.52 supl.1 Brasília, 2014;
  • BRAZILIAN INSTITUTE OF GEOGRAPHY AND STATISTICS (IBGE). Agricultural census 2006-2017 Available at: https://censos.ibge.gov.br/agro/2017/;
    » https://censos.ibge.gov.br/agro/2017/
  • BRAZILIAN INSTITUTE OF GEOGRAPHY AND STATISTICS (IBGE). Demographic census 2010 Available at: https://censo2010.ibge.gov.br/;
    » https://censo2010.ibge.gov.br/
  • OLIVEIRA, Edvaldo. Eucalyptus and family farming-predicting impacts: the case of Planalto da Conquista-BA In: Rural development and territorial policies: evidence in the Brazilian Northeast. Editora UESB, 2017, p.83-108;
  • QUINTERO, Sandra Patricia Duque, QUINTERO, Marta Lucía Quintero and QUINTERO, Derfrey Antonio Duque. Social security as a fundamental right for rural communities in Colombia Legal Opinion, Vol. 16, No. 32, pp. 189-209 - ISSN 1692-2530 • Julio-December 2017 / 272 p. Medellin, Colombia;
  • SCHNEIDER, Sergio and CASSOL, Abel. Family Farming in Brazil. Job Documents Series N° 145. Job Group: Desarrollo con Cohesión Territorial. Territorial Cohesion Program for Development. Rimisp, Santiago, Chile;
  • SCHWARZER, Helmut. Socioeconomic impacts of the rural pension system in Brazil — empirical evidence from a case study in the state of Pará Institute of Research and Applied Economics-IPEA, Rio de Janeiro, June 2000;
  • SILVA, José Graziano da. What is Agrarian Question? São Paulo: Brasiliense publishing house, 1981;
  • VALADARES, Alexandre Arbex and GALIZA, Marcelo. Rural Social Security: Contextualizing the debate around funding and access rules. Institute of Research and Applied Economics-IPEA, Brasília, May 2016.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    25 Jul 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    21 Nov 2021
  • Aceito
    26 Mar 2022
UESB - Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia ESTRADA DO BEM QUERER KM 4, Vitória da Conquista - Bahia / Brasil, CEP 45083-900 Caixa postal 95, Tel: +55 (77) 3242-8741 - Vitória da Conquista - BA - Brazil
E-mail: geopauta@uesb.edu.br