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CARTA DO EDITOR

CARTA DO EDITOR

Neste número, o leitor encontrará detalhada radiografia do percurso de História, Ciências, Saúde – Manguinhos. Esperamos que seja, para você, tão esclarecedora quanto foi instrutivo, para nós, realizá-la.

A poucos meses de completar 13 anos de veiculação contínua, a revista mescla características de periódicos mais jovens a outras, típicas dos que já alcançaram a maturidade. A oferta gratuita de textos completos na versão online (http://www.scielo.br/hcsm) nos torna co-participantes de um movimento positivo, saudável, de democratização do conhecimento científico, com grandes benefícios no tocante ao alcance e à visibilidade da revista e sem prejudicar as edições em papel, onde ainda ocorrem as principais inovações gráficas. Certos indicadores nos infundem otimismo, outros pedem reflexão mais cuidadosa sobre os rumos a seguir.

Com certeza, será animada a próxima reunião dos editores da História, Ciências, Saúde _ Manguinhos, e você, leitor, que nos acompanha há mais ou menos tempo, está convidado a participar desta reflexão. Escreva-nos!

Na seção Fontes encontrará um subproduto da pesquisa feita aqui na redação por bolsistas de iniciação científica, com o fim de obter dados sobre a trajetória de História, Ciências, Saúde – Manguinhos. Trata-se da descrição da Revista Brasileira de História da Medicina, a pioneira no país nesse campo do conhecimento. Criada e editada pelo médico Ivolino de Vasconcellos, serviu como porta-voz dos médicos historiadores que se organizaram, no pós-guerra, na Sociedade Brasileira de História da Medicina e na Federação do mesmo nome. Conjugado ao artigo de Mauro Amoroso, o trabalho dos bolsistas Amanda Mendonça e Gabriel Nicolini forma quase um dossiê.

Em meio ao repertório de temas que dão o colorido particular a esta edição de História, Ciências, Saúde – Manguinhos, chamamos a atenção do leitor para outro conjunto de artigos cujo efeito combinado resulta muito interessante. Com sua habilidade para a análise conceitual, Sandra Caponi compara a obra de Jean Christian Marc Boudin, marco da geografia médica oitocentista, com teorias de aclimatação defendidas contemporaneamente. Após delimitar o solo compartilhado por elas, concernente à maior ou menor capacidade de os organismos individuais se adaptarem às determinações climáticas e ambientais, Caponi volta a se debruçar sobre as clivagens e continuidades entre essa medicina das 'zonas tórridas' e aquela instituída com a qualificação de 'tropical' em fins do século XIX. O artigo de Rosa Helena de Santana Girão de Morais oferece excelente contraponto empírico à reflexão de Caponi. A doutoranda da École des Hautes Études en Sciences Sociales (Paris) apresenta resul-tados parciais de sua pesquisa com fontes primárias pouco exploradas concer-nentes às relações da medicina naval francesa com o Brasil. Como outros médicos ligados às marinhas européias, Paul Marie Victor Bourel-Roncière, o cirurgião-chefe da estação naval criada pela França na bacia do rio da Prata, preocupa-se em compilar informações sobre as doenças da região e sobre os fatores socioambientais que determinam seu aparecimento e seus traços característicos, tendo como meta estratégica a produção de cartas nosográficas que servissem como bússolas médicas aos Estados europeus expansionistas. Informado pelos teóricos da geografia médica, Bourel-Roncière, no período de 1868 a 1870, dedica especial atenção à cidade do Rio de Janeiro, considerada uma das mais insalubres do continente. O clima, categoria fundamental nos dois referidos artigos, serve como pedra angular aos médicos colombianos na conceituação das febres que, em meados do século XIX, grassam epidemicamente no vale do rio Magdalena, cujos habitantes se dedicavam à produção de tabaco e anil. Se Girão de Morais mergulha na rede tentacular da geografia médica francesa, a historiadora colombiana Claudia Mónica García faz excelente uso da vigência deste referencial teórico, até o advento da bacteriologia, no enquadramento social de uma doença que desempenhou papel importante na consolidação da profissão médica em seu país. Daí provém outro artigo que interage de maneira proveitosa com aqueles descritos acima. Baseando-se em outro artigo de Caponi publicado nesta revista, Victoria Estrada Orrego e Jorge Márquez Valderrama analisam as dificuldades epistemológicas que marcaram, na Colômbia, a passagem da teoria dos miasmas à dos vetores, examinando controvérsias relativas ao impaludismo no seio de uma geração de médicos que emerge na arena científica à época em que se instituem as medicinas pasteuriana e tropical.

Além dos artigos que se aglomeram por essas instigantes afinidades de enfoque e abordagem, o leitor encontrará na presente edição de História, Ciências, Saúde – Manguinhos, entre outros materiais interessantes, a exaustiva descrição que faz a historiadora Filomena Amador dos textos publicados após o terremoto de Lisboa, de 1755; a instrutiva análise de Everardo Nunes das contribuições de Robert Merton (1910-2003) para o campo da sociologia médica; a instigante discussão do problema da autodeterminação de pessoas com deficiência, feita pelo psicólogo Ray Pereira a partir da rumorosa tentativa de eutanásia praticada pela mãe de Vincent Humbert, jovem francês que ficou tetraplégico, cego e mudo após um acidente automobilís-tico. Mencionamos, ainda, o estudo do sanitarista Walter Ferreira de Oliveira sobre a educação social de rua, sistema pedagógico surgido na América Latina ao final da década de 1970; e a ambiciosa revisão bibliográfica dos estudos dietéticos realizados no Brasil entre meados do século XIX e início do século XXI, de autoria de Francisco de Assis Guedes de Vasconcelos, professor de nutrição da Universidade Federal de Santa Catarina.

Encerramos esta carta com agradecimentos a todos aqueles que vêm colaborando conosco na emissão de pareceres sobre os originais submetidos à publicação em História, Ciências, Saúde – Manguinhos. Membros ou não de seu conselho editorial, põem seu saber, sua experiência e seu tempo precioso a serviço da revista, generosamente colaborando com a difusão da literatura em história das ciências e da medicina.

A esses colaboradores, condenados ao anonimato, um muito obrigado.

Jaime L. Benchimol

Editor

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    04 Maio 2007
  • Data do Fascículo
    Mar 2007
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