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A rota dos nórdicos à USP: notas sobre O comércio varegue e o grão-principado de Kiev (1942), de E. Simões de Paula

The route from the Norsemen to USP: notes on O comércio varegue e o grão-principado de Kiev (1942), by E. Simões de Paula

Resumo

Em 1942, era defendida na Universidade de São Paulo a primeira tese doutoral em História feita no Brasil, intitulada O comércio varegue e o Grão-Principado de Kiev , escrita por Eurípedes Simões de Paula (1910-1977). Apesar de sua importância, especialmente para os estudos da chamada “Idade Média”, pouca atenção foi dada à tese, que foi relegada a um trabalho consolidador da influência dos Annales no Brasil. Mesmo em produções dedicadas ao balanço da medievalística brasileira, a tese é quase sempre mencionada muito brevemente, quando não é ignorada como um todo ou até mesmo criticada por sua suposta falta de influência no campo. Este artigo, fruto de uma pesquisa ainda em estágio inicial, visa apresentar o conteúdo do trabalho e suas bases teóricas e bibliográficas, enfatizando sua relação com a perspectiva teórica de Henri Pirenne e com a perspectiva evolucionista da história russa.

Palavras-chave
Eurípedes Simões de Paula; Historiografia; História medieval

Abstract

In 1942, the first doctoral thesis in History made in Brazil was defended at the University of São Paulo, titled O comércio varegue e o Grão-Principado de Kiev (The Varangian Commerce and the Great Principality of Kiev) and written by Eurípedes Simões de Paula (1910-1977). Despite its importance, especially for the so-called “Middle Ages” studies, little attention was paid to the thesis, relegating it to a work that consolidated the influence of the Annales in Brazil. Even in papers dedicated to survey Brazilian medievalism, the thesis is almost always mentioned very briefly, when it is not ignored as a whole or even criticized for its supposed lack of influence in the field. This article, result of a study still in its initial stage, aims to present the content of the work and its theoretical and bibliographical bases, emphasizing its relationship with the theoretical perspective of Henri Pirenne and with the evolutionist perspective of Russian history.

Keywords
Eurípedes Simões de Paula; Historiography; Medieval history

Introdução

Eurípedes Simões de Paula (1910-1977) é talvez um dos historiadores brasileiros mais enigmáticos e mal compreendidos. Tal afirmação pode causar estranheza aos leitores dada sua importância, afinal, seus feitos para a consolidação da História no país são notáveis. Além de professor catedrático de História da Civilização Antiga e Medieval na Universidade de São Paulo (USP) e diretor da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da mesma instituição por seis vezes, Simões de Paula foi um dos fundadores da Revista de História uspiana e da Associação dos Professores Universitários de História (ANPUH). Também foi membro de várias sociedades científicas, doutor honoris causa pela Universidade de Toulouse, ex-combatente da Força Expedicionária Brasileira durante a Segunda Guerra Mundial e vice-reitor da USP.

Eurípedes tampouco é desconhecido da academia: foi objeto central ou tangencial de diversos trabalhos e memoriais, embora com grande ênfase em sua face administrativa, militar e de difusor da produção acadêmica brasileira (Glezer, 1983GLEZER, Raquel. Eurípedes Simões de Paula: uma bibliografia. In: VV. AA. In memoriam de Eurípedes Simões de Paula: artigos, depoimentos de colegas, alunos, funcionários e ex-companheiros de FEB; vida e obra. São Paulo: FFLCH, 1983. p. 661-706. ; Roiz, 2020ROIZ, Diogo da Silva. O curso de Geografia e História da FFCL/USP e a constituição de um campo disciplinar em São Paulo (1934-1968). São Paulo: Alameda, 2020. , p. 317-337; Roiz; Santos, 2012ROIZ, Diogo da Silva; SANTOS, Jonas Rafael. As transferências culturais na historiografia brasileira: leituras e apropriações do movimento dos Annales no Brasil. Jundiaí: Paco Editorial, 2012. , p. 172-186; Silva, 2009 SILVA, Janice Theodoro da. Eurípedes Simões de Paula (1910-1977). Revista de História, São Paulo, n. 160, p. 17-50, 2009. Disponível em: https://rb.gy/vmaxr1 . Acesso em: 10 mar. 2023.
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, 2019SILVA, Patrícia Helena Gomes da. Um soldado do ofício: análise da trajetória intelectual de Eurípedes Simões de Paula nos anos 1940-1960. 2019. Dissertação (Mestrado em História) — Programa de Pós-Graduação em História, Universidade Federal de São Paulo, Guarulhos, 2019. , 2020 SILVA, Patrícia Helena Gomes da. A construção do perfil biográfico de Eurípedes Simões de Paula na historiografia brasileira: entre a fabricação de uma identidade historiadora e a elaboração dos lugares da memória. In: XXV ENCONTRO ESTADUAL DE HISTÓRIA — ANPUH, 25, 2020, São Paulo. Anais […]. São Paulo: ANPUH, 2020. p. 1-18. Disponível em: https://bit.ly/3Ud4Nyy . Acesso em: 12 mar. 2022.
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). Nessas produções e em outras, Simões de Paula é famoso por ser um dos principais expoentes do movimento historiográfico dos Annales na historiografia brasileira, influenciado principalmente por Fernand Braudel (1902-1985) quando este ainda lecionava na USP. Tamanha seria a ligação com os Annales que alguns autores insistem que sua produção acadêmica foi influenciada pelo modo francês de conceber e pesquisar a História (Capelato; Glezer; Ferlini, 1994 CAPELATO, Maria Helena Rolim; GLEZER, Raquel; FERLINI, Vera Lúcia Amaral. Escola uspiana de História. Estudos Avançados, São Paulo, v. 8, n. 22, p. 349-358, 1994. Disponível em: https://bit.ly/3AZVUiY . Acesso em: 11 mar. 2022.
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, p. 359; Motoyama, 1983MOTOYAMA, Shozo. Eurípedes Simões de Paula e a ideia de cultura abrangente. In: VV. AA. In memoriam de Eurípedes Simões de Paula: artigos, depoimentos de colegas, alunos, funcionários e ex-companheiros de FEB; vida e obra. São Paulo: FFLCH, 1983. p. 457-472. , p. 459-464) 1 1 A associação entre Eurípedes e os Annales em sua memorialística se dá especialmente por conta de seu prefácio presente na primeira Revista de História (Simões de Paula, 1950 ). .

Há uma outra face de Simões de Paula que curiosamente recebeu (e ainda recebe) pouquíssima atenção historiográfica: o Eurípedes pesquisador e, de especial interesse aqui, o Eurípedes medievalista. Outra façanha do uspiano foi ter produzido e defendido a primeira tese de doutorado em História no Brasil em 1942, intitulada O comércio varegue e o Grão-Principado de Kiev (CVGPK). Mesmo com sua produção não se restringindo à História Medieval, tampouco a tese sendo sua primeira contribuição ao campo (Glezer, 1983GLEZER, Raquel. Eurípedes Simões de Paula: uma bibliografia. In: VV. AA. In memoriam de Eurípedes Simões de Paula: artigos, depoimentos de colegas, alunos, funcionários e ex-companheiros de FEB; vida e obra. São Paulo: FFLCH, 1983. p. 661-706. , p. 682-683), grande parte dos balanços e análises sobre a produção medievalística no Brasil tendem a tratar Simões de Paula como um tópos de pai fundador da disciplina (Almeida, 2013 ALMEIDA, Néri de Barros. A História Medieval no Brasil. Signum, Rio de Janeiro, v. 14, n. 1, p. 1-16, 2013. Disponível em: https://tinyurl.com/2ap9x5xk . Acesso em: 9 maio 2024.
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, p. 9-10; Alvaro; Mota, 2019ALVARO, Bruno Gonçalves; MOTA, Bruna Oliveira. Grandes sertões do Nordeste brasileiro: o horizonte dos estudos medievais nos Programas de Pós-Graduação em História. In: AMARAL, Clínio; LISBÔA, João (org.). A historiografia medieval no Brasil: de 1990 a 2017. Curitiba: Appris, 2019. p. 93-127. , p. 104; Asfora; Aubert; Castanho, 2008 ASFORA, Wanessa Colares; AUBERT, Eduardo Henrik; CASTANHO, Gabriel de Carvalho Godoy. Faire l’histoire du Moyen Âge au Brésil: fondements, structures, développements. Bulletin du centre d’études médiévales d’Auxerre (BUCEMA), Auxerre, v. 12, p. 1-15, 2008. Disponível em: https://bit.ly/3RRuzX2 . Acesso em: 11 mar. 2022.
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, p. 11-12, 2010ASFORA, Wanessa Colares; AUBERT, Eduardo Henrik; CASTANHO, Gabriel de Carvalho Godoy. L’histoire médiévale au Brésil: structure d’un champ disciplinaire. In: MAGNANI, Eliana (org.). Le Moyen Âge vu d’ailleurs: voix croisées d’Amérique latine et d’Europe. Dijon: Éditions Universitaires de Dijon, 2010. p. 53-118. , p. 92, 95; Bastos; Rust, 2008 BASTOS, Mario Jorge da Motta; RUST, Leandro Duarte. Translatio Studii: a história medieval no Brasil. Signum, Rio de Janeiro, n. 10, p. 163-188, 2008. Disponível em: https://rb.gy/sx5ubo . Acesso em: 10 mar. 2023.
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, p. 167-168; Cândido da Silva; Sobreira, 2019CÂNDIDO DA SILVA, Marcelo; SOBREIRA, Victor. O Laboratório de Estudos Medievais: balanço e perspectivas. In: AMARAL, Clínio; LISBÔA, João (org.). A historiografia medieval no Brasil: de 1990 a 2017. Curitiba: Appris, 2019. p. 251-261. , p. 252; Grzybowski; Birro, 2019GRZYBOWSKI, Lukas Gabriel; BIRRO, Renan Marques. Um ensaio historiográfico sobre a escandinavística brasileira. In: AMARAL, Clínio; LISBÔA, João (org.). A historiografia medieval no Brasil: de 1990 a 2017. Curitiba: Appris, 2019. p. 23-58. , p. 26; Lima, 2019LIMA, Douglas Mota Xavier de. Uma História do porvir: a medievalística brasileira em terras amazônicas. In: AMARAL, Clínio; LISBÔA, João (org.). A historiografia medieval no Brasil: de 1990 a 2017. Curitiba: Appris, 2019. p. 61-90. , p. 62; Macedo, 2006MACEDO, José Rivair. Os estudos medievais no Brasil: tentativa de síntese. Reti Medievali, Nápoles, n. 7, v. 1, p. 1-9, 2006. , p. 1, 2019MACEDO, José Rivair. Prefácio. In: AMARAL, Clínio; LISBÔA, João (org.). A historiografia medieval no Brasil: de 1990 a 2017. Curitiba: Appris, 2019. p. 9-15. , p. 13-14; Miatello, 2017 MIATELLO, André. A História Medieval na graduação em História: da pesquisa à docência. Revista Chilena de Estudios Medievales, Santiago, n. 11, p. 68-90, 2017. Disponível em: https://rb.gy/o1zz7e . Acesso em: 10 mar. 2023.
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, p. 74; Muceniecks, 2014MUCENIECKS, André Szczawlinska. Austrvegr e Garđaríki — (re)significações do leste na Escandinávia tardo-medieval. 2014. Tese (Doutorado em História Social) — Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2014. , p. 79; Nogueira, 2002 NOGUEIRA, Carlos Roberto Figueiredo. Os estudos medievais no Brasil de hoje. Medievalismo, Murcia, n. 12, p. 291-298, 2002. Disponível em: https://rb.gy/brxetp . Acesso em: 10 mar. 2023.
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, p. 291).

Sua “paternidade” dos estudos medievais no Brasil, contudo, é frequentemente reconhecida por uma suposta negligência e uma implícita “falta de compromisso” com o campo dos estudos medievais, o que demonstra uma curiosa frustração de expectativas por parte de autores com seu pioneirismo. Por exemplo, Néri Almeida ( 2013 ALMEIDA, Néri de Barros. A História Medieval no Brasil. Signum, Rio de Janeiro, v. 14, n. 1, p. 1-16, 2013. Disponível em: https://tinyurl.com/2ap9x5xk . Acesso em: 9 maio 2024.
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, p. 9) constatou que “Eurípedes Simões de Paula era e continuou sendo uma figura de destaque da Universidade. Mas sua notoriedade não se transferiu aos estudos medievais”, já que Eurípedes teria focado demais em um “[…] desejo comum de reflexão sobre o fato civilizacional” (Almeida, 2013 ALMEIDA, Néri de Barros. A História Medieval no Brasil. Signum, Rio de Janeiro, v. 14, n. 1, p. 1-16, 2013. Disponível em: https://tinyurl.com/2ap9x5xk . Acesso em: 9 maio 2024.
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, p. 10). Lukas Grzybowski e Renan Birro ( 2019GRZYBOWSKI, Lukas Gabriel; BIRRO, Renan Marques. Um ensaio historiográfico sobre a escandinavística brasileira. In: AMARAL, Clínio; LISBÔA, João (org.). A historiografia medieval no Brasil: de 1990 a 2017. Curitiba: Appris, 2019. p. 23-58. , p. 27) concordam que “[…] a iniciativa de Eurípedes, embora tenha dado início à escandinavística brasileira — e aos estudos medievais, concomitantemente –, não serviu como um verdadeiro impulso nem mesmo para estes últimos”, e Marcelo Cândido da Silva e Victor Sobreira ( 2019CÂNDIDO DA SILVA, Marcelo; SOBREIRA, Victor. O Laboratório de Estudos Medievais: balanço e perspectivas. In: AMARAL, Clínio; LISBÔA, João (org.). A historiografia medieval no Brasil: de 1990 a 2017. Curitiba: Appris, 2019. p. 251-261. , p. 252) afirmam que “[…] o fato de a primeira Tese ter sido em História Medieval teve pouca repercussão para a área, cuja pesquisa continuou a ser feita de forma isolada e na dependência de algumas figuras-chave do mundo acadêmico”.

Não é de nosso interesse debater aqui a suposta insignificância de Simões de Paula no desenvolvimento da medievalística brasileira. Dizemos apenas que não nos parece prudente afirmar que mais de vinte trabalhos a nível de pós-graduação (Mesgravis, 1983 MESGRAVIS, Laima. O curso de Pós-Graduação do Departamento de História da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo. Revista Brasileira de História, São Paulo, v. 3, n. 5, p. 87-118, 1983. Disponível em: https://rb.gy/h7magi . Acesso em: 10 mar. 2023.
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, p. 100-102, 112-113) orientados somente sobre o que se convencionou classificar como “medieval”, com vários dos orientandos mais tarde lecionando e orientando trabalhos da área 2 2 Ressaltamos a importância de uma orientação informal de Pedro Moacyr Campos (1920-1975), orientado por Simões de Paula, presente em agradecimentos de teses orientadas por Eurípedes (Asfora; Aubert; Castanho, 2010 , p. 95-96; Miatello, 2017 , p. 74). , e diversos artigos e resenhas acerca do período (Glezer, 1983GLEZER, Raquel. Eurípedes Simões de Paula: uma bibliografia. In: VV. AA. In memoriam de Eurípedes Simões de Paula: artigos, depoimentos de colegas, alunos, funcionários e ex-companheiros de FEB; vida e obra. São Paulo: FFLCH, 1983. p. 661-706. , p. 683-699), corresponderia a uma ausência de legado. O rechaço à sua figura pela medievalística se transforma, citando Eduardo Aubert ( 2013 AUBERT, Eduardo Henrik. Apontamentos sobre a legitimidade atual da história medieval tecidos no entorno de uma obra recente. Medievalista, Lisboa, n. 14, p. 1-34, 2013. Disponível em: https://bit.ly/3Ud454m . Acesso em: 29 mar. 2022.
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, p. 15), em uma retórica de “terra arrasada” que anula a qualificação de medievalista a qualquer um que não tenha estado em atividade durante o boom das décadas de 1980 e 1990 (Bastos; Rust, 2008 BASTOS, Mario Jorge da Motta; RUST, Leandro Duarte. Translatio Studii: a história medieval no Brasil. Signum, Rio de Janeiro, n. 10, p. 163-188, 2008. Disponível em: https://rb.gy/sx5ubo . Acesso em: 10 mar. 2023.
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, p. 172).

Com a atitude negativa dos medievalistas atuais, somada à relativa dificuldade de acesso à tese original 3 3 Conseguimos encontrar cópias do CVGPK somente nas bibliotecas da USP, da Unicamp e da Unesp, além da Biblioteca Nacional, ou seja, o acesso à tese está restrito à região Sudeste. , não nos surpreende, portanto, que pouquíssima atenção tenha sido dada à produção primeva. Até onde sabemos, há pouquíssimas apreciações críticas nacionais da tese de Eurípedes, nenhuma tendo-a como objeto central. Em uma coletânea que homenageou Simões de Paula alguns anos após sua morte, Victoria e Joubran El Murr ( 1983EL MURR, Victoria (Namestnikov); EL MURR, Joubran. O comércio varegue e o Grão-Principado de Kiev. In: VV. AA. In memoriam de Eurípedes Simões de Paula: artigos, depoimentos de colegas, alunos, funcionários e ex-companheiros de FEB; vida e obra. São Paulo: FFLCH, 1983, p. 405-409. , p. 405-408), ex-orientandos do professor, dissertam de modo breve sobre a tese e sua importância, mas não se aventuram pelos detalhes historiográficos e teóricos. Mais de duas décadas depois, tanto André Muceniecks ( 2014MUCENIECKS, André Szczawlinska. Austrvegr e Garđaríki — (re)significações do leste na Escandinávia tardo-medieval. 2014. Tese (Doutorado em História Social) — Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2014. , p. 80-81) quanto Grzybowski e Birro ( 2019GRZYBOWSKI, Lukas Gabriel; BIRRO, Renan Marques. Um ensaio historiográfico sobre a escandinavística brasileira. In: AMARAL, Clínio; LISBÔA, João (org.). A historiografia medieval no Brasil: de 1990 a 2017. Curitiba: Appris, 2019. p. 23-58. , p. 26-27) atreveram-se a desbravar o CVGPK, mas somente nos aspectos referentes aos elementos escandinavísticos e de modo breve. Asfora, Aubert e Castanho (2009, p. 101-102) dedicaram pouco mais de um parágrafo à tese, dividindo-a com aquela feita por Pedro Moacyr e contrastando ambas as perspectivas em uma oposição material-ideal. Fora da medievalística, Diogo Roiz ( 2020ROIZ, Diogo da Silva. O curso de Geografia e História da FFCL/USP e a constituição de um campo disciplinar em São Paulo (1934-1968). São Paulo: Alameda, 2020. , p. 330-331) aborda holisticamente a tese em duas páginas ao tentar identificar a construção da pesquisa histórica uspiana, todavia não há uma tentativa de análise. Por fim, é útil mencionar uma breve passagem de um prefácio escrito por José Rivair Macedo ( 2019MACEDO, José Rivair. Prefácio. In: AMARAL, Clínio; LISBÔA, João (org.). A historiografia medieval no Brasil: de 1990 a 2017. Curitiba: Appris, 2019. p. 9-15. , p. 14), na qual afirma que o CVGPK estaria dissociado de influências de acadêmicos próximos, como seu orientador e Braudel.

Dado o aparente desconhecimento geral sobre o CVGPK na historiografia e sua relativa dificuldade de acesso, visamos aqui apresentar ao leitor algumas características da tese pioneira. Na parte que segue, faremos uma descrição da tese, destrinchando os capítulos e as principais citações contidas no trabalho. Nos dois tópicos seguintes, dissertaremos sobre dois eixos teóricos que embasam a tese e dão sua originalidade, a relação do recorte geográfico com o Mar Mediterrâneo e a perspectiva evolucionista. Enfatizamos que não se trata do esgotamento do CVGPK na condição de documento, afinal nossa pesquisa ainda está em andamento, mas ao longo do texto apontaremos alguns caminhos que serão abordados de modo mais aprofundado em publicações futuras.

O comércio varegue e o Grão-Principado de Kiev: descrição, dados e influências

Caminhemos rumo ao nosso objeto: O comércio varegue e o Grão-Principado de Kiev . Aqui utilizaremos a reimpressão de 1972, inalterada em relação ao manuscrito de 1942 (El Murr e El Murr, 1983EL MURR, Victoria (Namestnikov); EL MURR, Joubran. O comércio varegue e o Grão-Principado de Kiev. In: VV. AA. In memoriam de Eurípedes Simões de Paula: artigos, depoimentos de colegas, alunos, funcionários e ex-companheiros de FEB; vida e obra. São Paulo: FFLCH, 1983, p. 405-409. , p. 408). Antes, contudo, vale lembrar algumas palavras de Victoria e Joubran El Murr sobre como olhar a tese na década de 1980:

Aos olhos de algum incauto, O comércio varegue e o grão-principado de Kíev poderia parecer, na década de oitenta, uma obra superada. Aliás, é natural que depois de quarenta anos qualquer trabalho científico deva ser visto com parcimônia. No entanto, seu valor primeiro está em ser uma coletânea crítica da bibliografia ocidental existente até o momento de sua publicação que, até hoje, não perdeu o seu lugar pioneiro dentro da historiografia russa, no Brasil

(El Murr; El Murr, 1983EL MURR, Victoria (Namestnikov); EL MURR, Joubran. O comércio varegue e o Grão-Principado de Kiev. In: VV. AA. In memoriam de Eurípedes Simões de Paula: artigos, depoimentos de colegas, alunos, funcionários e ex-companheiros de FEB; vida e obra. São Paulo: FFLCH, 1983, p. 405-409. , p. 408).

Oito décadas após a escrita do CVGPK, seria mais fácil ainda criticar o trabalho em diversos aspectos: desde o emprego do termo varegue , que hoje é mais bem transliterado como variague (Simone, 2019 SIMONE, Lucas Ricardo. Recontar o tempo: apresentação e tradução da Narrativa dos anos passados. 2019. Tese (Doutorado em Letras) — Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2019. Disponível em: https://rb.gy/j2thry . Acesso em: 10 mar. 2023.
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, p. 60) 4 4 Nas citações diretas, utilizaremos a grafia usada por Eurípedes e todos os termos como presentes no CVGPK (por exemplo, varegue, dêsse, entre outros). , até a opção de se chamar o território de grão-principado 5 5 Simões de Paula usa o termo grão-príncipes , mas o adjetivo grão ( velikii ) só se torna recorrente na alcunha ao final do século XI (Raev, 2014 , p. 66). , reproduzindo uma lógica orientalista sobre uma entidade política compreendida como reino para seus contemporâneos estrangeiros (Raffensperger, 2017RAFFENSPERGER, Christian. The Kingdom of Rus’. Leeds: ARC Humanities, 2017. ). Um procedimento melhor seria lembrar que o produto historiográfico é condicionado pelo tempo, espaço e ânimo de seu criador (Rüsen, 2001RÜSEN, Jörn. Razão histórica: teoria da história: os fundamentos da ciência histórica. Tradução de Estevão Martins. Brasília, DF: Editora UnB, 2001. , p. 128-129). A tese foi feita no Brasil durante a década de 1940 em uma modalidade completamente nova no país e com pouca bibliografia disponível, o que nos impede de exigir mais dela do que ela pode oferecer. O que não significa, entretanto, que o pioneirismo do CVGPK seja uma carta branca que o isenta de críticas, como veremos mais adiante com sua repercussão no exterior.

A tese foi escrita sob a égide da USP e orientada pelo classicista francês Jean Gagé (1902-1986), substituto de Braudel no departamento (Costa, 2018 COSTA, Aryana Lima. De um Curso d’Água a Outro: memória e disciplinarização do saber histórico na formação dos primeiros professores no curso de História da USP. Tese (Doutorado em História Social) — Instituto de História, Programa de Pós Graduação em História Social, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2018. Disponível em: https://rb.gy/qshpvk . Acesso em: 10 mar. 2023.
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, p. 211-227). Como constatado anteriormente, o CVGKP foi o primeiro trabalho a nível doutoral na área de História a ser defendido no Brasil (El Murr; El Murr, 1983EL MURR, Victoria (Namestnikov); EL MURR, Joubran. O comércio varegue e o Grão-Principado de Kiev. In: VV. AA. In memoriam de Eurípedes Simões de Paula: artigos, depoimentos de colegas, alunos, funcionários e ex-companheiros de FEB; vida e obra. São Paulo: FFLCH, 1983, p. 405-409. , p. 405). Além do orientador, participaram da banca de defesa dois acadêmicos brasileiros: o historiador e jurista Alfredo Ellis Júnior (1896-1974) e o influente etnógrafo Plínio Ayrosa (1895-1961); e dois convidados estrangeiros, o geógrafo francês Pierre Monbeig (1908-1987) e o “Conde” Emmanuil Pavlovitch Bennigsen (1875-1955), político e maçom russo radicado no Brasil. Exceto o último, todos faziam parte do quadro docente do curso de História e Geografia da universidade, mas nenhum dos participantes era especialista na temática, algo que não surpreende, visto a falta de especialização disciplinar durante o período (Costa, 2018 COSTA, Aryana Lima. De um Curso d’Água a Outro: memória e disciplinarização do saber histórico na formação dos primeiros professores no curso de História da USP. Tese (Doutorado em História Social) — Instituto de História, Programa de Pós Graduação em História Social, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2018. Disponível em: https://rb.gy/qshpvk . Acesso em: 10 mar. 2023.
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, p. 125-126).

Não sabemos exatamente o que moveu Simões de Paula a escrever sobre o tema da tese, mas ele parece se alinhar às outras teses defendidas sob a orientação de Gagé, todas com ênfase em economia: O comércio no Rio da Prata de 1580 a 1640 , de Alice Piffer Canabrava (1942); A política colonial de Hespanha através das encomiendas , de Astrogildo Rodrigues de Mello (1942); e A penetração comercial da Inglaterra na América Espanhola, de 1713 a 1783 , de Olga Pantaleão (1944).

Há uma justificativa para o exotismo do tema em dois momentos na introdução do CVGPK. Primeiramente, a preocupação em entender a história europeia de modo comparativo, não limitada somente ao espaço ocidental: “Pensamos, portanto, que os estudiosos dos problemas históricos da Idade Média não deviam circunscrever suas pesquisas ao Ocidente, mas procurar comparar a evolução política, econômica e social dos diversos povos europeus, mostrando o que há de comum entre eles” (Simões de Paula, 1942SIMÕES DE PAULA, E. O Comércio Varegue e o Grão-Principado de Kiev. São Paulo: FFLCH-USP, 1942 (Reimpressão de 1972). , p. 6). Em seguida, estabelece-se um vínculo entre a suposta colonização nórdica dos eslavos e mercantilização da Rússia com a terra natal do autor:

Além dêsses aspectos econômicos e culturais, pensamos que o assunto por nós escolhido tem também interesse para o estudo de nossa História Colonial, pois, como os Portugueses no Brasil, os Varegues invadiram em pequeno número um território até então à margem do mundo mediterrâneo e estabeleceram aí uma colonização e uma civilização de base inteiramente mercantil, mesclando-se com os indígenas e utilizando-se como mão de obra na exploração dos produtos peculiares à região. Mas não é só. Êles vão mais longe ainda: dão seu próprio nome ao Estado que vão organizar

(Simões de Paula, 1942SIMÕES DE PAULA, E. O Comércio Varegue e o Grão-Principado de Kiev. São Paulo: FFLCH-USP, 1942 (Reimpressão de 1972). , p. 7).

A passagem pode ser interpretada como a materialização das tendências nacionalistas uspianas (Rodrigues, 2011 RODRIGUES, Lidiane Soares. A produção social do marxismo universitário em São Paulo: mestres, discípulos e ‘um seminário’ (1958-1978). 2011. Tese (Doutorado em História Social) — Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2011. Disponível em: https://rb.gy/fwoxbj . Acesso em: 10 mar. 2023.
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, p. 292-293) e colonialistas europeias (Birro, 2020 BIRRO, Renan Marques. A Idade Média Brasileira? Colonialismos e medievalismos historiográficos (c.1900- 1940). Antíteses, Londrina, v. 13, n. 26, p. 36-67, jul-dez. 2020. Disponível em: https://rb.gy/48iuqt . Acesso em: 10 mar. 2023.
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, p. 44-50) durante a época da escrita, mas não podemos descartar uma possível influência da maneira pelas quais os intelectuais nacionais tentavam compreender o Brasil durante as décadas de 1930 e 1940. Particularmente no caso do CVGPK, há uma instigante similaridade entre o modo que Simões de Paula pensou a formação da civilização “russa” e o pensamento de Caio Prado Jr. (1907-1990) sobre a formação brasileira. Não é nossa intenção, neste artigo, desenvolver sobre o possível “sentido da colonização” nórdica pensada por Simões de Paula, pois tal reflexão, assim como a inserção da medievalística de Simões de Paula dentro da historiografia brasileira como um todo, é digna de um tratamento bem mais aprofundado em um trabalho futuro.

A tese, em sua forma editada para publicação, possui cerca de 130 páginas de texto argumentativo, contando com introdução, capítulos e conclusão; duas páginas bibliográficas contendo 28 referências e incluindo coleções completas; e dois mapas adaptados e traduzidos ao português de volumes da Cambridge Medieval History (doravante CMH). Sete capítulos, de tamanhos variados, compõem o trabalho. O primeiro, “O estabelecimento dos eslavos nas planícies russas. — Os Antes”, realiza, em seis páginas, uma análise étnico-geográfica da diáspora a partir do século VI dos povos eslavos que habitavam as atuais Rússia e Ucrânia, afirmando que estes — chamados “antes” — já possuíam um “Estado” antes da chegada dos nórdicos (Simões de Paula, 1942SIMÕES DE PAULA, E. O Comércio Varegue e o Grão-Principado de Kiev. São Paulo: FFLCH-USP, 1942 (Reimpressão de 1972). , p. 11-14).

O segundo capítulo, “Os varegues na Rússia”, contém 15 páginas e é o primeiro a ser dividido em tópicos. No primeiro, Simões de Paula trabalha com a etimologia dos termos — mais precisamente “Rússia” — presentes no título de seu trabalho, a fim de justificar sua adesão à chamada “escola normanda” (Simões de Paula, 1942SIMÕES DE PAULA, E. O Comércio Varegue e o Grão-Principado de Kiev. São Paulo: FFLCH-USP, 1942 (Reimpressão de 1972). , p. 11), oposta à “escola eslava” na chamada “Controvérsia Normanista” (Muceniecks, 2014MUCENIECKS, André Szczawlinska. Austrvegr e Garđaríki — (re)significações do leste na Escandinávia tardo-medieval. 2014. Tese (Doutorado em História Social) — Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2014. , p. 36-50). O cerne da disputa está na origem do termo Rus , considerado de raiz escandinava pelos “normanistas” e eslava pelos “antinormanistas”. Eurípedes, fiel à “escola normanda” graças aos relatos presentes na Crônica de Nestor 6 6 Um dos vários nomes da compilação analística conhecida como Povest Vremmenykh Let ( Narrativa dos anos passados ), graças à hipótese de que seu autor e/ou compilador seria o monge Nestor († século XII) do Monastério das Cavernas de Kiev (Simone, 2019 , p. 39-41). , percebe o quão importante é a associação entre terminologia e a construção da civilização, mencionando outras hipóteses “[…] verdadeiramente fantasistas” como a do historiador e político ucraniano Mykhailo Hrushevsky (1866-1934), “que nega a origem escandinava da Rússia de Kiev e sustenta ser ela ucraniana” (Simões de Paula, 1942SIMÕES DE PAULA, E. O Comércio Varegue e o Grão-Principado de Kiev. São Paulo: FFLCH-USP, 1942 (Reimpressão de 1972). , p. 17; ver ainda Hrushevsky, 1997HRUSHEVSKY, Mykhailo. History of Ukraine-Rus’. Volume 1: From Prehistory to the Eleventh Century. Tradução de Marta Skorupsky. Edmonton e Toronto: Canadian Institute of Ukrainian Studies Press, 1997 [1898]. , p. 289-326). No segundo tópico, o autor situa a chegada dos varegues dentro das incursões escandinavas do século IX, tratando o movimento como “invasões” (Simões de Paula, 1942SIMÕES DE PAULA, E. O Comércio Varegue e o Grão-Principado de Kiev. São Paulo: FFLCH-USP, 1942 (Reimpressão de 1972). , p. 23-24) de nórdicos aventureiros em busca de rotas para comercializar com os bizantinos, eventualmente mesclando-se com a população eslava dominada (Simões de Paula, 1942SIMÕES DE PAULA, E. O Comércio Varegue e o Grão-Principado de Kiev. São Paulo: FFLCH-USP, 1942 (Reimpressão de 1972). , p. 26).

Segue o terceiro capítulo, intitulado “O comércio varegue”, que lida diretamente com o objeto da tese em 24 páginas. Aqui é mais evidente uma das hipóteses centrais para o CVGPK: a chamada “civilização varegue-eslava”, de matriz urbano-mercantil, teria nascido por conta do comércio entre os nórdicos e seu alvo principal, os bizantinos, por meio da famosa “Rota dos varegues aos gregos” (Shepard, 2009SHEPARD, Jonathan. From the Bosporus to the British Isles: the way from the Greeks to the Varangians. In: DJAKSON, Tatiana N. (org.). Drevneichie Gossudarstva Vostotchnoi Evropy: transkontinentalnye i lokalnye puti kak sotsiokulturnyi fenomen. Moskva: Indrik, 2009. p. 15-42. ), graças ao suposto fechamento do Mar Mediterrâneo pelos árabes (Simões de Paula, 1942SIMÕES DE PAULA, E. O Comércio Varegue e o Grão-Principado de Kiev. São Paulo: FFLCH-USP, 1942 (Reimpressão de 1972). , p. 32-34). Atenção especial é dada ao ataque dos nórdicos contra Constantinopla em 860, enfatizando as relações entre Kiev e Bizâncio (Simões de Paula, 1942SIMÕES DE PAULA, E. O Comércio Varegue e o Grão-Principado de Kiev. São Paulo: FFLCH-USP, 1942 (Reimpressão de 1972). , p. 41-44). Simões de Paula analisa o assentamento dos varegues nas terras ao longo do rio Dnipro, especialmente em Kiev, e a construção dos laços políticos entre os invasores e as populações nativas, notando que “[…] existe grande semelhança entre essas instituições varegues e as do feudalismo ocidental” ao abordar as novas aristocracias (Simões de Paula, 1942SIMÕES DE PAULA, E. O Comércio Varegue e o Grão-Principado de Kiev. São Paulo: FFLCH-USP, 1942 (Reimpressão de 1972). , p. 47). Por fim, retorna-se às relações nórdico-bizantina, evidenciando um certo progresso que teria beneficiado os primeiros graças ao contato e à integração entre ambos (Simões de Paula, 1942SIMÕES DE PAULA, E. O Comércio Varegue e o Grão-Principado de Kiev. São Paulo: FFLCH-USP, 1942 (Reimpressão de 1972). , p. 53-54).

Tanto o quarto capítulo, “A dinastia dos Grão-Príncipes de Kiev” (14 páginas), quanto o quinto, “A Cristianização da Rússia” (28 páginas), são sínteses factuais que funcionam dentro da narrativa da tese como o desdobramento da intensificação e subsequente declínio comercial de Kiev. O quarto capítulo narra os mandatos dos governantes pré-cristãos: Oleg, o pressago (879-912); Igor (912-945), filho do nórdico semilendário Riurik, a respeito do qual Eurípedes exprime opiniões conflitantes sobre crer ou não em sua existência (Simões de Paula, 1942SIMÕES DE PAULA, E. O Comércio Varegue e o Grão-Principado de Kiev. São Paulo: FFLCH-USP, 1942 (Reimpressão de 1972). , p. 25-26, 28); Olga (945-957), esposa de Igor e regente de Kiev após o assassinato de seu marido; e Sviatoslav (957-972), filho de Igor e Olga que tinha “[…] um nome eslavo, mas foi um verdadeiro guerreiro varegue” (Simões de Paula, 1942SIMÕES DE PAULA, E. O Comércio Varegue e o Grão-Principado de Kiev. São Paulo: FFLCH-USP, 1942 (Reimpressão de 1972). , p. 66).

Quanto ao quinto capítulo, Eurípedes aborda alguns aspectos culturais de Kiev, ligados à evolução e ao declínio das rotas comerciais, bem como à narrativa política. Os dois primeiros tópicos tratam de Vladimir (ou Vladímiro, 980-1015), governante que, após assassinar e tomar o trono de seu irmão, Iaropolk, em 980, aderiu ao cristianismo de rito bizantino, por volta de 988 ou 989, e empreendeu um esforço de propagar sua nova fé ao longo dos seus domínios. O terceiro tópico analisa algumas consequências do batismo do governante e de seus sucessores, assim como as características da nova Igreja:

[…] a nova religião propagou-se pacificamente ao longo de todas as rotas comerciais frequentadas pelos Varegues, com exceção de Novgorod, onde Vladímiro foi obrigado a empregar a força, o que vem provar mais uma vez que a cristianização da Rússia foi obra do comércio varegue com Bizâncio

(Simões de Paula, 1942SIMÕES DE PAULA, E. O Comércio Varegue e o Grão-Principado de Kiev. São Paulo: FFLCH-USP, 1942 (Reimpressão de 1972). , p. 79).

O próximo tópico aborda a “época áurea” (Simões de Paula, 1942SIMÕES DE PAULA, E. O Comércio Varegue e o Grão-Principado de Kiev. São Paulo: FFLCH-USP, 1942 (Reimpressão de 1972). , p. 85) de Iaroslav, “o sábio” (1019-1054), fruto das riquezas obtidas através do comércio internacional. Finalmente, no último tópico, Eurípedes sintetiza mais de um século de acontecimentos considerando se tratar de período marcado por um suposto declínio de Kiev, causado por três fatores, ainda que, no capítulo, ênfase seja dada às guerras internas entre os governantes (Simões de Paula, 1942SIMÕES DE PAULA, E. O Comércio Varegue e o Grão-Principado de Kiev. São Paulo: FFLCH-USP, 1942 (Reimpressão de 1972). , p. 98-99).

O sexto capítulo, “Kiev e os nômades das estepes”, tem, em suas 28 páginas, um teor mais teórico que os anteriores. Neste, Simões de Paula analisa o papel dos nômades turcos — kházaros (“Khazares” no CVGPK), búlgaros do Volga, petchenegues e cumanos (“Polovtzes”, no CVGPK) — na dinâmica comercial de Kiev, muitas vezes considerando as populações como um obstáculo ao tráfego. Eurípedes afirma que especialmente os petchenegues e os cumanos nutriam uma espécie de desejo em acabar com as rotas (Simões de Paula, 1942SIMÕES DE PAULA, E. O Comércio Varegue e o Grão-Principado de Kiev. São Paulo: FFLCH-USP, 1942 (Reimpressão de 1972). , p. 118, 122-123). Ao final, há uma comparação entre os ataques dos Polovtzes e as invasões árabes na Europa Ocidental durante o século VIII, evidenciando os outros dois fatores para o suposto declínio de Kiev: as investidas constantes dos nômades e, mais interessante para nós, a reabertura do Mediterrâneo (Simões de Paula, 1942SIMÕES DE PAULA, E. O Comércio Varegue e o Grão-Principado de Kiev. São Paulo: FFLCH-USP, 1942 (Reimpressão de 1972). , p. 127).

As sete páginas do último capítulo, “A decadência de Kiev e a invasão Tártara”, amplificam os debates contidos nos capítulos anteriores sobre as disputas fragmentárias e nômades que atrapalhavam o comércio e abordam problemas internos e externos que ocasionaram a derrocada de Kiev como centro econômico rus, em favor, principalmente de Novgorod, e como a invasão mongol teria mudado o rumo da história russa. Eurípedes conclui a tese resumindo os pontos principais do trabalho: o caráter multiétnico e mercantil de uma civilização varegue-eslava (Simões de Paula, 1942SIMÕES DE PAULA, E. O Comércio Varegue e o Grão-Principado de Kiev. São Paulo: FFLCH-USP, 1942 (Reimpressão de 1972). , p. 138), que viveu e morreu por seu acesso ao comércio de longa distância. Ademais, Simões de Paula se preocupa em abordar de modo comparativo a “evolução” da Rússia e da Europa Ocidental, unindo ambos em uma escala evolutiva que teria como telos o feudalismo (Simões de Paula, 1942SIMÕES DE PAULA, E. O Comércio Varegue e o Grão-Principado de Kiev. São Paulo: FFLCH-USP, 1942 (Reimpressão de 1972). , p. 140-141).

Análise quantitativa da bibliografia

Na bibliografia diretamente citada, há um número expressivo de textos presentes na CMH (156 referências, 28,4% das citações), especialmente do quarto volume The Eastern Roman Empire 717-1453 (106 referências, 19,3% das citações). Não é de se estranhar, pois a coletânea era vista como a maior obra de referência sobre o período (McGuire, 1943MCGUIRE, Martin R. P. An Appreciation of the “Cambridge Medieval History”. The Catholic Historical Review, Washington, DC, v. 29, n. 1, p. 60-64, 1943. , p. 61). As demais obras estão, em sua maioria, em francês, mas não são necessariamente de autores franceses. De fato, das dezenove referências francófonas, três são traduções de autores russos e duas foram escritas em francês por russos émigrés . Há também acadêmicos britânicos e escandinavos traduzidos para o francês. Há dois atlas citados em idioma espanhol. A bibliografia utilizada por Eurípedes é, considerando o período da escrita da tese, relativamente recente. O livro mais antigo, exceto uma tradução que falaremos a seguir, é Histoire de la Bulgaire de R. P. Guérin-Songeon de 1913, ao passo que a maioria do material utilizado foi publicada durante a década de 1930. O texto mais recente é “O comércio de Bizâncio com o Extremo-Oriente”, de 1941, única obra em língua portuguesa e de autoria do próprio Simões de Paula em uma separata da revista Filosofia, Ciências e Letras .

Apresentamos no Gráfico 1 os principais trabalhos individuais citados diretamente no CVGPK, e quantas vezes são citados. Ressaltamos que uma única nota de rodapé da tese pode conter várias referências, ou seja, as 549 vezes que uma obra é referenciada estão espalhadas entre 301 notas 7 7 Algumas dessas são notas explicativas e não contêm referências. . Do mesmo modo, abreviamos o nome das obras por questões de espaço, quando o autor ou tem vários escritos referenciados, ou quando está presente na CMH. Na instância do segundo caso, também colocamos o volume do livro em algarismos romanos. Evidenciamos ainda que Simões de Paula, por razões desconhecidas, cita o primeiro volume da coletânea Histoire de Russie organizada por Pavel Miliukov, Charles Seignobos e Louis Eisenmann, mas as páginas referenciadas correspondem ao capítulo “Les pays russes, des origines à la fin des invasions tatares”, do historiador russo expatriado Venedikt Miakotin ( 1935MIAKOTINE, Venedikt A. Les pays russes, des origines à la fin des invasions tatares. In: MILIOUKOV, Paul; SEIGNOBOS, Charles; EISENMANN, Louis (org.). Histoire de Russie. Tome I: des origines à la mort de Pierre le Grand. Paris: Librairie Ernest Leroux, 1935. p. 81-124. , p. 81-124).

Gráfico 1
- Bibliografia diretamente citada na edição da tese (feito pelo autor do artigo)

Em termos quantitativos de um único trabalho, o pódio é dominado pelo jurista e historiador tcheco Karel Kadlec (1865-1928), com seu capítulo “The Empire and its Northern Neighbours” presente na CMH responsável por 14,4% das referências, sendo a principal autoridade recorrida por Eurípedes ao falar dos povos das estepes (Kadlec, 1923KADLEC, Charles (Karel). The Empire and Its Northern Neighbours. In: BURY, J. B. (org.). The Cambridge Medieval History. Volume 4: The Eastern Roman Empire (717–1453). Cambridge: Cambridge University Press, 1923. p. 183-215. , p. 187-192). Se olharmos aos autores mais citados, como no Gráfico 2 , temos uma mudança significativa no topo das citações.

Gráfico 2
- Autores diretamente citados na edição do CVGPK (feito pelo autor do artigo) 8 8 Considerando apenas autores citados cinco vezes ou mais.

Com 18,6% das citações (102), o historiador soviético Serguei Fiodorovitch Platonov (1860-1933) é o autor mais citado por Eurípedes. Suas referências estão divididas em dois textos: o mais utilizado é o capítulo “La Russie Chrétienne”, uma tradução de seu livro ginasial Utchebnik Russkoi Istorii , escrito em 1909 — sendo, tecnicamente, a referência mais antiga no CVGPK — e presente na coleção Histoire du Monde , dirigida por Eugène Cavaignac (1876-1969). Ressaltamos que o original era extremamente popular, sendo utilizado como material-base em aulas de professores russos émigrés (Tsamutali, 2015TSAMUTALI, Aleksei Nikolaevich. Sergei Fedorovich Platonov (1860-1933): a life for Russia. In: SANDERS, Thomas (org.). Historiography of Imperial Russia: the profession and writing of history in a multinational state. Londres: Routledge, 2015. p. 311-331. , p. 326-327), o que pode ter motivado seu uso por Simões de Paula. O segundo — ao qual, infelizmente, não temos acesso — é “Histoire de la Russie des Origines à 1918” (1929), possivelmente tradução de uma obra mais geral de Platonov. Assim como Kadlec, o acadêmico russo compõe as citações sobre a história geral do recorte geográfico específico.

A terceira referência historiográfica mais utilizada é Alexandre Eck (1876-1953), um engenheiro russo emigrado na Bélgica que se tornou professor de História russa na Universidade de Gante. Seu Le Moyen Âge Russe , de 1933ECK, Alexandre. Le Moyen Âge Russe. Prefácio de Henri Pirenne. Paris: Maison du Livre Étranger, 1933. , reúne uma vasta bibliografia de língua russa e ucraniana, sendo o principal ponto de contato entre essa historiografia e Eurípedes. Outros nomes importantes que não escreveram para a CMH também figuram nas notas, como o medievalista francês Ferdinand Lot (1866-1952), o bizantinista francês Charles Diehl (1859-1994), o bizantinista britânico Steven Runciman (1859-1994), e o historiador russo émigré Aleksandr Vassiliev (1867-1953).

Simões de Paula também cita uma ampla variedade de acadêmicos indiretamente, por meio de trechos referenciados em outras obras, empregando o recurso apud. Dentre eles vale destacar o etnógrafo tcheco Lubor Niderle (1865-1944), o já mencionado Hrushevsky e o influente historiador russo Vassilii Kliutchevskii (1841-1911). A referência por apud também é o único meio pelo qual Eurípedes acessa a documentação, salvo uma única citação acessada diretamente de uma coletânea de fontes medievais (Simões de Paula, 1942SIMÕES DE PAULA, E. O Comércio Varegue e o Grão-Principado de Kiev. São Paulo: FFLCH-USP, 1942 (Reimpressão de 1972). , p. 76). Entre as diversas fontes citadas indiretamente destacam-se várias escritas por autores bizantinos e árabes, como Constantino VII (905-959) e al-Masʿūdī (896-956).

Repercussões acadêmicas da tese

Por fim, ressaltamos que a tese de Simões de Paula pode, ironicamente, ser mais conhecida na academia estrangeira que na medievalística brasileira. Em 1949, o CVGPK fora objeto de uma resenha feita pelo medievalista franco-argelino Maurice Lombard (1904-1965) para os prestigiosos Annales . Em 1948, a tese aparece na bibliografia de Kievan Russia do acadêmico russo émigré e professor da Universidade de Yale, George Vernadsky (1887-1973), um dos livros mais importantes sobre a chamada “Rus Kievana” ou “Rus Pré-mongol”, sob a categoria “esboços gerais do período Kievano” ( 1972VERNADSKY, George. Kievan Russia. 2. ed. New Haven: Yale University Press, 1972 [1946]. , p. 380), junto com o influente Kievskaia Rus de 1939, de autoria do historiador soviético Boris Grekov. Percebe-se também que o CVGPK chegou aos Estados Unidos poucos anos após sua defesa pois, antes ainda de figurar na bibliografia de Vernadsky, a tese é brevemente mencionada em The Russian Attack on Constantinople in 860 de Aleksandr Vasiliev, então vinculado à Universidade de Harvard. Ao mencionar a historiografia que aborda o evento que dá o título a seu livro, o acadêmico cita Simões de Paula “como uma curiosidade” (Vasiliev, 1946VASILIEV, Alexander A. The Russian Attack on Constantinople in 860. Cambridge: The Mediaeval Academy of America, 1946. , p. 144, tradução nossa) e prossegue:

Não familiarizado com a língua russa, o autor baseia sua apresentação nos trabalhos de acadêmicos modernos, escritos principalmente em francês. A história do ataque em si nada mais é do que uma tradução literal do texto relevante de Ch. Diehl e de G. Marçais Le Monde Oriental ; seu tratamento da questão da datação do ataque em duas citações das homilias de Fócio são apenas uma tradução da edição francesa do meu Histoire de l’Empire Byzantin ; a terceira citação de Fócio vem de Ch. Diehl e G. Marçais. O historiador brasileiro termina sua história do ataque russo referindo-se ao conhecido livro francês de J. Calmette, Le Monde Féodale . O autor indica francamente sua dependência dos historiadores mencionados, dizendo em suas notas de rodapé Apud Diehl e Marçais , ou Apud Vasiliev , e até mesmo reproduzindo um erro de impressão no livro de Diehl. É claro que o historiador brasileiro está apenas repetindo o que dois historiadores recentes escreveram sobre o ataque. Mas parece-me impressionante que em um centro tão distante da Europa como São Paulo, um historiador se interessou pelo comércio varegue e pelo grão-principado de Kiev

(Vasiliev, 1946VASILIEV, Alexander A. The Russian Attack on Constantinople in 860. Cambridge: The Mediaeval Academy of America, 1946. , p. 144, tradução nossa).

A negatividade de Vasiliev esconde um fator que pode ser considerado grave nos dias de hoje. Generalizando, a tese de Simões de Paula, ao menos quando confrontada com a bibliografia que conseguimos encontrar, é majoritariamente composta por traduções muitas vezes literais para o português das obras citadas e costuradas. A tese é como uma colcha historiográfica composta de tecidos e, às vezes, confunde o leitor em sua peculiar variedade estilística e afirmações estranhas. Por exemplo, é incompreensível a razão pela qual Eurípedes caracterizou Vladimir Vsevolodovitch Monômaco (1053-1125) como “Guerreiro forte e capaz […] bravo mas não ambicioso, másculo e piedoso, bom cristão e senhor generoso para com seus companheiros, homem prático e conciliar […] a figura mais atraente de todo o período ( sic )” (Simões de Paula, 1942SIMÕES DE PAULA, E. O Comércio Varegue e o Grão-Principado de Kiev. São Paulo: FFLCH-USP, 1942 (Reimpressão de 1972). , p. 95), até constatarmos que se trata de uma tradução verbatim (Mirsky, 1932MIRSKY, Prince D. S. Russia, 1015–1462. In: TANNER, J. R.; PREVITÉ-ORTON, C. W.; BROOKE, Z. N. (org.). The Cambridge Medieval History. Volume 7: Decline of Empire and Papacy. Cambridge: Cambridge University Press, 1932. p. 599-631. , p. 607) do capítulo do “príncipe” Dmitry Svyatopolk-Mirsky (1890-1939) para a CMH, texto esse que desagradou seu próprio autor (Smith, 2000SMITH, Gerald Stanton. D. S. Mirsky: A Russian-English Life, 1890-1939. Oxford: Oxford University Press, 2000. , p. 115).

Ora, para além da idade e da suposta falta de legado, é fácil exagerar e acusar o CVGPK de plágio para descartá-lo ainda mais, como indicado acima! Afinal, quem gostaria de ter uma cópia, a princípio acrítica, como pedra fundadora de uma tradição? Não cremos que seja o caso, contudo. Eurípedes referenciou quase todas as passagens de suas traduções, até mesmo as citações apud que retira dos trabalhos. Ademais, a concepção de tese acadêmica no tempo de Simões de Paula pode ter sido diferente da nossa, ou ao menos o CVGPK parece ter um objetivo especial conforme explicitado pelo autor na introdução:

É óbvio que não realizamos uma pesquisa inteiramente original, — cousa difícil no Brasil com os meios bibliográficos existentes e principalmente com a carência de documentos inéditos sobre o assunto — mas pensamos ter feito um trabalho de síntese que talvez tenha alguma utilidade para os jovens estudantes de História da nossa Faculdade

(Simões de Paula, 1942SIMÕES DE PAULA, E. O Comércio Varegue e o Grão-Principado de Kiev. São Paulo: FFLCH-USP, 1942 (Reimpressão de 1972). , p. 5).

Se for esse o caso, a primeira produção doutoral nacional estaria mais interessada na difusão do que na produção de conhecimento, feito que não é de pequena importância para a história de nosso campo acadêmico. Talvez sua originalidade reside na sua própria existência, dentro do ainda incipiente setor universitário do Brasil. Ademais, como veremos a seguir, mesmo uma tese costurada por paráfrases ainda precisa de agulhas para atar as mais diversas passagens.

Sem o Mediterrâneo, Rus é inconcebível

Talvez Macedo ( 2019MACEDO, José Rivair. Prefácio. In: AMARAL, Clínio; LISBÔA, João (org.). A historiografia medieval no Brasil: de 1990 a 2017. Curitiba: Appris, 2019. p. 9-15. , p. 14) não esteja totalmente correto em sua já mencionada aferição sobre a falta de influência de Braudel e Gagé na tese de Simões de Paula. O primeiro proferiu uma palestra em 1936, depois republicada pela Revista de História ( 1955 BRAUDEL, Fernand. Pedagogia da História. Revista de História, São Paulo, v. 11, n. 23, p. 3-21, 1955. Disponível em: https://bit.ly/3DhC7y3 . Acesso em: 14 abr. 2022.
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), sobre ensino de História, e mencionou a magnífica simplicidade de um certo “insigne historiador belga […], o primeiro historiador de língua francesa dos tempos que correm, professor notável, entre todos, por quem não sou o único a votar uma veneração particular” (Braudel, 1955 BRAUDEL, Fernand. Pedagogia da História. Revista de História, São Paulo, v. 11, n. 23, p. 3-21, 1955. Disponível em: https://bit.ly/3DhC7y3 . Acesso em: 14 abr. 2022.
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, p. 7), que teria influenciado fortemente seu magnum opus (Burke, 2010BURKE, Peter. A Escola dos Annales (1929-1989): a revolução francesa da historiografia. 2. ed. Tradução de Nilo Odalia. 2ª edição. São Paulo: Editora Unesp, 2010. , p. 56; Ford, 2015 FORD, Caroline. The Inheritance of Empire and the Ruins of Rome in French Colonial Algeria. Past & Present, Oxford, n. 226, p. 57-77, 2015. Supplement 10. Disponível em: https://rb.gy/gpvhgj . Acesso em: 10 mar. 2023.
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, p. 71-73). O segundo, antes mesmo de chegar no Brasil, recomendou que Eurípedes ministrasse os cursos de História Medieval a partir dos “[…] belos trabalhos” do mesmo acadêmico (Costa, 2018 COSTA, Aryana Lima. De um Curso d’Água a Outro: memória e disciplinarização do saber histórico na formação dos primeiros professores no curso de História da USP. Tese (Doutorado em História Social) — Instituto de História, Programa de Pós Graduação em História Social, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2018. Disponível em: https://rb.gy/qshpvk . Acesso em: 10 mar. 2023.
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, p. 168). O historiador louvado por Braudel e Gagé, que se tornou um importante norteador teórico do CVGPK, talvez por influência de ambos, foi Henri Pirenne (1862-1935).

Pirenne é conhecido pela tese que geralmente leva seu nome, mais bem explicitada em seu livro póstumo Mahomet et Charlemagne , mas desenvolvida em trabalhos anteriores (Pirenne, 1973PIRENNE, Henri. As cidades da Idade Média. 3. ed. Tradução de Carlos Montenegro Miguel. Lisboa: Publicações Europa-América, 1973 [1927]. , p 26-36, 2010PIRENNE, Henri. Maomé e Carlos Magno: o impacto do Islã sobre a civilização europeia. Tradução de Regina Schöpke e Mauro Baladi. Rio de Janeiro: Contraponto: Ed. PUC-RJ, 2010 [1937]. , p. 271-280). Em termos gerais e ignorando algumas nuances, o historiador belga postulou que a invasão árabe na Europa Ocidental teria causado um bloqueio do Mediterrâneo. O ato fechou comercialmente o Mare Nostrum e cortou o contato europeu com o “Oriente” não cristão de rito romano. Tal obstrução marítima teria instigado o deslocamento do comércio para norte e afetado negativamente a “evolução natural” europeia (Pirenne, 2010PIRENNE, Henri. Maomé e Carlos Magno: o impacto do Islã sobre a civilização europeia. Tradução de Regina Schöpke e Mauro Baladi. Rio de Janeiro: Contraponto: Ed. PUC-RJ, 2010 [1937]. , p. 270), instaurando na região o sistema feudal e, efetivamente, a Idade Média, mas essa guardemos essa informação para o próximo tópico.

Oitenta anos após o lançamento de Mahomet et Charlemagne , a tese de Pirenne ainda possui um lugar importante na academia, mesmo que ressalvas sejam feitas quanto ao seu discurso de “choque de civilizações” fruto de pensamentos colonialistas sobre a África Setentrional e o Oriente Médio pulverizados pela lógica europeia de sua época (Effros, 2017 EFFROS, Bonnie. The Enduring Attraction of the Pirenne Thesis. Speculum, Chicago, v. 92, n. 1, p. 184-208, 2017. Disponível em: https://rb.gy/xwna5h . Acesso em: 10 mar. 2023.
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, p. 191-194); e ao seu desconhecimento geral sobre contatos mais globais entre o continente e o restante do mundo que não dependiam necessariamente do Mediterrâneo, ponto criticado poucos anos após a publicação do livro (Bolin, 1953 BOLIN, Sture. Mohammed, Charlemagne and Ruric. Scandinavian Economic History Review, [S. l.], v. 1, n. 1, p. 5-39, 1953. Disponível em: https://rb.gy/hojfdy . Acesso em: 10 mar. 2023.
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, p. 23-33). Tais ressalvas não afetaram o julgamento de Simões de Paula, pois é possível que ele as desconhecesse, já que dificilmente as críticas feitas ao belga chegaram ao Brasil no período 9 9 Por exemplo, o artigo citado de Bolin ( 1953 , p. 5) é uma tradução de uma conferência realizada pelo acadêmico sueco na Universidade de Lund em 1939, somente traduzida para o inglês na década de 1950. .

A influência de Pirenne na tese de Eurípedes já foi atestada em outros trabalhos (Asfora; Aubert; Castanho, 2010ASFORA, Wanessa Colares; AUBERT, Eduardo Henrik; CASTANHO, Gabriel de Carvalho Godoy. L’histoire médiévale au Brésil: structure d’un champ disciplinaire. In: MAGNANI, Eliana (org.). Le Moyen Âge vu d’ailleurs: voix croisées d’Amérique latine et d’Europe. Dijon: Éditions Universitaires de Dijon, 2010. p. 53-118. , p. 101; Roiz, 2020ROIZ, Diogo da Silva. O curso de Geografia e História da FFCL/USP e a constituição de um campo disciplinar em São Paulo (1934-1968). São Paulo: Alameda, 2020. , p. 330), mas somente como uma pequena menção que não dá conta de sua importância. Referências ao historiador belga ocupam 3,84% das citações e se encontram distribuídas em três livros: Histoire de l’Europe — o trabalho de Pirenne mais citado —, o segundo volume de Les villes et les institutions urbaines , e o já mencionado Mahomet et Charlemagne , este com apenas uma menção e caracterizado como “excelente livro póstumo” (Simões de Paula, 1942SIMÕES DE PAULA, E. O Comércio Varegue e o Grão-Principado de Kiev. São Paulo: FFLCH-USP, 1942 (Reimpressão de 1972). , p. 32). A maioria das citações aparece no terceiro capítulo, sobretudo tratando das rotas comerciais europeias até o século IX e as interações entre nórdicos e bizantinos. Destacamos aqui o tratamento dado por Eurípedes à tese sobre o fechamento do Mediterrâneo:

Henri Pirenne, o grande historiador belga recentemente falecido, demonstrou nas suas obras que a Europa Central e Ocidental tiveram seu desenvolvimento comercial paralizado pelo domínio árabe no Mediterrâneo e consequentemente sua economia reduzida à troca in natura. A Europa Oriental e a Ásia procuram, a partir do século XIII, reorganizar o intercâmbio internacional noutras direções. Com a transferência da capital árabe de Damasco para Bagdá, o comércio do Oriente com o Báltico, através da Rússia, intensificou-se extraordinariamente, transformando-se os povos estabelecidos nas proximidades das novas rotas marítimas e fluviais em intermediários forçados

(Simões de Paula, 1942SIMÕES DE PAULA, E. O Comércio Varegue e o Grão-Principado de Kiev. São Paulo: FFLCH-USP, 1942 (Reimpressão de 1972). , p. 32-33).

Até mesmo a comparação entre Rus e o “Ocidente” pode ter sido influenciada pelo prefácio do historiador belga ao livro de Eck, no qual há uma defesa da comparação entre ambos os territórios (Pirenne, 1933PIRENNE, Henri. Préface. In: ECK, Alexandre. Le Moyen Âge Russe. Prefácio de Henri Pirenne. Paris: Maison du Livre Étranger, 1933. p. v-vii. , p. vi-vii; ver ainda Silva; Torres, 2015 SILVA, Andréia Cristina Lopes Frazão da; TORRES, Andréa Reis Ferreira. “Do método comparativo em história”, de Henri Pirenne. História da Historiografia: International Journal of Theory and History of Historiography, Ouro Preto, n. 17, p. 297-307, 2015. Disponível em: https://bit.ly/3DhCoRB . Acesso em: 28 jun. 2022.
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). O grande trunfo de Simões de Paula, no entanto, foi adequar a tese de Pirenne ao desenvolvimento kievano, algo impensado pela bibliografia utilizada pelo historiador brasileiro. Na lógica de Eurípedes, com o contato comercial pelo Mediterrâneo impossibilitado pelo domínio muçulmano na região, a Europa deveria conseguir produtos importados, particularmente bizantinos e do Extremo Oriente, através de outro caminho. Como Rus se encontrava em uma posição favorável dentro da rota que ligava o Báltico ao Mar Negro e ao Mar Cáspio, os varegues foram capazes de enriquecer a partir da demanda ocidental, impulsionando, portanto, o desenvolvimento de um “Estado” pelos nórdicos e (em menor grau) pelos eslavos lá assentados.

Há um certo “determinismo” econômico nas obras de Pirenne, fruto de sua visão influenciada por economistas alemães e de sua admiração pela interdisciplinaridade entre História, Economia e Sociologia (Thoen; Vanhaute, 2011THOEN, Erik; VANHAUTE, Eric. Pirenne and economic and social theory: influences, methods and reception. Belgisch Tijdschrift voor Nieuwste Geschiedenis, Bruxelas, v. 41, n. 3-4, p. 323-353, 2011. , p. 328-330, 332-334), e o CVGPK se encaixa nessa forma historiográfica. Para Eurípedes, Rus e sua civilização só foram possíveis graças ao comércio de longa distância, condicionando até mesmo a adesão ou não ao Cristianismo (Simões de Paula, 1942SIMÕES DE PAULA, E. O Comércio Varegue e o Grão-Principado de Kiev. São Paulo: FFLCH-USP, 1942 (Reimpressão de 1972). , p. 79-80) e a coesão interna do território (Simões de Paula, 1942SIMÕES DE PAULA, E. O Comércio Varegue e o Grão-Principado de Kiev. São Paulo: FFLCH-USP, 1942 (Reimpressão de 1972). , p. 89-90). Do mesmo modo, o que selou o suposto declínio de Kiev foi o restabelecimento da união do Mediterrâneo promovida pela primeira Cruzada, enfraquecendo tanto o Califado quanto o Império. Conforme o autor:

Essa curiosa organização talvez só tenha subsistido em consequência da grande procura no ocidente de produtos orientais e, também, porque os Eslavos e Varegues — ao contrário dos habitantes do Oeste da Europa, que permaneceram isolados em grandes grupos por causa da cessação do comércio — mantiveram-se em estreito contato com Bizâncio e Bagdadá, os maiores centros urbanos e manufatureiros da Alta Idade-Média

(Simões de Paula, 1942SIMÕES DE PAULA, E. O Comércio Varegue e o Grão-Principado de Kiev. São Paulo: FFLCH-USP, 1942 (Reimpressão de 1972). , p. 138).

“Sem Maomé, Carlos Magno é inconcebível” (Pirenne, 2010PIRENNE, Henri. Maomé e Carlos Magno: o impacto do Islã sobre a civilização europeia. Tradução de Regina Schöpke e Mauro Baladi. Rio de Janeiro: Contraponto: Ed. PUC-RJ, 2010 [1937]. , p. 222), tampouco Rus. Quase nenhum outro autor citado por Eurípedes fez essa associação, todos muito (ou nada) ocupados em explicar o peso étnico — eslavo ou nórdico — do desenvolvimento (Brian-Chaninov, 1955BRIAN-CHANINOV, Nikolai. Historia de Rusia. Tradução de Fabricio Valserra. Barcelona: Luis de Carlat, 1955. , p. 9-15; Kadlec, 1923KADLEC, Charles (Karel). The Empire and Its Northern Neighbours. In: BURY, J. B. (org.). The Cambridge Medieval History. Volume 4: The Eastern Roman Empire (717–1453). Cambridge: Cambridge University Press, 1923. p. 183-215. , p. 199-204; Lot, 1937LOT, Ferdinand. Les invasions barbares et le peuplement de l’Europe. Introduction a l’intelligence des derniers traités de paix. Volume 2. Paris: Payot, 1937. , p. 13-16; Miakotine, 1935MIAKOTINE, Venedikt A. Les pays russes, des origines à la fin des invasions tatares. In: MILIOUKOV, Paul; SEIGNOBOS, Charles; EISENMANN, Louis (org.). Histoire de Russie. Tome I: des origines à la mort de Pierre le Grand. Paris: Librairie Ernest Leroux, 1935. p. 81-124. , p. 88-89; Platonov, 1931PLATONOV, Sergei F. La Russie Chrétienne. In: GAUDEFROY-DEMONBYNES, Maurice; PLATONOV, Sergei. Le Monde Musulman et Byzantin jusqu’aux Croisades. Paris: E. de Boccard, 1931, p. 499-588. , p. 469-475). A maioria destes, aliás, minimizando ou omitindo o peso nórdico na formação da Rus. Ao contrário de sua bibliografia, a qual isola a Rus no mundo, Simões de Paula adiciona o elemento mediterrânico e o situa no plano da Eurásia como eco de um acontecimento maior. A exceção é Eck ( 1933ECK, Alexandre. Le Moyen Âge Russe. Prefácio de Henri Pirenne. Paris: Maison du Livre Étranger, 1933. , p. 2), que associa somente à uma evolução natural dos eslavos orientais, ignorando o elemento nórdico tão caro a Eurípedes (Eck, 1933ECK, Alexandre. Le Moyen Âge Russe. Prefácio de Henri Pirenne. Paris: Maison du Livre Étranger, 1933. , p. 5-7). Nem mesmo o próprio Pirenne, que já havia comparado o estabelecimento dos rus com o surgimento do Império Carolíngio (Pirenne, 1973PIRENNE, Henri. As cidades da Idade Média. 3. ed. Tradução de Carlos Montenegro Miguel. Lisboa: Publicações Europa-América, 1973 [1927]. , p. 43-48), pensou que existiria uma conexão transformadora entre Rus e seus entornos. Embora não queiramos caracterizar Simões de Paula como um precursor, é interessante notar que tese de 1942 não aparece, nem mesmo para críticas a seu método, em trabalhos recentes sobre as conexões e integrações eurasiáticas durante a pré-Modernidade (por exemplo, Bovo e Bayard, 2020 BOVO, Claudia Regina; BAYARD, Adrien. Histórias conectadas da Idade Média: abordagens globais antes de 1600. Esboços, Florianópolis, v. 27, n. 44, p. 10-16, 2020. Disponível em: https://rb.gy/78qhp7 . Acesso em: 10 mar. 2023.
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, p. 11-12; Cândido da Silva, 2020 CÂNDIDO DA SILVA, Marcelo. Uma História Global antes da Globalização? Circulação e espaços conectados na Idade Média. Revista de História, São Paulo, n. 179, p. 1-19, 2020. Disponível em: https://bit.ly/3xeNHGu . Acesso em: 15 ago. 2022.
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, p. 14-16). A presença do CVGPK talvez seria bem-vinda em tais balanços.

Como constatamos anteriormente, ainda que criticada em sua própria época, a tese de Pirenne cativou Simões de Paula ao ponto de embasar seu argumento teórico e sua metodologia de comparação. Para o brasileiro, o território estudado tem seu desenvolvimento atrelado ao fechamento do Mare Nostrum . É possível pensar que erros cometidos pelo autor belga, logo, comprometeriam o CVGPK, mas o mérito de Eurípedes ainda era percebido mesmo com equívocos de sua inspiração. Vejamos, por exemplo, uma parte da resenha do CVGPK por Maurice Lombard, notório oponente da ideia de que contatos inexistiam entre cristãos latinos e muçulmanos (Lombard, 1947 LOMBARD, Maurice. Les bases monétaires d’une suprématie économique: l’or musulman du VIIe au XIe siècle. Annales. Economies, sociétés, civilisations, Paris, ano 2, n. 2, p. 143-160, 1947. Disponível em: https://rb.gy/eorikh . Acesso em: 10 mar. 2023.
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, p. 146-160, 1948LOMBARD, Maurice. Mahomet et Charlemagne. Le problème économique. Annales. Economies, sociétés, civilisations, Paris, ano 3, n. 2, p. 188-199, 1948. , p. 188-199) durante o período abordado por Simões de Paula e Pirenne, particularmente avesso às proposições do último:

É uma síntese elegante do nosso conhecimento do comércio escandinavo ao longo dos rios russos, do Báltico ao Mar Negro e ao Mar Cáspio; e também uma boa visão histórica de um Estado criado por esta rota comercial — o Principado de Kiev — um “Estado-Rota” cujos personagens, vicissitudes, toda a vida são determinados pelos horizontes comerciais: Bizâncio, o mundo muçulmano, o domínio Báltico. Em tudo isso o autor foi muito bem claro. Mas ele está errado em acreditar, com Pirenne, que essa rota fluvial russa foi, do século VIII ao XI, a única zona de contato entre o Oriente Bizantino ou muçulmano e o Ocidente bárbaro

(Lombard, 1949 LOMBARD, Maurice. E. Simoes de Paula, ouvrages sur la route commerciale des fleuves russes et la principauté de Kiev. Annales. Economies, sociétés, civilisations, Paris, ano 4, n. 3, p. 351, 1949. Disponível em: https://rb.gy/dm3rh3 . Acesso em: 10 mar. 2023.
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, p. 351, tradução nossa).

Vemos que o medievalista francês eleva o CVGPK a um patamar de equidade com a historiografia escrita na Europa, afinal Simões de Paula elegantemente sintetizou “nosso conhecimento” e sua perspectiva de civilização baseada no comércio urbano não é contestada. Há também concordância com o peso maior da economia sobre os outros componentes do “fato civilizacional” (Almeida, 2013 ALMEIDA, Néri de Barros. A História Medieval no Brasil. Signum, Rio de Janeiro, v. 14, n. 1, p. 1-16, 2013. Disponível em: https://tinyurl.com/2ap9x5xk . Acesso em: 9 maio 2024.
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, p. 10) expresso na tese, destoando ao menos da primeira geração dos Annales . Lombard, contudo, discorda da exclusividade dada à rota dos varegues, assim como fez Pirenne. Ademais, a suposta abertura do Mediterrâneo — que jamais “fechou”, segundo o historiador — a partir do século XI não teria causado o declínio de Kiev (Lombard, 1949 LOMBARD, Maurice. E. Simoes de Paula, ouvrages sur la route commerciale des fleuves russes et la principauté de Kiev. Annales. Economies, sociétés, civilisations, Paris, ano 4, n. 3, p. 351, 1949. Disponível em: https://rb.gy/dm3rh3 . Acesso em: 10 mar. 2023.
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, p. 351). O erro estaria nas tintas que colorem o quadro e não na moldura que enquadra a tese, já que Simões de Paula compartilha a visão evolucionista da academia europeia.

A “Velha Rússia” e o evolucionismo de Simões de Paula

Há outro aspecto do CVGPK que merece destaque. Para Pirenne, a invasão de uma população estrangeira teria causado o fim da Antiguidade e interrompido a “evolução” civilizacional europeia, modificando o principal motor econômico e criando uma nova civilização. Simões de Paula parece ver na Rus um fenômeno análogo, mas o tratamento evolucionista não parece ser exclusivo do belga, ao abordar o “Ocidente”. O motivo é simples. A periodização preferida foi a chamada “Rus Antiga” ou “Velha Rus” ( Drevniaia Rus ), traduzida na bibliografia de Simões de Paula como Russie Ancienne ou Ancient / Old Russia. O termo Rus , etnônimo e também designação do local onde os rus habitavam, é transformado em ou traduzido por “Rússia” no material utilizado para o CVGPK, fruto da visão predominantemente russófila da bibliografia, conforme Raffensperger ( 2020RAFFENSPERGER, Christian. Rus v Srednevekovoi Evrope: osmyslenie istoriografii. Novoe Prochloe, Rostov-do-Don, n. 3, p. 230-236, 2020. , p. 232-233), que aparta o território do restante da Europa.

Com o desenvolvimento da historiografia nacional do Império Russo ao longo do século XIX, os primeiros historiadores dividiram o que compreendiam como história russa em dois momentos distintos, a Rússia Antiga e a Moderna, a partir das várias reformas de Piotr I Alekseevitch (1672-1725), ou Pedro I o Grande, a partir do século XVIII (Anisimov, 2015ANISIMOV, Evgenii V. The reforms of Peter the Great: progress through coercion in Russia. Tradução de John T. Alexander. Londres: Routledge, 2015. ) como marco divisor. Mesmo com o questionamento do adjetivo “moderno” pela historiografia a partir do início do XX (Korenevskii, 2020KORENEVSKII, A. V. Mnogo v pole tropinok… Novoe Prochloe, Rostov-do-Don, n. 3, p. 8-34, 2020. , p. 18-19), o recorte entre os séculos IX e XVI continuou e continua compreendido como Drevniaia Rus , embora haja subdivisões. Até 1240, o período é comumente conhecido como “Rus Kievana” ( Kievskaia Rus ) dada a suposta centralidade política, econômica e cultural de Kiev até a invasão mongol de 1240. Atualmente, Drevniaia Rus é ainda utilizada de maneira sinedótica quando autores se referem ao período kievano (Korenevskii, 2020KORENEVSKII, A. V. Mnogo v pole tropinok… Novoe Prochloe, Rostov-do-Don, n. 3, p. 8-34, 2020. , p. 20), e até hoje preferida pela academia (Steindorff, 2020STEINDORFF, Ludwig. Tsezury i bifurkatsii v istorii Russkogo Srednevekovia i Drevnei Russi. Novoe Prochloe, Rostov-do-Don, n. 3, p. 222-229, 2020. , p. 224).

Como essas indicações dialogam com a tese de Simões de Paula? Com exceção de Brian-Chaninov ( 1955BRIAN-CHANINOV, Nikolai. Historia de Rusia. Tradução de Fabricio Valserra. Barcelona: Luis de Carlat, 1955. ), nenhum dos autores que tratam do passado rus chamam o período abordado por Eurípedes de “medieval”, preferindo sempre as traduções de Drevniaia ou Kievskaia . Com uma bibliografia que não compreende o período como “medieval” e a influência de Pirenne sobre o que caracterizaria uma Idade Média, não estranhamos que o próprio Eurípedes não entenda seu recorte como de História Medieval, apesar da cronologia ocidental. A seguinte passagem exemplifica nossa afirmação:

O jugo tártaro se abateu sobre a Rússia por mais de dois séculos, e sua civilização, após êsse começo tão feliz e tão belo que foi o período da hegemonia de Kiev, viu-se sùbitamente isolada de Bizâncio e da Europa Ocidental, justamente na época em que nesta havia uma renovação de civilização. Tudo isso era o fim da Velha Rússia de Kiev. A Idade Média Russa vai começar

(Simões de Paula, 1942SIMÕES DE PAULA, E. O Comércio Varegue e o Grão-Principado de Kiev. São Paulo: FFLCH-USP, 1942 (Reimpressão de 1972). , p. 135, grifo nosso).

A última frase de Simões de Paula é bem parecida com “ Ainsi se termine la période ancienne de l’histoire russe ” (Miakotine, 1935MIAKOTINE, Venedikt A. Les pays russes, des origines à la fin des invasions tatares. In: MILIOUKOV, Paul; SEIGNOBOS, Charles; EISENMANN, Louis (org.). Histoire de Russie. Tome I: des origines à la mort de Pierre le Grand. Paris: Librairie Ernest Leroux, 1935. p. 81-124. , p. 124); e “ Une époque historique nouvelle s’ouvrit pour la Russie: elle entrait dans son moyen âge ” (Eck, 1933ECK, Alexandre. Le Moyen Âge Russe. Prefácio de Henri Pirenne. Paris: Maison du Livre Étranger, 1933. , p. 27), frases que terminam o capítulo sobre o período kievano. Deste último, aliás, é de onde Eurípedes traduz todo o trecho citado anteriormente, exceto pela parte grifada (Eck, 1933ECK, Alexandre. Le Moyen Âge Russe. Prefácio de Henri Pirenne. Paris: Maison du Livre Étranger, 1933. , p. 26), e o livro de Eck, intitulado Le Moyen Âge Russe, somente aborda uma Idade Média que teria se iniciado com a mudança do centro político para Suzdal (Eck, 1933ECK, Alexandre. Le Moyen Âge Russe. Prefácio de Henri Pirenne. Paris: Maison du Livre Étranger, 1933. , p. 32-37), logo o período posterior ao século XIII (Vernadsky, 1935VERNADSKY, George. Le Moyen Age Russe by Alexandre Eck. Speculum, Chicago, v. 10, n. 2, p. 208-209, 1935. , p. 209). De qualquer modo, Simões de Paula enxerga uma ruptura de um suposto desenvolvimento natural daquilo que ele compreende por “civilização russa” causado por disputas políticas internas, reordenamentos comerciais e invasões de povos estrangeiros. Esses três fatores fizeram com que Rus voltasse “inteiramente para si própria, mantendo apenas ligações não muito intensas com o Báltico” (Simões de Paula, 1942SIMÕES DE PAULA, E. O Comércio Varegue e o Grão-Principado de Kiev. São Paulo: FFLCH-USP, 1942 (Reimpressão de 1972). , p. 141), trocando o comércio pela agricultura e enfatizando o domínio sobre a terra.

As constantes comparações corroboram a concepção de uma Rússia ainda não medieval. Baseando-se em Pirenne e no geógrafo britânico Gordon East, haveria uma equivalência entre os efeitos dos ataques nômades contra Kiev e as incursões árabes contra a Gália, correspondendo ao mesmo contratempo evolutivo apesar da diferença cronológica. Conforme Simões de Paula ( 1942SIMÕES DE PAULA, E. O Comércio Varegue e o Grão-Principado de Kiev. São Paulo: FFLCH-USP, 1942 (Reimpressão de 1972). , p. 126):

Assim, tanto no Ocidente como no Oriente da Europa, as mesmas causas produziram os mesmos efeitos. A diferença entre as duas regiões está, entretanto, na cronologia, porque a Rússia vivia do comércio na época em que a Gália carolíngia só conhecia o regime dominial, e aquela só inaugurou êsse regime quando a Europa Ocidental, tendo encontrado novos mercados, abandonava precisamente a economia de base agrícola. Como vemos, tanto na Rússia como na Gália, essas mudanças econômico-políticas foram produzidas em grande parte por invasões e não por evolução interna.

Há uma hierarquização entre as duas sociedades. Rus já era “atrasada” enquanto o território ocidental se recuperava do dano à sua evolução apesar de ambas coexistirem (Simões de Paula, 1942SIMÕES DE PAULA, E. O Comércio Varegue e o Grão-Principado de Kiev. São Paulo: FFLCH-USP, 1942 (Reimpressão de 1972). , p. 137-138). Se o evolucionismo presente na tese de Eurípedes não está suficientemente claro, sua conclusão explicita a fusão do método comparativo de Pirenne com a periodização imperial da história russa:

Poderíamos mesmo afirmar — com as necessárias reservas — que o período de Kiev na Rússia corresponde à Antiguidade do mundo mediterrâneo, e que a Idade Média começa verdadeiramente para essa região com a invasão tártara. Como vemos, a Rússia sempre acompanhou a evolução do ocidente com um atrazo

(Simões de Paula, 1942SIMÕES DE PAULA, E. O Comércio Varegue e o Grão-Principado de Kiev. São Paulo: FFLCH-USP, 1942 (Reimpressão de 1972). , p. 139).

Em suma, a compreensão da história da Rus para Simões de Paula é uma síntese evolucionista da tese de Pirenne com a lógica de uma Drevniaia Rus , com ambos os aspectos se complementando na escrita do uspiano. Há, contudo, um último ponto digno de realce em relação ao evolucionismo de Eurípedes. Vejamos a seguinte citação, também da conclusão do CVGPK:

Os Varegues não tiveram sorte, ou não puderam conter os nômades, e a melhor prova de ser a civilização mercantil de Kiev obra dêles e não exclusivamente dos Eslavos Orientais é a de que bastou os Tártaros terem destruído — tomando as cidades e taxando-as com produtos da terra — a classe dos mercadores e dos burgueses da bacia do Dnieper, para que a terra, somente a terra, ficasse como base econômica da nova sociedade que vai ter Moscou como centro. Com isso, podemos afirmar que a Rússia começou a atingir o estágio da sociedade feudal de tipo carolíngio

(Simões de Paula, 1942SIMÕES DE PAULA, E. O Comércio Varegue e o Grão-Principado de Kiev. São Paulo: FFLCH-USP, 1942 (Reimpressão de 1972). , p. 140).

Além de tratar os nórdicos como civilizadores estrangeiros, ecoando na comparação anterior entre Rus e o Brasil recém-colonizado, novamente há a comparação entre Rus e o Império Carolíngio, dessa vez com ênfase na capital. Se Pirenne argumentou que o fechamento do Mare Nostrum moveu o centro político ocidental do Sul para o Norte do Reno, algo semelhante acontecera na Rússia com a nova centralidade de Moscou sucedendo a decadência de Kiev. Não é uma mera transposição da tese do historiador belga, mas uma associação possibilitada pela própria historiografia utilizada.

A bibliografia referenciada por Eurípedes foi influenciada fortemente pelo chamado “esquema tradicional da História russa” (Hrushevsky, 1965HRUSHEVSKY, Mykhailo. The traditional scheme of “Russian” history and the problem of a rational organization of the history of the East Slavs. 2. ed. Editado por Andrew Gregorovich. Winnipeg: UVAN, 1965 [1904]. , p. 8), compreendido como uma evolução da “Rússia kievana” para a chamada “Rússia moscovita”. Esta última teria como centro político o Reino de Vladimir-Suzdal, que eventualmente se tornaria Moscou. Tal abordagem tende a ignorar os outros reinos que formavam Rus, como Novgorod e a Galícia, enfatizando somente o nordeste da Rússia europeia após meados do século XII com o suposto declínio de Kiev. Hegemônica dentro do Império e da União Soviética, mas não de modo inconteste (Plokhy, 2005PLOKHY, Serhii. Unmaking imperial Russia: Mykhailo Hrushevsky and the writing of Ukrainian history. Toronto, University of Toronto Press, 2005. , p. 134-152), a teoria foi popularizada no exterior pelas muitas traduções de Kliutchevskii (Raffensperger, 2022RAFFENSPERGER, Christian. Situating medieval Eastern Europe: historiography and discontent. In: CURTA, Florin (ed.). The Routledge Handbook of East Central and Eastern Europe in the Middle Ages. 500–1300. Oxon: Routledge, 2022. p. 9-22. , p. 13-14) e por traduções de autores nativos que o citavam.

A princípio, parece que Simões de Paula segue acriticamente o “esquema tradicional”, mas o uspiano percebeu a complexidade do objeto. Eurípedes traduz uma passagem de Platonov ( 1931PLATONOV, Sergei F. La Russie Chrétienne. In: GAUDEFROY-DEMONBYNES, Maurice; PLATONOV, Sergei. Le Monde Musulman et Byzantin jusqu’aux Croisades. Paris: E. de Boccard, 1931, p. 499-588. , p. 552-553) sobre as “[…] evoluções políticas completamente diferentes” de três reinos Rus: a Novgorod republicana; a Galícia oligárquica e a Suzdal autocrática. Destas, Novgorod fora a única poupada pelos mongóis e, com a intensificação do seu comércio com a Europa Setentrional, apresentou uma trajetória similar à kievana (Simões de Paula, 1942SIMÕES DE PAULA, E. O Comércio Varegue e o Grão-Principado de Kiev. São Paulo: FFLCH-USP, 1942 (Reimpressão de 1972). , p. 130-132). Simões de Paula sente que é mais importante escrever sobre Kiev e Novgorod apesar da preferência da historiografia por Suzdal, dada a lógica de sua tese. Ademais, o reconhecimento de trajetórias diferentes explica as “necessárias reservas” da comparação anteriormente mencionada. Nem toda a Rússia entrava no Medievo com as invasões, pois Novgorod já estaria par-a-par com o restante do continente.

Considerações finais

De modo tragicômico, Eurípedes e a produção brasileira que precede os anos “dourados” são tratados da mesma maneira que a própria Idade Média fora pelos Iluministas (Amalvi, 2017AMALVI, Christian. Idade Média. In: LE GOFF, Jacques; SCHMITT, Jean-Claude (org.). Dicionário analítico do Ocidente Medieval. Volume 1. São Paulo: Editora Unesp. 2017. p. 599-631. , p. 599-601). Ignorar o legado complexo de Simões de Paula na historiografia medievalística brasileira nada mais faz do que realçar a concepção de uma Idade das Trevas aguardando teleologicamente uma nova era de ouro na qual se inserem quem denuncia a primeira. Parece-nos que a indiferença direcionada à tese, para além de sua difícil acessibilidade, é fruto tanto da visão “civilizacional” monolítica que supostamente agrilhoava Eurípedes, quanto de uma expectativa frustrada sobre sua (falta de) conexão com os Annales , mas assim como a complexa Rus que Simões de Paula analisou, as coisas não são tão simples quanto parecem.

A primeira tese de doutorado em História (Medieval) defendida no Brasil é mais complexa e interessante do que seu relativo desconhecimento pela historiografia tende a dar crédito. Eurípedes Simões de Paula se preocupou com a evolução da Europa Medieval em seu “conjunto harmônico” (Simões de Paula, 1942SIMÕES DE PAULA, E. O Comércio Varegue e o Grão-Principado de Kiev. São Paulo: FFLCH-USP, 1942 (Reimpressão de 1972). , p. 5), escolhendo Rus/Rússia e sua relação com o comércio de longa distância como seu estudo de caso. Sem abdicar da comparação, o uspiano percebeu o impacto que a atividade mercantil (empreendida pelos nórdicos “varegues” que se sedentarizaram ao longo do Dnipro) teria causado na fundação e consolidação de um “Estado”, que viveu e morreu segundo os ritmos da suposta dependência da Europa Ocidental por produtos cuja importação seria impossível devido ao fechamento do Mediterrâneo. Eventualmente, devido a vários fatores, com a reabertura do Mare Nostrum como principal razão, o comércio desapareceu na maior parte do território e modificou o curso histórico-evolutivo com a mudança da capital austral de Kiev para a setentrional Vladimir-Suzdal, o que teria iniciado o período medieval russo graças à ruralização da sociedade. A decadência foi, conforme Simões de Paula, bastante parecida com a situação dos francos, também vítima de um bloqueio econômico e de invasões constantes. Aliás, Eurípedes diz que Rus merece o mesmo reconhecimento dos francos e dos cruzados ao “[…] repelir a investida do Crescente rumo ao Ocidente” (Simões de Paula, 1942SIMÕES DE PAULA, E. O Comércio Varegue e o Grão-Principado de Kiev. São Paulo: FFLCH-USP, 1942 (Reimpressão de 1972). , p. 128).

Não se trata de uma emulação e absorção pura do modelo historiográfico dos Annales como alguns balanços levam a acreditar. Preocupações com a formação étnica da Rus, seu desenvolvimento e suposto declínio são questões com as quais a produção especializada lida desde antes do nascimento do próprio Simões de Paula. O uspiano foi, na verdade, influenciado tanto pela concepção de Pirenne sobre a História Econômica e seu método comparativo quanto pelo viés nacionalista da historiografia russa imperial e soviética. A síntese desses elementos foi a compreensão de uma Rússia — não Rus — inicialmente calcada no tráfego internacional que condicionou sua “civilização”, até que com ataques externos e disputas internas houve a chegada tardia do estágio civilizacional medieval, apesar da conservação do comércio no Noroeste. Ainda assim, Eurípedes discordou de certos aspectos de ambos os vetores historiográficos que estruturaram sua tese, como o caráter absoluto de uma “Idade Média Russa” e do peso maior dos eslavos na formação da Rus. Eis a originalidade do CVGKP não apenas para a historiografia brasileira, mas para a historiografia mundial de sua época dedicada ao estudo daquela região.

Obviamente, vista pelos olhos de hoje, a tese sofre de uma crucial dependência da historiografia, de uma aderência a teorias atualmente desatualizadas (e que foram contestadas mesmo durante sua escrita), e de problemas de tradução que prejudicam a leitura e a compreensão de sua originalidade, especialmente para os leitores de nossos dias. Há até certa influência de um colonialismo na comparação da Rus com o Brasil e na concepção evolucionista sobre as diferentes culturas europeias. Não é nosso propósito glorificar a tese de Simões de Paula ou transformar seu autor em um arauto das novas maneiras de compreender a História, mas demonstrar suas relações com as principais correntes historiográficas de sua época. Seria preciso pensar o que significava escrever uma tese na Universidade de São Paulo — por que não no Brasil? — no segundo quartel do século XX.

Por fim, enfatizamos que o Comércio varegue e o Grão-Principado de Kiev é somente uma parte da produção acadêmica de Simões de Paula, tanto nos estudos medievais quanto em outras áreas (como indicado, as orientações também fazem parte desta atividade profissional e certamente impactaram no campo acadêmico). Mesmo se o desbravamento de sua obra é considerado difícil (Silva, 1983SILVA, Victor Deodato da. Uma obra que suscitou necessidades acadêmicas. In: VV. AA. In memoriam de Eurípedes Simões de Paula: artigos, depoimentos de colegas, alunos, funcionários e ex-companheiros de FEB; vida e obra. São Paulo: FFLCH, 1983. p. 555-561. , p. 557), esperamos, com este artigo, suscitar algum interesse por seus trabalhos, particularmente entre os medievalistas que, na crescente ânsia por escrever a história de seu próprio campo, ainda tendem a maldizer, ignorar ou “afrancesar” demasiadamente a contribuição de Eurípedes sem levar em conta a época, as circunstâncias de sua pesquisa e, especialmente, como fizemos aqui, as diferentes tradições historiográficas dos estudos sobre Rus então em voga naquele momento.

Agradecimento

Agradeço ao meu orientador, Gabriel de Carvalho Godoy Castanho, pelo encorajamento inicial e pelos apontamentos. Também registro minha gratidão aos gentis comentários e críticas prévias de Caio Féo, Daniele Gallindo, Kaio Moura, Leandro Rust, Lucas Simone, Marcos Caldas, Olga Pisnitchenko, Suênia Damásio e Willian Reis, bem como a Clínio Amaral pelo incentivo. De igual modo, agradeço aos pareceristas e aos editores da revista História da Historiografia.

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  • TSAMUTALI, Aleksei Nikolaevich. Sergei Fedorovich Platonov (1860-1933): a life for Russia. In: SANDERS, Thomas (org.). Historiography of Imperial Russia: the profession and writing of history in a multinational state. Londres: Routledge, 2015. p. 311-331.
  • VASILIEV, Alexander A. The Russian Attack on Constantinople in 860. Cambridge: The Mediaeval Academy of America, 1946.
  • VERNADSKY, George. Kievan Russia. 2. ed. New Haven: Yale University Press, 1972 [1946].
  • VERNADSKY, George. Le Moyen Age Russe by Alexandre Eck. Speculum, Chicago, v. 10, n. 2, p. 208-209, 1935.
  • 1
    A associação entre Eurípedes e os Annales em sua memorialística se dá especialmente por conta de seu prefácio presente na primeira Revista de História (Simões de Paula, 1950 SIMÕES DE PAULA, E. O nosso programa. Revista de História, [S. l.], v. 1, n. 1, p. 1-2, 1950. Disponível em: https://rb.gy/fsapah . Acesso em: 11 mar. 2023.
    https://rb.gy/fsapah...
    ).
  • 2
    Ressaltamos a importância de uma orientação informal de Pedro Moacyr Campos (1920-1975), orientado por Simões de Paula, presente em agradecimentos de teses orientadas por Eurípedes (Asfora; Aubert; Castanho, 2010ASFORA, Wanessa Colares; AUBERT, Eduardo Henrik; CASTANHO, Gabriel de Carvalho Godoy. L’histoire médiévale au Brésil: structure d’un champ disciplinaire. In: MAGNANI, Eliana (org.). Le Moyen Âge vu d’ailleurs: voix croisées d’Amérique latine et d’Europe. Dijon: Éditions Universitaires de Dijon, 2010. p. 53-118. , p. 95-96; Miatello, 2017 MIATELLO, André. A História Medieval na graduação em História: da pesquisa à docência. Revista Chilena de Estudios Medievales, Santiago, n. 11, p. 68-90, 2017. Disponível em: https://rb.gy/o1zz7e . Acesso em: 10 mar. 2023.
    https://rb.gy/o1zz7e...
    , p. 74).
  • 3
    Conseguimos encontrar cópias do CVGPK somente nas bibliotecas da USP, da Unicamp e da Unesp, além da Biblioteca Nacional, ou seja, o acesso à tese está restrito à região Sudeste.
  • 4
    Nas citações diretas, utilizaremos a grafia usada por Eurípedes e todos os termos como presentes no CVGPK (por exemplo, varegue, dêsse, entre outros).
  • 5
    Simões de Paula usa o termo grão-príncipes , mas o adjetivo grão ( velikii ) só se torna recorrente na alcunha ao final do século XI (Raev, 2014RAEV, Mikhail. The emergence of the title Velikii Kniaz’ in Rus’ and the Povest’ Vremennykh let. Zbornik radova Vizantološkog instituta, Belgrado, n. 51, p. 47-69, 2014. , p. 66).
  • 6
    Um dos vários nomes da compilação analística conhecida como Povest Vremmenykh Let ( Narrativa dos anos passados ), graças à hipótese de que seu autor e/ou compilador seria o monge Nestor († século XII) do Monastério das Cavernas de Kiev (Simone, 2019 SIMONE, Lucas Ricardo. Recontar o tempo: apresentação e tradução da Narrativa dos anos passados. 2019. Tese (Doutorado em Letras) — Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2019. Disponível em: https://rb.gy/j2thry . Acesso em: 10 mar. 2023.
    https://rb.gy/j2thry...
    , p. 39-41).
  • 7
    Algumas dessas são notas explicativas e não contêm referências.
  • 8
    Considerando apenas autores citados cinco vezes ou mais.
  • 9
    Por exemplo, o artigo citado de Bolin ( 1953 BOLIN, Sture. Mohammed, Charlemagne and Ruric. Scandinavian Economic History Review, [S. l.], v. 1, n. 1, p. 5-39, 1953. Disponível em: https://rb.gy/hojfdy . Acesso em: 10 mar. 2023.
    https://rb.gy/hojfdy...
    , p. 5) é uma tradução de uma conferência realizada pelo acadêmico sueco na Universidade de Lund em 1939, somente traduzida para o inglês na década de 1950.
  • Financiamento
    Coordenadoria de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior — Programa Institucional de Doutorado Sanduíche no Exterior (CAPES-PDSE).
  • Aprovação no comitê de ética
    Não se aplica.
  • Modalidade de avaliação
    Duplo-cega por pares.
  • Contexto de pesquisa
    Partes do texto derivam de duas apresentações orais proferidas em dois eventos distintos: 1) City and Rusian civilization in “The Varangian Commerce and the Great Principality of Kiev” ( 1942SIMÕES DE PAULA, E. O Comércio Varegue e o Grão-Principado de Kiev. São Paulo: FFLCH-USP, 1942 (Reimpressão de 1972). ), proferida no evento Международная научная конференция «Древнерусский город и его округа через призму источников и историографии» em 4 de junho de 2022 ( Санкт-Петербургская Духовная Академия / Rússia); e 2) “O Comércio Varegue e o Grão-Principado de Kiev” de E. Simões de Paula, 80 anos depois , proferida no evento Global Medievalism: culture, appropriations and reinventions em 24 de junho de 2022 (Unimontes / MG). O presente artigo consiste em uma versão mais detalhada e aberta de ambas as apresentações. Durante o processo de avaliação e editoração, também tive a oportunidade de expor as conclusões aqui presentes na palestra ““O Comércio Varegue e o Grão-Principado de Kiev”: Revisitando a primeira tese doutoral de História (medieval) brasileira ( 1942SIMÕES DE PAULA, E. O Comércio Varegue e o Grão-Principado de Kiev. São Paulo: FFLCH-USP, 1942 (Reimpressão de 1972). )“, organizada pelo Translatio Studii: Núcleo Dimensões do Medievo (UFF) e proferida em 17 de novembro de 2023.
  • Preprint
    O artigo não é um preprint.
  • Disponibilidade de dados de pesquisa e outros materiais
    Não se aplica.

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Flávia Varella – Editora-chefe
Ledesma-Alonso – Editor executivo

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    08 Jul 2024
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    20 Dez 2022
  • Aceito
    28 Mar 2023
  • Revisado
    08 Mar 2023
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