Open-access As vilas operárias das regiões carboníferas de Santa Catarina e do Rio Grande Do Sul na perspectiva da história comparada

The Working Villages of the Coal Regions of Santa Catarina and Rio Grande Do Sul, Brazil, from the Perspective of Comparative History

Resumo

O Sul do Brasil, em especial os Estados de Santa Catarina e o Rio Grande do Sul foram fortemente marcados pela exploração do carvão mineral desde as primeiras décadas do século XX. Esse processo crescente de exploração do carvão (em especial no contexto das guerras mundiais, que dificultaram a importação do carvão inglês) levou à constituição das chamadas regiões carboníferas. O crescimento da exploração do carvão gerou a necessidade de ampliação da força de trabalho que vinham trabalhar nas minas e moravam nas vilas operárias construídas pelas empresas mineradoras. Utilizando-se da metodologia da história comparada, o artigo tem como objetivo fazer uma análise comparada das Vilas Operárias das regiões carboníferas de São Jerônimo (que abrigava as vilas de Arroio dos Ratos e Butiá, Minas do Leão e Charqueadas), no Rio Grande do Sul, e de Criciúma, em Santa Catarina, entre os anos de 1945 a 1964.

Palavras-Chave: mundos do trabalho; história comparada; Vilas Operárias; São Jerônimo; Criciúma

Abstract

The South of Brazil, especially the States of Santa Catarina and Rio Grande do Sul, were strongly marked by coal mining since the first decades of the 20th century. This growing process of coal exploitation (especially in the context of the world wars, which made it difficult to import English coal) led to the formation of the so-called coal regions. The growth of coal exploration generated the need to expand the workforce that came to work in the mines and lived in the workers’ villages built by the mining companies. Using the methodology of comparative history, the article aims to make a comparative analysis of the Worker Villages of the coal regions of São Jerônimo (which was home to the villages of Arroio dos Ratos and Butiá, Minas do Leão and Charqueadas) in Rio Grande do Sul, and Criciúma, in Santa Catarina, between the years 1945 to 1964.

Keywords: worlds of work; comparative history; Worker Villages; São Jerônimo; Criciúma

Este artigo fez uma análise comparada das Vilas Operárias das regiões carboníferas de São Jerônimo (que abrigava as vilas de Arroio dos Ratos e Butiá, Minas do Leão e Charqueadas), no Rio Grande do Sul, e de Criciúma, em Santa Catarina, entre os anos de 1945 a 1964. Ambas as comunidades mineiras possuíam em torno de 7 mil (Speranza, 2012, p. 19) e 10 mil trabalhadores (Carola, 2004, p. 235), respectivamente, na década de 1950, tornando-se uma das áreas de maior concentração operária no mesmo setor de produção no Brasil naquele período, com uma produção de mais de dois milhões de toneladas de carvão no ano de 1960.

Contudo, antes de fazer uma análise empírica, é essencial abordarmos teoricamente a metodologia utilizada na comparação das duas regiões estudadas. A História Comparada como metodologia de pesquisa na história tem uma longa tradição entre os historiadores e oferece uma abordagem enriquecedora para o estudo das sociedades e dos processos históricos. Ela permite uma análise mais aprofundada ao estabelecer comparações entre diferentes contextos, períodos e culturas, revelando tanto as semelhanças quanto singularidades.

Marc Bloch, por exemplo, inovou em sua época com uma análise comparada entre a sociedade inglesa e francesa, as quais, embora com suas diferenças econômicas, sociais e culturais, nutriam um imaginário em comum sobre a crença popular no poder taumatúrgico dos reis (Bloch, 1993). Entretanto, o mérito de Bloch não estava apenas na perspectiva espacial de comparação de dois países europeus vizinhos. A análise comparada de ambas as sociedades lhes forneceu indícios das analogias e aproximações entre a influência que a crença popular nesse poder real possuía naquele período.

A História Comparada, portanto, oferece uma metodologia que permite estabelecer um duplo ou múltiplo campo de observação, possibilitando uma análise mais abrangente e contextualizada dos fenômenos históricos. Ao comparar sociedades sincronicamente, com uma contiguidade espacial e temporal, é possível identificar e compreender as dinâmicas, os processos e as interações que moldaram a história. Essa abordagem metodológica proporciona espaços de inteligibilidade e reflexão, ampliando a compreensão das sociedades e dos eventos históricos. Ao analisar várias experiências em comparação, é possível explorar as múltiplas perspectivas das sociedades, os contrastes, os excessos e os segredos que inicialmente não têm fronteiras de tempo ou espaço.

No entanto, é importante reconhecer os desafios enfrentados pela perspectiva comparada. Os historiadores devem estar atentos às variações circunstanciais entre os lugares que estão sendo comparados, evitando a simplificação excessiva ou generalizações arbitrárias que obscureçam as particularidades e as nuances de cada contexto. É fundamental apreender as especificidades dos diferentes espaços comparados, estabelecendo suas reciprocidades e analisando as relações de poder, as estruturas sociais e as formas de dominação que moldaram a história. Ao utilizar a História Comparada como metodologia de pesquisa os historiadores podem explorar as conexões, as influências mútuas e as trajetórias históricas compartilhadas entre diferentes sociedades e grupos sociais.

Desse modo, comparar duas ou mais sociedades sincronicamente, com certa contiguidade espacial e temporal, é um meio de evidenciar as discrepâncias e semelhanças fundamentais entre certos acontecimentos, fenômenos ou processos históricos. Além disso, segundo Theml e Bustamante o método comparativo na história possui o mérito de colocar em múltiplas perspectivas “as sociedades, os contrastes, os excessos, e o secreto, inicialmente, sem fronteiras de tempo ou de espaço. Isso porque, ao colocar em comparação várias experiências, produzem-se frequentemente espaços de inteligibilidade e de reflexão nova” (Theml; Bustamante, 2003, p. 11).

Contudo, um dos maiores problemas a ser enfrentado pela perspectiva comparada, segundo Chris Wrigley, é reconhecer as variações circunstanciais entre os lugares que estão sendo comparados, sem recuar em detalhes consideráveis que acentuem as diferenças e fazer generalizações abstratas (Berger; Alexander, 2019, p. 235). Isto é, apreender as particularidades dos diferentes espaços comparados, estabelecendo suas reciprocidades, sem, contudo, fazer generalizações arbitrárias.

Isso ocorreu nos anos 1960 e 1970, quando a história comparada foi utilizada por pesquisadores da história operária no Brasil e na América Latina de modo a criar hierarquizações e generalizações sobre o movimento operário.1 Como destaca Maria Ligia Coelho Prado, ao comparar os movimentos de trabalhadores das sociedades latino-americanas com as europeias, os pesquisadores se decepcionavam com a comparação por um suposto “atraso” da consciência de classe dos trabalhadores latino-americanos, assumindo:

[…] uma certa hierarquização apoiada em determinados juízos de valor assumidos a priori, escalonando dos mais “avançados” movimentos sociais europeus aos mais “atrasados” latino-americanos que, por seu turno, ainda teriam um longo caminho a percorrer até chegar ao patamar idealizado. (Prado, 2005, p. 94).

Essa hierarquização da classe trabalhadora portadora de uma consciência de classes “atrasada” criou um paradigma na historiografia. Afastando-se dessa concepção esquemática, utiliza-se a história comparada como forma de observação da realidade estudada e como modo de apresentar os resultados pesquisados (Barros, 2007, p. 3).

Se tenho como campo de observação as relações de trabalho de categorias de trabalhadores diversas, como os têxteis, os metalúrgicos e os calçadistas, posso comparar como se dão as diferentes formas de contratação do trabalhador, se é por tarefa, por dia, por mês ou por produção. Bem como as greves e formas de protestos desses trabalhadores, se recorrem mais a via legal para atender suas reivindicações ou por meio da ação direta; ou ainda, se utilizam de táticas violentas, como a quebra de máquinas, para atingirem seus objetivos de reivindicação político-econômica. Se optar por uma análise individual de comparação dos diferentes perfis de trabalhadores segundo as particularidades do trabalho, pode-se comparar os riscos de acidentes de trabalho segundo o grau de periculosidade de cada ofício, e como isso reflete (ou não) na forma de organização e reivindicação de cada categoria.

Do ponto de vista de gênero, pode-se comparar a utilização de trabalhadores masculinos ou femininos no emprego de determinadas funções, suas diferenças de ocupações e de salários, bem como a opressão de gênero que atinge diferentemente (ou não) cada categoria de trabalhadores.

Nas minas de Santa Catarina, por exemplo, o trabalho feminino foi intensamente utilizado pelas mineradoras. As mulheres exerceriam a função de “escolhedeira”, atividade que era realizada na superfície da mina separando o carvão de melhor qualidade (Carola, 2002). Para os mineradores, o emprego do trabalho feminino foi uma das maneiras de diminuir custos de produção, pois as mulheres recebiam salários muito inferiores aos dos homens (Mandelli, 2019).

Em relação às minas do Rio Grande do Sul, não havia mulheres operárias, o trabalho feminino restringia-se ao espaço doméstico. Para as mineradoras rio-grandense, as mulheres não eram utilizadas como instrumento para pagar baixos salários, mas faziam “parte das estratégias de fixação dos trabalhadores homens nas minas, bem como na reprodução da mão de obra (através da geração e criação de filhos)” (Speranza, 2020, p. 119).

De um ponto de vista antropológico, pode-se analisar as diferenças e similaridades entre os trabalhadores urbanos e rurais, em sua absorção por uma indústria em acelerada expansão, bem como sua incorporação pela legislação trabalhista em meados do século XX. Essa análise foi feita por José Sérgio Leite Lopes sobre os trabalhadores camponeses e os “operários industriais” de uma usina canavieira do Nordeste: segundo o autor, os operários do açúcar eram considerados “industriais” e se beneficiaram da legislação trabalhista implantada na década de 1940; já os trabalhadores rurais, também conhecidos como “clandestinos”, que eram excluídos desses direitos, tiveram seu reconhecimento somente a partir da organização do movimento dos camponeses da década de 1960. Segundo o autor:

Estes foram, logo depois, o alvo principal, na área canavieira, da repressão por parte da nova ditadura implantada pelos militares em 1964. Em consequência dessa transformação, “o instrumental cognitivo proporcionado por essa visão do passado, aliado à curta vivência no início dos anos 60 de um sentimento de libertação, dava a este grupo social a possibilidade e a vontade de associação reivindicativa mesmo sob condições severas de repressão. (Lopes, 2011, p. 585).

Esses são breves exemplos de como se pode utilizar a História Comparada nas pesquisas sobre trabalhadores e a favor de uma escrita da história marcada pela complexa relação entre semelhanças e diferenças de uma mesma categoria ou de diferentes categorias, pois se o que as une é a condição de exploração do trabalho, as formas de dominação são diversas, e, portanto, as formas de resistência também o são.

No que diz respeito à metodologia para se pensar a articulação dos mineiros nas duas regiões, utiliza-se da História Comparada como modalidade historiográfica marcada pela complexidade e preocupada em produzir uma reflexão que evidencie as semelhanças e as diferenças (Barros, 2007, p. 3), por requerer uma percepção apurada do historiador.

Dessa forma, a história comparada pode oferecer uma perspectiva enriquecedora para a pesquisa sobre os mundos do trabalho. Ela permite que os historiadores explorem os vínculos e as interações entre diferentes experiências laborais, revelando tanto as peculiaridades quanto os elementos compartilhados que moldaram as lutas, as relações de poder e as transformações no campo do trabalho ao longo do tempo e do espaço.

Essa abordagem metodológica complexa e reflexiva contribui para uma compreensão mais profunda e contextualizada da história dos trabalhadores e do mundo do trabalho na totalidade. A seguir, faremos uma análise comparada dos trabalhadores das minas de carvão em Santa Catarina e no Rio Grande do Sul a partir de seu espaço de moradia, as Vilas Operárias, onde residiam e socializavam uma grande quantidade de famílias que dependiam da mineração de carvão como fonte de renda.

As Vilas Operárias mineiras: uma comparação das regiões carboníferas de Santa Catarina e do Rio Grande do Sul

A sociedade capitalista procura ter o controle social, dominando todos os espaços da vida e adentrando em todas as esferas do cotidiano. Esse controle perpassa desde o estabelecimento da disciplina rígida, do espaço e do tempo de trabalho, e, além disso, procura ampliar esse controle, regulando a vida dos trabalhadores fora do espaço fabril. O controle social no mundo capitalista busca abarcar a totalidade das relações sociais (Fenelon, 1985).

Nesse sentido, para a indústria carbonífera se expandir foi necessário um grande contingente de operários, os quais necessitavam de moradias e de uma infraestrutura para se manter em condições de trabalhar e de viver com suas famílias. A solução encontrada pelas empresas foi a construção de vilas operárias próximas às minas de carvão, uma característica em comum das regiões mineiras no Sul do Brasil.

Desde o início do século XX, portanto, começaram a ser construídas casas operárias para abrigar a família dos mineiros, o que levou à formação de grandes vilas operárias com centenas de famílias. Foram construídas pequenas casas de madeira destinadas aos operários, além de armazéns, igrejas, escolas, farmácias e hospitais (clubes de futebol). Essas vilas operárias também eram utilizadas como forma de propaganda para atrair trabalhadores de outras regiões no contexto da Segunda Guerra Mundial, um período de grande crescimento da mineração.

Foi no contexto das duas guerras mundiais que a mineração teve grande expansão em Santa Catarina e no Rio Grande do Sul. Na região carbonífera de Santa Catarina, por exemplo, durante e logo após o fim da Primeira Guerra Mundial surgiram as primeiras companhias de mineração: Cia. Brasileira Carbonífera Araranguá S.A (1917); Cia. Carbonífera Urussanga S.A (1918); Cia. Carbonífera Próspera S.A (1921); Cia. Carbonífera Ítalo-Brasileira Ltda (1921) e Cia. Nacional de Mineração Barro Branco S.A (1922) (Carola, 2002, p. 16). A exploração do carvão cresceu ainda mais durante a Segunda Guerra Mundial e transformou Criciúma na cidade polo da região carbonífera de Santa Catarina.

A década de 1940 marcou o boom da mineração em Criciúma, pois no contexto da Segunda Guerra Mundial, o governo brasileiro ampliou os incentivos e subsídios à exploração do carvão. A mineração atraiu muitos trabalhadores, entre 1940 e 1950, a população de Criciúma praticamente dobrou. Constituiu-se na cidade um grupo de empresários vinculados à exploração do carvão, os quais iriam participar e influenciar decisivamente nas disputas pelo poder político local e regional, e os trabalhadores das minas se organizando para lutar por melhores salários, condições de trabalho e moradia. (Zanelatto, 2020, p. 205).

Portanto, um dos primeiros aspectos que se pode comparar entre as regiões carboníferas dos dois Estados foi o processo de migração. Nas duas regiões o crescimento da exploração do carvão implicava na necessidade de ampliação da força de trabalho que foi sendo constituída por migrantes provenientes de municípios próximos das regiões carboníferas e até de outros Estados. As empresas mineradoras criavam estratégias para atrair a força de trabalho. Essas estratégias serão evidenciadas ao longo do artigo. Dessa maneira, pode-se afirmar que a ampla maioria dos trabalhadores que habitavam as vilas operárias das duas regiões carboníferas foram migrantes. Trabalhadores migrantes e vilas operárias mudaram profundamente a paisagem das duas regiões carboníferas.

Retomando a questão da constituição das vilas operárias, esses locais, além de espaço de moradia, eram lugares de sociabilidade e de troca de experiências. O convívio de milhares de trabalhadores e suas respectivas famílias contribuía para que se formasse uma identidade de classe, o que em momentos de greve servia como uma rede de classe e de solidariedade ao movimento.

Entretanto, essa forma de administração não foi novidade dessas regiões mineiras. As primeiras vilas operárias surgiram em meados do século XIX na Europa, com a expansão urbana que atraía muitos pobres para as cidades. Os capitalistas industriais de cidades inglesas como Manchester investiram na construção de moradias operárias. Friedrich Engels, no livro A situação da classe trabalhadora na Inglaterra, descreve o estado das moradias operárias:

Por regra geral, as casas dos operários estão mal localizadas, são mal construídas, malconservadas, mal arejadas, úmidas e insalubres; seus habitantes são confinados num espaço mínimo e, na maior parte dos casos, num único cômodo vive uma família inteira [...]. (Engels, 2008, p. 115).

Vale salientar que essas casas eram alugadas ou cedidas pelos donos das indústrias através do modelo cottage system2, ou truck-system, utilizado para prender os trabalhadores economicamente, por exemplo, ao proporcionar moradia nas casas das companhias ou ao fazer com que o empregado comprasse os produtos para sua alimentação nos armazéns do empregador, os remédios nas farmácias das companhias, etc. (van der Linden, 2009, p. 24).

No Nordeste do Brasil, José Sérgio Leite Lopes já havia considerado a importância que o sistema de fábrica-vila possuiu no contexto da expansão do capitalismo industrial em meados do século XX, tal como comenta em sua obra A tecelagem dos conflitos de classe na cidade das chaminés, quando faz uma extensa análise sobre a cidade de Paulista, em Pernambuco, onde as fábricas têxteis da Companhia de Tecidos Paulista controlavam a moradia dos operários, geralmente com um aluguel descontado do salário, o que significava “de fato uma interferência direta e visível na administração da fábrica sobre a vida social extra fabril dos trabalhadores” (Lopes, 2008, p. 17).

O autor reflete que o sistema de fábrica com vila operária caracteriza-se também pelo cottage-system e “sistema de caserna” como padrão de dominação geral, que consiste em um controle centralizado sobre a produção, as moradias e a cidade, a produção agrícola e a “circulação mercantil dos bens de consumo dos operários sob a forma de uma feira administrada” (Lopes, 2008, p. 21).

Além desses aspectos, o autor vai além, afirmando que a promoção de atividades “médicas, religiosas e recreativas, e também uma numerosa milícia particular garantindo o ‘governo local de fato’ da companhia sobre estas múltiplas atividades” (Lopes, 2008, p. 21). Seu argumento era de que a concentração do poder político e econômico nas mãos do mesmo grupo dominante impunha um rígido controle do trabalhador que vivia sob uma paradoxal “servidão-burguesa” (Lopes, 2008, p. 18).

Ainda sobre literatura brasileira que analisa a moradia operária, destaca-se os estudos de Blay (1985). Na literatura encontram-se interpretações que partem de uma visão idealizada, apresentando, de um lado, as vilas operárias, harmoniosamente integradas e sem contradições, e, de outro, os moradores, tidos como companheiros sem conflitos ou submissão, e os patrões como capitalistas-empreendedores, benemerentes e humanistas.

Divergindo dessa perspectiva, Blay considera as vilas operárias como “uma das primeiras soluções coletivas encontradas pelos patrões para resolver o problema da moradia da força de trabalho assalariada urbana empregada pela emergente indústria capitalista” (Blay, 1981, p. 143). Para a autora a moradia configurou-se em um meio na relação entre capital e trabalho que possibilitou uma atuação seguindo dois caminhos, pois: “serviu para pressionar o comportamento social do emergente operariado urbano e atuou no processo de acumulação de capital a ser investido na indústria e na reprodução ampliada do capital” (Blay, 1981, p. 143).

No caso das vilas mineiras do Sul do Brasil, pode-se comparar e perceber semelhanças entre Santa Catarina e o Rio Grande do Sul. Nos dois Estados do Sul, as mineradoras enviavam agentes para o interior com o objetivo de recrutar mão de obra. Um dos atrativos era a apresentação de fotos de modelos de casas que, segundo Silveira, “o operário poderia ter ao passar a fazer parte do quadro funcional da companhia de mineração” (Silveira, 2013, p. 289).

Na fotografia abaixo (Figura 1), tem-se as casas construídas pelo CADEM3 em Arroio dos Ratos. Nota-se que o enquadramento dado pelo fotógrafo objetivou registrar o espaço amplo da rua e as casas seguindo um mesmo modelo, ordenadas na mesma linha. Com a foto tem-se a sensação de que todas as casas seguiam um mesmo padrão, proporcionando o mesmo tratamento a todos os funcionários da empresa. Contudo, o acesso à moradia era concedido através do desconto de um valor do salário dos operários, que era feito diretamente na folha de pagamento.

Figura 1 -
Casas dos operários que trabalhavam para o CADEM, Vila Arroio dos Ratos, município de São Jerônimo, década de 1940.

Vale salientar que só poderiam habitar as casas das companhias caso estivessem empregados nas indústrias, o que em momentos de greve era utilizado pelos proprietários como pressão e coação para que não se paralisasse a produção, com ameaças de despejo dos grevistas de suas casas. Isso pode ser entendido como uma estratégia de controle sobre a mão de obra. Klovan evidenciou, no caso do Rio Grande do Sul, a adoção desse sistema de pagamento por descontos e a existência de mina-com-vila-operária como forma de manter uma dependência da família do trabalhador à mineradora (Klovan, 2014, p. 34).

Desse modo, esse sistema de moradia que condiciona a permanência do trabalhador à manutenção no trabalho, com descontos na folha de pagamento, era uma forma de prendê-lo economicamente à empresa, além de tentativa de disciplinar a força de trabalho. Tal forma de pagamento era uma prática comum, tanto em Santa Catarina quanto no Rio Grande do Sul, de acordo com pesquisa de Speranza: “Não raro o tamanho dos descontos (especialmente os do armazém e da cooperativa) deixava o salário líquido reduzido a zero” (Speranza, 2012, p. 61).

As vilas mineiras em São Jerônimo cresceram no compasso do aumento da produção, urbanizando-se de acordo com a abertura de novos poços de lavra. Durante a Primeira Guerra Mundial, o carvão de São Jerônimo substituiu o carvão estrangeiro e a importação de petróleo, racionado por conta da guerra. Após o término da guerra, na década de 1920, houve um aumento da demanda de carvão pela Viação Férrea (encampada pelo Governo do Estado), que começou a queimá-lo em suas locomotivas (Sulzbach, 1985, p. 25).

Um período de grande investimento nas vilas operárias no Rio Grande do Sul se deu na conjuntura da Segunda Guerra Mundial, quando o Estado Novo publicou o Decreto-lei nº 4.613, em agosto de 1942, que instituiu, como medida de emergência, a entrega obrigatória ao Governo Federal de todo o carvão nacional.. Esse período coincidiu também com um maior investimento nas vilas mineiras, com a construção de hospital, maternidade, posto de puericultura, clubes e cinemas (Speranza, 2012, p. 153).

No entanto, essas reais melhorias de condições de vida dos moradores de Butiá vieram somente no período da Segunda Guerra Mundial, quando o CADEM investiu em áreas estratégicas no município com o objetivo de ter maior controle da produção e da força de trabalho das vilas mineiras. Naquela época, de acordo com os historiadores Witkowski e Freitas: “tudo dependia ou passava pelo aval do CADEM” (2006, p. 24). Foi quando se iniciou a “Era Cadem”, assim chamada pela criação de uma verdadeira estrutura de fábrica com vila operária montada para atrair e fixar a mão-de-obra mineira.

As memórias do mineiro Joaquim Celso de Lima,4 que trabalhou na década de 1950 nas minas de Arroio dos Ratos e Butiá, oferecem um panorama de como o Cadem controlava todo espaço social do Município de São Jerônimo:

As minas do Cadem constituíam, cada uma delas, um feudo. A propriedade onde a cidade e quase toda a periferia eram instaladas também pertencia ao Cadem. […] Dessa maneira, todos os moradores, mesmo aqueles que não tivessem vínculos empregatícios com a companhia, ficavam sempre sob o controle do Cadem. […] Além de tudo, como a vivência era muito ligada por laços de trabalho, tonava-se fácil o perigo da delação. Sobre tudo isso ainda pesava o controle efetuado pelos fiscais que rondavam dia e noite a vida dos trabalhadores e moradores em geral. A perseguição nas minas era tradicional. (Lima, 1984, p. 114).

Percebe-se pelo relato de Celso de Lima que o controle social dos trabalhadores era intenso na vila. Em momentos de conflitos, como greves, por exemplo, eram comuns os destelhamentos e a expulsão das casas de operários que haviam sido demitidos (Speranza, 2020, p. 132). No entanto, as experiências comuns de exploração e precariedade (além da insalubridade das casas, eram frequentes a falta de água potável, bem como as enchentes) forjaram laços de solidariedade e uma cultura militante entre as famílias mineiras. Muitas vezes eram nos espaços da própria vila onde eles se organizavam para reivindicarem melhores condições de moradia e aumentos salariais.

Foi um período de grande investimento nas vilas operárias da região carbonífera para se montar uma estrutura que possibilitasse a extração do chamado “ouro negro” através do trabalho do mineiro, o qual ficou marcado na memória da comunidade da região como um momento de grandes transformações urbanas em São Jerônimo. Nas palavras do pároco Ervino Lothar Sulzbach, o CADEM “levou a mineração ao seu apogeu, marcando seus tempos áureos em Arroio dos Ratos e em Butiá” (1985, p 54). Cabe salientar que essa memória acerca dos “tempos áureos” do município foi formada a partir de um esforço de construção de monumentos e obras que inscrevem determinada época de esplendor em virtude da extração do carvão. Contudo, trata-se de uma seleção dos aspectos considerados positivos, enquanto as memórias dos acidentes e mortes ficam em segundo plano, ou sequer são mencionadas.

A professora e historiadora local Gertrudes Hoff também menciona esse período como de “apogeu, marcando seus tempos áureos em Butiá e Arroio dos Ratos” (Hoff, 1992, p. 35). Não por acaso, Roberto Cardoso5 (no Rio Grande do Sul) e Henrique Lage6 (em Santa Catarina), ambos sócios e diretores das maiores carboníferas do Sul do País, foram vistos por alguns historiadores locais como grandes personalidades e benfeitores dos municípios. Em uma época de pouquíssimos investimentos do setor público nos municípios do interior do Brasil, quando havia carência de infraestrutura generalizada (sem água encanada, rede elétrica, hospitais), aqueles empresários que investiam uma pequena parte dos seus lucros em obras públicas à comunidade eram vistos como “benfeitores” e “caridosos” por parte da população.

Na fotografia abaixo (Figura 2) está a vila operária da Companhia Carbonífera de Araranguá, em Criciúma, década de 1950. Percebe-se que o referente da fotografia é a vila operária e seus moradores em um dia especial, pois os homens estão vestidos de terno e gravata e as mulheres de vestido. As casas, todas enfileiradas, lado a lado, construídas de madeira no mesmo estilo, tamanho e padrão, geralmente tinham três cômodos: sala, cozinha e quarto.

Figura 2 -
Vila Operária da C.B.C.A no bairro Operária, atual Santa Bárbara, início década de 1950.

No relatório escrito pelo médico sanitarista Boa Nova Jr. para o Departamento Nacional de Produção Mineral no ano de 1953, ele assim descreveu as casas dos operários de Criciúma:

Casas (ou melhor dizendo ranchos) velhíssimas, toscas, de madeira empenada e podre, com cobertura de cacos de telhas, cheias de buracos enormes por onde a chuva se escoa aos borbotões, com assoalhos e paredes repletos de largas frestas, por onde o vento sul, no inverno rigoroso, penetra impiedosamente, fustigando não só o próprio mineiro, mal agasalhado, como também sua mulher e seus infelizes filhos, cobertos com farrapos, constituem as habitações dos mineiros. [...] Tivemos a oportunidade de visitar uma dessas casas em que o mineiro, casado, possuía 10 filhos, sendo que os 4 menores dormiam na mesma cama do casal, ou sejam 4 crianças e o casal (6 pessoas!) numa mesma cama. (Boa Nova Jr., 1953, p. 67).

Vivendo com essas condições de moradia, a mortandade infantil em Criciúma era superior a 100 crianças para cada 1.000 nascidos vivos em 1950. No entanto, nem todas as moradias eram “velhas e toscas” como relata o médico Boa Nova Jr. Na década de 1950, a Companhia Siderúrgica Nacional adquiriu a Carbonífera Próspera S.A., implementando algumas melhorias na moradia dos operários: começou a construir casas de alvenaria, mais confortáveis e com maior número de cômodos, distribuídas, segundo Costa, primeiro “aos capatazes e as outras por sorteio. A participação no sorteio dependia da efetiva eficiência do trabalhador na empresa” (Costa, 1999, p. 68). Desse modo, conseguir morar em uma casa de alvenaria passou a ser visto como uma gratificação dada pela empresa, como uma forma de recompensa ao trabalhador disciplinado, uma forma da empresa exercer o controle e a vigilância.

Outro aspecto revelado pela foto é que foi tirada em um dia de procissão da Santa Bárbara, padroeira dos mineiros (Barchinski, 2004, p. 157). Ao fundo da figura 2 aparece um pouco apagada a Igreja de Santa Bárbara, construída na década de 1950 pelos próprios mineiros, “que nas horas vagas eram voluntários na mão-de-obra e nas contribuições” (Viana, 2003, p. 84). A religiosidade popular e a crença na Santa Bárbara eram símbolos comuns aos mineiros das duas regiões. Cornélia Eckert, que estudou sobre a devoção à santa, afirma que ela “revela a crença na sua proteção contra acidentes de trabalho, incêndios, explosões, desmoronamentos, inundações, doenças e contra toda sorte de catástrofes” (Eckert, 1992, p. 57).

Em Criciúma (SC) essa religiosidade popular também se fez presente no cotidiano, sendo que o dia 4 de dezembro foi decretado feriado municipal em homenagem à santa. Desde a década de 1950 eram realizados todos os anos uma festa que reunia milhares de pessoas. Os dias que antecediam e sucediam à festa da padroeira eram de muita comemoração: encontros, jantares, venda de rifas, tudo era preparado com entusiasmo redobrado pela comunidade para celebração do dia.

Em Arroio dos Ratos (RS), segundo Freitas, em 1910 já havia sido construída uma capela à Santa Bárbara, e, em 1944, foi criada a paróquia de Santa Bárbara das Minas de Carvão do Arroio dos Ratos (Freitas, 2021, p 94). Todo ano era realizada a Festa de Santa Bárbara, que, de acordo com Silveira, “era a principal celebração dos operários. [...] Com a aproximação da data, aumentavam os momentos de sociabilidade dos mineiros, uma vez que encontros, reuniões, jantares, missas e novenas antecipavam a procissão do dia 4” (2013, p. 106).

Essa religiosidade nas minas é comum em outros países. Nas minas de estanho da Bolívia, por exemplo, segundo Rocha, os mineiros realizam a tradicional challa à Pachamama ao Tio da Mina, se trata de uma cerimônia

[...] de reciprocidade com a Mãe-Terra e o Tio da Mina. [...] É uma espécie de pacto no qual “todos os trabalhadores negociam com o ‘diabo’ (segundo a tradição cristã); ele é o dono das vetas, que são reveladas aos mineiros em troca de oferendas: folhas de coca, cigarros e álcool e um feto de llama). (Rocha, 2018, p. 55).

Nas minas de carvão no Sul do Brasil acontece um ritual semelhante, no qual o trabalhador faz um gesto simbólico (uma oração ou um sinal da cruz) a uma estátua da Santa Bárbara, geralmente colocada na boca da mina, antes do início do trabalho. Essa ligação com o catolicismo foi fomentada também pela própria instituição católica, que se inseriu nas vilas operárias de Santa Catarina, através das freiras da Congregação das Irmãs da Divina Providência, que vieram trabalhar como assistentes sociais no município na década de 1950, com o intuito de “moralização e de disciplinarização das famílias” (Costa, 1999, p. 169).

O trabalho das freiras foi formalizado com uma parceria entre o Serviço Social da Indústria (SESI), a Igreja Católica e algumas empresas da região, como a Carbonífera Próspera. Segundo Costa, o trabalho das freiras consistia “em visitar as famílias, no intuito de ensinar às mulheres economia doméstica, regras de higiene, algumas noções sanitárias e, até mesmo, aconselhar no relacionamento do casal. Realizaram ainda, juntamente com o SESI, cursos de saúde pública” (1999, p. 169). Pode-se notar a presença das freiras no cotidiano familiar pelas fotografias abaixo (Figuras 3 e 4):

Figura 3 -
Visita das Freiras da Congregação das Irmãs da Divina Providência às residências da Vila Operária Próspera, 1952.

Figura 4 -
Visita das Freiras da Congregação das Irmãs da Divina Providência às residências da Vila Operária Próspera, 1952.

Na figura 3, nota-se as freiras caminhando por uma rua da Vila Operária, as casas de madeira enfileiradas bem próximas umas das outras, com crianças brincando nas ruas e suas mães na porta de casa, provavelmente após receberem a visita das irmãs. Já na figura 4, nota-se a presença das freiras acompanhando o cultivo de hortaliças no quintal de uma casa da vila operária, “ensinando” a esposa de um mineiro sobre hortas e a produção de alimentos. A nutrição operária era uma das funções que as freiras se preocupavam em melhorar, haja vista os baixos salários e pouco poder aquisitivos das famílias, o que resultava em uma má alimentação e alta mortalidade infantil.. Entretanto, a presença das freiras possuía um papel “civilizador”, ao que tentavam introduzir hábitos de alimentação e higiene às famílias mineiras.

Em relação a esses, Gavski observou em sua pesquisa sobre o salário mínimo em Porto Alegre que a nutrição operária era vista como um fator determinante para o “progresso industrial” quando a “alimentação passou a ter um efeito civilizador sobre a população, principalmente trabalhadores e camponeses, mães e crianças, que tiveram suas dietas tradicionais atacadas enquanto práticas anacrônicas” (Silva, 2014, p. 76).

Em São Jerônimo, a cerca de 70 km da capital gaúcha, as freiras da congregação do Imaculado Coração de Maria também faziam parte da comunidade, administrando o Hospital Sarmento Leite, que possuía maternidade e atendimento de puericultura. Embora esse não seja o foco do presente objeto de pesquisa, tudo indica que o cottage system era reforçado pelo truck system - isto é, a condição de ser morador da vila operária era também ser trabalhador da empresa proprietária das moradias. Marcel van der Linden, que pesquisou essa estratégia disciplinar ao redor do mundo, sugere que a forma de “prender” o trabalhador por dívidas com aluguéis e pela compra de produtos nos armazéns das companhias foi efetivada por grandes companhias no mundo, como a “United Fruit Company, que abrigava os seus campesinos na América Central nas plantations ou a siderúrgica Krupp na Alemanha” (van der Linden, 2009, p. 24). Através desse sistema de pagamento, parte dos salários era pago através da troca por produtos e serviços, que as companhias monopolizavam e definiam os preços.

Essa relação de dependência econômica também possuía um viés político, pois ao fornecer moradia e alimentação em troca do trabalho, o patrão esperava obediência e disciplina do operário, o que reforçava uma espécie de paternalismo na relação entre operários e patrões. Inclusive, o pároco local de Arroio dos Ratos, Ervino Lothar Sulzbach, escrevendo em 1989, enfatizou esse problema: “as terras, as casas, a luz, a água, o telefone, o hospital, a cooperativa e outras coisas mais, eram propriedade exclusiva dela. Tal dependência trouxe consigo um paternalismo nocivo, cujas consequências se fazem, sentir até nossos dias [...]” (Sulzbach, 1985, p. 18).

No entanto, se as estruturas de dominação eram construídas de modo a coibir e controlar a força de trabalho, essa forma de controle não era total, pois nos locais de moradia formavam-se laços de solidariedade entre as famílias mineiras, pois eram essas que conviviam com os problemas diários das vilas: falta de água potável, enchentes, locais insalubres. Muitas vezes eram nesses espaços onde se organizavam para reivindicarem melhores condições de moradia e aumentos salariais. Como bem observou E. P. Thompson, se os trabalhadores “agiam segundo um modelo teórico consistente, esse era uma reconstrução seletiva do paternalismo, extraindo dele todas as características que mais favoreciam os pobres” (2015, p. 167).

Desse modo, se a implantação da estrutura de vilas operárias em torno das minas de carvão, com todos os seus condicionantes - as casas alugadas, os armazéns, o estreito controle sobre os operários, a presença das freiras -, agiam como estratégias para manutenção das famílias mineiras próximas ao local de trabalho de modo a reforçar a disciplina e legitimar a exploração, os trabalhadores, por sua vez, constituíam experiências partilhadas como resultado de suas ações, como greves, piquetes, passeatas, em seu processo de fazer-se enquanto classe trabalhadora.

O esporte pode ser utilizado como forma de conter - ou extravasar - fúrias, sejam elas de cunho social, político, econômico ou cultural. Nessa perspectiva, o futebol foi praticado também como forma de controle da classe operária (fora de seu ambiente fabril), contendo manifestações trabalhistas através do jogo e minimizando atritos entre patrões e operários. Tais práticas ocorriam, em muitos casos, nas atividades beneficentes, cunhando uma característica assistencialista aos times de futebol, atitude comum a muitos clubes e vista, de modo geral, como positiva pela sociedade.

Para compensar a dureza do trabalho, um dos espaços de lazer criados para o entretenimento foi o futebol, espaço ao mesmo tempo de socialização entre os operários homens e de exercício de disciplina dos patrões. Em Criciúma, cada carbonífera possuía um clube de futebol. Alguns contavam com estádio ou campo próprios. Os jogadores, em sua maioria, eram operários das próprias empresas, porém, segundo Bernardo, “acontecia que alguns jogadores vinham integrar o time e se tornavam operários das empresas” (2004, p. 132).

A paixão pelo futebol foi sendo construída pelos operários e apoiada pelas empresas, que viam com bons olhos os trabalhadores que se dedicavam ao esporte e ao clube, tornando-se um requisito importante para a garantia de um emprego, segundo Monteiro: “jogar futebol enriquecia o currículo de um trabalhador aspirante a um emprego na mina” (2014, p. 7). Como a maioria dos jogadores era operária, e as equipes eram patrocinados pelas carboníferas, criava-se uma relação paternalista e disciplinar entre alguns jogadores com seus respectivos patrões. Os jogadores eram selecionados entre os operários considerados “de bom comportamento”.

Entretanto, esses jogadores-operários eram os mesmos que participavam intensamente do movimento sindical em Criciúma. As greves em busca de melhores condições de trabalho e de remuneração eram constantes e o sindicato dos mineiros era local de intensas discussões e articulações grevistas. Nesse sentido, os operários que lutavam contra os patrões por melhores condições de vida eram os mesmos, que entravam em campo defendendo a camisa de um time que, geralmente, era patrocinado pelo proprietário da mineradora. Portanto, esse contexto evidencia um panorama de contradição, em que a luta de classe e a paixão pelo time da vila operária vão se fundir e estabelecer um novo panorama na cidade.

Em Criciúma, entre 1939 e 1947, foram criados seis clubes de futebol: Esporte Clube Metropol, Esporte Clube Próspera, Comerciário Futebol Clube, Ouro Preto Futebol Clube, Atlético Operário Futebol Clube e São Paulo Futebol Clube (Monteiro, 2014, p. 7). Um dos times de Criciúma de maior destaque no cenário estadual e nacional foi o Esporte Clube Metropol, da Carbonífera Metropolitana, fundado em 1945, que passou por um processo de profissionalização na década de 1960, com forte investimento dos empresários da Metropolitana com objetivo de aproximação dos empregados com patrões, tendo conquistado os títulos estaduais em 1960, 1961 e 1962, e sido campeão do torneio sul brasileiro de futebol em 1964 e 1968 (Rosa, 2003, p. 74).

Na região carbonífera do Rio Grande do Sul, as equipes criadas foram, conforme pesquisa de Freitas:

  1. Arroio dos Ratos: Esporte Clube Brasil (1918), Sport Club Guarani (1926), Departamento Desportivo do CADEM (1938) e Grêmio Esportivo Estrela (1944).

  2. Butiá: Butiá Futebol Clube (1926) e Brasil Futebol Clube (1942).

  3. Charqueadas: Grêmio Atlético Jeromina (1931).

  4. Minas do Leão: Atlético Mineiro (1950) e Olaria Futebol Clube (1956).

  5. Porto do Conde: Conde Futebol Clube (1937).

  6. São Jerônimo: Grêmio Esportivo São Jerônimo (1935) e Grêmio Esportivo Rio-grandense (1938). (Freitas, 2017, p. 139).

Marta Cioccari em seus estudos sobre o futebol nas minas do Rio Grande do Sul também destaca que:

Nas décadas de 1920 e 1930, em boa parte dos distritos vizinhos, todos pertencentes ao município de São Jerônimo, já havia equipes de futebol varziano: o Butiá Futebol Clube havia sido fundado em 1926, com o incentivo do engenheiro-chefe da empresa privada Consórcio Administrador de Empresas de Mineração (Cadem), que havia estimulado também o surgimento do Grêmio Atlético Jeromina, no então distrito de Charqueadas, em 1931. Na sede do município de São Jerônimo, haviam sido criados o Grêmio Esportivo São Jerônimo, em 1935, e o Grêmio Esportivo Riograndense, em 1938, este último utilizando um campo que fora doado pela Câmara de Vereadores. Em outra localidade, Porto do Conde, surgira, em 1937, o Conde Futebol Clube. Na década de 1940, outros times de futebol foram criados no então distrito de Arroio dos Ratos, como as equipes Brasil, Guarani e Estrela. No auge da mineração na região, nos anos 1960, havia em São Jerônimo nove equipes amadoras, inscritas na Federação Gaúcha de Futebol, sem contar uma pluralidade de times varzianos, cujo funcionamento e a duração eram mais irregulares. (Cioccari, 2010, p. 85-86).

Conforme a autora uma diversidade de poderes permeava a vida cotidiana local demarcando diferentes espaços geográficos e sociais, ocasionando oposições entre bairros, vilas operárias, núcleos urbanos constituídos por diferentes minas que se rivalizavam e provocavam disputas, sendo as mais expressivas aquelas que envolviam futebol (Cioccari, 2015).

As pesquisas indicam que o futebol era uma atividade que gerava contradições entre os times, seus jogadores, público e patrões: se, por um lado, servia para controlar o tempo “ocioso” dos operários e premiar aqueles que mantinham uma disciplina ao agrado dos patrões, fortalecendo a disciplina operária, por outro lado, criava laços de solidariedade entre os times operários quando jogavam contra o time das elites.

Dessa forma, o futebol se tornou para os operários mais um espaço de socialização e de experiência, que servia também como ponto de encontro para se falar de política. Exemplo disso foi que, em outubro de 1957, em Criciúma, quando ocorreram as eleições para a diretoria da Federação Interestadual dos Mineiros de Carvão da Região Sul, um dos locais de votação era a “mesa-sede do Atlético Operário F.C., onde votavam os operários da Companhia Brasileira Carbonífera de Araranguá” (Sindicato, 1957).

Em relação a São Jerônimo, a tese de Freitas aprofundou a análise sobre a atuação dos operários nos clubes de futebol da região. Segundo a autora, “os clubes de futebol também podem ser observados como uma forma de expressão institucional das relações ocorridas no interior da produção, relação dialética marcada por processos de dominação e resistência” (Freitas, 2021, p. 189).

Consoante a isso, fazia parte do repertório dos trabalhadores do carvão, além das estratégias individuais de resistência, de sua experiência e do seu horizonte de expectativas, a greve. Michelle Perrot definiu que as greves eram “simultaneamente, um meio de pressão para obter algo ou para se defender, e um modo de expressão”. Essa expressão era “de um grupo mais ou menos comunitário que, seguidamente, pela greve se tornava mais comunitário (às vezes também era a ocasião de cisões, de clivagens, de divisões)” (1996, p. 195). A historiadora ressaltou que os movimentos grevistas dos mineiros foram analisados como os mais violentos e duradouros da história. Desse modo, todos os elementos analisados neste artigo apontam para as condições de vida, trabalho e cultura das comunidades mineiras no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina.

Considerações Finais

Ao longo deste artigo, empreendemos uma análise comparada das vilas operárias localizadas nas regiões carboníferas de São Jerônimo, no Rio Grande do Sul, e Criciúma, em Santa Catarina, durante o período de 1945 a 1964. Essas comunidades mineiras desempenharam um papel crucial na produção de carvão no Brasil e concentravam um considerável contingente de trabalhadores, tornando-se um ponto focal de interesse para o estudo das dinâmicas do mundo do trabalho nesse contexto histórico.

Por meio da metodologia da História Comparada, exploramos as similaridades e diferenças fundamentais entre as duas regiões, visando uma compreensão mais profunda dos fenômenos históricos e das implicações que as vilas operárias tiveram na vida dos trabalhadores e suas famílias. A abordagem comparativa permitiu-nos expandir o escopo de nossa investigação e enriquecer nossas análises ao estabelecer um duplo campo de observação, possibilitando um olhar mais abrangente e contextualizado sobre o período estudado.

As vilas operárias surgiram como uma resposta das empresas carboníferas à necessidade de alojar os trabalhadores e suas famílias próximas às minas de carvão. Elas eram projetadas para abrigar e regular a vida dos operários fora do ambiente fabril, representando uma estratégia de controle social empregada pela indústria carbonífera. Além das moradias, eram construídos estabelecimentos como armazéns, igrejas, escolas, farmácias e hospitais, além de clubes esportivos, que também serviam como forma de propaganda para atrair trabalhadores de outras regiões, especialmente no período de expansão impulsionado pela Segunda Guerra Mundial.

Através da análise comparada, foi possível identificar que, apesar das diferenças específicas entre as duas regiões, ambas compartilhavam desafios e características comuns decorrentes da exploração do trabalho nas minas de carvão. Questões como as condições de trabalho, as relações de poder e as formas de resistência ganharam maior clareza ao serem abordadas sob a lente da História Comparada.

A metodologia adotada também nos permitiu compreender que, embora as vilas operárias fossem uma resposta ao controle social exercido pela indústria, elas também se tornaram espaços de sociabilidade e solidariedade entre os trabalhadores e suas famílias. Nessas comunidades, foram forjados laços de vizinhança e cooperação, criando uma identidade operária que transcendia o mero espaço de trabalho e moldava uma cultura própria.

Contudo, é essencial reconhecer os desafios e limitações enfrentados pela perspectiva comparada. É preciso evitar simplificações excessivas e generalizações arbitrárias, pois cada contexto possui suas particularidades históricas e culturais que devem ser respeitadas e compreendidas em sua especificidade.

A história comparada, quando aplicada de forma cuidadosa e crítica, é uma ferramenta valiosa para aprofundar nossa compreensão do passado e da complexidade das experiências humanas. Por meio dessa abordagem, podemos destacar conexões e interações entre diferentes sociedades, ampliando nossa visão e fornecendo novas visões para a narrativa histórica.

Ao fim desta análise, ressalta-se a importância de uma abordagem complexa e reflexiva ao estudar os mundos do trabalho, especialmente no contexto das vilas operárias nas regiões carboníferas do Sul do Brasil. Ao compreendermos a história dos trabalhadores e suas lutas, não apenas como uma sequência linear de eventos, mas como um intricado mosaico de experiências entrelaçadas, podemos captar de forma mais abrangente a riqueza e a diversidade da trajetória humana no mundo do trabalho.

Nesse sentido, a História Comparada representa uma poderosa ferramenta metodológica para historiadores, permitindo-nos transcender fronteiras tradicionais e revelar novas perspectivas para a investigação sobre o passado. Ao revisitar e reinterpretar a história das vilas operárias, lançamos luz sobre as vivências das famílias que habitaram esses espaços, contribuindo assim para uma visão mais abrangente da história social e econômica dessas regiões.

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  • 1
    Como exemplo dessa perspectiva de análise, cf. CARDOSO, Fernando Henrique; FALETTO, Enzo. Dependência e desenvolvimento na América Latina: ensaio de interpretação sociológica. 7. ed. Rio de Janeiro: Guanabara, 1986; JAGUARIBE, Helio et al. La dependencia político-económica de América Latina. México: Siglo XXI, 1970.
  • 2
    Esse sistema de descontos dos salários ficou conhecido como sistema de “barracão”, ou truck system, muito comum no Brasil durante o século XX em várias regiões e formas de ocupação e de trabalho, sendo utilizado para a criação de uma dependência do empregado ao patrão, de forma a tentar manter o controle e a superexploração sobre a força de trabalho.
  • 3
    No início de 1936, a diretoria da “Companhia Estrada de Ferro e Minas de São Jerônimo” promoveu a sua reestruturação, buscando a fusão com outra empresa do ramo, a “Companhia Carbonífera Rio-Grandense”, com a qual firmou um acordo de formação de um consórcio de empresas em 23 de junho de 1936, sob o nome “Consórcio Administrador de Empresas de Mineração - CADEM”. O consórcio era composto por quatro sócios: Paes Leme e Otávio Reis, por intermédio da “Companhia Estrada de Ferro e Minas de São Jerônimo”, e Roberto Cardoso e o Grupo Martineli, por intermédio da “Companhia Carbonífera Rio-Grandense”. Nesse consórcio, a direção coube ao Dr. Roberto Cardoso, e a participação das responsabilidades legais, bem como os dividendos obtidos, estariam em conformidade com o capital de cada empresa, ou seja, 20 milhões e 10 milhões, respectivamente. A partir de então, o diretor-presidente passou a imprimir ao consórcio a sua forma de administração (Silva, 2007, p. 158-159).
  • 4
    As memórias foram reproduzidas do livro Navegar é preciso: memórias de um operário comunista (1984), escritas pelo próprio trabalhador.
  • 5
    Em 1932 Roberto Cardoso era diretor da companhia do grupo Martineli, que atuava nas minas de Leão. Foi nomeado diretor da Companhia Carbonífera Riograndense que atuava em Butiá e era o segundo distrito em importância da mineração depois de Arroio dos Ratos. Em sua gestão impulsionou o acirramento de um modelo de administração que manteve o direcionamento de suas atividades na busca pela ampliação e diversificação de investimentos. Buscou ainda parecerias com órgãos governamentais e os principais dirigentes do país: “Roberto Cardoso é o símbolo e o marco da consolidação de um modelo modernizante e racional de extração de minério na região do Rio Grande do Sul” (Klovan, 2014, p. 57).
  • 6
    Henrique Laje iniciou a vida de empresário em 1918, quando substituiu o pai na direção de sua companhia de navegação. Expandiu os negócios investindo na construção naval, instalando estaleiros na ilha do Viana, na baía de Guanabara, e sendo ainda, nos primeiros anos da década de 1920, um precursor da extração do carvão mineral em Santa Catarina. Criou também a Companhia Nacional de Navegação Aérea, responsável pela produção de equipamentos aeronáuticos e a primeira fábrica de aviões no Brasil. No sul de Santa Catarina estruturou a indústria carbonífera com a criação de Companhias de Mineração, Companhia Nacional de Mineração de Barro Branco, Companhia Carbonífera Brasileira de Araranguá, e mais a estruturação do sistema portuário e ferroviãrio que hoje respondem as necessidades da Industria Siderurgica. Foi o principal idealizador do Porto de Imbituba, o segundo maior porto do estado de Santa Catarina. Fundou a Companhia Docas de Imbituba em 1922. Na cidade, além do porto, montou uma cerâmica e uma granja para produção de louça e hortifrutigranjeiros, para sua companhia de navegação (Bossle, 1981).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    23 Set 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    07 Set 2023
  • Aceito
    03 Mar 2024
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