Open-access Instrumento sobre a formação em saúde LGBTI+ de estudantes de Enfermagem, Medicina e Odontologia

An instrument for assessing training in LGBTI+ health among nursing, medical and dental students

Instrumento sobre la formación en salud LGBTI+ de estudiantes de Enfermería, Medicina y Odontología

Resumos

A sexualidade humana é um tema complexo, sendo acompanhado também por fatores biológicos, psicológicos e, sobretudo, sociais. O artigo objetiva apresentar a construção de um instrumento para a avaliação do conhecimento clínico sobre saúde LGBTI+ entre estudantes de Enfermagem, Medicina e Odontologia. A partir de revisão de literatura, foi desenvolvido um questionário com 76 itens, que passou pelas seguintes etapas: (1) análise de linguagem e adequação de conteúdo por meio de seis grupos focais com 21 estudantes heterossexuais e vinte LGBTI+ dos três cursos; e (2) Técnica Delphi, com 16 experts em educação superior nas três formações; e em gênero e diversidade sexual. Os dados do processo apontam que o instrumento, em sua versão final de quarenta itens, está adequado para a avaliação da formação dos estudantes para a assistência à saúde de pessoas LGBTI+.

Palavras-chave Minorias sexuais e de gênero; Formação profissional em Saúde; Avaliação de recursos humanos em Saúde; Instrumento; Ensino superior


Human sexuality is a complex element of human life, involving biological, psychological and, above all, social factors. This article outlines the development of an instrument designed to assess clinical knowledge of LGBTI+ health among nursing, medical and dental students. Based on a literature review, we developed a 76-item questionnaire in the following stages: (1) language analysis and adaptation of content through six focus groups involving 21 heterosexual students and 20 LGBTI+ students from the three courses; (2) use of the Delphi technique with 16 experts in higher education in the three areas and in gender and sexual diversity. The findings show that the final 40-item version of the instrument is suitable for assessing training in health care for LGBTI+ people among students.

Keywords Sexual and gender minorities; Professional health training; Assessment of human resources for health; Instrument; Higher education


La sexualidad humana es un aspecto complejo de la vida humana, con factores biológicos, psicológicos y, sobre todo, sociales. El objetivo del artículo es presentar la construcción de un instrumento para la evaluación del conocimiento clínico sobre salud LGBTI+ entre estudiantes de enfermería, medicina y odontología. A partir de la revisión de la literatura se desarrolló un cuestionario con 76 ítems que pasó por las etapas siguientes: (1) análisis de lenguaje y adecuación de contenido por medio de seis Grupos Focales con 21 estudiantes heterosexuales y veinte LGBTI+ de los tres cursos; (2) Técnica Delphi con 16 expertos en educación superior en las tres graduaciones y en género y diversidad sexual. Los datos del proceso señalan que el instrumento, en su versión final de cuarenta ítems, se encuentra adecuado para la evaluación de la formación de los estudiantes para la asistencia a la salud de personas LGBTI+.

Palabras clave Minorías sexuales y de género; Formación profesional en salud; Evaluación de recursos humanos en salud; Instrumento; Enseñanza superior


Introdução

Gênero e sexualidade, assim como questões econômicas e raciais, constituem parte dos determinantes sociais da saúde. Trata-se de dimensões complexas da vida, com implicações diretas tanto na experiência individual quanto nas relações sociais dos seres humanos. Cada pessoa tem inúmeras formas de vivenciar e expressar sua sexualidade e identidade de gênero; dentro dessas formas, estão as relações afetivas e sexuais, como o indivíduo se enxerga e como é visto pela sociedade1. Justamente por esse caráter que se refere às relações entre as pessoas e seu entorno social, gênero e sexualidade constituem-se em uma dimensão fundamental da saúde e, como tal, está na origem das intensas discussões contemporâneas sobre os desafios para que os serviços de saúde alcancem melhores condições de saúde e existência para pessoas lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais, intersexo e outras identidades de gênero e orientações sexuais (LGBTI+), bem como o reconhecimento e a garantia dos direitos humanos em sua plenitude para todas as pessoas2.

Garantir saúde para as pessoas LGBTI+ é um desdobramento da Constituição Federal de 1988, que condena condutas preconceituosas e discriminatórias – incompatíveis com qualquer Estado Democrático de Direito, em consonância com a Declaração dos Direitos Humanos – ao assumir em seu primeiro artigo que todos os seres humanos devem ter liberdade e serem iguais em termos de dignidade e direitos. Nesse panorama, avanços significativos foram conquistados no Brasil, especialmente pelo engajamento dos movimentos sociais, mas ainda há grandes barreiras no acesso aos serviços de saúde entre pessoas que não vivem dentro dos padrões da heteronormatividade, o que constitui em um entrave para a assistência à saúde em conformidade com suas necessidades2,3.

A Política Nacional de Saúde Integral LGBT (PNSILGBT)4 é uma das mais importantes expressões, tanto da conquista quanto dos desafios, para que a promoção da saúde integral dessa população e a eliminação da discriminação e do preconceito institucional estejam dentro do objetivo geral da política, na intenção de garantir um Sistema Único de Saúde (SUS) universal, integral e equitativo.

A qualificação dos profissionais de saúde é uma das estratégias importantes defendidas na política, especialmente no eixo ‘’Educação permanente e educação popular em saúde com foco na população LGBT”, que aponta a necessidade de ações que visem à qualificação do profissional atuante no SUS na temática de diversidade sexual e de gênero, como a inserção da pauta nos processos de Educação Permanente; e a produção de materiais educativos com foco na promoção, proteção e recuperação de pessoas LGBTI+4.

Os debates sobre diversidade sexual e de gênero mencionados na PNSILGBT são recentes dentro da formação em Saúde no território brasileiro quando comparados à existência de cursos de nível superior no país. A formação de profissionais de Saúde no Brasil iniciou-se em 1808, com a criação da primeira escola de Medicina e as primeiras regulamentações para atividades exercidas por cirurgiões. Nessa época, a população sofria principalmente com doenças infectocontagiosas e as ações em saúde eram voltadas à erradicação desses males5.

A Odontologia como curso superior foi formalizada no ano de 1884, com a publicação do Decreto n. 9.311/1884, que criou o curso de Odontologia nas faculdades do Rio de Janeiro e da Bahia, funcionando como um anexo da faculdade de Medicina6.

Poucos anos depois, foi implantada a primeira escola de Enfermagem, mais precisamente, no ano de 1890, com a adoção de um currículo voltado desde os cuidados de propedêutica até os de administração de enfermarias7,8. É importante citar que nesse primeiro momento só poderiam ingressar na escola mulheres de cor branca7.

No decorrer do século XX, as profissões de Saúde passaram por uma série de modificações curriculares e regulamentações do exercício profissional. As décadas de 1960 e 1970 foram marcadas pelo aumento da oferta de cursos de ensino superior de todas as áreas, assim como um incremento de vagas nos cursos já existentes. Só para o curso de Medicina foram criadas 33 novas escolas subsidiadas pelo governo. Nesse período, os países da América Latina estavam sendo incentivados pela Organização Mundial da Saúde para fomentar a formação de recursos humanos para a área desde o nível elementar até o superior3.

Contudo, foi a partir da Constituição Federal de 1988 que vieram as principais mudanças do setor saúde, não apenas no âmbito profissional, mas também na saúde pública de todo o país. A Constituição de 1988, entre outras ações, institui que a saúde é um direito social de todos, cria o SUS e estabelece a organização da formação dos recursos humanos para o setor saúde. A Lei n. 8.080 de 1990, no artigo 27, item I, dispôs que o SUS é responsável pela formação de todo recurso humano em Saúde, em todos os níveis de educação9.

No decorrer da implantação e expansão do SUS, houve tentativas de organizar a formação de profissionais de saúde para atuarem nesse sistema10. Entretanto, foi a partir dos anos 2000 que foram instituídas as Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) para criação de novos cursos na área da Saúde.

Nesse sentido, a formação de nível superior no Brasil segue as DCN. Por meio do perfil esperado para cada profissão, as DCN norteiam como se dará a estrutura curricular, diz quais conteúdos são indispensáveis para prática profissional e uniformiza o currículo no nível nacional. Nos cursos de graduação de Medicina e Odontologia, existe menção à diversidade sexual e de gênero. Pressupõe-se que o profissional tanto médico quanto odontólogo, dentro das suas competências do exercício profissional, devem considerar as dimensões de diversidade de gênero e orientação sexual na prática profissional. No entanto, alguns estudos apontam para deficiência na formação desses profissionais no que tange à saúde LGBTI+. Um estudo realizado no sul do Brasil com estudantes da fase final do curso de Medicina revelou que a maioria dos entrevistados apresentou preconceito contra a diversidade sexual e de gênero, sendo os transsexuais os mais prejudicados por essa conduta desumana11.

Moretti-Pires11 aponta o currículo médico formal como um dos fomentadores da discriminação de pessoas LGBTI+ entre os estudantes e afirma que os currículos médicos são “[...] propulsores e mantenedores de preconceito, além da total ausência de conteúdo curricular relacionado à temática de saúde LGBT”11 (p. 576). Diante disso, é imprescindível que as instituições formadoras de profissionais sejam submetidas a processos avaliativos para que haja mudanças nas práticas discriminatórias dos futuros profissionais de saúde.

Um estudo no Reino Unido sobre a saúde LGBTI+ dentro das instituições médicas com líderes de curso concluiu que existe significativa variação na quantidade e abrangência da temática dentro dos currículos das instituições médicas. Os autores de tal pesquisa recomendam tanto a qualidade quanto a quantidade de conteúdo LGBTI+, com foco nas boas práticas de saúde, aumentem12. Outro estudo no Reino Unido, dessa vez com estudantes de Medicina, aponta para a falta de segurança por parte dos estudantes na assistência a pacientes LGBTI+ e o desconhecimento dos problemas específicos dessa população13. O aumento de conteúdo sobre saúde de pacientes LGBTI+ para profissionais de Saúde demostra ganhos significativos na assistência a essa população. Um estudo avaliativo realizado nos Estados Unidos trouxe que sessões didáticas sobre como cuidar de pacientes LGBTI+ com estudantes e residentes de Medicina resultam em maior preparado clínico para lidar com as especificidades dos pacientes14.

Estudos de avaliação sobre saúde de pessoas LGBTI+ dentro do ensino superior são comuns internacionalmente, mas, em território brasileiro, não. Diante disso, o presente trabalho teve como objetivo a construção de um instrumento de avalição de conhecimento clínico de estudantes de Enfermagem, Medicina e Odontologia sobre saúde de LGBTI+.

Metodologia

A seleção dos cursos de Enfermagem, Medicina e Odontologia para a pesquisa justifica-se por incluir as três categorias profissionais de nível superior preconizadas para o trabalho na Atenção Primária, conforme a Política Nacional de Atenção Básica do Brasil.

A imagem a seguir ilustra o processo de construção do instrumento e suas etapas.

Figura 1
Fluxograma do processo de construção do instrumento.

Inicialmente, foi realizada ampla revisão da literatura científica internacional na busca por artigos e outras publicações que versassem sobre a formação médica, odontológica e em enfermagem em termos do atendimento clínico as pessoas LGBTI+, não se tratando de revisão sistemática. A pretensão é instrumentalizar o projeto em termos tanto quantitativos quanto qualitativos no que existia de acumulado científico na temática. Como referencial teórico, a pesquisa apoiou-se na literatura sobre formação médica, odontológica e em enfermagem que analisou a temática central do presente artigo3,6-8,11-14. Foram feitas reuniões por três meses, em que os integrantes da equipe da pesquisa discutiram profundamente todos os artigos, produzindo sínteses dos elementos-chave referentes à formação profissional e assistência à saúde de pessoas LGBTI+, identificando tanto os avanços quanto as barreiras para a inclusão do tema nos currículos dos cursos de Saúde. A equipe contou com dois professores universitários, seis pós-graduandos e quatro graduandos do curso de Medicina, Odontologia e Enfermagem.

Com base nessa etapa preliminar, construiu-se a proposta com 76 itens, dividida em três blocos: I – Gênero e sexualidade no atendimento clínico; II – Gênero e sexualidade na relação de alunos e professores durante a graduação; e III – Gênero e sexualidade no conhecimento de alunos. As questões dos blocos I e II foram elaboradas especialmente a partir de produções científicas da área de educação médica e educação em enfermagem, com base nos desafios e nas características curriculares que impactam no atendimento a pessoas LGBTI+, conforme a literatura internacional. Já o bloco III baseou-se na literatura sobre saúde de pacientes LGBTI+ com enfoque clínico; e em documentos oficiais do Ministério da Saúde do Brasil e de órgãos e iniciativas internacionais sobre esses aspectos. Optou-se pela diversidade das pessoas que compõem a sigla LGBTI+ na composição do conteúdo, pois se sabe que, dentro das minorias sexuais e de gênero, também existem desigualdades quanto à visibilidade de alguns grupos. Para as respostas às questões, optou-se pela escala tipo Likert, com cinco pontos de mensuração (de “discordo totalmente” até “concordo totalmente”). Foi aplicado um questionário-piloto com dois profissionais que cursavam mestrado ou doutorado em cada uma das áreas de formação que estão no escopo do instrumento.

A avaliação do instrumento ocorreu na realização de seis grupos focais (GF) com estudantes de enfermagem, medicina e odontologia. Para cada formação, houve um grupo focal para estudantes abertamente LGBTI+ e outro para estudantes heterossexuais. Os convites aos alunos para participação na pesquisa foram feitos tendo em vista a técnica snowball (“bola de neve”). Entre os critérios de seleção dos participantes da pesquisa estão: I) ser estudante de Enfermagem, Medicina ou Odontologia; e II) Estar no último ano da graduação durante a realização dos grupos focais. Optou-se para que cada grupo tivesse no mínimo uma pessoa do sexo feminino e no mínimo um do masculino por GF. Todos os aspectos éticos foram garantidos, conforme projeto geral do projeto, aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da universidade, sob CAAE n. 39242920.1.0000.0121. Os GF foram exclusivamente focados na avaliação do instrumento e na adequação ou não de seu conteúdo frente à formação desses cursos de graduação.

Todos os participantes receberam previamente o instrumento e o responderam, antes dos GF, conscientes da necessidade de avaliação dele. O instrumento apresentava uma folha com explicações sobre conceitos-chave – tais como sexualidade, orientação sexual, gênero, entre outros – e instruções para preenchimento do questionário, incluindo o uso da escala Likert nas respostas. Essa folha fazia parte do material enviado a todos os participantes e deverá ser utilizada na aplicação do instrumento, futuramente.

Os GF foram realizados de maneira remota, utilizando uma plataforma específica da universidade para aulas e atividades didáticas virtuais, uma vez que se atravessava o período de pandemia de Covid-19. A composição de cada grupo foi a seguinte: GF Medicina Heterossexuais – seis participantes; GF Medicina LGBTI+ – sete participantes; GF Odontologia Heterossexuais – sete participantes; GF Odontologia LGBTI+ – sete participantes; GF Enfermagem Heterossexuais – oito participantes; GF Enfermagem LGBTI+ – seis participantes. Cada GF foi agendado previamente com todos os convidados. Não se registrou ausência de nenhuma pessoa convidada, não havendo, portanto, a necessidade de reagendamento de qualquer um dos GF.

A partir das perguntas disparadoras sobre linguagem, conteúdo e tamanho do instrumento, foi solicitado que os sujeitos da pesquisa discorressem sobre suas percepções na leitura do instrumento anterior à realização do GF. Também houve um espaço para que colocassem suas sugestões sobre as questões. O questionário foi encaminhado via e-mail aos estudantes com as orientações gerais sobre os GF e o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido digital com antecedência. Ao início de cada encontro, o moderador pactuava a operacionalização do GF e seguia um roteiro estabelecido. Um segundo integrante da equipe participava do apoio técnico para suporte tecnológico. Todos os membros da equipe de pesquisa foram previamente treinados na condução de GF, nos dois papéis. No entanto, o mesmo moderador (autor principal do presente artigo) e o mesmo suporte (um dos acadêmicos participantes da equipe) conduziram essa etapa da pesquisa. Dentro da condução dos encontros, foi acordado com os participantes o tempo de duração desses encontros; a pertinência da opinião de todos os envolvidos; que, caso houvesse divergências de opinião, estas deveriam ser sinalizadas; e que a falta de oposição após as falas era sinal de que o grupo concordava com o exposto. Os GF foram gravados com recursos de áudio e vídeo e transcritos para posterior análise.

Em se tratando de GF para a avaliação do instrumento original, cabe ressaltar que não se realizou análise do conteúdo produzido a partir de marcos teóricos, como em estudos que empregam essa metodologia como forma de investigação empírica. Durante a condução dos GF, foram provocadas discussões sobre a linguagem empregada pelos participantes (acadêmicos dos três cursos) e sobre a pertinência dos conteúdos para a futura prática clínica, com base nas evidências levantadas a esse respeito na literatura científica. Com o conhecimento prévio do instrumento proposto, cada GF discutiu esses dois aspectos, com abertura para que expusessem em que medida a formação garantia ou não a base para a ação frente às demandas específicas apresentadas da população-foco, assim como a relevância frente ao que os estudantes encontravam nos campos de estágio e vivências clínicas ao longo do curso de graduação. Os resultados transcritos foram então categorizados, buscando a valoração entre a adequação ou não do instrumento, em termos tanto de linguagem quanto de conteúdo.

Na terceira e última fase, o instrumento passou pela avaliação de pesquisadores da área, por meio do Método Delphi, importante e reconhecida técnica de desenvolvimento de instrumentos de pesquisa que permite a um grupo de especialistas trabalhar em cima de um problema e, por meio do consenso, levar a resultados densos sobre temáticas abrangentes e complexas15. Nesse sentido, foi dividida em três etapas, sendo elas: Seleção dos especialistas e envio do instrumento; Reenvio do instrumento; e Oficina de consenso. O critério para convite de participação da Técnica Delphi era ser especialista na área com titulação mínima de mestre. Foram convidados quatro pesquisadores de Enfermagem, quatro de Medicina, quatro de Odontologia e quatro em gênero e diversidade e sexual, todos da área de Saúde Coletiva. Houve duas rodadas assíncronas e individuais, nas quais 16 experts avaliaram o instrumento, sendo que era necessário que o consenso das questões entre os especialistas atingisse 70% ou mais, seja pela manutenção no formato inicial, pela modificação ou pela exclusão do item, seguindo Goulart16. Não houve desistência de nenhum especialista nessas duas rodadas. Entre as 22 questões que ficaram abaixo da aprovação necessária, 22 foram encaminhadas para a segunda rodada da Técnica Delphi, que contou com a análise de 22 questões, nas quais 15 foram consensuadas e sete não obtiveram o percentual mínimo para aprovação. Caso não houvesse consenso no retorno dos especialistas sobre todas as questões desta etapa, foi definido que seria realizada a oficina de consenso.

Na tabela a seguir, apresentamos os dados sobre o consenso (mantendo ou excluindo questões) ou não das rodadas, com as porcentagens de consenso atingidas entre os especialistas.

Tabela 1
Quantitativo de questões após as duas etapas da Técnica Delphi

Na terceira e última etapa, foi realizada a oficina de consenso síncrona com os especialistas que participaram das duas etapas iniciais para definição das perguntas que não obtiveram aprovação mínima após as duas etapas iniciais de 70% de aprovação. As sugestões de modificação, inclusão e exclusão consensuadas nas duas etapas anteriores foram apresentadas aos participantes. Nesse caso, a maioria simples (50% ou mais) definiu o texto final das questões até então não consensuadas das duas primeiras etapas da Técnica Delphi. Também foi definida a exclusão de perguntas de menor importância para temática como valoração dos blocos de questões. A oficina de consenso foi realizada em três momentos. O primeiro momento, referente à duplicidade nos blocos e no qual era necessário analisar se existiam questões próximas em conteúdo, tinha por finalidade diminuir o tamanho do questionário. Já o segundo momento da oficina consistiu na exclusão de conteúdo, sendo que os especialistas deveriam manter equilíbrio quantitativo entre os blocos, ou seja, excluir questões até os blocos atingirem tamanhos próximos. O critério adotado para essa exclusão foi a pertinência para as três áreas de formação; assim, priorizou-se manter as questões mais relacionadas à atuação profissional da Enfermagem, Medicina e Odontologia. Na medida em que as três dimensões se referem ao constructo como um todo, houve a necessidade de discutir os termos da valoração final dos blocos de questões, sendo que os especialistas deveriam definir o peso de cada um, conforme a importância para o conhecimento clínico dos egressos de Enfermagem, Medicina e Odontologia para atenção à saúde de pacientes LGBTI+. Foi consenso que cada bloco tem o mesmo peso dos demais frente ao constructo.

Resultados

A avaliação dos seis GF foi unânime quanto à linguagem acessível e ao tempo adequado para resposta do instrumento proposto originalmente. No que se refere ao conteúdo do instrumento, houve alteração conforme o proposto pelos estudantes. Os resultados da avaliação dessa etapa estão sintetizados no quadro 1.

Quadro 1
Análise dos grupos focais realizados com os estudantes dos cursos de Enfermagem, Medicina e Odontologia

Os aspectos do atendimento clínico às pessoas LGBTI+ registrados nos itens dos três eixos do instrumento, construídos conforme a revisão de literatura sobre a assistência a essa população, foram considerados pertinentes pelos GF. Registra-se o esforço de contemplar aspectos pertinentes da temática de diversidade sexual e de gênero com base em documentos oficiais, artigos científicos e leitura de grupos focais para elaboração dos itens. No entanto, não se esgotam aqui as inúmeras abordagens possíveis dentro da imensidão da temática e da possibilidade de muitos aspectos ainda não terem atingido a visibilidade em publicações científicas, a despeito das pesquisas e iniciativas nos serviços de saúde frente à temática. A realização dos GF foi um momento crucial, no entendimento dos pesquisadores, para o desenvolvimento da pesquisa, na medida em que permitiu que um grupo de estudantes, com características semelhantes aos futuros respondentes, opinasse sobre a adequação da proposta, em termos tanto de linguagem quanto de conteúdo.

A versão do instrumento encaminhada aos especialistas contou com 76 questões, das quais 54 foram consensuadas já na primeira rodada por atingirem 70% dos experts, seja na manutenção, seja na exclusão de cada um dos itens. Ao final do processo, foram preservados os três eixos originais, seja na avaliação dos estudantes, seja na dos experts. Das questões iniciais, permaneceram quarenta no instrumento final, com a seguinte dinâmica de resultados:

Eixo I – Gênero e sexualidade no atendimento clínico: os seis itens iniciais propostos foram ampliados para 13 a partir do desmembramento de conteúdos.

Eixo II – Gênero e sexualidade na relação de alunos e professores: os 19 itens propostos tiveram a exclusão de cinco, permanecendo 14.

Eixo III – Gênero e sexualidade no conhecimento de alunos: dos 51 itens propostos, permaneceram 13 após as exclusões de 38 itens.

Quadro 2
Versão final do instrumento de avaliação de conhecimento clínico sobre saúde de pessoas LGBTI+

A partir das etapas da pesquisa, houve modificação de 44% do conteúdo total do questionário. Cabe ressaltar que não houve modificações significativas quanto ao conteúdo dos itens, mas sim quanto a suas formas escritas.

Na fase final da Técnica Delphi, a consonância dos pesquisadores da Enfermagem, Odontologia e Medicina com a perspectiva daqueles que foram convidados por trabalharem com diversidade sexual e gênero em Saúde Coletiva foi importante; e trouxe pluralidade nas abordagens e, consequentemente, riqueza no potencial do instrumento no sentido clínico, o que enfatiza a necessidade de readequação das políticas públicas de saúde brasileiras.

Discussão

Na medida em que o presente instrumento se dedica à investigação sobre a formação de profissionais de saúde para a assistência a minorias, é interessante os apontamentos de Goulart16 na construção de instrumento e validação de instrumento para avaliar aspectos da saúde e da atenção de gestantes privadas de liberdade no sistema prisional. A autora afirma a importância de instrumentos de avalição destinados às gestantes privadas de liberdade na medida em que se trata de uma população pouco investigada na literatura, mas cujos desafios para a constituição da saúde como direito cidadão se refere a um nó, seja nos serviços, seja na academia, seja na formação de profissionais de Saúde.

A necessidade de instrumentos como o que desenvolvemos é premente. Especificamente falando de avaliação sobre a saúde da população LGBTI+, da insuficiência da formação e do preconceito entre estudantes de Medicina em uma universidade no sul do Brasil, Moretti-Pires et al.11 apontam que mais da metade dos estudantes de Medicina têm atitudes discriminatórias com pessoas deste grupo. O trabalho de Silva et. al.17 corrobora essa perspectiva ao mostrar que as representações sociais por parte de profissionais de um município brasileiro sobre a população LGBTI+ são atreladas a concepções morais, comportamentos sexuais e características pessoais, distantes de uma concepção inclusiva e que vá em direção à promoção de saúde dessa população.

As concepções morais dos profissionais de Saúde têm efeito nas diferentes exclusões das pessoas LGBTI+ do currículo formal das instituições. King et al.18, ao analisarem a presença da temática LGBTI+ nos materiais didáticos de Enfermagem, identificaram que essa população ou é invisibilizada ou, quando aparece, vai de encontro aos princípios éticos da profissão.

A inclusão de conteúdo LGBTI+ na formação dos profissionais pode variar conforme nacionalidade da instituição, o que também afeta diretamente a formação pela cultura, uma vez que ainda existem países do mundo em que a homossexualidade tem a pena de morte prevista na legislação. No entanto, conforme todas as diretrizes de direitos humanos vigentes, esse fato não isenta os profissionais e educadores da Saúde de atuarem na saúde das pessoas LGBTI+, inclusive podendo gerar mudanças para maior inclusão dessa população na assistência19.

Estudo realizado nos Estados Unidos por Feng et al.20, com o objetivo de conhecer as percepções e conhecimentos dos alunos de Odontologia em relação às necessidades de pessoas LGBTI+, concluiu haver insuficiência para esses aspectos da formação dentro das instituições de ensino superior20. Ploumen e Livas21, ao investigarem os serviços e instalações de Odontologia destinadas a pacientes LGBTI+ na Holanda, apontaram que os estudantes de graduação desconhecem tais recursos, chamando a atenção para responsabilidade das chefias das instituições de Odontologia, coordenadore(a)s de curso e professores para promoção da visibilidade desses espaços destinados a pessoas LGBTI+21.

Hillenburg et al.22, ao avaliarem a cobertura de conteúdo curricular de Saúde LGBTI+ em escolas de Odontologia dos EUA e Canadá e os programas de higiene dental dos EUA, concluíram que 29% das escolas e 48% dos programas não preconizavam conteúdo LGBTI+ nos seus currículos22. Também Hodges et al.23 apontaram que o corpo docente do curso de Enfermagem encontrava-se com formação inadequada para ministrar conteúdos sobre saúde de pessoas LGBTI+ dentro do ensino, com prejuízo, por parte dos estudantes, do aprendizado dos cuidados para essa população23.

A incorporação do conteúdo de diversidade de gênero nos currículos e seus possíveis efeitos na formação dos futuros profissionais de saúde são defendidos na literatura científica. A iniciativa de incluir conteúdos sobre a saúde de transgêneros no currículo de um curso de Enfermagem baseado em evidências, com a intenção de avaliar a eficácia preliminar e viabilidade desse conteúdo na graduação, trouxe resultados que indicaram que o conteúdo específico melhorou a sensibilidade dos estudantes sobre questões de diversidade de gênero ao longo do tempo24.

Pesquisas que avaliam cuidados em saúde de pessoas LGBTI+ também estão presentes na perspectiva dos pacientes. Um estudo a respeito das experiências de indivíduos LGBTI+ na assistência à saúde aponta para a urgência da presença de profissionais de saúde capacitados para atuar no cuidado da saúde dessa população. No enfrentamento do desafio do despreparo profissional está a inclusão de conteúdo sobre necessidades de saúde de indivíduos LGBTI+ nos currículos das instituições de ensino25.

Um estudo realizado nos EUA, que avaliou o envolvimento de estudantes de Medicina na educação em saúde LGBTI+, destacou as atitudes positivas dos participantes sobre a temática. No entanto, identificou também inadequações nas habilidades clínicas e na preparação do atendimento de pacientes LGBTI+26. Essas deficiências curriculares da graduação têm efeito negativo na prática clínica dos futuros profissionais de Saúde. Uma pesquisa realizada com pacientes LGBTI+, que objetivava conhecer as experiências dessas pessoas em seus atendimentos de saúde, descobriu que a abordagem heteronormativa prevalece por parte dos profissionais, o que promove o enfraquecimento do vínculo profissional e paciente LGBTI+27.

A despeito de sua importância, não foram encontrados na literatura científica instrumentos correlatos e, ao mesmo tempo, o processo de desenvolvimento do presente instrumento revelou indícios de aplicabilidade, que poderão ter serventia como subsídio para tomada de decisão e readequações na estrutura curricular dos cursos de Enfermagem, Medicina e Odontologia no que diz respeito à saúde LGBTI+. Assim, o conhecimento clínico dos estudantes pode ser aprimorado na direção de inclusão dessa população à sociedade.

Há que se ressaltar que as barreiras de acesso a saúde enfrentadas por essa população na atenção a saúde por insuficiência de conhecimento dos profissionais da Saúde e demais questões estruturais estão presentes também na assistência a povos indígenas; população em situação de rua; população negra; povos ciganos; população privada de liberdade; egressos do sistema prisional; população de migrantes, refugiados e apátridas; e população do campo, da floresta e das águas.

Diante desse panorama, a urgência de pesquisas de avaliação da formação profissional é premente e essencial para a proposição de mudanças que vão ao encontro dos avanços nos marcos legais sobre direitos das pessoas LGBTI+, na mesma direção de aplicabilidade do instrumento aqui proposto.

Conclusões

Instrumentos de avalição da formação visam contribuir com as necessárias mudanças e possíveis adequações das práticas institucionais e profissionais. Além disso, o processo de construção do instrumento aqui proposto está pautado na possibilidade de adaptação e utilização dos caminhos aqui traçados para além da temática de diversidade sexual e de gênero.

Por fim, o presente instrumento teve seu desenvolvimento realizado. No entanto, há a necessidade de validação psicométrica, para que, além de levantar informações a respeito de como os cursos se encontram na formação para a temática, haja a possibilidade de avaliação concreta. Certamente há passos futuros para o desenvolvimento do instrumento na forma como ele se encontra hoje, uma vez que isso não foi proposto na presente pesquisa, que se restringiu a sua criação.

  • Moretti-Pires RO, Leiria M, Flores JM, Junior ZCT, Oliveira DC. Instrumento sobre a formação em saúde LGBTI+ de estudantes de Enfermagem, Medicina e Odontologia. Interface (Botucatu). 2024; 28: e230624 https://doi.org/10.1590/interface.230624

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Editado por

  • Editora
    Roseli Esquerdo Lopes
    Editor associado
    Gustavo Antonio Raimondi

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    28 Out 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    16 Dez 2023
  • Aceito
    11 Jul 2024
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