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Impacto dos Fatores de Risco para Doença Arterial Coronariana nos Gastos Hospitalares dos Pacientes Submetidos à Cirurgia de Revascularização do Miocárdio no SUS

Resumo

Fundamentos:

As doenças cardiovasculares representam uma importante causa de mortalidade e morbidade. A cirurgia de revascularização do miocárdio pode ser indicada para o alívio dos sintomas e para diminuir a mortalidade. Entretanto, a cirurgia é um procedimento de custo elevado e não está estabelecido o impacto do número de fatores de risco cardiovasculares nos gastos do procedimento.

Objetivos:

Identificar o impacto dos fatores de risco para a doença arterial coronariana nos gastos com a cirurgia de revascularização do miocárdio.

Métodos:

Foram selecionados 239 pacientes submetidos à cirurgia de revascularização do miocárdio isolada no Instituto Nacional de Cardiologia no período entre 01 de Janeiro a 31 de Dezembro de 2013. Foram incluídos pacientes com idade superior a 30 anos e indicação de revascularização cirúrgica do miocárdio. Foram excluídos os pacientes submetidos a procedimentos combinados.

Resultados:

Sete pacientes apresentaram apenas 1 fator de risco, 32 pacientes apresentaram 2 fatores de risco, 75 pacientes apresentaram 3 fatores de risco, 78 pacientes apresentaram 4 fatores de risco, 36 pacientes apresentaram 5 fatores de risco e 11 pacientes apresentaram 6 fatores de risco. O total dos gastos, em média, foi de R$ 14 143,22 no grupo com 1 fator de risco, R$ 18 380,40 no grupo com 2 fatores de risco, R$ 21 229,51 no grupo com 3 fatores de risco, R$ 24 620,86 no grupo com 4 fatores de risco, R$ 21 337,92 no grupo com 5 fatores de risco e R$ 36 098,35 no grupo com 6 fatores de risco (p = 0,441).

Conclusão:

Este trabalho demonstra que, em uma unidade pública de referência para a realização de procedimentos cardiológicos de alta complexidade, não houve uma correlação significativa entre o número de fatores de risco cardiovascular e os custos da internação.

Palavras-chave:
Doença da Artéria Coronariana; Revascularização Miocárdica / economia; Fatores de Risco; Custos Hospitalares; Sistema Único de Saúde

Abstract

Background:

Cardiovascular diseases are a major cause of mortality and morbidity. Myocardial revascularization surgery may be indicated for the relief of symptoms and to reduce mortality. However, surgery is a costly procedure and the impact of the number of cardiovascular risk factors on the cost of the procedure has not been established.

Objectives:

To identify the impact of risk factors for coronary artery disease on myocardial revascularization surgery cost.

Methods:

We selected 239 patients undergoing myocardial revascularization surgery at the National Institute of Cardiology in the period from 01 January to 31 December 2013. We included patients aged over 30 years, with indication for the procedure. Patients undergoing combined procedures were excluded.

Results:

Seven patients had only one risk factor, 32 patients had two risk factors, 75 patients had 3 risk factors, 78 patients had four risk factors, 36 patients had 5 risk factors and 11 patients presented 6 risk factors. The total costs, on average, was R$ 14,143.22 in the group with 1 risk factor, R$ 18,380.40 in the group with 2 risk factors, R$ 21,229.51 in the group with 3 risk factors, R$ 24,620.86 in the group with 4 risk factors, R$ 21,337.92 in the group with 5 risk factors and R$ 36,098,35 in the group with 6 risk factors (p = 0.441).

Conclusion:

This study demonstrates that, in a public referral center for highly complex cardiology procedures, there was no significant correlation between the number of cardiovascular risk factors and hospitalization costs.

Keywords:
Coronary Artery Disease; Myocardial Revascularization / economics; Risk Factors; Hospital Costs; Unified Health System

Introdução

As doenças cardiovasculares representam uma importante causa de mortalidade e morbidade.11 World Health Organization (WHO). The global burden of disease: 2004 update. Geneva (Switzerland); 2008. No cenário nacional, a prevalência da doença isquêmica do coração está aumentando ao longo dos últimos anos, levando a um aumento no número de internações hospitalares e dos gastos com a saúde.22 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria Executiva. Datasus. Informações de saúde. [;Acesso em 2013 Junho 20];. Disponível em: http://www.datasus.gov.br.
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A cirurgia de revascularização do miocárdio (CRM) é um tratamento indicado para pacientes selecionados e tem um elevado custo. As condições de saúde do paciente no pré-operatório podem ter um importante papel nos gastos com este procedimento. Entretanto, são escassas as informações sobre o impacto dos fatores de risco cardiovasculares relacionados ao desenvolvimento da doença arterial coronariana (DAC) nos custos com a CRM no cenário nacional. O objetivo deste estudo é o de pesquisar o impacto dos fatores de risco nos custos da CRVM no Sistema Único de Saúde (SUS).

Métodos

Este é um estudo observacional, prospectivo, realizado em um único centro. Foram selecionados 239 pacientes consecutivos submetidos à CRM no Instituto Nacional de Cardiologia (INC), que é um hospital público terciário do SUS de referência para procedimentos de alta complexidade em Cardiologia, no período entre 01 de Janeiro de 2013 e 31 de Dezembro de 2013.

Foram incluídos pacientes com idade superior a 30 anos, de ambos os sexos, com DAC comprovada por coronariografia e com indicação para a realização de CRM. Foram excluídos os pacientes que realizaram a CRM associada a outros procedimentos cirúrgicos tais como cirurgias valvares associadas, endarterectomia de carótidas, cirurgias vasculares, dentre outras.

Foram considerados como fatores de risco para a DAC a hipertensão arterial sistêmica, o diabetes mellitus, a dislipidemia, o tabagismo atual ou prévio, o sedentarismo, a história familiar de DAC, a insuficiência renal crônica e a obesidade.

Foram contabilizados a partir de dados no prontuário os gastos da internação hospitalar relacionados aos medicamentos, exames laboratoriais, exames complementares de imagem, materiais, profissionais e outros gastos comuns rateados conforme os dados fornecidos pelos centros de custo. Utilizou-se a metodologia do microcusteio, pela qual as intervenções às quais os pacientes foram submetidos são contabilizadas individualmente, levando finalmente à consolidação do custo total da internação hospitalar. Os valores utilizados como base de cálculo dos gastos foram obtidos por meio de consulta ao Sistema de Gerenciamento da Tabela de Procedimentos e Medicamentos do SUS (SIGTAP).

Análise exploratória dos dados foi obtida com as medidas de frequência para as variáveis categóricas. As variáveis contínuas forneceram informações sobre a média, mediana e outras medidas de tendência central, de dispersão e ordenamento, quando pertinentes. Os dados foram submetidos ao teste de normalidade de Shapiro-Wilk. A análise estatística das variáveis contínuas foi conduzida com a análise de variância (ANOVA) ou com o teste de Kruskal-Wallis, quando indicado. As variáveis categóricas foram analisadas com o teste do qui-quadrado. Foram considerados como significativos os valores de p < 0,05 para os testes estatísticos. Foi utilizado o programa SPSS 20.0 (IBM). O presente estudo foi aprovado na Comissão de Ética em Pesquisa sob o número 648089 e está de acordo com a Declaração de Helsinki.

Resultados

Foram observados 239 pacientes, que apresentaram entre 1 e 6 fatores de risco cardiovasculares. Sete pacientes apresentaram apenas um fator de risco, 32 pacientes apresentaram dois fatores de risco, 75 pacientes apresentaram três fatores de risco, 78 pacientes apresentaram quatro fatores de risco, 36 pacientes apresentaram cinco fatores de risco e 11 pacientes apresentaram seis fatores de risco.

As características dos pacientes estão expostas na Tabela 1 e as definições dos fatores de risco cardiovascular estão descritos na Tabela 2.

Tabela 1
Dados dos pacientes
Tabela 2
Definições dos fatores de risco cardiovascular

Os pacientes com maior número de comorbidades apresentaram um IMC mais elevado quando comparados com os pacientes com menos fatores de risco (p < 0,001). Não foram observadas diferenças significativas na média de idade entre os grupos.

Os pacientes apresentaram uma prevalência variável dos fatores de risco cardiovascular, sendo mais frequentes a hipertensão arterial sistêmica e a dislipidemia, presentes em 95,8% e 76,6% dos casos, respectivamente. A prevalência dos fatores de risco analisados está ilustrada na Figura 1.

Figura 1
Frequência dos fatores de risco cardiovascular.

A Tabela 3 exibe os custos da hospitalização observados na forma de microcusto, estratificados como medicamentos, exames laboratoriais, exames complementares de imagem, materiais, profissionais e custos comuns rateados.

Tabela 3
Gastos* * valores em real. relacionados à hospitalização estratificados de acordo com o número de fatores de risco cardiovascular

A ocorrência de complicações durante a internação hospitalar não apresentou uma diferença significativa entre os grupos e está demonstrada na tabela 4.

Tabela 4
Complicações durante a internação hospitalar por número de fatores de risco cardiovascular

Os óbitos foram proporcionais ao número de indivíduos de cada grupo, não apresentando diferenças significativas entre os grupos de pacientes.

Os dias de internação hospitalar e de permanência no CTI foram semelhantes entre os grupos.

Discussão

Os resultados deste trabalho representam os custos da CRM isolada, compreendendo todo o período de internação hospitalar, em um hospital de referência em Cardiologia do SUS.

Estudos na literatura indicam que várias características demográficas dos pacientes, tais como a idade avançada, sexo feminino, fração de ejeção do VE, número de coronárias doentes, cirurgias prévias e elevado número de comorbidades, podem interferir de modo relevante nos custos hospitalares da CRVM,33 Saleh SS, Racz M, Hannan E. The effect of preoperative and hospital characteristics on costs for coronary artery bypass graft. Ann Surg. 2009;249(2):335-41. doi: 10.1097/SLA.0b013e318195e475.
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porém uma análise dos gastos sob esta perspectiva ainda não foi realizada no Brasil.

Os pacientes do presente estudo apresentaram uma prevalência mais elevada de hipertensão arterial, diabetes mellitus, tabagismo, insuficiência renal crônica e lesão de tronco da coronária esquerda quando comparados com os pacientes de outras publicações semelhantes.44 Toor I, Bakhai A, Keogh B, Curtis M, Yap J. Age =75 years is associated with greater resource utilization following coronary artery bypass grafting. Interact CardioVasc Thorac Surg. 2009;9(5):827-31. doi: 10.1510/icvts.2009.210872.
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Os custos variaram, em todas as suas categorias, em relação direta com o número de fatores de risco, porém este aumento não alcançou significância estatística. Outros estudos correlacionaram a existência de um maior número de fatores de risco cardiovasculares com um maior custo hospitalar.55 Mauldin PD, Weintraub WS, Becker ER. Predicting hospital costs for first-time coronary artery bypass grafting from preoperative and postoperative variables. Am J Cardiol. 1994;74(8):772-5. PMID: 7942547.,66 Smith LR, Milano CA, Molter BS, Elbeery JR, Sabiston DC Jr, Smith PK. Preoperative determinants of postoperative costs associated with coronary artery bypass graft surgery. Circulation. 1994;90(5 Pt 2):II124-8. PMID: 7955238. Entretanto, existem evidências de que fatores locais tais como o país e até mesmo o grau de complexidade do hospital podem contribuir para que os fatores de risco cardiovasculares tenham impacto nos custos hospitalares.77 Gaughan J, Kobel C, Linhart C, Mason A, Street A, Ward P; EuroDRG group. Why do patients having coronary artery bypass grafts have different costs or length of stay? An analysis across 10 European countries. Health Econ. 2012;21 Suppl 2:77-88. doi: 10.1002/hec.2842.
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Observou-se, neste trabalho, que os grupos não apresentaram diferenças significativas com relação às variáveis demográficas e os motivos de internação, função ventricular e os dados angiográficos. Algumas diferenças relacionadas à história clínica e às comorbidades foram encontradas, porém estes achados eram esperados, tendo em vista que a caracterização dos grupos foi baseada justamente na existência e no número de comorbidades.

Com relação às complicações, que representam uma parcela importante dos gastos durante a internação hospitalar, seja pelo aumento do tempo de internação e permanência no CTI ou pelo aumento na utilização de insumos,88 Girardi PB, Hueb W, Nogueira CR, Takiuti ME, Nakano T, Garzillo CL, et al. Comparative costs between myocardial revascularization with or without extracorporeal circulation. Arq Bras Cardiol. 2008; 91 (6): 369-76. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0066-782X2008001800003.
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não foram observadas diferenças importantes entre os grupos. Entretanto, outros trabalhos correlacionam a existência de alguns fatores de risco com a ocorrência de complicações durante o período de internação hospitalar,99 Wrobel K, Stevens SR, Jones RH, Selzman CH, Lamy A, Beaver TM, et al. Influence of baseline characteristics, operative conduct, and postoperative course on 30-day outcomes of coronary artery bypass grafting among patients with left ventricular dysfunction: results from the Surgical Treatment for Ischemic Heart Failure (STICH) trial. Circulation. 2015;132(8):720-30. doi: 10.1161/CIRCULATIONAHA.114.014932.
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podendo resultar em custos de internação maiores nestes pacientes.

Os resultados referentes à internação hospitalar também não apresentaram diferenças significativas entre os grupos. Essas informações são importantes porque o tempo de permanência hospitalar e o tempo de permanência no CTI são fortes determinantes do custo total da internação.1010 Badreldin AMA, Doerr F, Kroener A, Wahlers T, Hekmat K. Preoperative risk stratification models fail to predict hospital cost of cardiac surgery patients. J Cardiothorac Surg. 2013 May 9;8:126. doi: 10.1186/1749-8090-8-126.
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Neste trabalho, a utilização do método do microcusteio permitiu a contabilização mais precisa dos custos da internação hospitalar de cada paciente, permitindo também uma análise mais refinada dos gastos com medicamentos, exames laboratoriais, exames complementares de imagem, materiais e profissionais.

Escores clínicos para a avaliação do risco de complicações e mortalidade na CRM, tais como o EuroSCORE1111 Roques F, Nashef SA, Michel P, Gauducheau E, de Vincentiis C, Baudet E, et al. Risk factors and outcome in European cardiac surgery: analysis of the EuroSCORE multinational database of 19030 patients. Eur J Cardiothorac Surg. 1999;15(6):816-22. PMID: 10431864. e o STS score,1212 Shahian DM, O'Brien SM, Filardo G, Ferraris VA, Haan CK, Rich JB, et al; Society of Thoracic Surgeons Quality Measurement Task Force. The Society of Thoracic Surgeons 2008 cardiac surgery risk models: part 1-coronary artery bypass grafting surgery. Ann Thorac Surg. 2009;88(1 Suppl):S43-62. doi: 10.1016/j.athoracsur.2009.05.055.
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apoiam-se em informações sobre as comorbidades e fatores de risco cardiovascular com o objetivo de estimar eventos. Entretanto, neste estudo, com grupos variando entre um até seis fatores de risco, demonstrou que as taxas de complicações e os custos entre os grupos não foram diferentes.

É limitação deste trabalho o fato de que os grupos com maior e menor número de fatores de risco corresponder àqueles com o menor número de indivíduos, o que pode dificultar a identificação de uma diferença significativa entre os grupos. Além disso, o pequeno número de pacientes em alguns grupos pode ter contribuído para que não fosse alcançada uma diferença estatisticamente significativa entre os grupos.

Os resultados deste trabalho podem contribuir para o melhor controle dos gastos e uma alocação otimizada dos recursos da saúde pelos gestores públicos. A realização deste estudo na forma de microcusteio permite estabelecer como prioridade os custos de cada paciente, levando-se em consideração os custos unitários das diversas intervenções às quais cada paciente é submetido durante a internação hospitalar.

Novos estudos poderão utilizar a metodologia do microcusteio, possibilitando um conhecimento mais detalhado dos custos da CRM nos sistemas público e privado de saúde.

  • Fontes de Financiamento
    O presente estudo não teve fontes de financiamento externas.
  • Vinculação Acadêmica
    Este artigo é parte de tese de Doutorado de João Luís Barbosa pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
  • Aprovação Ética e consentimento informado
    Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética do Instituto Nacional de Cardiologia sob o número de protocolo 648089. Todos os procedimentos envolvidos nesse estudo estão de acordo com a Declaração de Helsinki de 1975, atualizada em 2013. O consentimento informado foi obtido de todos os participantes incluídos no estudo.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Mar-Apr 2018

Histórico

  • Recebido
    31 Maio 2016
  • Revisado
    22 Jul 2017
  • Aceito
    31 Jul 2017
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