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Prescrições de exercícios físicos para pacientes em hemodiálise no Brasil: uma revisão de escopo

Resumo

Introdução:

O exercício físico está sendo incorporado ao tratamento de pacientes em hemodiálise, porém pouco se sabe sobre as principais características dessas intervenções.

Objetivo:

Descrever os protocolos de exercício físico prescritos para pacientes em hemodiálise no Brasil.

Métodos:

Uma revisão de escopo foi conduzida de acordo com as diretrizes JBI e Prisma-ScR. Foram realizadas pesquisas na Medline, Embase e em outras três bases de dados até maio de 2024. Outras fontes (sites, livros e diretrizes) também foram pesquisadas. Foram incluídas evidências de pacientes em hemodiálise, descrevendo protocolos de exercício físico em todos os ambientes e desenhos no Brasil.

Resultados:

Encontradas 45 evidências, resultando em 54 protocolos de exercício físico de 16 estados brasileiros. O exercício de força (33,3%), seguido do exercício aeróbico (22,2%), foi o mais prescrito para ser realizado durante a diálise (85,2%). Os profissionais mais prevalentes na supervisão dos programas foram fisioterapeutas e profissionais de educação física (37,0% e 18,5%, respectivamente). Todos os protocolos adotaram os princípios de treinamento tipo e frequência, enquanto a progressão foi adotada em apenas 53,7%. A frequência mais prescrita foi três vezes por semana (88,9%). A intensidade do exercício foi determinada predominantemente por métodos subjetivos (33,3%).

Conclusão:

Os exercícios aeróbicos e de força durante a diálise foram as modalidades mais prescritas no Brasil, com a maioria dos programas sendo adequadamente supervisionada por profissionais qualificados. No entanto, os protocolos existentes não adotaram a progressão sistemática no decorrer da intervenção, o que seria adequado para proporcionar melhores respostas e adaptações fisiológicas.

Descritores:
Insuficiência Renal Crônica; Diálise; Exercício Físico; Treinamento Resistido; Treino Aeróbico

Abstract

Introduction:

Exercise is being incorporated into the treatment of patients on hemodialysis; however, little is known about the major characteristics of these interventions.

Objective:

To describe the exercise protocols prescribed for hemodialysis patients in Brazil.

Methods:

A scoping review was conducted following JBI and Prisma-ScR guidelines. Searches were carried out in Medline, Embase and three other databases until May 2024. Other sources (websites, books and guidelines) were also investigated. Evidence from patients on hemodialysis describing exercise protocols in all settings and designs in Brazil was included.

Results:

Forty-five pieces of evidence were found, resulting in 54 exercise protocols from 16 Brazilian states. Strength exercises (33.3%), followed by aerobic exercises (22.2%), were the most prescribed, mainly to be performed during dialysis (85.2%). The most prevalent professionals supervising the programs were physiotherapists and exercise physiologists (37.0% and 18.5%, respectively). All protocols implemented the principles of type and frequency training, while progression was adopted in only 53.7%. The main prescription was three times per week (88.9%). Exercise intensity was predominantly determined by subjective methods (33.3%).

Conclusion:

Aerobic and strength exercises during dialysis were the most commonly prescribed modalities in Brazil, with the majority of programs being properly supervised by qualified professionals. However, existing protocols have not employed systematic progression throughout the intervention, which would be appropriate for providing better physiological responses and adaptations.

Keywords:
Renal Insufficiency; Chronic; Dialysis; Exercise; Resistance Training; Endurance Training

Introdução

A hemodiálise é a terapia renal substitutiva mais prescrita no Brasil. Dados brasileiros do inquérito sobre diálise de 2022 mostraram que 95% dos pacientes com falência renal faziam esse tratamento11. Nerbass FB, Lima HDN, Moura-Neto JA, Lugon JR, Sesso R. Brazilian Dialysis Survey 2022. J Bras Nefrol. 2024;46(2):1–8. doi: http://doi.org/10.1590/2175-8239-jbn-2023-0062en. PubMed PMID: 38078834.
https://doi.org/10.1590/2175-8239-jbn-20...
. Pacientes em hemodiálise comumente apresentam comportamento sedentário22. Almeida LS, Ribeiro HS, Duarte MP, Dourado GÍ, Ferreira TL, Inda-Filho AJ, et al. Physical activity is associated with nutritional biomarkers in hemodialysis patients: a cross-sectional study. Ther Apher Dial. 2022;26(5):924–31. doi: http://doi.org/10.1111/1744-9987.13782. PubMed PMID: 34939328.
https://doi.org/10.1111/1744-9987.13782...
e incapacidade física33. Lim K, McGregor G, Coggan AR, Lewis GD, Moe SM. Cardiovascular functional changes in chronic kidney disease: integrative physiology, pathophysiology and applications of cardiopulmonary exercise testing. Front Physiol. 2020;11:1–14. doi: http://doi.org/10.3389/fphys.2020.572355. PubMed PMID: 33041870.
https://doi.org/10.3389/fphys.2020.57235...
66. Duarte MP, Almeida LS, Neri SGR, Oliveira JS, Wilkinson TJ, Ribeiro HS, et al. Prevalence of sarcopenia in patients with chronic kidney disease: a global systematic review and meta-analysis. J Cachexia Sarcopenia Muscle. 2024;15(2):501–12. doi: http://doi.org/10.1002/jcsm.13425. PubMed PMID: 38263952.
https://doi.org/10.1002/jcsm.13425...
, o que aumenta sua morbidade e mortalidade. Intervenções com exercícios físicos têm sido introduzidas como uma tentativa de modificar tal cenário77. Wilund K, Thompson S, Bennett PN. A global approach to increasing physical activity and exercise in kidney care: the international society of renal nutrition and metabolism global renal exercise group. J Ren Nutr. 2019;29(6):467–70. doi: http://doi.org/10.1053/j.jrn.2019.08.004. PubMed PMID: 31591041.
https://doi.org/10.1053/j.jrn.2019.08.00...
, mas ainda falta sua implementação como parte da rotina de tratamento88. Bennett PN, Kohzuki M, Bohm C, Roshanravan B, Bakker SJL, Viana JL, et al. Global policy barriers and enablers to exercise and physical activity in kidney care. J Ren Nutr. 2022;32(4):441–9. doi: http://doi.org/10.1053/j.jrn.2021.06.007. PubMed PMID: 34393071.
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. Além disso, há a necessidade de evidências que descrevam protocolos de exercícios em detalhes para apoiar a expansão de programas viáveis.

Anteriormente, os resultados da análise mundial de uma revisão de escopo mostraram que o Brasil foi o principal país a relatar protocolos de exercícios físicos para essa população99. Ribeiro HS, Andrade FP, Leal DV, Oliveira JS, Wilund KR, Viana JL. How is exercise being prescribed for patients on hemodialysis? A scoping review. J Nephrol. 2022;36(5):1307–19. doi: http://doi.org/10.1007/s40620-022-01513-8. PubMed PMID: 36418777.
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. Contudo, Barros et al.1010. Barros FS, Pinheiro BV, Lucinda LMF, Rezende GF, Segura-Ortí E, Reboredo MM. Exercise training during hemodialysis in Brazil: A national survey. Artif Organs. 2021;45(11):1368–76. doi: http://doi.org/10.1111/aor.14018. PubMed PMID: 34153118.
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descobriram recentemente que apenas 16% dos centros de diálise no Brasil tinham um programa de exercício intradialítico integrado à sua rotina clínica. Na tentativa de aumentar a conscientização e o conhecimento da Sociedade Brasileira de Nefrologia para ajudar na implementação de programas de exercícios físicos, realizamos uma análise secundária de uma revisão de escopo para descrever as prescrições de exercícios físicos para pacientes em hemodiálise no Brasil.

Métodos

O protocolo da nossa revisão de escopo e o artigo com os dados mundiais foram publicados anteriormente99. Ribeiro HS, Andrade FP, Leal DV, Oliveira JS, Wilund KR, Viana JL. How is exercise being prescribed for patients on hemodialysis? A scoping review. J Nephrol. 2022;36(5):1307–19. doi: http://doi.org/10.1007/s40620-022-01513-8. PubMed PMID: 36418777.
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,1111. Ribeiro HS, Andrade FP, Leal DV, et al. How is exercise prescribed for hemodialysis patients? A Scoping review protocol. medRxiv 2021;1–9. doi: http://doi.org/10.1101/2021.12.21.21268178.
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e mais detalhes da metodologia podem ser vistos nessas publicações. Brevemente, foram adotadas as diretrizes JBI1212. Peters MDJ, Marnie C, Tricco AC, Pollock D, Munn Z, Alexander L, et al. Updated methodological guidance for the conduct of scoping reviews. JBI Evid Synth. 2020;18(10):2119–26. doi: http://doi.org/10.11124/JBIES-20-00167. PubMed PMID: 33038124.
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e Prisma-ScR1313. Tricco AC, Lillie E, Zarin W, O’Brien KK, Colquhoun H, Levac D, et al. PRISMA Extension for Scoping Reviews (PRISMA-ScR): checklist and explanation. Ann Intern Med. 2018;169(7):467–73. doi: http://doi.org/10.7326/M18-0850. PubMed PMID: 30178033.
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de revisão de escopo. Foi realizada uma estratégia de busca completa nas bases de dados Medline, Embase, SportDiscus, Cinahl e Lilacs utilizando termos relacionados a “hemodiálise”, “diálise”, “exercício físico” e “treinamento físico”. A estratégia de busca completa para cada base de dados pode ser vista no Supplementary Material 1. As bases de dados foram pesquisadas desde o início até dezembro de 2021 e a busca manual adicional por novas evidências brasileiras foi feita até maio de 2024.

Foi seguida a estrutura do PCC e escolhida qualquer evidência de relatórios/estudos com pacientes adultos em hemodiálise (participantes), prescrevendo intervenções com exercícios físicos (conceito), em todos os ambientes e desenhos de estudo no Brasil (contexto). Dois revisores independentes (HR e FA) selecionaram títulos e resumos. A leitura do texto completo foi feita pelo revisor principal (HR). As divergências foram discutidas com um revisor adicional (DL).

A extração dos dados relevantes foi realizada pelo revisor principal (HR) e dupla verificação por outros (FA e DL) em uma planilha adaptada1414. Peters M, Godfrey C, McInerney P, Munn Z, Tricco AC, Khalil H. Chapter 11: Scoping Reviews. In: E Aromataris, Z Munn, editor. JBI Manual for Evidence Synthesis. Australia: JBI; 2020. doi: http://doi.org/10.46658/JBIMES-20-12.
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. Os dados relevantes incluíram detalhes sobre a prescrição do exercício (por exemplo, tipo, frequência, duração, local, volume, progressão, intensidade, profissionais envolvidos, periodização etc.). As divergências foram resolvidas com um revisor adicional (JV).

Os dados foram descritos de acordo com a diretriz Prisma-ScR1313. Tricco AC, Lillie E, Zarin W, O’Brien KK, Colquhoun H, Levac D, et al. PRISMA Extension for Scoping Reviews (PRISMA-ScR): checklist and explanation. Ann Intern Med. 2018;169(7):467–73. doi: http://doi.org/10.7326/M18-0850. PubMed PMID: 30178033.
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. Foram realizadas análises dos protocolos de acordo com os princípios de exercício do American College of Sports Medicine (ACSM) (FITT-VP: frequência, intensidade, tempo, tipo, volume e progressão)1515. American College of Sports Medicine. ACSM’s Guidelines for Exercise Testing and Prescription. 11th ed. Philadelphia: Wolters Kluwer; 2021.. Uma descrição mais detalhada da análise dos dados pode ser vista em outra publicação99. Ribeiro HS, Andrade FP, Leal DV, Oliveira JS, Wilund KR, Viana JL. How is exercise being prescribed for patients on hemodialysis? A scoping review. J Nephrol. 2022;36(5):1307–19. doi: http://doi.org/10.1007/s40620-022-01513-8. PubMed PMID: 36418777.
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.

Resultados

Seleção de Estudos

Foram encontrados 21.312 registros; destes, 285 foram incluídos em nossa principal revisão mundial88. Bennett PN, Kohzuki M, Bohm C, Roshanravan B, Bakker SJL, Viana JL, et al. Global policy barriers and enablers to exercise and physical activity in kidney care. J Ren Nutr. 2022;32(4):441–9. doi: http://doi.org/10.1053/j.jrn.2021.06.007. PubMed PMID: 34393071.
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. Do Brasil, 39 foram incluídos nessa análise secundária. Em uma busca adicional conduzida em maio de 2024, foram encontrados 6 artigos publicados entre 2022 e 2024, rendendo 54 protocolos de exercícios (Figura 1; lista completa dos artigos no Supplementary Material 2). Todos os protocolos de exercícios foram relatados em artigos originais.

Figura 1
Fluxograma da revisão de escopo.

Características

Os protocolos incluídos vieram de 16 estados e de todas as regiões brasileiras. A Figura 2 mostra que o estado mais prevalente foi São Paulo (n = 14; 25,9%). O treinamento de força (n = 18; 33,3%) foi o tipo mais prescrito. A Table S2 mostra as características dos protocolos incluídos.

Figura 2
Mapa de calor geográfico dos protocolos de exercícios físicos prescritos para pacientes em hemodiálise no Brasil.

Constatações Gerais

A Tabela 1 descreve as principais características dos programas de exercícios. A duração mediana das intervenções foi de 12 [intervalo interquartil: 8 – 13] semanas. O exercício foi prescrito principalmente durante a diálise (ou seja, intradialítica; n = 45; 83,3%). Para os programas de exercícios que prescreveram qualquer componente intradialítico, a intervenção foi realizada principalmente durante a primeira metade da sessão de diálise (n = 35; 77,8%). Os profissionais mais prevalentes na supervisão dos programas de exercícios foram fisioterapeutas e profissionais de educação física (n = 20; 37,0% e n = 10; 18,5%, respectivamente).

Tabela 1
Características dos protocolos de exercício físico

Os princípios de exercício físico adotados nos protocolos de exercícios prescritos estão demonstrados na Figura 3. Todos os protocolos adotaram tipo e frequência, mas a progressão foi adotada em apenas 53,7% (n = 29). A maioria dos protocolos prescrevia exercícios três dias por semana (n = 47; 88,9%) e utilizava métodos subjetivos (n = 18, 33,3%) para determinar a intensidade do exercício, enquanto 14 (25,9%) protocolos não relatavam controle de intensidade.

Figura 3
Princípios de treinamento FITT-VP (ACSM) adotados nos protocolos mais prescritos.

Características dos Protocolos se Exercícios

Aeróbico

O cicloergômetro foi utilizado em todos os protocolos aeróbicos (n = 12, 100%) e um incluiu restrição parcial do fluxo sanguíneo nos membros inferiores. Todos os protocolos prescreveram exercícios três dias por semana, e a maioria monitorou a intensidade do exercício usando métodos objetivos (n = 9; 75,0%), principalmente por meio de escalas de frequência cardíaca (n = 9; 75,0%) e taxa de percepção subjetiva de esforço (PSE) (n = 6; 50,0%).

Força

Seis protocolos de força incluíram exercícios para membros inferiores (33,3%) e 11 combinados para membros inferiores e superiores (61,1%). Seis protocolos utilizaram halteres e pesos livres (33,3%). Dois estudos incorporaram exercícios com peso corporal (11,1%). A maioria dos protocolos prescrevia exercícios três dias por semana (n = 16, 88,9%) e monitorava a intensidade do exercício utilizando métodos subjetivos por meio de escalas de PSE (n = 10, 55,6%).

Combinado

Todos os protocolos combinados prescreveram treinamento aeróbico e de força na mesma sessão (n = 6, 100%), sendo o aeróbio realizado predominantemente primeiro (n = 5, 83,3%).

Componente Aeróbico

O ciclismo foi prescrito para todos os protocolos, e um também incluiu caminhada/corrida em esteira1616. Tomich GM, Bernardino LS, Ferreira FO. Impact of physical therapy on functional capacity and life quality of patients with chronic kidney disease. Fisioter Mov. 2014;27(4):643–51. doi: http://doi.org/10.1590/0103-5150.027.004.AO16.
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. Cinco protocolos prescreveram exercícios três dias por semana (83,3%), e a maioria monitorou a intensidade do exercício usando métodos subjetivos (n = 5, 83,3%), principalmente por meio de escalas de PSE (n = 4, 66,7%).

Componente de Força

Quatro protocolos incluíram exercícios para membros inferiores e superiores (66,6%) e dois apenas para membros inferiores (33,3%). A maioria dos protocolos utilizou halteres e pesos livres (n = 5; 83,3%) e um incorporou faixas elásticas ou bolas (16,7%). Cinco protocolos prescreviam exercícios três dias por semana (83,3%) e apenas três descreviam monitoramento da intensidade do exercício (50%).

Respiratório

As intervenções respiratórias (n = 8) foram realizadas principalmente três dias por semana (n = 6; 75,0%) e métodos objetivos de intensidade aplicados em todas, principalmente através da pressão inspiratória máxima (n = 7; 87,5%), variando de 40 a 70%.

Mobilidade

Os protocolos de mobilidade (n = 3) foram prescritos principalmente três dias por semana (n = 2, 66,3%), com duração variando de 25 a 45 minutos. Nenhuma abordagem de intensidade ou progressão foi descrita.

Estimulação Elétrica Neuromuscular

Cinco protocolos utilizaram estimulação elétrica neuromuscular três dias por semana (100%), com sessões que duraram de 20 a 60 minutos cada. A intensidade foi objetivamente prescrita através da frequência de pulso (100%), que variou de 20 a 80 Hz.

Realidade Virtual

Um único protocolo utilizou exergames não imersivos e foi prescrito três dias por semana. A intensidade do exercício foi monitorada através da PSE, variando de 12 a 14 na escala de Borg de 6 a 20, representando uma intensidade um pouco difícil a difícil.

Plataforma Vibratória

Um protocolo de exercício utilizou plataformas vibratórias na frequência de 35 Hz. O protocolo consistia em realizar semiagachamentos isométricos consecutivos de 30 segundos separados por períodos de descanso de 30 segundos por um total de 10 a 20 minutos, duas vezes por semana.

Discussão

Nossa revisão de escopo descreveu os protocolos de exercícios físicos prescritos para pacientes em hemodiálise no Brasil. As evidências vieram principalmente dos estados de São Paulo e Rio Grande do Sul, sendo o treinamento de força o tipo de exercício físico mais prescrito. Os fisioterapeutas supervisionaram a maior parte dos protocolos. O princípio da progressão sistemática foi aplicado em apenas metade dos protocolos, enquanto a intensidade do exercício foi predominantemente determinada por métodos subjetivos. A frequência de exercício foi principalmente três vezes por semana e durante a diálise, o que mostra a necessidade de uma abordagem mais holística ao exercício e à atividade física nessa população, incluindo um estilo de vida que considera “mover-se mais”1717. Wilund KR, Viana JL, Perez LM. A critical review of exercise training in hemodialysis patients. Exerc Sport Sci Rev. 2020;48(1):28–39. doi: http://doi.org/10.1249/JES.0000000000000209. PubMed PMID: 31453844.
https://doi.org/10.1249/JES.000000000000...
.

Diferentemente das análises mundiais realizadas, os exercícios de força, mas não o aeróbico, foi o tipo mais prescrito entre os protocolos incluídos99. Ribeiro HS, Andrade FP, Leal DV, Oliveira JS, Wilund KR, Viana JL. How is exercise being prescribed for patients on hemodialysis? A scoping review. J Nephrol. 2022;36(5):1307–19. doi: http://doi.org/10.1007/s40620-022-01513-8. PubMed PMID: 36418777.
https://doi.org/10.1007/s40620-022-01513...
. O exercício aeróbico geralmente requer supervisão profissional mínima e menor custo. No Brasil, o exercício físico só pode ser prescrito e supervisionado por fisioterapeutas e/ou profissionais de educação física, o que leva a acreditar que os exercícios de força têm sido mais amplamente adotados do que nos demais países do mundo, bem como por serem mais baratos e exigirem equipamentos mais simples quando comparados aos exercícios aeróbicos por cicloergômetro. Porém, mesmo com esse acompanhamento profissional, outros tipos de programas de exercícios (por exemplo, estimulação elétrica neuromuscular, realidade virtual e plataforma vibratória) têm sido pouco prescritos. Tais intervenções são geralmente caras e requerem equipamentos modernos, tornando mais difícil implementá-las na rotina clínica.

Em nossa análise global99. Ribeiro HS, Andrade FP, Leal DV, Oliveira JS, Wilund KR, Viana JL. How is exercise being prescribed for patients on hemodialysis? A scoping review. J Nephrol. 2022;36(5):1307–19. doi: http://doi.org/10.1007/s40620-022-01513-8. PubMed PMID: 36418777.
https://doi.org/10.1007/s40620-022-01513...
, um grande número de protocolos não descreveu adequadamente as variáveis relacionadas ao exercício físico recomendadas pelo ACSM (ou seja, princípios FITT-VP)1515. American College of Sports Medicine. ACSM’s Guidelines for Exercise Testing and Prescription. 11th ed. Philadelphia: Wolters Kluwer; 2021., entretanto, nesta análise brasileira houve maior quantidade de protocolos de exercícios que seguiram todos ou a maioria dos princípios. Contudo, a progressão foi pouco adotada nos programas aeróbicos e combinados. A progressão adequada do exercício desempenha um papel importante na produção de adaptações fisiológicas em longo prazo e pode ter impacto nos benefícios para a saúde1818. Spiering BA, Mujika I, Sharp MA, Foulis SA. Maintaining physical performance: the minimal dose of exercise needed to preserve endurance and strength over time. J Strength Cond Res. 2021;35(5):1449–58. doi: http://doi.org/10.1519/JSC.0000000000003964. PubMed PMID: 33629972.
https://doi.org/10.1519/JSC.000000000000...
,1919. Smart NA, Williams AD, Levinger I, Selig S, Howden E, Coombes JS, et al. Exercise & Sports Science Australia (ESSA) position statement on exercise and chronic kidney disease. J Sci Med Sport. 2013;16(5):406–11. doi: http://doi.org/10.1016/j.jsams.2013.01.005. PubMed PMID: 23434075.
https://doi.org/10.1016/j.jsams.2013.01....
. Portanto, são necessários esforços das sociedades brasileiras de nefrologia, fisioterapia e educação física para fornecer diretrizes sobre a implementação, a prescrição, o monitoramento e a supervisão de exercícios para pacientes em hemodiálise, como feito recentemente pela UK Renal Association2020. Baker LA, March DS, Wilkinson TJ, Billany RE, Bishop NC, Castle EM, et al. Clinical practice guideline exercise and lifestyle in chronic kidney disease. BMC Nephrol. 2022;23(1):75. doi: http://doi.org/10.1186/s12882-021-02618-1. PubMed PMID: 35193515.
https://doi.org/10.1186/s12882-021-02618...
. O recém-criado Grupo Brasileiro de Reabilitação em Nefrologia (GBREN)2121. Ribeiro HS, Andrade FP, Reboredo MM. Rehabilitation and exercise in Brazilian nephrology: where we are and future perspectives. Rev Bras Pesqui em Ciências da Saúde. 2021;8:1–2.,2222. Andrade FP, Ribeiro HS, Krug RR, Reboredo MM. Grupo Brasileiro de Reabilitação em Nefrologia (GBREN). Biomotriz. 2022;16(1):7–8. doi: http://doi.org/10.33053/biomotriz.v16i1.733.
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funciona até agora como uma rede colaborativa para apoiar profissionais do exercício que têm trabalhado nessa área. Na prática clínica, até que haja uma diretriz nacional, recomendamos que os profissionais envolvidos na prescrição e supervisão de exercícios físicos nessa população sigam recomendações como as da ACSM1515. American College of Sports Medicine. ACSM’s Guidelines for Exercise Testing and Prescription. 11th ed. Philadelphia: Wolters Kluwer; 2021..

Até onde sabemos, esta é a primeira revisão de escopo que descreve as evidências sobre como os exercícios físicos têm sido prescritos para pacientes em hemodiálise no Brasil. Seguimos diretrizes bem reconhecidas, conduzimos uma estratégia de pesquisa abrangente e incluímos a maioria dos tipos de exercícios, o que contribuiu para um número robusto de estudos incluídos. Apesar desses pontos fortes, existem algumas limitações. A leitura do texto completo foi feita apenas pelo revisor principal, mas, para minimizar esse viés, a extração dos dados foi verificada novamente por outros dois. Além disso, a estratégia de busca não incluiu termos brasileiros específicos nem o idioma português brasileiro, o que pode ter impactado a captura de publicações que não sejam em inglês.

Em conclusão, as intervenções com exercícios de força e aeróbicos foram as mais prescritas no Brasil, porém outras modalidades estão sendo recentemente prescritas. Contudo, encontramos um baixo número de protocolos que adotaram progressão sistemática dos princípios do treinamento físico no decorrer da intervenção. Protocolos futuros deverão adotar esses critérios para proporcionar melhores respostas e adaptações fisiológicas. Portanto, acreditamos que nossas descobertas podem fornecer à comunidade da nefrologia melhor compreensão de como fornecer, implementar, monitorar e supervisionar programas de exercício físico para pessoas em hemodiálise. Além disso, as políticas públicas devem incentivar o aumento da presença de profissionais qualificados para supervisionar os programas de exercício físico (sabidamente, fisioterapeutas e profissionais de educação física).

Agradecimentos

Esta revisão é endossada pela rede Global Renal Exercise (GREX) e pelo Grupo Brasileiro de Reabilitação em Nefrologia (GBREN). A interpretação e as conclusões aqui contidas são de responsabilidade dos pesquisadores e não representam as opiniões do GREX e do GBREN.

Material Suplementar

O seguinte material on-line está disponível para o presente artigo:

Supplementary Material 1 – Search strategies.

Supplementary Material 2 – References of the included reports.

Table S1 – Preferred Reporting Items for Systematic reviews and Meta-Analyses extension for Scoping Reviews (Prisma-ScR) Checklist.

Table S2 – Characteristics of the exercise protocols.

References

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    20 Set 2024
  • Data do Fascículo
    Oct-Dec 2024

Histórico

  • Recebido
    03 Abr 2024
  • Aceito
    16 Jun 2024
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