Resumo
Antecedentes: Este estudo teve como objetivo avaliar a relação entre espessura muscular do quadríceps e desempenho funcional no teste sit-to-stand de 60s (STS-60s), no teste de caminhada de seis minutos (TC6M), e na força de preensão manual em pacientes não dialíticos com doença renal crônica (DRC) estágios 4 e 5.
Métodos: Este foi um estudo transversal que avaliou 40 pacientes com DRC com idades entre 30-70 anos. Os participantes foram submetidos a uma avaliação que incluiu a espessura muscular do quadríceps avaliada por um ultrassom portátil. Os testes de desempenho funcional incluíram o STS-60s, a distância percorrida no TC6M e a força de preensão manual. Além disso, foram medidos a composição corporal, avaliada usando a análise de bioimpedância elétrica e o nível de atividade física por meio da versão curta do International Physical Activity. A regressão linear múltipla foi usada para investigar a relação entre a espessura do quadríceps e o desempenho funcional.
Resultados: A espessura muscular do quadríceps foi correlacionada com o STS-60s (R2 = 43,6%; IC 95% = 0,022 - 0,665; β = 0,34; p = 0,037). Também foi encontrada uma correlação moderada entre esta espessura muscular e a massa muscular esquelética apendicular (MEA) em pacientes com DRC. (r = 0,603, p <0,001). Nenhuma relação foi encontrada entre a espessura muscular do quadríceps com o TC6M e a força de preensão manual.
Conclusão: A espessura muscular do quadríceps está associada ao STS-60s, assim nossos resultados demonstram as repercussões da doença sobre o sistema músculo-esquelético.
Descritores: Sistema Musculoesquelético; Ultrassom; Composição Corporal; Desempenho Físico Funcional
Abstract
Background: This study aimed to evaluate the relationship between quadriceps muscle thickness and functional performance on the 60s sit-to-stand test (60s-STS), the six-minute walk test (6MWT), and handgrip strength in non-dialytic stage 4 and 5 chronic kidney disease (CKD) patients.
Methods: This was a cross-sectional study that evaluated 40 CKD patients aged between 30-70 years. Participants were submitted to an assessment that included quadriceps muscle thickness evaluated by a portable ultrasound. Functional performance tests included the 60s-STS, distance walked in the 6MWT, and handgrip strength. Also, body composition evaluated using electrical bioimpedance analysis and physical activity level through the short version of International Physical Activity were measured. Multiple linear regression was used to investigate the relationship between the quadriceps thickness and functional performance.
Results: Quadriceps muscle thickness was correlated to 60s-STS (R2 = 43.6%; 95% CI = 0.022 - 0.665; β = 0.34; p = 0.037). Also, a moderate correlation between this muscle thickness and appendicular skeletal muscle (ALM) was found in CKD patients (r = 0.603, p <0.001). No relationship was found between quadriceps muscle thickness with the 6MWT and handgrip strength.
Conclusion: Quadriceps muscle thickness is associated to 60s-STS, thus our results demonstrate the repercussions of the disease on the musculoskeletal system.
Keywords: Musculoskeletal System; Ultrasonics; Body Composition; Physical Functional Performance
Introducão
A disfunção no sistema músculo-esquelético é frequente na doença renal crônica (DRC) como resultado de alterações sistêmicas causadas pela diminuição da taxa de filtração glomerular (TFG), processo inflamatório, acidose metabólica, ingestão reduzida de proteína, resistência insulínica e inatividade física1-5. Esta condição contribui para o desenvolvimento da sarcopenia urêmica, caracterizada pela redução da força e da massa muscular5,6. Estudos anteriores mostraram que a prevalência de sarcopenia em pacientes com DRC não dialíticos (não-D) pode variar de 5 a 60%4,7,8, e está associada a limitações físicas, qualidade de vida reduzida e aumento da morbidade e mortalidade4,8.
A redução na massa muscular em pacientes com DRC torna-se aparente no início do curso desta doença e é multifatorial, uma vez que a própria doença contribui para o estado catabólico devido ao aumento da proteólise muscular e à redução da síntese proteica5,9. Esta redução na massa muscular leva a um estilo de vida sedentário, intolerância ao exercício e baixa aptidão cardiorrespiratória5,9-11 sendo, por sua vez, associada à limitação funcional e ao aumento da mortalidade9,12.
A ressonância nuclear magnética (RM) e a tomografia computadorizada (TC) têm sido consideradas o padrão ouro para avaliar a quantificação da massa muscular. Entretanto, a falta de portabilidade, o alto custo e a exposição à radiação limitam seu uso na prática clínica6,12,13. Desta forma, a ultrassonografia (US) tem sido proposta como um meio alternativo para avaliação, por ser um método de imagem válido, confiável e de baixo custo, com boa confiabilidade intra e interavaliador, e por ser viável na prática clínica12,13.
Considerando a existência de perda de massa muscular durante a DRC e suas repercussões clínicas na inatividade e funcionalidade, avaliar a espessura muscular do quadríceps em relação ao desempenho funcional desses pacientes pode fornecer informações sobre o curso da perda de massa muscular e declínio funcional ao longo da doença renal. Estudos anteriores demonstraram correlação positiva e boa confiabilidade e validade entre US com DEXA, TC, e RM para quantificar a massa muscular em idosos e jovens e pacientes com DRC12,13. No entanto, investigar a associação entre a espessura muscular do quadríceps por US e a função física em pacientes com DRC não dialíticos fornecerá mais informações sobre como o comprometimento muscular afeta o desempenho funcional em pacientes no tratamento conservador. Assim, o presente estudo teve como objetivo avaliar a relação entre a espessura muscular do quadríceps e o desempenho funcional no teste sit-to-stand de 60s (STS-60s), teste de caminhada de seis minutos (TC6M), e força de preensão manual em pacientes com DRC em estágio não dialítico.
Métodos
Desenho e cenário do estudo
Este foi um estudo transversal realizado de Abril de 2018 a Junho de 2019, onde pacientes com DRC do Serviço de Nefrologia do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Pernambuco foram recrutados por conveniência. Todos os procedimentos foram realizados no Laboratório de Fisioterapia Cardiopulmonar da Universidade Federal de Pernambuco, em Recife-PE, Brasil. Este estudo foi aprovado pelo comitê de ética e pesquisa desta instituição (CAAE: 84135518.3.0000.5208 e número de parecer: 3.366.668) e seguiu as normas da ferramenta STROBE (Strengthening the Reporting of Observational Studies in Epidemiology)14.
Participantes
Foram incluídos no estudo participantes com DRC, não dialíticos, nos estágios 4 e 5 de acordo com os critérios propostos pela Kidney Disease Improving Global Outcomes15, com idade entre 30 e 70 anos e de ambos os sexos. Foram excluídos os pacientes que estavam em um programa de diálise, que haviam sido transplantados e que não puderam realizar os testes funcionais ou clínicos ou responder aos questionários.
Medidas Do Desfecho
Os participantes foram submetidos a uma avaliação inicial que incluiu dados sociodemográficos (idade, sexo), medidas antropométricas (peso e altura), número de comorbidades relatadas pelo próprio participante e tempo em meses e causa da DRC. Depois, foram medidos nível de atividade física, composição corporal, espessura muscular do quadríceps e testes de desempenho funcional conforme descrito abaixo.
Nível de atividade física
O nível de atividade física foi avaliado utilizando o Questionário Internacional de Atividade Física (IPAQ - versão curta), validado para a população brasileira. O questionário consistia de oito questões abertas que avaliavam o tempo e a frequência de realização de caminhadas e atividades de intensidade moderada e vigorosa na última semana, a fim de avaliar o tempo gasto por semana em atividades físicas. Para os fins deste estudo, categorizamos os níveis de atividade física da seguinte forma: sedentário, quando os participantes relataram frequência de atividades inferiores a 5 dias/semana ou inferiores a 150 min/semana e ativos, quando os participantes estavam acima desses limites16.
Composição corporal
A composição corporal foi avaliada por análise de bioimpedância elétrica (InBody R20® - Dogok 2-Dong, Gangnam-gu, Seul, Coreia). O paciente foi previamente instruído a se alimentar pelo menos duas horas antes da avaliação, usar roupas leves, evitar atividades físicas e esvaziar sua bexiga antes da avaliação. O mesmo permaneceu em posição ortostática durante o teste com seus pés posicionados sobre os eletrodos na superfície da balança digital e os demais eletrodos presos a uma barra sustentada pelas mãos do paciente. A bioimpedância durou 30 segundos e foi repetida em caso de erro de leitura17. Foram obtidos peso corporal (kg), índice de massa corporal (IMC, kg/m2, e massa muscular esquelética apendicular (MEA, kg).
Espessura muscular do quadríceps
A espessura muscular do quadríceps foi medida utilizando um ultrassom portátil de alta definição (Sonoace R3®, Samsung Medison - Coreia do Sul) com o transdutor posicionado perpendicularmente na parte anterior da coxa. A avaliação da espessura muscular foi realizada no segmento dominante, o qual foi identificado a partir de uma pergunta sobre com qual perna o paciente costuma chutar, e realizada com o paciente em posição de decúbito dorsal, com um rolo de espuma abaixo da região poplítea deste membro. O transdutor foi posicionado a meio caminho entre a espinha ilíaca ântero-superior e a linha da articulação do joelho, da qual foi obtida a imagem transversal do músculo quadríceps18,19. Foram realizadas três medições da espessura do quadríceps femoral (mm) a partir da imagem congelada do músculo no monitor do equipamento. Para fins de registro, considerou-se a média dos três valores obtidos, desde que a diferença entre eles fosse inferior a 10%18,20.
Testes de desempenho funcional
Resistência dos membros inferiores (sts-60s)
Foi realizado o teste sit-to-stand de 60s (STS-60s) para avaliar a resistência dos membros inferiores. O paciente foi instruído a ficar em pé e sentar-se em uma cadeira de 46 cm de altura sem apoio de braços e com as mãos posicionadas sobre o ombro contralateral por 60 segundos. Os pacientes foram instruídos a completar o maior número possível de repetições dentro da padronização do movimento correto de execução do teste21,22.
Capacidade funcional submáxima
Realizou-se o teste de caminhada de seis minutos (TC6M) de acordo com as diretrizes estabelecidas pela Sociedade Torácica Americana23. A distância percorrida foi registrada em metros ao final do teste. A equação de referência para a população brasileira foi utilizada para estimar o percentual previsto24.
Força de preensão manual
A força de preensão manual foi verificada usando um dinamômetro (Dinamômetro Smedley® - tipo manual, Saehan - Coreia) de acordo com as diretrizes estabelecidas pela Sociedade Americana de Terapeutas de Mão25. O teste foi realizado 3 vezes no membro dominante, com um intervalo de descanso de 30 segundos entre cada manobra, e o valor mais alto entre as medições foi adotado desde que a diferença entre elas fosse inferior a 10%26. O valor previsto para cada paciente foi determinado a partir de equações de predição propostas pelo estudo de Novaes et al. (2009)27. A força muscular foi classificada como baixa se fossem obtidos valores inferiores a 32 kg para homens e inferiores a 17 kg para mulheres, com base no 20º percentil da amostra.
Análise Estatística
Foi utilizado inicialmente o teste de Kolmogorov-Smirnov para verificar a distribuição de normalidade das variáveis contínuas. Os dados foram expressos como média e intervalo de confiança de 95% para variáveis contínuas e como médias de distribuição de frequência absoluta e percentual para variáveis dicotômicas. O teste de correlação de Pearson foi usado para avaliar a relação entre a espessura do quadríceps e o músculo esquelético apendicular. Utilizou-se a regressão linear múltipla para investigar a relação entre a espessura do quadríceps e o desempenho funcional (STS-60s, TC6M, e força de preensão manual)28,29. Cada variável de desempenho funcional foi analisada separadamente com a espessura do quadríceps, a fim de evitar multicolinearidade. Todos os modelos foram ajustados para sexo, idade e altura. Os dados foram processados utilizando o software Statistical Package for Social Science (SPSS), Chicago, IL, EUA, versão 20.0 para Windows. Os testes foram considerados significativos ao nível de 5%.
Resultados
Após a triagem para participação no estudo, 192 dos 312 pacientes não preencheram os critérios de inclusão. Dos 120 pacientes elegíveis, 40 não concordaram em participar por residirem no interior do estado, 17 desistiram devido a dificuldades financeiras e 23 não aceitaram se deslocar até o local da avaliação, portanto, um total de 40 pacientes foram avaliados.
As características gerais dos pacientes estão descritas na Tabela 1. A idade média dos participantes era de 51,45 anos, a maioria dos participantes eram homens (52,5%), sedentários (57,5%), e com tempo de doença de 77,63 meses.
A Tabela 2 mostra os valores descritivos da espessura do quadríceps, os testes de desempenho funcional e seus valores previstos. Os pacientes com DRC caminharam 82,64% do TC6M previsto e 81,13% deles apresentaram valores baixos de força de preensão manual.
Espessura muscular do quadríceps,teste sit-to-stand de 60s, distância percorrida em metros no TC6M e sua porcentagem prevista, valores absolutos de preensão manual e presença de fraqueza muscular em pacientes com DRC
A espessura do quadríceps foi de 26,60 (25,03-28,15) mm para homens e 20,98 (19,01-22,94) mm para mulheres. O desempenho no STS-60s foi de 24,81 (23,11-26,50) repetições para homens e 20,84 (19,19-22,50) repetições para mulheres. Em relação ao TC6M, 16 pacientes (40%) apresentaram desempenho abaixo de 80% do valor previsto, com 28,6% homens (6) e 52,6% mulheres (10). A frequência de fraqueza muscular entre homens e mulheres foi de 28,6% (6) e 21% (4), respectivamente.
De acordo com o resultado da análise de regressão linear múltipla, foi observada uma relação entre a espessura do quadríceps e o número de repetições no STS-60s, onde o aumento em uma repetição foi relacionado a um aumento de 0,34 mm na espessura do quadríceps (R2 = 0,436; IC95%: 0,022-0,665; p=003), como mostrado na Tabela 3. Além disso, a espessura do quadríceps foi moderadamente correlacionada com a MEA (r = 0,603, p < 0,001).
Discussão
Foi observada uma relação entre a espessura muscular do quadríceps com o STS-60s nos pacientes do estudo. Até o momento, o único estudo com resultados semelhantes foi o de Wilkinson et al. (2019)30, que encontraram uma relação negativa entre a baixa ecogenicidade do reto femoral medida por ultrassom e o STS-60s em pacientes com DRC sob tratamento conservador; entretanto, de acordo com esses autores, a área de secção transversal desse músculo foi considerada o melhor preditor de desempenho físico nesses pacientes, em relação à ecogenicidade, como encontrado no presente estudo.
Nosso estudo encontrou uma relação positiva entre a espessura do quadríceps e o STS-60s, semelhante à encontrada em estudos de Mateos-Angulo et al. (2019)31, Lopez et al. (2017)32, e McIntyre et al. (2006)33. Mateos-Angulo et al. (2019)31 e Lopez et al. (2017)32 avaliaram a espessura muscular por ultrassom e testes funcionais (CST-5R e CST-30R, respectivamente) em idosos. McIntyre et al. (2006)33utilizaram a TC para verificar a área seccional do quadríceps, relacionando-a com o STS-60s e também encontraram resultados similares ao comparar pacientes com DRC sob tratamento conservador com aqueles submetidos à terapia de diálise. No entanto, Segura-Ortí et al. (2018)34 não encontraram relação entre a área de secção transversal do quadríceps e o teste sit-to-stand de 5 repetições usando RM em indivíduos com DRC, em hemodiálise e sob tratamento conservador, mas encontraram uma forte relação entre a força isocinética e isométrica deste músculo. As alterações ocorrem no desempenho físico e funcional de pacientes com DRC e são devidas à degradação da proteína muscular35, que pode ser observada por exames de imagem31-34. A associação encontrada em nosso estudo reforça a importância da medição periódica de ambos os testes, uma vez que o US é um método portátil e de baixo custo, e tem boa confiabilidade, que pode complementar os testes funcionais para monitorar as repercussões da doença sobre o sistema músculo-esquelético.
Nosso estudo não encontrou relação entre a espessura do quadríceps e o TC6M. Wilkinson et al. (2019)30 avaliaram a área de secção transversal do músculo reto femoral de pacientes com DRC sob tratamento conservador por ultrassom e encontraram uma associação moderada com o teste incremental de caminhada, que é oposto aos nossos achados. Em pacientes com DRC, fatores ligados à qualidade muscular (infiltração de gordura e colágeno no músculo desses pacientes) e ao tamanho do músculo podem resultar em comprometimento muscular, contribuindo para alterações estruturais nas propriedades contráteis desses pacientes30) levando à perda muscular, incapacidade de exercício e imobilidade36.
O TC6M avalia o estado de saúde dos pacientes e envolve uma análise integrativa entre os sistemas cardiovascular, pulmonar, neuromuscular e metabólico23. A incapacidade funcional em pacientes com DRC é multifatorial37, associada à doença cardiovascular38,39, comportamento sedentário40,41, fraqueza muscular e redução da taxa de filtração glomerular5,42,43. Desta forma, a espessura muscular do quadríceps, que representa apenas a quantidade de massa muscular, pode não estar relacionada com a distância percorrida no TC6M.
Nosso estudo também não encontrou nenhuma relação entre a espessura do quadríceps e a força de preensão manual. Estes resultados sugerem que as medições de força dos membros superiores não são comparáveis às medições de espessura do quadríceps, embora ambas reflitam na funcionalidade do paciente. Pacientes com DRC têm força e massa muscular reduzidas, caracterizando sarcopenia6,44, embora tenhamos observado apenas 5% de sarcopenia em nossa amostra (dados não mostrados). De acordo com o atual Consenso Europeu sobre Sarcopenia em Idosos6, a força muscular é o melhor preditor de desfechos adversos (quedas, fraturas, disfunção física e mortalidade) para pacientes quando comparada apenas à redução/perda de massa muscular, e sua avaliação periódica na DRC é necessária.
Foi encontrada uma correlação moderada entre a espessura muscular e a MEA em nossos pacientes, o que poderia explicar a relação entre a espessura do músculo e seu desempenho funcional. Alterações na composição corporal estão presentes nos estágios iniciais da DRC como consequência de síndrome urêmica, e estas levam ao aumento da proteólise muscular e à redução da síntese proteica5,33,45. A redução da massa muscular e da força muscular pode causar prejuízo no desempenho físico e funcional desses pacientes à medida que a TFG diminui5,34,35.
A fraqueza muscular foi observada em 25% de nossos pacientes sob tratamento conservador. Um estudo relativamente recente descobriu que a redução da massa muscular e da força em pacientes em diálise eram preditores de mortalidade nesta população, mas a redução da força muscular estava mais fortemente associada à mortalidade44. Entretanto, destacamos o fato de que os pacientes avaliados em nosso estudo estavam sob tratamento conservador e já tinham apresentado fraqueza muscular. Considerando que esses pacientes progredirão para os estágios finais da DRC, espera-se uma redução acentuada da massa muscular e da força, o que pode resultar em uma diminuição do desempenho funcional35.
Com relação ao desempenho funcional no TC6M de nossos pacientes, observamos que 40% deles estavam abaixo de 80% da distância prevista percorrida. Ao avaliar pacientes em programas de diálise peritoneal e hemodiálise, Painter et al (2017)46 identificaram 62,2 e 52,8% do TC6M previsto, respectivamente. Faria et al. (2013)47 observaram um declínio progressivo na distância percorrida no TC6M por pacientes com DRC à medida que avançavam no estágio da doença. Segura-Ortí et al. (2018)34 também encontraram uma distância percorrida mais curta neste teste entre pacientes em tratamento conservador e dialítico, quando comparado a indivíduos saudáveis. A redução da capacidade funcional de nossos pacientes no estágio conservador exige que sejam instituídas medidas preventivas a fim de evitar o declínio funcional em estágios mais avançados da doença, quando os pacientes podem progredir para DRC terminal. Para implicações clínicas, considerando que quase 60% de nossa amostra era sedentária, programas de exercícios para esta população precisam ser implementados como estratégia para manter o nível de atividade física.
Conclusão
No presente estudo, encontramos uma correlação entre a espessura muscular do quadríceps avaliada por ultrassonografia e o desempenho funcional no STS-60s e entre esta espessura muscular e a MEA em pacientes com DRC sob tratamento não dialítico. Como perspectiva futura, a avaliação por imagem e os testes funcionais podem ser considerados na prática clínica, uma vez que seus resultados podem ser usados para o monitoramento da fisioterapia a fim de melhorar o estado funcional em programas de exercícios desenvolvidos para minimizar os efeitos deletérios da DRC.
Limitações do estudo
O presente estudo teve como limitação a falta de avaliação da ecogenicidade do quadríceps. Outra limitação possível foi não incluirmos pacientes em todos os estágios da DRC, o que poderia fornecer informações adicionais sobre em qual estágio da doença ocorre o maior comprometimento da função física. Finalmente, não realizamos um cálculo prévio do tamanho da amostra. Entretanto, uma análise de poder post-hoc utilizando quatro preditores e o nível de probabilidade de 0,05, resultou em um poder de 0,99, 0,97, e 0,97, respectivamente48.
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
01 Set 2021 -
Data do Fascículo
Apr-Jun 2022
Histórico
-
Recebido
13 Mar 2021 -
Aceito
19 Jul 2021