Há mais de 4 décadas, Hodson & Edwards11. Hodson CJ, Edwards D. Chronic pyelonephritis and vesico-ureteric
reflex. Clin Radiol 1960;11:219-31. PMID: 13714877 DOI:
http://dx.doi.org/10.1016/S0009-9260(60)80047-5
http://dx.doi.org/10.1016/S0009-9260(60)...
descreveram a associação de pielonefrite crônica e refluxo vesicoureteral (RVU). Logo, o
termo nefropatia de refluxo passou a ser adotado. Desde então, as infecções de trato
urinário (ITU) e o RVU são considerados como fatores de risco para a formação de cicatrizes
renais causadoras de hipertensão arterial em 10% a 20% e doença renal crônica (DRC) se
lesões bilaterais. Baseado nestes conceitos, a investigação urológica tem sido recomendada
na ocasião da primeira pielonefrite aguda ou nas ITU recorrentes, em crianças de qualquer
idade.
Na última década, surgiram diretrizes do NICE22. National Institute for Health and Clinical Excellence. Urinary tract
infection in children. London: NICE, 2007 [Cited 2014 Feb 3]. Available from:
http://guidance.nice.org.uk/CG054
http://guidance.nice.org.uk/CG054...
(National Institute for Health and Clinical Excellence) e da AAP33. Subcommittee on Urinary Tract Infection, Steering Committee on
Quality Improvement and Management.; Roberts KB. Urinary tract infection: clinical
practice guideline for the diagnosis and management of the initial UTI in febrile
infants and children 2 to 24 months. Pediatrics 2011;128:595-610. PMID: 21873693 DOI:
http://dx.doi.org/10.1542/peds.2011-1330
http://dx.doi.org/10.1542/peds.2011-1330...
(American Academy of Pediatrics) com
protocolos restritivos em relação à investigação, priorizando as crianças menores. Surgiram
diversas publicações44. Lytzen R, Thorup J, Cortes D. Experience with the NICE guidelines for
imaging studies in children with first pyelonephritis. Eur J Pediatr Surg
2011;21:283-6. DOI: http://dx.doi.org/10.1055/s-0031-1277212
http://dx.doi.org/10.1055/s-0031-1277212...
5. La Scola C, De Mutiis C, Hewitt IK, Puccio G, Toffolo A, Zucchetta P,
et al. Different guidelines for imaging after first UTI in febrile infants: yield,
cost, and radiation. Pediatrics 2013;131:e665-71. DOI:
http://dx.doi.org/10.1542/peds.2012-0164
http://dx.doi.org/10.1542/peds.2012-0164...
6. Pennesi M, L'erario I, Travan L, Ventura A. Managing children under
36 months of age with febrile urinary tract infection: a new approach. Pediatr
Nephrol 2012;27:611-5. DOI:
http://dx.doi.org/10.1007/s00467-011-2087-3
http://dx.doi.org/10.1007/s00467-011-208...
7. Shaikh N, Ewing AL, Bhatnagar S, Hoberman A. Risk of renal scarring
in children with a first urinary tract infection: a systematic review. Pediatrics
2010;126:1084-91. DOI: http://dx.doi.org/10.1542/peds.2010-0685
http://dx.doi.org/10.1542/peds.2010-0685...
-88. Round J, Fitzgerald AC, Hulme C, Lakhanpaul M, Tullus K. Urinary
tract infections in children and the risk of ESRF. Acta Paediatr 2012;101:278-82.
PMID: 22122273 DOI:
http://dx.doi.org/10.1111/j.1651-2227.2011.02542.x
http://dx.doi.org/10.1111/j.1651-2227.20...
com o intuito de demonstrar que a aplicação
indiscriminada destes protocolos pode induzir a uma falha na prevenção, já que um número
significativo de crianças ficaria sem diagnóstico de RVU e cicatrizes que podem ocorrer a
partir da primeira ITU em 5%-15% dos casos.
Se investigação e profilaxia antibiótica ainda são motivo de controvérsia nos tempos atuais, mais ainda a indicação de tratamento conservador, cirúrgico ou endoscópico do RVU. Na falta de um consenso internacional, atualmente procura-se estratificar os fatores de risco de acordo com o histórico familiar, sexo, idade, lateralidade, recorrência da ITU, grau do RVU, presença de cicatrizes e associação com disfunções de trato urinário inferior (DTUI). Neste sentido, é interessante perceber a tendência atual de separar dois grupos de pacientes:
a) Os meninos com mais hidronefrose, ITU, e maior grau de RVU no período neonatal, muitas
vezes portadores de lesão renal congênita por displasia (10%) e podendo também apresentar
lesões cicatriciais adquiridas, são os mais indicados à tratamento cirúrgico.99. Paintsil E. Update on recent guidelines for the management of urinary
tract infections in children: the shifting paradigm. Curr Opin Pediatr 2013;25:88-94.
DOI: http://dx.doi.org/10.1097/MOP.0b013e32835c14cc
http://dx.doi.org/10.1097/MOP.0b013e3283...
b) As meninas com maior recorrência de ITU febril e cicatrizes renais adquiridas após o
período neonatal e relacionadas com as DTUI. 40%-60% das crianças com DTUI apresentam RVU e
a prevalência de cicatrizes renais chega a 30%.1010. Tekgül S, Riedmiller H, Hoebeke P, Kočvara R, Nijman RJ, Radmayr C,
et al.; European Association of Urology. EAU guidelines on vesicoureteral reflux in
children. Eur Urol 2012;62:534-42. As
DTUI se apresentam com sintomas de urgência ou postergação, incontinência diurna e/ou
noturna, alterações no fluxo urinário, resíduo pós-miccional, deformações de uretra (em
forma de pião) e ITU recorrente, podendo associar-se à constipação crônica e grave
(síndrome de eliminações). A Associação Americana de Urologia (AUA), em sua diretriz,1111. Peters CA, Skoog SJ, Arant BS Jr, Copp HL, Elder JS, Hudson RG, et
al. Summary of the AUA Guideline on Management of Primary Vesicoureteral Reflux in
Children. J Urol 2010;184:1134-44. DOI:
http://dx.doi.org/10.1016/j.juro.2010.05.065
http://dx.doi.org/10.1016/j.juro.2010.05...
destaca a necessidade de pesquisar estes sintomas
logo de início, no primeiro episódio de ITU e, assim, o foco deve ser o tratamento das
DTUI, referindo "A happy bladder is an empty bladder and an empty
rectum".
Os lactentes também apresentam DTUI relacionadas ao RVU. No recente trabalho publicado1212. Sillén U, Brandström P, Jodal U, Holmdahl G, Sandin A, Sjöberg I, et
al. The Swedish reflux trial in children: v. Bladder dysfunction. J Urol
2010;184:298-304. (Swedish Reflux Trial), com 203 lactentes portadores
de RVU III-IV, 34% apresentavam DTUI com efeito negativo sobre a resolução do RVU e a
ocorrência de cicatrizes renais em dois anos de seguimento. A avaliação não invasiva da
função vesical em lactentes é possível e foi aplicada neste estudo, por meio do Teste de 4
horas de observação miccional,1313. Holmdahl G, Hanson E, Hanson M, Hellström AL, Hjälmås K, Sillén U.
Four-hour voiding observation in healthy infants. J Urol 1996;156:1809-12. PMID:
8863622 DOI: http://dx.doi.org/10.1016/S0022-5347(01)65543-5
http://dx.doi.org/10.1016/S0022-5347(01)...
permitindo
selecionar precocemente este grupo de pacientes.
O tratamento conservador é baseado no fato de ocorrer resolução espontânea do RVU, principalmente em jovens pacientes com RVU de baixo grau, chegando a 80% no RVU I-II e 30%-50% no RVU III-IV em 4 a 5 anos de acompanhamento.1010. Tekgül S, Riedmiller H, Hoebeke P, Kočvara R, Nijman RJ, Radmayr C, et al.; European Association of Urology. EAU guidelines on vesicoureteral reflux in children. Eur Urol 2012;62:534-42.
No presente número do Jornal Brasileiro de Nefrologia (Colocar a página), Teixeira et al.1414. Teixeira CBB, Cançado MAP, Carvalhaes JTA. Refluxo Vesicoureteral primário na infância: tratamento conservador versus intervenção cirúrgica. J Bras Nefrol 2014;36:10-7 descrevem um grupo de pacientes com RVU mantidos em tratamento conservador ou encaminhados para tratamento cirúrgico e, apesar do número limitado de pacientes e do caráter retrospectivo, confirma os achados de literatura em relação a idade, sexo, recorrência de ITU e o elevado índice de cicatrizes renais (37,2%), reforçando a necessidade de seriedade na aplicação dos protocolos de investigação e tratamento nas crianças portadoras de ITU e colocando na discussão pontos atuais sobre a estratificação dos grupos a risco.
A heterogeneidade dos diversos estudos dificulta uma análise comparativa e a maioria das recomendações são baseadas em consenso. Enquanto o RVU primário recebe tratamento conservador com profilaxia ou cirurgia endoscópica ou aberta, os casos secundários as DTUI se beneficiam de uroterapia, profilaxia antibiótica, biofeedback de assoalho pélvico, anticolinérgicos e eletroestimulação transcutânea parassacral, de acordo com o tipo de disfunção, com alto índice de resolução do RVU. Na nossa experiência1515. Meneses RP, Braga D, Melamed SCV, Andrade L. Tratamento das disfunções do trato urinário inferior. J Parana Pediatr 2010;11:76-81., entre 402 crianças portadoras de DTUI, 73% do sexo feminino com idade média de 7,3 ± 2,8 anos, 29% apresentavam RVU e entre estes 39% apresentavam cicatrizes renais. Com o tratamento da DTUI, houve cura e redução do grau do RVU em 56% e 24%, respectivamente.
No Brasil, além de poucos centros especializados para atender o elevado número de
pacientes, as dificuldades sociais muitas vezes dificultam a manutenção de profilaxia
antibiótica e acompanhamento e estes casos acabam sendo levados ao tratamento cirúrgico,
mas vale lembrar que na vigência de DTUI, os procedimentos cirúrgicos são muitas vezes
fadados ao insucesso. Muitos estudos ainda estão por vir e ditos como "an ounce of
prevention is better than a pound of cure'99. Paintsil E. Update on recent guidelines for the management of urinary
tract infections in children: the shifting paradigm. Curr Opin Pediatr 2013;25:88-94.
DOI: http://dx.doi.org/10.1097/MOP.0b013e32835c14cc
http://dx.doi.org/10.1097/MOP.0b013e3283...
ou 'scars may develop in infant kidneys quicker than urine culture can
confirm the diagnosis, and that reflux nephropathy has no age limit"88. Round J, Fitzgerald AC, Hulme C, Lakhanpaul M, Tullus K. Urinary
tract infections in children and the risk of ESRF. Acta Paediatr 2012;101:278-82.
PMID: 22122273 DOI:
http://dx.doi.org/10.1111/j.1651-2227.2011.02542.x
http://dx.doi.org/10.1111/j.1651-2227.20...
demonstram a preocupação dos nefropediatras em
relação às ITU recorrentes e RVU na infância.
Referências
-
1Hodson CJ, Edwards D. Chronic pyelonephritis and vesico-ureteric reflex. Clin Radiol 1960;11:219-31. PMID: 13714877 DOI: http://dx.doi.org/10.1016/S0009-9260(60)80047-5
» http://dx.doi.org/10.1016/S0009-9260(60)80047-5 -
2National Institute for Health and Clinical Excellence. Urinary tract infection in children. London: NICE, 2007 [Cited 2014 Feb 3]. Available from: http://guidance.nice.org.uk/CG054
» http://guidance.nice.org.uk/CG054 -
3Subcommittee on Urinary Tract Infection, Steering Committee on Quality Improvement and Management.; Roberts KB. Urinary tract infection: clinical practice guideline for the diagnosis and management of the initial UTI in febrile infants and children 2 to 24 months. Pediatrics 2011;128:595-610. PMID: 21873693 DOI: http://dx.doi.org/10.1542/peds.2011-1330
» http://dx.doi.org/10.1542/peds.2011-1330 -
4Lytzen R, Thorup J, Cortes D. Experience with the NICE guidelines for imaging studies in children with first pyelonephritis. Eur J Pediatr Surg 2011;21:283-6. DOI: http://dx.doi.org/10.1055/s-0031-1277212
» http://dx.doi.org/10.1055/s-0031-1277212 -
5La Scola C, De Mutiis C, Hewitt IK, Puccio G, Toffolo A, Zucchetta P, et al. Different guidelines for imaging after first UTI in febrile infants: yield, cost, and radiation. Pediatrics 2013;131:e665-71. DOI: http://dx.doi.org/10.1542/peds.2012-0164
» http://dx.doi.org/10.1542/peds.2012-0164 -
6Pennesi M, L'erario I, Travan L, Ventura A. Managing children under 36 months of age with febrile urinary tract infection: a new approach. Pediatr Nephrol 2012;27:611-5. DOI: http://dx.doi.org/10.1007/s00467-011-2087-3
» http://dx.doi.org/10.1007/s00467-011-2087-3 -
7Shaikh N, Ewing AL, Bhatnagar S, Hoberman A. Risk of renal scarring in children with a first urinary tract infection: a systematic review. Pediatrics 2010;126:1084-91. DOI: http://dx.doi.org/10.1542/peds.2010-0685
» http://dx.doi.org/10.1542/peds.2010-0685 -
8Round J, Fitzgerald AC, Hulme C, Lakhanpaul M, Tullus K. Urinary tract infections in children and the risk of ESRF. Acta Paediatr 2012;101:278-82. PMID: 22122273 DOI: http://dx.doi.org/10.1111/j.1651-2227.2011.02542.x
» http://dx.doi.org/10.1111/j.1651-2227.2011.02542.x -
9Paintsil E. Update on recent guidelines for the management of urinary tract infections in children: the shifting paradigm. Curr Opin Pediatr 2013;25:88-94. DOI: http://dx.doi.org/10.1097/MOP.0b013e32835c14cc
» http://dx.doi.org/10.1097/MOP.0b013e32835c14cc -
10Tekgül S, Riedmiller H, Hoebeke P, Kočvara R, Nijman RJ, Radmayr C, et al.; European Association of Urology. EAU guidelines on vesicoureteral reflux in children. Eur Urol 2012;62:534-42.
-
11Peters CA, Skoog SJ, Arant BS Jr, Copp HL, Elder JS, Hudson RG, et al. Summary of the AUA Guideline on Management of Primary Vesicoureteral Reflux in Children. J Urol 2010;184:1134-44. DOI: http://dx.doi.org/10.1016/j.juro.2010.05.065
» http://dx.doi.org/10.1016/j.juro.2010.05.065 -
12Sillén U, Brandström P, Jodal U, Holmdahl G, Sandin A, Sjöberg I, et al. The Swedish reflux trial in children: v. Bladder dysfunction. J Urol 2010;184:298-304.
-
13Holmdahl G, Hanson E, Hanson M, Hellström AL, Hjälmås K, Sillén U. Four-hour voiding observation in healthy infants. J Urol 1996;156:1809-12. PMID: 8863622 DOI: http://dx.doi.org/10.1016/S0022-5347(01)65543-5
» http://dx.doi.org/10.1016/S0022-5347(01)65543-5 -
14Teixeira CBB, Cançado MAP, Carvalhaes JTA. Refluxo Vesicoureteral primário na infância: tratamento conservador versus intervenção cirúrgica. J Bras Nefrol 2014;36:10-7
-
15Meneses RP, Braga D, Melamed SCV, Andrade L. Tratamento das disfunções do trato urinário inferior. J Parana Pediatr 2010;11:76-81.
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
Jan-Mar 2014
Histórico
-
Recebido
25 Out 2013 -
Aceito
03 Jan 2014